Nise Da Silveira Método e Prática (Final)
Nise Da Silveira Método e Prática (Final)
Nise Da Silveira Método e Prática (Final)
Introdução
Método
Resultados
Discussão
Conclusão
Por fim, podemos conferir que os aspectos de intrusão e desintegração que
caracterizam o que é considerado patologia, transtorno e sofrimento psíquico são um
contraponto à concepção de psiquismo como um sistema vivo que podemos extrair dos
livros de Nise da Silveira (1992, 2015). Sistema cujo dinamismo próprio tende à
autorregulação e se orienta para a saúde e a autocura e desemboca num método de
leitura que vai do psíquico ao artístico extrapolando o que se poderia identificar coma
uma psicopatologia para alcançar os mecanismos de constituição psíquica e a própria
vontade de formar o mundo, num ponto em que coincidem os laços entre a psicologia
profunda, a lógica da criatividade e a base profunda universal da psique (Frayze-Pereira,
1995, p.15).
Partindo da comunicação e do acesso – mediante linguagem simbólica não-
verbal – à vivência da pessoa em sofrimento psíquico, Nise busca realizar os contornos
da experiência, auxiliando-os na luta por uma existência menos sofrida. Contornos
dados desde a dinâmica dos conflitos que se expressam nos símbolos (imagens
carregadas de afeto) e que devem auxiliar a restabelecer o ego e as relações de mediação
e socialização dele dependentes ao passo em que visa o favorecimento o
desenvolvimento das “sementes criativas inerentes” (Silveira, 2015, p. 110),
enaltecendo o potencial de simbolização, criatividade e produção de vida.
Logo, a reabilitação psicossocial colocada em marcha no tratamento depreende
uma prática inovadora efetivada mediante duas condições: a tendência do psiquismo à
instauração de meios de autorregulação e autocura impulsionadas, por sua vez pela
mediação do cuidado através do que Nise chama de afeto catalizador.
No que concerne ao ímpeto de autorregulação e saúde próprio da psique, o
acompanhamento dos ateliês de pintura e modelagem proporcionou a Nise uma maior
compreensão do dinamismo psíquico presente na esquizofrenia, assim como da
tendência humana ao simbolismo. Tendência que ela encontra especialmente na
produção espontânea das mandalas, que indica, por usa vez uma disposição inconsciente
a compensar o caos interior e na busca de um ponto central na psique como tentativa de
reconstruir a personalidade dividida. Ao mesmo tempo em que esta tendência apresenta
uma face que visa de restabelecimento de uma ordem, pulsa nela ainda um propósito
criador, que leva a dar forma e expressão a algo de novo e único que ainda não existe.
Por fim, a prática de cuidado pautada por Nise da Silveira (2015) depreende que
se faça do ateliê um ambiente de acolhedor com clima de liberdade e sem coação, no
qual, por meio de diversas atividades, os sintomas pudessem encontrar oportunidade
para sua expressão. Para construir este espaço significativo, desencadeador de
aproximações e disparadores do processo de criação ela investe na formação de
monitores. Sua presença constante no ateliê não visa condicionar ou interferir nos
trabalho dos clientes, mas ofertar um afeto catalisador capaz de estimular a criatividade
e restaurar os meios de comunicação com o mundo ao redor.
A eficácia do tratamento depende da presença de um ponto de apoio com o qual
o paciente fazer trocas de investimento afetivo. Assim, a presença dos monitores visa
dar continência às experiências, para não apressar as coisas, acolhendo dores, silêncios,
ritmos, e, ao mesmo tempo, estimulando a expressão e processos de criação, que se
desenvolvem apenas mediante o suporte do afeto. Neste ponto em que o suporte afetivo
funciona como um disparador do processo de cura é que se tocam o método analítico, a
abordagem humana e a prática radical e acolhedora de Nise da Silveira. Ponto no qual
se diminui a importância da função diagnóstica – base da ideia de arte patológica e dos
tratamentos desumanos coercitivos – em prol da experimentação, da invenção, da
criatividade, do afeto e do cuidado através dos quais o tratamento se volta para
compreensão da vivência e construção de passagens para a autonomia dos usuários dos
sistemas de saúde mental.
Referências
Arantes, O. (1991). Mário Pedrosa itinerário crítico. São Paulo: Página Aberta.
Gullar, F. (1996) Nise da Silveira: uma psiquiatra rebelde. Rio de Janeiro: Relume-
Dumará.
Horta, B. (2008) Arqueóloga dos mares (2ª ed.) Rio de Janeiro: Aeroplano.
Jung, C. A Natureza da Psique. Tradução de Pe. Dom Mateus Ramalho Rocha, OSB.
Petrópolis: Vozes, 1984, capítulo II, volume VIII/2 das Obras Completas
Machado, R., Loureiro, Â., Luz, R. & Muricy, K. (1978) Danação da norma: a
medicina social e constituição da psiquiatria no Brasil. Rio de Janeiro: Edições
Graal.
Pedrosa, M. (1949) Arte, necessidade vital. Rio de Janeiro: Casa do Estudante do
Brasil.