Treinamento Imo 2017

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 33

Primeira Lista de Preparação para a LVIII IMO

e XXVII Olimpı́ada Iberoamericana de Matemática


Nı́vel III
Soluções

Prazo: 17/02/2017, 23:59 de Brası́lia


Álgebra

PROBLEMA 1
O algarismo mais à esquerda (na base decimal) dos números 4n e 5n são iguais. Prove que esse algarismo é 2
ou 4.

Solução
Seja k o algarismo mais à esquerda de 4n e 5n , no caso em que eles são iguais. Então k · 10a < 4n < (k + 1) · 10a
e k · 10b < 5n < (k + 1) · 10b (nenhuma igualdade pode ocorrer pois 4n não ter fator 5 e 5n não tem fator 2).
Elevando a segunda desigualdade ao quadrado e multiplicando obtemos k 3 ·10a+2b < 100n < (k+1)3 ·10a+2b ⇐⇒
k 3 < 102n−a−2b < (k + 1)3 , ou seja, deve existir alguma potência de 10 entre k 3 e (k + 1)3 . A tabela a seguir
mostra que isso só é possı́vel para k = 2 ou k = 4:
k 1 2 3 4 5 6 7 8 9
k3 1 8 27 64 125 256 343 256 729
Observação: Com o auxı́lio de um computador, encontramos 411 = 4194304 e 511 = 48828125; 452 =
20282409603651670423947251286016 e 552 = 2220446049250313080847263336181640625. 11 e 52 são os menores
expoentes possı́veis.

PROBLEMA 2
Encontre todos os pares (α, β) de reais positivos tais que
⌊α⌊βx⌋⌋ = ⌊β⌊αx⌋⌋
para todo x real.

Solução
Resposta: (α, α), α real positivo, e (1/m, 1/n), m, n inteiros positivos.
Sejam a = 1/α e b = 1/β, de modo que a igualdade agora é
! " ! "
⌊x/b⌋ ⌊x/a⌋
= .
a b
Agora, vamos calcular quando o lado esquerdo é igual a um inteiro n. Para isso, devemos ter
⌊x/b⌋
n≤ < n + 1 ⇐⇒ na ≤ ⌊x/b⌋ < (n + 1)a ⇐⇒ ⌈na⌉ ≤ x/b < ⌈(n + 1)a⌉ ⇐⇒ b⌈na⌉ ≤ x < b⌈(n + 1)a⌉.
a
Assim, trocando a e b de lugar obtemos que a condição é equivalente a
b⌈na⌉ = a⌈nb⌉, n ∈ Z,
que, quando ⌈nb⌉ ̸= 0, pode ser reescrita como
a ⌈na⌉
= .
b ⌈nb⌉
Se a e b são ambos inteiros, os tetos somem e a condição é válida. Suponha então, sem perdas, que a não é
inteiro.
Sejam A = ⌈a⌉ e B = ⌈b⌉ (note que B ≥ 1). Como a < A e (n + 1)a − (na + 1) < ⌈(n + 1)a⌉ − ⌈na⌉ <
(n + 1)a + 1 − na ⇐⇒ a − 1 < ⌈(n + 1)a⌉ − ⌈na⌉ < a + 1 ⇐⇒ ⌈(n + 1)a⌉ − ⌈na⌉ ∈ {A − 1, A}, existe k inteiro
positivo tal que ⌈na⌉ = nA para n = 1, 2, . . . , k − 1 e ⌈ka⌉ = kA − 1. Então para n = 1 temos ab = B A
e, para
2 ≤ n ≤ k − 1,
A a nA
= = =⇒ ⌈nb⌉ = nB.
B b ⌈nb⌉
Fazendo n = k, obtemos
A kA − 1 B
= ⇐⇒ ⌈kb⌉ = kB − .
B ⌈kb⌉ A
Mas ⌈kb⌉ ∈ {kB − 1, kB}, logo B = A =⇒ ab = 1 ⇐⇒ a = b, ou seja, α = β.
Desta forma, a, b são inteiros positivos ou α = β.
PROBLEMA 3
Um polinômio é realı́stico se todos os seus coeficientes são reais. Sejam P e Q polinômios de coeficientes com-
plexos tais que a composição P ◦ Q(x) = P (Q(x)) é realı́stica. Suponha que os coeficientes lı́der e independente
de Q são ambos reais. Prove que P e Q são ambos realı́sticos.

Solução
#n #m
Sejam P (x) = j=1 aj xj e Q(x) = j=1 bj xj . Olhando o coeficiente dominante de P ◦ Q, que é an bm , vemos
que an é real.
Suponha que Q não é realı́stico e seja k o maior ı́ndice para o qual bk ∈ / R. Olhe para o coeficiente em
xm(n−1)+k de P ◦ Q: note que, sendo k > 0, não usamos o coeficiente de graus n − 1 para baixo em P , ou seja,
só olhamos para an Qn . Esse coeficiente é an bn−1
m bk + M , em que M só tem coeficientes com ı́ndice maior do
que k em Q e an . Sendo an , bm ̸= 0, bk é real, absurdo.
Agora provamos que P é realı́stico. Para isso, suponha o contrário e seja ℓ o maior ı́ndice para o qual aℓ não
é real. Olhe agora para o coeficiente em xℓm em P ◦ Q. Aparece aℓ bℓm + N , em que N só tem coeficientes de Q
e coeficientes de ı́ndice maior do que ℓ em P . Com isso, aℓ é real, outro absurdo.

Combinatória

PROBLEMA 4
Em cada vértice de um prisma com bases n-agonais escrevemos o número 1 ou −1. Para que valores de n é
possı́vel fazer isso de modo que os produtos dos números em cada face sejam todos iguais a −1?

Solução
Resposta: n múltiplo de 4.
Considere as arestas laterais do prisma. O produto dos números nas suas extremidades é −1 ou 1. Para
que os retângulos tenham produto −1, os produtos −1 e 1 devem se alternar, e portanto n é par. Além disso,
as quantidades de −1’s nas bases devem ser ambas ı́mpares, e somando temos que a quantidade total de −1’s
é par. Mas essa quantidade tem a mesma paridade que a quantidade de arestas laterais com produto −1, ou
seja, n/2 é par. Deste modo, n deve ser múltiplo de 4.
Por outro lado, existe um exemplo para n múltiplo de 4. Sendo A1 A2 . . . An e B1 B2 . . . Bn as bases, com
Ai Bi sendo as arestas laterais, os vértices com −1 podem ser os de ı́ndice ı́mpar de A1 A2 . . . An , exceto A1 ,
dando um total de n/2 − 1 (que é ı́mpar) −1’s nessa base, e B1 . Os demais vértices recebem 1. É imediato que
os produtos das faces são −1. Além disso, as arestas laterais alternam produtos 1 e −1, o que garante que as
faces laterais tenham produto −1.

PROBLEMA 5
Aino pensou em um número N pertencente a A = {1, 2, . . . , 1001}, e Eino precisa adivinhar o número de Aino.
Para isso, Eino escreve na lousa três listas, cada uma com subconjuntos distintos de A, e Aino diz para Eino
as quantidades de subconjuntos na lousa de cada uma das listas que contêm N (ou seja, Aino diz para Eino
uma tripla ordenada de números inteiros não negativos correspondentes às três listas de Eino). Um subconjunto
pode aparecer em mais de uma lista.
Qual é a menor quantidade total de subconjuntos que Eino deve escrever na lousa para conseguir adivinhar
o número de Aino, não importando quais são as respostas de Aino?

Solução
Resposta: 28.
Sejam a1 , a2 , a3 as quantidades de subconjuntos em cada lista. Queremos minimizar a1 + a2 + a3 . Sabemos
que há (a1 + 1)(a2 + 1)(a3 + 1) possibilidades de respostas para Eino (de 0 a ai para cada lista). Então, para
não haver dúvidas, devemos ter (a1 + 1)(a2 + 1)(a3 + 1) ≥ 1001. Usando médias, temos
$ %3
a1 + 1 + a2 + 1 + a3 + 1
1001 ≤ (a1 + 1)(a2 + 1)(a3 + 1) ≤
3
a1 + a2 + a3 √
3
=⇒ + 1 ≥ 1001 ⇐⇒ a1 + a2 + a3 ≥ 28
3
Por uma grande sorte, 1001 = 7 · 11 · 13 = (6 + 1)(10 + 1)(12 + 1) e 6 + 10 + 12 = 28. Então vamos mostrar
um exemplo com uma lista de 12 subconjuntos, depois outra de 10 subconjuntos e outra com 6 subconjuntos.
Disponha os números de 1 a 1001 em um paralelepı́pedo 7 × 11 × 13. Escreva na primeira lista os conjuntos
dos números nas primeiras i camadas 7 × 11, 1 ≤ i ≤ 12; na segunda lista, escreva os conjuntos dos números
nas primeiras j camadas 7 × 13, 1 ≤ j ≤ 10; na terceira lista, escreva os conjuntos dos números nas primeiras
k camadas 11 × 13, 1 ≤ k ≤ 6.
Note que se a primeira resposta é i, então o número escolhido está na camada 13 − i, pois ele está nas i + 1
últimas camadas. Analogamente, sabemos que ele está na camada 11 − j de 11 e na camada 7 − k de 7, o que
nos permite encontrar a casa onde o número está.
PROBLEMA 6
Na OBMlândia há uma quantidade finita de clubes de matemática. Quaisquer dois clubes de matemática têm
pelo menos um membro em comum. Prove que é possı́vel distribuir para os cidadãos da OBMlândia réguas e
compassos de modo que somente uma pessoa recebe ambos e tal que cada clube tem à disposição pelo menos
uma régua e pelo menos um compasso (mais precisamente, cada clube tem um membro que tem uma régua e
um membro – talvez a mesma pessoa! – que tem um compasso).

Solução
Seja C o clube com menos pessoas e dê a régua e o compasso para um de seus membros M . Os demais membros
desse clube ganham um compasso cada e todos os demais cidadãos da OBMlândia recebem uma régua.
Suponha que essa distribuição não dê certo e considere um clube D que não tem régua ou não tem compasso.
No primeiro caso, o clube D deve estar contido em C e não conter M , contradizendo a minimalidade de C. No
segundo caso, o clube D tem um membro em comum com C, e portanto tem compasso, absurdo.

Geometria

PROBLEMA 7
Os pontos D e E trissectam o lado AB do triângulo equilátero ABC, com D entre A e E. O ponto F está
sobre o lado BC e é tal que CF = AD. Calcule ∠CDF + ∠CEF .

Solução
Resposta: 30◦ .

M B
A D E

Como CF = AD, DF ∥ AC e BDF é equilátero. Assim, ∠CDF = ∠ACD e, sendo E ponto médio de BD,
EF ⊥ AB. Sendo M o ponto médio de AB, temos CM ∥ EF , e ∠CEF = ∠ECM = ∠M CD. Deste modo,

∠CDF + ∠CEF = ∠ACD + ∠M CD = ∠ACM = 30◦ .

PROBLEMA 8
No triângulo ABC, BC = 1. Sabe-se que existe um único ponto D sobre o lado BC tal que DA2 = DB · DC.
Encontre os possı́veis valores do perı́metro de ABC.

Solução √
Resposta: somente 2 + 1.
Seja E a segunda interseção da reta AD com o circuncı́rculo de ABC. Por potência de ponto, DA · DE =
DB · DC, logo DA = DE.

B D D2 C

E E2
Trace por E uma paralela a BC. Se essa reta corta o circuncı́rculo em E2 ̸= E, e AE2 corta BC em D2 , por
semelhança temos AD2 = D2 E2 , e temos dois pontos D que satisfazem AD2 = BD · CD, contradição. Logo a
reta corta o circuncı́rculo em um único ponto, ou seja, é tangente.
Agora considere a homotetia que leva E a D, que tem razão 1/2. Essa homotetia leva o circuncı́rculo de
ABC a um cı́rculo tangente a BC, B ao ponto médio M de AB e C ao ponto médio N de AC.

M N

B D C

√ √
Por potência de ponto, BD2 = BM · BA 2
√ = AB /2 =⇒ AB = BD √
2 e analogamente
√ AC = CD 2. Logo
o perı́metro de ABC é AB + BC + BC = 2(BD + CD) + BC = BC( 2 + 1) = 2 + 1.

Solução
Outra solução é fazer contas. Sabemos da relação de Stewart que BC ·(BD ·CD +AD2 ) = AB 2 ·CD +AC 2 ·BD.
Assim, como AD2 = BD · CD, sendo x = BD, a = BC, b = CA e c = AB, temos

2ax(a − x) = c2 (a − x) + b2 x ⇐⇒ 2ax2 − (2a2 − b2 + c2 )x + ac2 = 0.

Como
√ P =√c2 /2 > 0, a equação obtida
√ tem raı́zes de mesmo
√ sinal. Assim, S > 0 e ∆ = 0, e a raiz dupla é
x = P = b/ 2, de modo que √ c = x 2 ⇐⇒ AB = BD 2. Analogamente (fazendo a mesma equação para
y = CD) obtemos AC = CD 2, e concluı́mos como na solução anterior.

PROBLEMA 9
Seja ABC um triângulo com incentro I e circuncentro O ̸= I. Para cada ponto X no interior de ABC seja
f (X) a soma das distâncias de X às retas AB, BC e CA. Prove que se P e Q são pontos no interior de ABC
tais que f (P ) = f (Q) então P Q ⊥ OI.

Solução
Adote O como o centro de um sistema de coordenadas e suponha, sem perdas, que o circunraio de ABC é 1.
Sejam D, E, F os pontos médios dos arcos BC, CA, AB que não contêm os outros vértices. Sendo X um
−−→
ponto no interior de ABC, a distância de X a BC é igual à projeção de BX (ou de CX) sobre OD, que é
−−→ −−→
perpendicular a BC. Sendo OD = 1, essa projeção é o produto escalar XB · OD = (B − X) · D. Desta forma,

f (X) = (B − X) · D + (C − X) · E + (A − X) · F = B · D + C · E + A · F − X · (D + E + F ).

A
E

F
X
O

B C

Note que o ângulo entre AD e EF é 21 (m(AE) + m(DF )) = 14 (m(AC) + m(BC) + m(AB)) = 90◦ . Assim,
o incentro I, que é a interseção de AD, BE e CF , é o ortocentro de DEF , ou seja, I = D + E + F . Logo

f (X) = B · D + C · E + A · F − X · I.
Deste modo,
−−→ −→
f (P ) = f (Q) ⇐⇒ P · I = Q · I ⇐⇒ (P − Q) · I = 0 ⇐⇒ P Q ⊥ OI.

Teoria dos Números

PROBLEMA 10
Encontre todos os pares de inteiros positivos distintos {a, b} tais que a + b e ab + 1 são ambos potências de 2.

Solução
Resposta: {1, 2m − 1}, m ≥ 1; {2m − 1, 2m + 1}, m ≥ 1.
Se a = 1 ou b = 1 então a + b = ab + 1, então {1, 2m − 1} é uma solução. Assim, a, b ≥ 2.
Sendo b = 2k − a, temos ab + 1 = a(2k − a) + 1 = 2ℓ =⇒ a2 − 2k a + 2ℓ − 1 = 0. O discriminante dessa
equação é
∆ = (−2k )2 − 4 · 1 · (2ℓ − 1) = 22k − 2ℓ+2 + 4.
Como a + b ≥ 4, k > 0 e podemos dividir tudo por 4, de modo que queremos que

22k−2 − 2ℓ + 1 = t2 ⇐⇒ 2ℓ (22k−2−ℓ − 1) = t2 − 1 = (t − 1)(t + 1).

Primeiro, note que 2k − 2 ≥ ℓ. Se 2k − 2 = ℓ então t = 1, e a = 2k−1 ± 1 e b = 2k−1 ∓ 1, de modo


que {a, b} = {2m − 1, 2m + 1}. Se 2k − 2 > ℓ, então, sendo ℓ > 0 e mdc(t − 1, t + 1) = mdc(2, t + 1) = 2,
concluı́mos que 2ℓ−1 divide t − 1 ou t + 1. Assim, t ≥ 2ℓ−1 − 1 ⇐⇒ t2 ≥ 22ℓ−2 − 2ℓ + 1. Além disso,
ab + 1 − (a + b) = (a − 1)(b − 1) > 0 =⇒ ℓ > k. Logo t2 > 22k−2 − 2ℓ + 1 = t2 , absurdo. Assim, não há novas
soluções.

PROBLEMA 11
Encontre todos os inteiros positivos n que podem ser representados na forma n = mmc(a, b) + mmc(b, c) +
mmc(c, a) para a, b, c inteiros positivos.

Solução
Resposta: n pode ser qualquer inteiro, exceto potências de 2.
Escolha a = k e b = c = 1. Então n = 2k +1, e todo ı́mpar maior do que 1 pode ser representado. Multiplicar
a, b, c por 2t multiplica todos os mmc’s por 2t , e obtemos todos os inteiros positivos que não são potências de 2.
Agora, suponha que alguma potência de 2 pode ser representada nessa forma e seja 2m a menor dessas
potências. Primeiro veja que a soma dos mmc’s é pelo menos 3, logo m ≥ 2. Se todos os números a, b, c
forem ı́mpares, todos os mmc’s são ı́mpares, o que não é possı́vel. Se só um dos números a, b, c é par, ob-
temos dois mmc’s pares e um ı́mpar, outro absurdo. Logo pelo dois deles são pares. Se todos forem pares,
temos mmc(a/2, b/2) + mmc(b/2, c/2) + mmc(c/2, a/2) = 2m−1 , contradizendo a minimalidade de m, absurdo.
Então exatamente dois, digamos, a, b são pares, e c é ı́mpar. Logo mmc(a, b) + mmc(a, c) + mmc(b, c) =
2 mmc(a/2, b/2) + 2 mmc(a/2, c) + 2 mmc(b/2, c), e obtemos 2m−1 usando a/2, b/2, c, outro absurdo. Assim,
potências de 2 não podem ser representados.

PROBLEMA 12
Sejam a0 = 1, a1 = 2 e an = 4an−1 − an−2 para n ≥ 2. Encontre um fator primo ı́mpar de a500 .

Solução √
A equação √
caracterı́stica dessa recursão
√ linear homogênea
√ é x2 − 4x + 1 = 0, que tem raı́zes α = 2 + 3 e
α−1 = 2 − 3. Com isso, an = A(2 + 3)n + B(2 − 3)n . Resolvendo o sistema substituindo n = 0 e n = 1
obtemos A = B = 1/2, de modo que
αn + α−n
an = .
2
Para n ı́mpar, sendo m um fator ı́mpar de n e t = n/m temos

m m ⌊m/2⌋
1 tm 1 & & &
an = (α + α−tm ) = (αt + α−t ) αt(m−i) α−ti = at · αt(m−2i) = 2at am−2i ,
2 2 i=0 i=0 i=0

ou seja, an/m | an .
Logo a4 | a500 e basta encontrar um fator primo de a5 . Calculando, temos a2 = 4·2−1 = 7, a3 = 4·7−2 = 26
e a4 = 4 · 26 − 7 = 97. Assim, um fator primo ı́mpar de a500 é 97.
Observação: os sete menores fatores primos de a500 , um número de 286 algarismos, são 79, 97, 1999, 7663,
444001, 10633999, 17927599.
Problemas gerais

PROBLEMA 13
Considere n carros C1 , C2 , . . . , Cn de tamanhos a1 , a2 , . . . , an , todos inteiros, e um estacionamento de largura
s = a1 +a2 +· · ·+an , com posições marcados de 1 a s. Cada carro tem um lugar favorito ci . Os carros, começando
por C1 , depois C2 , e assim por diante, estacionam da seguinte forma: cada carro Ci procura o menor lugar
j ≥ ci tal que os lugares j, j + 1, . . . , j + ai − 1 estão vazios; se conseguir encontrar j, ele estaciona nesses lugares;
se não, o procedimento termina. Caso todos os carros consigam estacionar, a n-upla (c1 , c2 , . . . , cn ) é pacı́fica.
Caso contrário, não é.
Mostre que a quantidade de n-uplas pacı́ficas é

(a1 + n)(a1 + a2 + n − 1) . . . (a1 + a2 + a3 + · · · + an−1 + 2).

Solução
Seja M = a1 + a2 + · · · + an + 1. Consideramos que as vagas estão em um cı́rculo com M + 1 vagas, de modo que
todos os carros conseguem estacionar e sobra um espaço. Provaremos que, sendo N a quantidade de n-uplas
pacı́ficas, essa quantidade é

M · N = (a1 + n)(a1 + a2 + n − 1) . . . (a1 + a2 + a3 + · · · + an + 1),

o que termina o problema.


O primeiro carro C1 pode escolher seu lugar de M maneiras. Depois disso, apague as marcas das vagas e
coloque n + 1 divisórias, de modo que cada um dos n + 1 intervalos obtidos tenha um carro ou o espaço vazio.
As divisórias são móveis (imagine-as com rodinhas!).
Agora considere o segundo carro. Ele pode ter escolhido algum lugar que C1 já ocupou, o que pode acontecer
de y1 maneiras, e C2 ocupar o próximo lugar, ou qualquer um dos outros n intervalos e ele vai no intervalo
desejado, num total de y1 + n possibilidades. O carro C3 faz o mesmo: ou ele escolheu um dos y1 + y2 lugares
ocupados por C1 ou C2 ou ele escolhe um n − 1 intervalos, dando y1 + y2 + n − 1 possibilidades. Com isso, ele
tem y1 + y2 + n − 1 possibilidades. Isso é generalizável, e temos y1 + y2 + · · · + yi−1 + n − i + 2 possibilidades
para o carro i, i = 2, 3, . . . , n. Cada carro pode “empurrar” os outros carros e divisórias para caber na sua vaga.
No final do procedimento, rotacione todos os carros até que C1 ocupe sua vaga original, fixando a configuração,
incluindo o espaço vazio. Com isso, há

(a1 + n)(a1 + a2 + n − 1) . . . (a1 + a2 + a3 + · · · + an + 1)

maneiras de estacionar os carros circularmente.


Vamos provar que essa quantidade também é M · N . Uma configuração reta original corresponde a uma
circular em que a vaga vazia é M , pois nenhum carro da configuração reta tem M como vaga favorita e,
reciprocamente, nenhum carro passaria por M sem estacionar lá se não for para a sua vaga favorita (em outras
palavras, se M ficar vazio, é porque todos conseguiram estacionar).
Agora, como podemos girar as configurações circulares como quisermos, as quantidades de configurações
com uma determinada casa livre são iguais. Logo a quantidade de configurações circulares também é M · N , e
o problema acabou.

PROBLEMA 14
Seja ABCD um quadrilátero convexo. Os pontos K, L, M, N estão sobre os lados AB, BC, CD, DA respecti-
vamente e são tais que
AK DA BL AB CM BC DN CD
= , = , = , = .
KB BC LC CD MD DA NA AB
As semirretas AB e DC se cortam no ponto E e as semirretas AD e BC se cortam no ponto F . O incı́rculo
de AEF toca os lados AE em S e AF em T . O incı́rculo de CEF toca os lados CE em U e CF em V . Prove
que se K, L, M, N são concı́clicos então S, T, U, V são também concı́clicos.

Solução
Sejam AB = a, BC = b, CD = c e DA = d. Das condições temos
ad ab ab bc
AK = , BK = , BL = , CL = ,
b+d b+d a+c a+c
bc cd cd ad
CM = , DM = , DN = , AN = .
b+d b+d a+c a+c
Se a + c > b + d, então AK > AN , de modo que ∠AKN < ∠KN A. Analogamente,

∠BKL < ∠KLB, ∠CM L < ∠M LC e ∠DM N < ∠M N D.


Logo

2π − ∠AKN − ∠BKL − ∠CM L − ∠DM N > 2π − ∠KN A − ∠KLB − ∠M LC − ∠M N D,

ou seja, ∠N M L + ∠N KL > ∠M N K + ∠M KL, o que contradiz K, L, M, N sendo concı́clicos.


Portanto a + c ≤ b + d e, analogamente, a + c ≥ b + d, provando que a + c = b + d, ou seja, ABCD é
circunscritı́vel.

D T

Z
Y V
C G

U
X
A
E
W B S

Sejam W, X, Y, Z os pontos de tangência do incentro de ABCD nos lados AB, BC, CD, DA, respectivamente.
Temos
AE − AF = W E − ZF = EY − F X = EC − CF.
Agora, sejam G e H os pontos de tangência dos incı́rculos de AEF e CEF em EF , respectivamente. Temos
também

2(F G − F H) = (EF + AF − AE) − (EF + CF − CE) = (AF − AE) − (CF − CE) = 0,

ou seja, G = H.
Temos ES = EG = EU e F T = F G = F V , logo
π − ∠U ES ∠A + ∠ADC π − ∠T F V ∠A + ∠ABC
∠EU S = = , ∠F T V = = .
2 2 2 2
Sendo ∠AT S = 21 (π − ∠A) e ∠CU V = 12 (π − ∠BCD),

∠V T S + ∠V U S = (π − ∠F T V − ∠AT S) + (∠CU V + π − ∠EU S)


$ % $ %
∠A + ∠ABC π − ∠A π − ∠BCD ∠A + ∠ADC
= π− − + +π− = π,
2 2 2 2

de modo que S, T, U, V são concı́clicos.

PROBLEMA 15
Seja n ≥ 3 inteiro e k a quantidade de primos positivos menores ou iguais a n. É dado um subconjunto A
de S = {2, 3, 4, . . . , n − 1, n} com menos de k elementos, tal que nenhum elemento de A é múltiplo de outro
elemento de A. Prove que existe um subconjunto B com k elementos de S que contém A e tal que nenhum
elemento de B é múltiplo de outro elemento de B.

Solução
αk αk
Para cada inteiro m > 1, seja m = pα 1 α2 α1 α2
1 p2 . . . pk sua fatoração em primos e defina f (m) = max{p1 , p2 , . . . , pk }.
Como A tem menos de k elementos, existe um primo p ≤ n que não divide f (a) para a ∈ A. Seja α tal que
pα ≤ n < pα+1 . Provemos que pα ! a e a ! pα . No segundo caso, a só tem fator p, o que é impossı́vel pois a é
potência de p e f (a) = a. No primeiro caso, f (a) = q β com q ̸= p e q β > pα . Assim, a ≥ pα q β > p2α ≥ pα+1 > n,
contradição.
Isso implica pα ∈ / A, e além disso, podemos colocar pα em A sem que um número divida o outro em A.
Podemos continuar a fazer isso até ter todos os primos entre f (a), e temos um conjunto B que contém A, tem
k elementos e não dois números distintos tais que um divide o outro.

PROBLEMA 16
Sejam P, Q polinômios não constantes com coeficientes reais primos entre si. Prove que existem no máximo três
números reais λ tais que P + λQ é o quadrado de um polinômio.
Solução
Vamos resolver o problema para polinômios com coeficientes complexos (para a gente não se preocupar com o
quadrado de um real ser não negativo). Basta provar que se existem quatro razões distintas [α : β] ̸= [0 : 0] tais
que αP + βQ é o quadrado de um polinômio, então P e Q são constantes. Sejam [αi : βi ] as razões, i = 1, 2, 3, 4.
Então, supondo sem perdas que a soma dos graus de P e Q é mı́nimo e positivo,

α1 P + β1 Q = A2
α2 P + β2 Q = B 2
α3 P + β3 Q = C 2
α4 P + β4 Q = D 2

Note que podemos multiplicar cada equação por qualquer número não nulo. Podemos tomar P1 = α1 P +β1 Q,
Q1 = k(α2 P + β2 Q), α3 P + β3 Q = ℓ(P1 − Q1 ): fazemos ℓα1 − kℓα2 = α3 e ℓβ1 − kℓβ2 = β3 , o que é possı́vel pois
α1 −kα2 α3
β1 −kβ2 = β3 = t ⇐⇒ k(α2 − tβ2 ) = α1 − tβ1 , que não dá certo só se α2 − tβ2 = 0. Mas esse caso só ocorre
quando α2 β3 − α3 β2 = 0 ⇐⇒ [α2 : β2 ] = [α3 : β3 ], absurdo. Aı́ podemos escolher k para ajustar a razão e ℓ
para ajustar os valores. Finalmente, podemos trocar α4 P + β4 Q por mP1 − mn2 Q1 também (como estamos em
complexos, n2 pode ter qualquer sinal). Em resumo, podemos supor sem perdas que as razões são [1 : 0], [0 : 1],
[1 : −1] e [1 : −n2 ] (o que pode ser demonstrado usando um pouco de geometria analı́tica projetiva também!).
Assim, fazendo as substituições P1 = A2 e Q1 = B 2 , ajustando as multiplicações e multiplicando uns
quadrados por constantes, obtemos A2 − B 2 = C 2 e A2 − n2 B 2 = D2 . Fatorando temos (A − B)(A + B) = C 2
e (A − nB)(A + nB) = D2 . Agora, como mdc(A, B) = 1, A − B, A + B, A − nB e A + nB são quadrados, e
com razões diferentes. Em outras palavras, A e B, que têm grau igual às metades dos graus de P e Q, têm a
mesma propriedade, contradizendo a minimalidade da soma dos graus. Logo o problema está resolvido.
Segunda Lista de Preparação para a LVIII IMO
e XXVII Olimpı́ada Iberoamericana de Matemática
Nı́vel III
Soluções

Prazo: 03/03/2017, 23:59 de Brası́lia


Álgebra

PROBLEMA 1
Encontre o valor máximo de (x2 − yz)(y 2 − zx)(z 2 − xy) sabendo que x, y, z são reais tais que x2 + y 2 + z 2 = 1.

Solução
Resposta: 1/8.
Seja f (x, y, z) = (x2 − yz)(y 2 − zx)(z 2 − xy). A parte mais complicada é mostrar que podemos supor que
x − yz, y 2 − zx, z 2 − xy são todos não negativos. Feito isso, podemos usar médias:
2

"3 "3
x2 − yz + y 2 − zx + z 2 − xy 3(x2 + y 2 + z 2 ) − (x + y + z)2
! !
1
f (x, y, z) ≤ = ≤ .
3 6 8

O caso de igualdade é quando x2 − yz = y 2 − zx = z 2 − xy e x + y + z = 0, que é equivalente a x + y + z = 0,


já que x2 − yz − (y 2 − zx) = (x − y)(x + y + z).
Agora, vamos provar o que afirmamos no primeiro parágrafo. Primeiro, note que f (−x, −y, −z) = f (x, y, z)
e f é uma expressão simétrica em x, y, z, de modo que podemos supor que x + y + z ≥ 0 e x ≥ y ≥ z. Isso já
implica x2 − yz ≥ 0, pois se x2 < yz, então y, z < 0 e x2 ≥ (y + z)2 > yz.
Suponha que f é máximo para (x, y, z). Então

f (x, y, z) − f (x, −y, −z) = −2x(x2 − yz)(y 3 + z 3 ) ≥ 0,

ou seja, y 3 + z 3 ≤ 0, e z ≤ 0, de modo que y 2 − zx ≥ 0. Finalmente, f (x, y, z) > 0, de modo que x2 − yz,


y 2 − zx e, portanto, z 2 − xy são todos positivos. Isso conclui o problema.

PROBLEMA 2
Uma sequência infinita a0 , a1 , . . . de números reais satisfaz
m ! "
# m
an (−1)n =0
n=0
n

para todo m > m0 , m0 um inteiro positivo fixado. Prove que existe um polinômio P tal que an = P (n) para
todo n ≥ 0.

Solução
Considere a função geratriz exponencial
# (−1)n an xn
A(x) = .
n!
n≥0

Ao multiplicarmos A(x) por ex = xk /k! obtemos


$
k≥0

m m
(−1)n m m
% &
# (−1)n an xn # xk # (−1)n an xn+k (−1)n an xm n an x
## ##
x
A(x)e = = = = .
n! k! n! k! n=0
n! (m − n)! n=0
m!
n≥0 k≥0 n,k≥0 m≥0 m≥0

Como o numerador dessas frações é zero para m > m0 , A(x)ex é um polinômio Q(x) = i
$
m≥0 qm x /m! em
x, com grau menor ou igual a m0 . Invertendo, temos
# # (−1)n−m n qm xn
% &
# qm xm # (−1)k xk # # (−1)k qm xm+k
−x m
A(x) = Q(x)e = = =
m! k! m! k! n!
m≥0 k≥0 m≥0 k≥0 n≥0 m≥0

Logo
m0 ! " m0 ! "
# n # n
(−1)n an = qm (−1)n−m ⇐⇒ an = (−1)m qm ,
m=0
m m=0
m
que é um polinômio em n.
Observação: a fórmula
m ! " n ! "
# mn
#
m n
bm = (−1) an =⇒ an = (−1) bm
n=0
n m=0
m

é a fórmula da inversão binomial. Você pode usá-la para encontrar a quantidade de permutações caóticas, por
exemplo!

PROBLEMA 3
Dado um inteiro positivo n, defina f (0, j) = f (i, 0) = 0, f (1, 1) = n e
' ( ' (
f (i − 1, j) f (i, j − 1)
f (i, j) = +
2 2
para todos i, j inteiros positivos, (i, j) ̸
= (1, 1). Quantos pares ordenados (i, j) de inteiros positivos são tais que
f (i, j) é ı́mpar?

Solução
Resposta: n.
Considere o seguinte jogo: inicialmente há n pedras no ponto (1, 1). Um passo consiste em fazer a seguinte
operação em todos os pontos do plano simultaneamente: se há m pedras no ponto (i, j), coloque ⌊m/2⌋ em
cada um dos pontos (i + 1, j) e (i, j + 1) (sim, tiramos todas as pedras de (i, j) se m é par, e deixamos uma se
m é ı́mpar).
Note que se uma fila não está vazia, então ela nunca fica vazia. Deste modo, as pedras nunca saem do
quadrado [1, n]2 , e o jogo termina em uma quantidade finita de passos.
Após i + j − 2 passos, a quantidade de pedras em (i, j) é igual a f (i, j) (isso é imediato por indução em
i + j).
Para acabar o problema, note que, após i + j − 2 passos, o ponto (i, j) só perde pedra e mantém a paridade
da quantidade de pedras, e o jogo termina quando as pedras estão sozinhas nas casas; essas casas correspondem
as valores de f (i, j) que são ı́mpares.

Combinatória

PROBLEMA 4
Encontre a maior quantidade possı́vel de triângulos retângulos determinados por três de 100 retas no plano.

Solução
Resposta: 62500.
Considere 100 retas no plano. Particione as retas em conjuntos Ai , Bi em que todas as retas em Ai são
paralelas entre si e todas as retas de Bi são perpendiculares às retas de Ai (Bi pode ser potencialmente vazio).
Seja ai = |Ai | e bi = |Bi | e suponha que haja k pares de conjuntos. Então a quantidade de triângulos retângulos

k k k
# # (ai + bi )2 (100 − ai − bi ) 1#
ai bi (100 − ai − bi ) ≤ ≤ (ai + bi )[(ai + bi )(100 − ai − bi )]
i=1 i=1
4 4 i=1
k k
1# [(ai + bi + 100 − ai − bi )]2 #
≤ (ai + bi ) = 625 · (ai + bi ) = 62500.
4 i=1 4 i=1

Um exemplo com 100 retas que dão o caso de igualdade é, considerando o plano cartesiano, x = i, i =
1, 2, . . . , 25, y = i, i = 1, 2, . . . , 25, x + y = 100 + i, i = 1, 2, . . . , 25, y = x + 25 + i, i = 1, 2, . . . , 25. Nesse caso,
o total de triângulos é 25 · 25 · 50 + 25 · 25 · 50 = 62500.

PROBLEMA 5
Dados quaisquer 2n − 1 subconjuntos de {1, 2, . . . , n}, cada um com dois elementos, prove que é sempre possı́vel
escolher n deles cuja união tem 23 n + 1 ou menos elementos.

Solução
Provaremos por indução em k, k ≤ 2n−1 3 , que é possı́vel tirar 3k subconjuntos de modo que a união dos
subconjuntos restantes tem n − k ou menos elementos. O resultado então vai sair fazendo k = ⌊ n−1 3 ⌋, pois
n − ⌊ n−1 n−3 2
3 ⌋ ≤ n − 3 = 3 n + 1.
O caso k = 0 é imediato. Suponha então que k ≥ 1. Então, pela hipótese de indução, é possı́vel tirar
3(k − 1) subconjuntos, sobrando n − k + 1 elementos. Como 2n − 1 − 3(k − 1) < 2(n − k + 1), pelo menos um
dos elementos que sobraram está contido em no máximo três dos suconjuntos que sobraram, e podemos tirar
esses três subconjuntos e retirar um elemento, o que completa nossa indução, e o problema.
PROBLEMA 6
A Deziânia é um paı́s com dez cidades. Alguns pares de cidades são interligadas por uma estrada de duas mãos,
e cada estrada liga exatamente duas cidades. Diz a lenda que se três ou quatro cidades estarem ligadas em ciclo
por estradas, a Deziânia será destruı́da. Qual é a maior quantidade de estradas que podem ser construı́das de
modo que essa desgraça não ocorra?

Solução
Resposta: 15.
Traduzindo para a linguagem de grafos, temos um grafo com 10 vértices, sem triângulos ou ciclos de tamanho
quatro, e queremos saber a quantidade máxima de arestas que esse grafo pode ter.
Um exemplo com 15 arestas é o grafo de Petersen, cujos ciclos têm pelo menos seis vértices:

Esse grafo tem grau médio 15 · 2/5 = 3.


Considere o grau máximo de um grafo qualquer com dez vértices. Se o grau máximo é 4 ou mais, sendo v
esse vértice e v1 , v2 , v3 , v4 quatro de seus vizinhos, não podemos ter arestas ligadas entre eles, e dos demais 5
vértices, podemos ter no máximo 5 arestas entre eles, pois mais de cinco arestas implica presença de ciclo, e o
único ciclo possı́vel é o 5-ciclo, e colocar mais uma aresta forma triângulo, e cada um desses cinco vértices está
ligado a no máximo um dos outros cinco, dando um total de no máximo 4 + 5 + 5 = 14 arestas. Assim, o grau
máximo é menor ou igual a 3, e mostramos um exemplo com todos os graus iguais a 3.

Geometria

PROBLEMA 7
Definimos altura de um pentágono convexo como a reta que passa por um vértice e é perpendicular ao lado
oposto ao vértice (se ABCDE é o pentágono então o lado oposto a A é CD). Prove que se quatro alturas têm
um ponto comum H então a outra altura também passa por P .

Solução
Seja ABCDE o pentágono e suponha que as alturas por B, C, D, E se cortam em H. Sejam B ′ , C ′ , D′ , E ′ as
interseções das alturas por B, C, D, E com os lados opostos, respectivamente. Temos que provar que AH ⊥ CD.

C′
D′
E
B

E′ H B′

C D

Como ∠BD′ D = ∠BB ′ D = 90◦ , BD′ B ′ D é inscritı́vel, e HB·HB ′ = HD·HD′ . Analogamente, HB·HB ′ =
HE · HE ′ = HC · HC ′ .
Com isso, HC · HC ′ = HD · HD′ , de modo que CD′ C ′ D é inscritı́vel, e ∠CC ′ D′ = ∠CDD′ . Agora,
AD′ HC ′ também é inscritı́vel, logo ∠D′ AH = ∠D′ C ′ H = ∠D′ C ′ C = ∠CDD′ = ∠CDH, e AH ⊥ CD.

PROBLEMA 8
Seja A1 A2 A3 A4 A5 A6 um hexágono convexo tal que ∠A1 A3 A5 = ∠A2 A4 A6 e ∠A2 A3 A1 = ∠A5 A4 A6 . Defina
Bi como a interseção das diagonais Ai Ai+2 e Ai−1 Ai+1 , em que os ı́ndices são tomados módulo 6. Suponha que
B1 B2 B3 B4 B5 B6 é inscritı́vel em um cı́rculo Γ. Os circuncı́rculos de A2 B2 B6 e A5 B4 B6 se cortam novamente
em P ̸= B6 . A reta B6 P corta Γ novamente em Q. Prove que as retas B2 B4 e QB3 são paralelas.
Solução

A2

A1
B2 A3
B1
B6
P
B3

Q
A6 B5
B4 A4

A5

Denotaremos por ma (Bi Bj ) a medida angular do arco Bi Bj percorrido de Bi a Bj no sentido anti-horário.


Note que a condição ∠A1 A3 A5 = ∠A2 A4 A6 implica o quadrilátero B2 A3 A4 B4 ser cı́clico.
A condição ∠A2 A3 A1 = ∠A6 A4 A5 , combinada com ∠B4 A3 B2 = ∠B4 A4 B2 do quadrilátero cı́clico B2 A3 B4 B4 ,
nos mostra que ∠A2 A3 A5 = ∠A2 A4 A5 , ou seja, A2 A3 A4 A5 também é inscritı́vel.
Com uma boa figura, podemos conjecturar que P ∈ A2 A5 . De fato,
1
∠B6 P A2 = ∠B6 B2 A2 = ∠A1 B2 A2 + ∠B1 B2 B6 = 180◦ − ∠B1 B2 B3 + ma (B1 B6 )
2
◦ 1 1 ◦ 1
= 180 − ma (B1 B3 ) + ma (B1 B6 ) = 180 − ma (B6 B3 )
2 2 2
e
1
∠B6 P A5 = ∠B6 B4 A5 = 180◦ − ∠B6 B4 B3 = ma (B3 B6 ).
2
Somando temos
1 1
∠B6 P A2 + ∠B6 P A5 = 360◦ − (ma (B6 B3 ) + ma (B3 B6 )) = 360◦ − · 360◦ = 180◦ .
2 2
Agora, note que ∠A5 A2 A4 = ∠A5 A3 A4 = ∠B4 B2 A4 , de modo que A2 A5 ∥ B2 B4 . Para terminar,
∠QB6 B2 = ∠P B6 B2 = ∠P A2 B2 = ∠A5 A2 B4 = ∠B4 B2 B3 . Com isso, o arco menor QB2 é igual ao arco
menor B4 B3 , e tirando o arco comum QB3 obtemos ∠B4 B3 Q = ∠B2 B4 B3 ⇐⇒ B2 B4 ∥ QB3 .

PROBLEMA 9
Sejam O e H respectivamente o circuncı́rculo e o ortocentro do triângulo acutângulo e escaleno ABC. Sendo
M e N os pontos médios de AH e BH, prove que se M N OH é cı́clico então o seu circuncı́rculo tangencia o
circuncı́rculo de ABC.

Solução

H O
N
M
D
A P B
Primeiro, note que, sendo M N base média de ABH, a reflexão de H com relação a M N é o ponto D sobre
AB, o pé da altura. Assim, o circuncı́rculo de M N H é a reflexão do circuncı́rculo de DM N , que é o cı́rculo
dos nove pontos, com relação a M N . Assim, a reflexão de O com relação a M N pertence ao cı́rculo dos nove
pontos. Mas essa reflexão pertence à perpendicular por O a AB, ou seja, a mediatriz de AB. Logo essa reflexão
é a interseção dessa mediatriz com o cı́rculo dos nove pontos. Suponha que essa interseção Q não seja o ponto
médio de AB. Então DQ é diâmetro do cı́rculo dos nove pontos, e portanto HO é o diâmetro do circuncı́rculo
de M N OH, e O está no exterior de ABC, absurdo. Assim, a reflexão de O com relação a M N é o ponto médio
P de AB, e OH ∥ AB.
Como o raio do cı́rculo dos nove pontos é metade do circunraio R de ABC, o circuncı́rculo de M N OH tem
diâmetro R e passa por O, sendo então tangente ao circuncı́rculo de ABC.

Teoria dos Números

PROBLEMA 10
Seja k um inteiro positivo e n = (2k )!. Sendo σ(n) a soma dos divisores positivos de n, prove que σ(n) tem um
fator primo maior do que 2k .

Solução
pα+1 −1
Vamos calcular a quantidade de fatores primos de n: sendo n = (2k )!, esse
)
Note que σ(n) = pα ∥n p−1 .
total é
# ' 2k (
α2 = = 2k−1 + 2k−2 + · · · + 2 + 1 = 2k − 1.
2i
i≥1
k k−1 k−1
Então 22 − 1 | σ(n), e portanto 22 + 1 | σ(n) também. Mas, sendo p um divisor primo de 22 + 1,
k k−1
ordp 2 | 2 e ordp 2 ! 2 , ou seja, ordp 2 = 2k , ou seja, 2k ≤ p − 1 ⇐⇒ p ≥ 2k + 1. Assim, todo divisor primo
k−1
de 22 + 1 é maior do que 2k .

PROBLEMA 11 % √ & √ % √ &


Determine se existe um polinômio P (x) de coeficientes inteiros tal que P 1 + 3 2 = 1 + 3 2 e P ( 1 + 5 =

2 + 3 5.

Solução
Resposta: não.
Primeiro,
√ considere Q(x) = P (x) − x, que obviamente tem coeficientes inteiros. Então polinômio minimal
de 1 + 3 2, que é R(x) = (x − 1)3 − 2 = x3 − 3x2 + 3x − 3, divide Q(x).
Considere o seguinte (e√ conhecido)√lema: se A(x) é √
um polinômio√ com coeficientes inteiros, e a, b, c, d são
inteiros tais que A(a + b 5) = c + d 5 então A(a − b 5) = c − d 5. Para ver isso, basta ver que, sendo
A(x) = a0 + a1 x + · · · + an xn ,
n n i ! "
√ # √ # # i i−j j √ j
A(a + b 5) = ai (a + b 5)i = ai a b ( 5)
i=0 i=0 j=0
j
n i n i
i i−j j j/2 √ #
! " ! "
# # # i i−j j (j−1)/2
= ai a b 5 + 5· ai a b 5
i=0
j i=0
j
j=0,2|j j=0,2!j

e
n n i ! "
√ # √ i # # i i−j √
A(a − b 5) = ai (a − b 5) = ai a (−b)j ( 5)j
i=0 i=0 j=0
j
n i n i
i i−j j j/2 √ #
! " ! "
# # # i i−j j (j−1)/2
= ai a b 5 − 5· ai a b 5
i=0
j i=0
j
j=0,2|j j=0,2!j

√ √ √ √
Assim,
√ sendo √ Q(1 + 5) = 1√+ 2 5, √
e, sendo Q com coeficientes inteiros, Q(1 − 5) = 1 − 2 5. Além disso,
R(1 + 5) = 5 5 − 2 e R(1 − 5) = − 5 − 2. √
Como
√ R(x) divide Q(x), ou seja, Q(x) = R(x)T (x), R e T com coeficientes inteiros, sendo T (1 + 5) =
a + b 5, a, b inteiros,
√ √ √ √ √ √
Q(1 + 5)Q(1 − 5) = R(1 + 5)R(1 − 5)T (1 + 5)T (1 − 5)
√ √ √ √ √ √
⇐⇒ (1 + 2 5)(1 − 2 5) = (5 5 − 2)(−5 5 − 2)(a + b 5)(a − b 5)
⇐⇒ − 19 = −121(a2 − 5b2 ),

absurdo pois 121 não divide 19.


PROBLEMA 12
A sequência {an } satisfaz an + an+1 = 2an+2 an+3 + 2017, n ≥ 1. Encontre todos os valores de a1 e a2 para os
quais an é inteiro para todo n inteiro positivo.

Solução
Resposta: (a1 , a2 ) = (1, −2016), (−2016, 1), (0, 2017), (−18, 55), (55, −18), (19, −54), (−54, 19).
Seja bn = an+2 − an . Então, subtraindo a recorrência para n e n + 1, temos

(an+1 + an+2 ) − (an + an+1 ) = 2an+3 an+4 − 2an+2 an+3 ⇐⇒ bn = 2an+3 bn+2 .

Assim dá para “telescopar”, e encontramos

b1 = 2n b2n+1 a2 a4 . . . a2n+2 e b2 = 2n b2n+2 a3 a5 . . . a2n+3 .

Assim, b1 e b2 são inteiros divisı́veis por 2n para todo n. Isso só é possı́vel se b1 = b2 = 0. Substituindo
obtemos a1 = a3 e a2 = a4 , e obtemos para n = 1

a1 + a2 = 2a3 a4 + 2017 ⇐⇒ (2a1 − 1)(2a2 − 1) = −4033 = −37 · 109.

Com isso, encontramos os pares (a1 , a2 ) = (1, −2016), (−2016, 1), (0, 2017), (−18, 55), (55, −18), (19, −54),
(−54, 19). Em cada um desses exemplos an = an+2 para todo n.

Problemas gerais

PROBLEMA 13
Seja n ≥ 5 inteiro e seja A1 A2 . . . An um n-ágono convexo cujos ângulos internos são todos obtusos. Para cada
1 ≤ i ≤ n seja Oi o circuncentro de Ai−1 Ai Ai+1 , em que os ı́ndices são vistos módulo n. Prove que a linha
poligonal fechada O1 O2 . . . On não é um n-ágono convexo.

Solução
Suponha o contrário. Note que Oi e Oi−1 estão na mediatriz de Ai−1 Ai , e assim Oi−1 Oi ⊥ Ai−1 Ai . Logo
∠Oi−1 Oi Oi+1 = ∠Ai−1 Ai Ai+1 ou ∠Oi−1 Oi Oi+1 = 180◦ −∠Ai−1 Ai Ai+1 . De qualquer forma, como ∠Ai−1 Ai Ai+1
é obtuso, ∠Oi−1 Oi Oi+1 ≤ ∠Ai−1 Ai Ai+1 . Mas ambos os polı́gonos A1 A2 . . . An e O1 O2 . . . On têm a mesma
soma dos ângulos internos, logo as desigualdades são igualdades, ou seja, ∠Oi−1 Oi Oi+1 = ∠Ai−1 Ai Ai+1 .
Deste modo, as posições relativas de Ai−1 , Ai , Ai+1 , Oi−1 , Oi , Oi+1 são de uma das duas maneiras a seguir:
Ai Ai+1
Ai Ai+1

Oi−1 Oi+1
Oi Oi
Ai−1 Ai−1 Oi−1
Oi+1

Assim, Oi−1 Ai < Oi Ai < Oi+1 Ai ou Oi−1 Ai > Oi Ai > Oi+1 Ai . Sendo Ri o circunraio de Ai−1 Ai Ai+1 ,
então essas desigualdades se traduzem em Ri−1 < Ri < Ri+1 ou Ri−1 > Ri > Ri+1 , o que é falso quando Ri é
o máximo dos circunraios. Chegamos a uma contradição, e portanto O1 O2 . . . On não é um polı́gono convexo.

PROBLEMA 14
Zé Roberto e Umberto fazem um jogo de adivinhação. Zé Roberto pensa secretamente em uma 100-upla
ordenada (x1 , x2 , . . . , x100 ) de inteiros. Como é difı́cil lembrar 100 números, ele se limita a pensar numa 100-
upla em que 99 dos números são iguais e o outro é diferente, mas ele pode colocar o número diferente em
qualquer posição.
Umberto sabe dessa regra e deve adivinhar a 100-upla de Zé Roberto. Para tanto, ele fala a Zé Roberto uma
100-upla (y1 , y2 , . . . , y100 ), e Zé Roberto informa a Umberto o resultado da conta x1 y1 + x2 y2 + · · · + x100 y100 .
Umberto pode então repetir o procedimento quantas vezes quiser, usando a informação das contas anteriores se
quiser.
Qual é a quantidade mı́nima de 100-uplas que Umberto deve falar para garantir que consegue adivinhar a
100-upla de Zé Roberto?
Solução
Resposta: 2.
Primeiro mostremos que uma tentativa não é suficiente, ou seja, para qualquer 100-upla (y1 , . . . , y100 ) que
Umberto falar existem pelo menos duas possı́veis 100-uplas que satisfazem a equação x1 y1 + · · · + x100 y100 = k.
Se yi = yj para algum i ̸ = j, podemos escolher 99 uns e um zero, sendo o zero em qualquer posição diferente
de i e j. Assim, os yi precisam ser todos distintos. Seja S = y1 + · · · + y100 , e considere dois números yi e yj
diferentes de S (há 100 números, dois deles são diferentes de S). Tome xi = 0 e xk = S − yj , k ̸ = i, e obtemos
o resultado x1 y1 + · · · + y100 y100 = (S − yi )(S − yj ). É claro que podemos trocar i e j, e obtemos a segunda
possibilidade. Logo uma pergunta não é suficiente.
Agora, duas perguntas são suficientes: escolha (1, −1, 1, −1, . . . , −1). Sendo a o número que aparece 2016
vezes e b o número que aparece uma vez, o resultado da conta é R = (−1)t (a − b), em que t é a posição do b.
Para a segunda pergunta escolha (y1 , . . . , y100 ) tais que mdc(y1 + · · · + y100 , R) = 1 e não haja dois (−1)i yi
congruentes módulo S = y1 + · · · + y100 . Por exemplo, y1 = 1 e yi = |R|i, i > 1, funciona. A conta obtida é

R′ = (S − yt )a + yt b = S − yt (a − b) = Sa − yt (−1)t R.

Vendo módulo S, temos (−1)t yt R módulo S, e invertendo R, de (−1)t yt , e podemos encontrar t. Sabendo
t, é só resolver o sistema obtido: encontramos a de R′ , S, R, yt e t, e encontramos b de R e t.

PROBLEMA 15
Seja x0 , x1 , x2 , . . . uma sequência infinita de racionais definidos por
⎧-
⎨- x2n − 1- se o numerador de xn é par
-
xn+1 = -- -
⎩- 1 − 1-- se o numerador de xn é ı́mpar
xn

O valor inicial x0 é arbitrário.


Prove que

(a) a sequência tem uma quantidade finita de termos distintos.


(b) a sequência contém exatamente um dos números 0 e 2/3.

Solução

(a) Primeiro, tirando possivelmente x0 , todos os termos da sequência são não negativos. Sendo xn = pn /qn ,
mdc(pn , qn ) = 1, se pn é par x2n − 1 = pn /2−q qn
n
, com mdc(pn /2 − qn , qn ) = mdc(pn /2, qn ) = 1 e se pn é
1 qn −pn
ı́mpar xn − 1 = pn , com mdc(qn − pn , pn ) = 1. Assim, representando xn por (pn , qn ), temos que xn+1
vai para (|pn /2 − qn |, qn ) ou (|pn − qn |, pn ). Então max(pn , qn ) nunca aumenta, pois estamos subtraindo
de qn , pn ou pn /2.
Assim, como há uma quantidade finita de frações com numerador e denominador menores ou iguais a
max(|p0 |, |q0 |), a sequência tem uma quantidade finita de termos distintos.

(b) Primeiro provemos que os dois não aparecem na mesma sequência. Se 0 aparece primeiro, a sequência é
igual a 0 a partir desse ponto, e 2/3 não aparece. Se 2/3 aparece primeiro, a sequência é igual a 2/3 a
partir desse ponto, e 2/3 não aparece.
Provemos agora que pelo menos um dos dois números aparece. Suponha que zero não aparece; temos então
que provar que 2/3 aparece. A ideia é examinar melhor as desigualdades do item anterior, verificando
quando elas são estritas.

– Se pn > qn , pn par: o máximo muda de pn para max(|pn /2 − qn |, qn ) < pn .


– Se pn < qn , pn ı́mpar: o máximo muda de qn para max(|pn − qn |, pn ) < qn .
Então, como não é possı́vel diminuir o máximo para sempre, a partir de um ponto só ocorre um de
dois casos: ou pn < qn com pn par ou pn > qn com pn ı́mpar. No primeiro caso, o próximo termo é
|pn /2−qn |
qn = 1 − pnqn/2 < 1, e devemos ter pn+1 < qn+1 , ou seja, pn+1 deve ser par; no segundo caso, o
|pn −qn | qn
próximo termo é pn = 1− pn < 1, e novamente devemos ter pn+1 par. Em resumo, a partir de um
ponto devemos sempre ter xn+1 = 1 − x2n ⇐⇒ xn+1 − 2/3 = − xn −2/3
2 . A sequência é periódica, então
xn+k = xn para algum k > 0 e todo n suficientemente grande. Não é difı́cil ver que xn+i = 32 + x(−2)
n −2/3
i ,

ou seja, para i = k, xn = 23 + x(−2)


n −2/3
k ⇐⇒ xn = 32 ou (−2)k = 1 ⇐⇒ xn = 32 . Logo toda sequência é, a
partir de algum ponto, constante igual a 0 ou 2/3.
PROBLEMA 16
1 1
Prove que não existem racionais x, y tais que x − x +y− y = 4.

Solução
Primeiro vamos reduzir o problema para os positivos: note que se (x, y) é solução então podemos trocar x por
−1/x ou y por −1/y. Então podemos supor que x, y > 0.
A equação é equivalente a (x + y)(xy − 1) = 4xy. Sendo P = xy e S = x + y, S = 4P/(P − 1), ou seja, x e
y são soluções da equação
4P
t2 − t + P = 0.
P −1
. /2
Com isso, ∆ = P4P −1 − 4P é o quadrado de um racional, assim como (2P )2 − P (P − 1)2 = P (6P − P 2 − 1).
Agora, sendo P = m/n, mdc(m, n) = 1, multiplicando por n4 obtemos que mn(6mn − m2 − n2 ) é o quadrado
de um inteiro. Mas mdc(m, 6mn − m2 − n2 ) = mdc(m, n2 ) = 1, e analogamente mdc(n, 6mn − m2 − n2 ) = 1,
logo m = u2 , n = v 2 e 6mn − m2 − n2 = w2 . Substituindo obtemos a equação diofantina

w2 = 6u2 v 2 − u4 − v 4 = (2uv)2 − (u2 − v 2 )2 .


√ √
Note também que mdc(u, v) = mdc( m, n) = 1 e u ̸ = v, pois se u = v então P = 1 e S = 4P/(P − 1) não
estaria definido. Podemos supor, sem perdas, que u > v. Temos uma terna pitagórica com catetos w e u2 − v 2
e hipotenusa 2uv. Como toda terna pitagórica primitiva em hipotenusa ı́mpar, w e u2 − v 2 são ambos pares
(para cortar o 2 do uv), e sendo mdc(u, v) = 1, u e v são ı́mpares. Finalmente, mdc((u2 − v 2 )/2, uv) = 1 e
2 2
temos a terna pitagórica primitiva ( w2 , u −v
2 , uv). Logo existem inteiros a e b tais que mdc(a, b) = 1,

w = 2(a2 − b2 ), u2 − v 2 = 4ab, uv = a2 + b2 .

Ignoraremos w a partir de agora. Podemos supor sem perdas que a é par e b é ı́mpar. Temos (u − v)(u + v) =
4ab, assim existem A, B, C, D coprimos dois a dois tais que u + v = 2AB, u − v = 2CD, a = AC e b = BD.
Temos então

(AB + CD)(AB − CD) = (AC)2 + (BD)2 ⇐⇒ 2A2 B 2 = (A2 + D2 )(B 2 + C 2 ).

Como a é par, A ou C é par, e sendo A, B, C, D coprimos dois a dois, os outros três números são ı́mpares.
Se A é par, A2 + D2 é ı́mpar, B 2 + C 2 ≡ 2 (mod 4), e 0 ≡ 2A2 B 2 ≡ 2 (mod 4), absurdo. Logo C é par. Assim,
como B 2 é primo com B 2 +C 2 e A2 é primo com A2 +D2 , A2 = B 2 +C 2 e 2B 2 = A2 +D2 . Da primeira equação,
A = k 2 + ℓ2 , C = 2kℓ e B = k 2 − ℓ2 . Substituindo obtemos D2 = 2(k 2 − ℓ2 )2 − (k 2 + ℓ2 )2 = k 4 + ℓ4 − 6k 2 ℓ2 ⇐⇒
(2D)2 = 6(k + ℓ)2 (k − ℓ)2 − (k + ℓ)4 − (k − ℓ)4 . A mesma equação que w2 = 6u2 v 2 − u4 − v 4 . Então se supusermos
que u + v é mı́nimo chegamos a um absurdo, pois u + v = 2AB = 2B(k 2 + ℓ2 ) > 2k = (k + ℓ) + (k − ℓ) > 0.
Com isso, a equação dada não tem soluções racionais.
Terceira Lista de Preparação para a LVIII IMO
e XXVII Olimpı́ada Iberoamericana de Matemática
Nı́vel III
Soluções

Prazo: 17/03/2017, 23:59 de Brası́lia


Álgebra

PROBLEMA 1
Defina a sequência a1 , a2 , . . . a partir de suas somas parciais Sn = a1 + a2 + · · · + an da seguinte forma:

(2 + Sn−1 )2
S1 = 1, Sn = , n ≥ 2.
4 + Sn−1

Prove que an ≥ √ 4 para todo n inteiro positivo.


9n+7

Solução
Primeiro, veja que
4 4 4 4
Sn − Sn−1 = ⇐⇒ an = ⇐⇒ Sn−1 = − 4 ⇐⇒ an = .
4 + Sn−1 4 + Sn−1 an a1 + · · · + an−1 + 4

Provaremos a desigualdade por indução. Para n = 1, temos a1 = S1 = 1 = √ 4 . O passo dá certo quando
9·1+7

Sn−1 ≤ 9n + 7 − 4.

Agora vamos provar, também por indução, que



Sn ≤ 9n + 16 − 4.

Mas isso equivale a


4 √
Sn−1 + 4 + ≤ 9n + 16.
Sn−1 + 4
!
A função f (x) = x + x4 , para x > 0, atinge seu mı́nimo para x = 2, já que f (x) ≥ 2 x · 4
x = 4 com igualdade
para x = 4/x ⇐⇒ x = 2. Além disso, para x > y > 2, xy > 4 ⇐⇒ 1 − 4/xy > 0 e
" #
4 4 4
f (x) − f (y) = x − y + − = (x − y) 1 − > 0,
x y xy

ou seja, f é crescente em (2, ∞). √


Assim, como indutivamente Sn > 0, 2 < Sn−1 + 4 ≤ 9n + 7, de modo que
4 √ 4
Sn−1 + 4 + ≤ 9n + 7 + √ .
Sn−1 + 4 9n + 7
Logo basta que
√ 4 √ 4 √ √ 9
9n + 7 + √ ≤ 9n + 16 ⇐⇒ √ ≤ 9n + 16 − 9n + 7 = √ √
9n + 7 9n + 7 9n + 7 + 9n + 16
√ √
⇐⇒ 4 9n + 16 ≤ 5 9n + 7 ⇐⇒ 16(9n + 16) ≤ 25(9n + 7) ⇐⇒ n ≥ 1,

que é verdade, o que completa a demonstração.

PROBLEMA 2
O polinômio x3 − 21x + 35 tem três raı́zes reais distintas r, s, t. Encontre um polinômio P (x) = x2 + ax + b tal
que P (r) = s, P (s) = t e P (t) = r.
Solução
Resposta: P (x) = x2 + 2x − 14.
Temos
$ s = r2 + ar + b $ rs = r3 + ar2 + br
$ $
$ $
$ t = s2 + as + b =⇒ $ st = s3 + as2 + bs =⇒ rs + st + rt = r3 + s3 + t3 + a(r2 + s2 + t2 ) + b(r + s + t).
$ $
$ $
$ r = t2 + at + b $ rt = t3 + at2 + bt

Temos rs + st + rt = −21, r + s + t = 0, r2 + s2 + t2 = (r + s + t)2 − 2(rs + st + rt) = 42, e sendo r, s, t


raı́zes de x3 − 21x + 35 = 0,
$ 3
$ r = 21r − 35
$
$ s = 21s − 35 =⇒ r3 + s3 + t3 = 21(r + s + t) − 105 = −105.
$ 3
$
$ t3 = 21t − 35

Logo
−21 = −105 + a · 42 + 0 ⇐⇒ a = 2.
Somando as três primeiras equações temos r+s+t = r2 +s2 +t2 +a(r+s+t)+3b ⇐⇒ 0 = 42+2·0+3b ⇐⇒
b = −14. Logo o polinômio pedido é x2 + 2x − 14.
Pode-se provar que esse polinômio satisfaz as condições do enunciado verificando-se que
• P (x) = x3 − 21x + 35 é irredutı́vel e não tem raiz dupla;
• se r é raiz de P (x) então Q(r) = r2 + 2r − 14 também é;
• Q(r) ̸= r;
• se Q(r) = s e Q(t) = s então s é racional, o que não é possı́vel;
• Q(r) = s e Q(s) = r não é possı́vel.

PROBLEMA 3
Encontre todas as funções f : R → R tais que

f (xf (y) − f (x)) = 2f (x) + xy

para todos x, y reais.

Solução
Resposta: f (x) = −x + 1, para todo x real.
Note que não podemos ter f (x) = 0 para todo x real; de fato, fazendo x = 1 vemos que f (f (y) − f (1)) =
2f (1) + y, e sendo g(y) = y + 2f (1) sobrejetora em R, f é sobrejetora, e injetora, pois f (x) = f (y) =⇒
f (f (x) − f (1)) = f (f (y) − f (1)) ⇐⇒ 2f (1) + x = 2f (1) + y ⇐⇒ x = y. Ou seja, f é bijetora.
Vamos nos aproveitar disso, fazendo 2f (x) + xy = f (x) ⇐⇒ y = −f (x)/x, x ̸= 0. Da bijetividade de f ,
" # " #
f (x) f (x) f (x)
xf − − f (x) = x ⇐⇒ f − = + 1.
x x x

Agora substitua x → 0 na equação original. Temos f (−f (0)) = 2f (0). Se f (0) = 0, temos, trocando y → 0,
f (−f (x)) = 2f (x) ⇐⇒ f (x) = −2x para todo x, já que f é sobrejetora, e vemos que essa função não dá certo:
f (xf (y) − f (x)) = f (−2xy + 2x) = 4xy − 4x e 2f (x) + xy = −4x + xy. Assim, f (0) ̸= 0 e podemos fazer
x → −f (0) nessa última equação:
" #
f (−f (0)) f (−f (0))
f − = + 1 ⇐⇒ f (2) = −2 + 1 = −1.
−f (0) −f (0)

Com essa nova informação, fazemos y → 2 na equação original:

f (−x − f (x)) = 2(f (x) + x).

Já vimos que não é possı́vel que f (x) = −2x para todo x real, e por outro lado, acabamos de mostrar que
existe a tal que f (a) = −2a. Se encontrarmos todos os valores de a terminamos o problema, pois isso se reduz
a −x − f (x) = a ⇐⇒ f (x) = −x − a, e substituı́mos todos os valores de a.
Troque agora y pela raiz r de f , ou seja, o único real r tal que f (r) = 0. Então

f (−f (x)) = 2f (x) + rx.


Escolhendo x tal que f (x) = −a (existe pois f é sobrejetora), e lembrando que f (0) ̸= 0 ⇐⇒ r ̸= 0,
obtemos
f (a) = −2a + rx ⇐⇒ rx = 0 ⇐⇒ x = 0.
Assim, a = −f (0) é único e obtemos f (x) = −x + f (0). Sendo f (0) = b, substituindo na equação original
obtemos

f (xf (y) − f (x)) = 2f (x) + xy ⇐⇒ f (x(−y + b) − (−x + b)) = 2(−x + b) + xy


⇐⇒ (xy − xb − x + b) + b = xy − 2x + b ⇐⇒ (b + 1)x = 2x,

e devemos ter b = 1. Logo a única solução é f (x) = −x + 1, para todo x real.

Combinatória

PROBLEMA 4
Seja n ≥ 2 inteiro. Dizemos que duas permutações (a1 , a2 , . . . , an ) e (b1 , b2 , . . . , bn ) de {1, 2, . . . , n} são amigui-
nhas se existe um inteiro k ≥ n tal que bi = ak+1−i para i = 1, . . . , k e bi = ai para i = k + 1, . . . , n.
Prove que é possı́vel colocar todas as permutações de {1, 2, . . . , n} em um cı́rculo de modo que quaisquer
duas permutações vizinhas são amiguinhas.

Solução
Denote por fi a permutação que inverte os i primeiros termos, ou seja, troca (x1 , x2 , . . . , xi , xi+1 , . . . , xn ) por
(xi , xi−1 , . . . , x1 , xi+1 , . . . , xn ); em particular, sempre existe um fi que transforma uma permutação na sua
vizinha.
Fazemos indução em n, de fato com hipótese fortalecida: começaremos com P1 = (1, 2, . . . , n) e terminaremos
com Pn! = (n, n − 1, . . . , 2, 1). Para n = 1 não há o que se fazer (e para n = 2 também não).
Agora, suponha que o resultado é válido para n−1 e provemos para n. Fazendo as permutações da hipótese de
indução (isto é, sem mexer no último termo) obtemos P1 = (1, 2, . . . , n−1, n) até P(n−1)! = (n−1, n−2, . . . , 1, n).
Nesse caso, obtemos todas as permutações que terminam com n. Aplicamos fn e obtemos (n, 1, 2, . . . , n − 1) (ou
seja, permutamos ciclicamente). Fazemos de novo as permutações e obtemos todas as permutações com n − 1
no final, terminando em (n − 2, n − 3, . . . , 1, n, n − 1); aplicamos novamente fn e obtemos (n − 1, n, 1, . . . , n − 2) e
prosseguimos. Note que a cada iteração fazemos uma permutação cı́clica, e ao final de n! − 1 operações obtemos
todas as permutações.

PROBLEMA 5
Considere um tabuleiro n × n. Qual é a maior quantidade de casas que podemos escolher do tabuleiro de modo
que não haja um paralelogramo cujos vértices são os centros de quatro das casas escolhidas?

Solução
Resposta: 2n − 1.
Uma maneira de obter 2n − 1 casas é ocupar a primeira linha e a primeira coluna do tabuleiro.
Agora considere 2n casas do tabuleiro e considere as linhas. Se existem duas linhas com duas peças com
a mesma distância entre si, obtemos um paralelogramo; e é claro que há n − 1 possı́veis distâncias. Sendo
a1 , a2 , . . . , am as quantidades de peças nas linhas, ai > 0 (ou seja, m ≤ n), há pelo menos ai − 1 distâncias
distintas possı́veis (use a casa mais à esquerda como referência e faça as distâncias até essa casa). Com isso, há
pelo menos a1 + a2 + · · · + am − m distâncias. Se a1 + · · · + am ≥ 2n, há pelo menos 2n − m ≥ 2n − n = n
distâncias possı́veis, e por casa dos pombos duas distâncias se repetem; como tomamos o cuidado de não ter
distâncias repetidas na mesma linha, elas são em linhas diferentes, e o problema acabou.

PROBLEMA 6
Colorado e Colorina participam de um jogo. Eles alternadamente pintam uma aresta de uma pirâmide cuja base
é um 2017-ágono usando uma de k cores, de modo que arestas com um vértice comum tenha cores diferentes.
Não é permitido pintar uma aresta que já foi pintada. Colorado começa o jogo e Colorina quer pintar todas as
arestas. Qual é o menor valor de k para o qual Colorina sempre consegue pintar todas as arestas da pirâmide?

Solução
Resposta: 2017.
Primeiro, é imediato que k ≥ 2017, pois o vértice da pirâmide tem grau 2017.
Para k = 2017, adote a estratégia de simetria; se Colorado pintar uma aresta a da cor i, pinte a aresta a′ a
a simétrica em relação à altura pirâmide (que podemos supor sem perdas ser regular) com a cor 2018 − i. Com
isso, Colorina tem sempre uma aresta para pintar.
Geometria

PROBLEMA 7
Seja ABCD um quadrilátero circunscrito no cı́rculo ω, que tem centro I. Suponha que ∠BAD + ∠ADC < π.
Sejam M e N os pontos de tangência de ω em AB e CD, respectivamente. O ponto K ̸= M está sobre a reta
M N e satisfaz AK = AM . Prove que a reta ID corta o segmento de reta KN em seu ponto médio.

Solução
A condição ∠BAD + ∠ADC < π serve para mostrarmos que as retas AB e CD se intersectam em um ponto
E tal que ω é incı́rculo de ADE. A partir daqui, podemos ignorar os pontos B e C, e temos um problema no
triângulo ADE.
E

N
P
M I
K

A Q D

Sejam P o ponto de interseção de DI e M N e Q o ponto de tangência de ω em AD. Como DN = DQ, DP


é comum e ∠IDN = ∠IDQ, os triângulos DQP e DN P são congruentes pelo caso LAL, e P Q = P N . Então
basta provar que P Q = P K, ou seja, P QK é isósceles.
Mas da mesma congruência, agora com ângulos externos e considerando que EN = EM e AM = AK,
∠P QA = ∠P N E = ∠N M E = ∠KM A = ∠AKM = ∠AKP < 90◦ , AQ = AM = AK e AP é comum. Assim,
pela lei dos senos
AQ AP AP AK
= = = ,
sen ∠AP Q sen ∠AQP sen ∠AKP sen ∠AP K
de modo que sen ∠AP Q = sen ∠AP K, ou seja, ∠AP Q e ∠AP K são iguais ou suplementares. Mas ∠AP Q +
∠AP K < π, logo ∠AP Q = ∠AP K, e os triângulos AKP e AQP são congruentes pelo caso ALA, e P Q = P K,
como querı́amos demonstrar.

PROBLEMA 8
Os cı́rculos ω1 e ω2 se cortam em P e Q. Uma reta é tangente a ω1 em A e a ω2 em B. Um cı́rculo passa por
CP DP
A e B e corta ω1 em C ̸= A e ω2 em D ̸= B. Prove que CQ = DQ .

Solução
Se ω1 e ω2 têm o mesmo raio, a figura toda é simétrica com relação a P Q, e a relação é imediata.

P
O2
C
O1

Q
O
A B

Caso contrário, seja O a interseção da reta que liga os centros O1 de ω1 e O2 de ω2 e AB. Considere a
inversão de centro O que leva ω1 a ω2 (isso é possı́vel pois toda inversão que leva um cı́rculo a outro tem
centro no centro de homotetia direta entre os dois cı́rculos). Ela leva A a B, e sendo C ′ a imagem de C, sendo
OA · OB = OC · OC ′ , A, B, C e C ′ são concı́clicos e, como C pertence a ω1 , C ′ pertence a ω2 . Logo D = C ′ .
Note também que P e Q são fixados pois interseções são levadas a interseções.
Deste modo, usando a fórmula X ′ Y ′ = XY
OX·OY r2 , em que r é o raio de inversão, como OP = OQ = r,

DP C ′P ′ CP · r2 OQ · OC CP
= ′ ′ = · 2
= .
DQ CQ OP · OC CQ · r CQ

PROBLEMA 9
No triângulo ABC, ω é um cı́rculo que passa por B e C e corta o lado AB em E e o lado AC em F . As retas
BF e CE cortam o circuncı́rculo de ABC novamente em B ′ e C ′ , respectivamente. Seja A′ o ponto sobre BC
tal que ∠C ′ A′ B = ∠B ′ A′ C.
Prove que, ao variar ω, os circuncı́rculos dos triângulos A′ B ′ C ′ passam um ponto comum.

Solução

A
B′

C′
E

B A′ X C

Seja X ̸= A′ a interseção do circuncı́rculo de A′ B ′ C ′ com BC. Então, no quadrilátero cı́clico A′ C ′ B ′ X,


∠XB ′ C ′ = ∠BA′ C ′ = ∠CA′ B ′ = ∠B ′ C ′ X, ou seja, XB ′ C ′ é isósceles. Isso quer dizer que X pertence à
mediatriz de B ′ C ′ .
Por outro lado, ∠C ′ CA = ∠ECF = ∠EBF = ∠ABB ′ , e os arcos AC ′ e AB ′ são congruentes. Ou seja,
AC ′ = AB ′ , e A também pertence à mediatriz de B ′ C ′ . Sendo B ′ C ′ uma corda do circuncı́rculo de ABC, essa
mediatriz também passa pelo circuncentro O de ABC. Portanto X é a interseção de AO com BC, e é o ponto
comum a todos os circuncı́rculos de A′ B ′ C ′ .
Teoria dos Números

PROBLEMA 10
Seja n um inteiro positivo. Suponha que seus divisores possam ser particionados em pares de modo que a soma
de cada par de divisores é um primo. Prove que esses primos são todos distintos e que nenhum desses primos é
divisor de n.

Solução
Sejam d1 , d2 um dos pares do problema. Se p | d1 e p | d2 , então p | d1 + d2 e d1 + d2 > p, de modo que d1 + d2
não é primo. Portanto mdc(d1 , d2 ) = 1, e d1 d2 | n. Em particular, d1 d2 ≤ n. Multiplicando tudo, temos que
o produto de todos os 2t divisores é menor ou igual a nt . Por outro lado, podemos formar pares {d, n/d} de
divisores, e o produto dos divisores é (d · n/d)t = nt . Com isso, ocorre igualdade, e todos os pares são da forma
{d, n/d}, e mais ainda, mdc(d, n/d) = 1. √
Agora podemos provar os fatos do problema. Primeiro note que f (d) = d + n/d é decrescente em [0, n],
logo os primos são distintos. Finalmente, se p é um primo que divide n então p divide exatamente um dos
números d, n/d, já que mdc(d, n/d) = 1. Logo p ! d + n/d, e mdc(n, d + n/d) = 1, ou seja, d + n/d não pode ser
divisor de n.

PROBLEMA 11
Sejam c, d ≥ 2 inteiros. Defina a1 = c e an = adn−1 + c, n ≥ 2. Prove que, para todo n ≥ 2, existe um primo p
que divide an e nenhum dos números a1 , a2 , . . . , an−1 .
Solução
Primeiro, é fácil ver por indução de c | ai para todo i, então seja bi = ai /c. Com isso, b1 = 1 e bn = cd−1 bdn−1 +1.
Com isso, mdc(bn , c) = 1. Começaremos provando que mdc(bn , bm ) = bmdc(n,m) .
Para isso, provaremos que bn ≡ bn−m (mod bm ) para n > m, por indução em n. Para n = m + 1,
bm+1 = cd−1 bdm + 1 ≡ 1 = b1 (mod bm ). Para n > m + 1, bn = cd−1 bdn−1 + 1 ≡ cd−1 bdn−m−1 + 1 = bn−m
(mod bm ). Com isso, mdc(bn , bm ) = mdc(bn−m , bm ) e usamos o algoritmo de Euclides, obtendo o resultado.
Isso ainda não resolve o problema, pois bn pode ser grande sem ter fatores primos novos. Para ajeitar isso,
vamos comparar os fatores primos p de bn . Para isso, mostraremos que se pk | bn então pkd | bmn − bn . Para
isso, note que bn+1 = cd−1 bdn + 1 ≡ 1 = b1 (mod pdk ), e a mesma indução que a acima mostra que bn+t ≡ bt
(mod pdk ) para todo t. Em particular, bmn ≡ bn (mod pdk ). A consequência imediata disso é que se p | bn
então νp (bn ) = νp (bt ) para todo divisor t de n, pois se k = νp (at ) então pdk | an − at e, sendo d > 1, an ≡ at ̸≡ 0
(mod pk+1 ) e pk | an .
Agora, se bn não tem fator primo novo então bn tem todos os seus fatores em bt , t divisor de n, de modo que
d(d−1) d(d−1)−1
b1 b2 . . . bn−1 ≥ bn > bdn−1 =⇒ b1 b2 . . . bn−2 > bd−1
n−1 > bn−2 =⇒ b1 . . . bn−3 > bn−2 , e assim por diante,
até que obtemos b1 > b1 , um absurdo. Com isso, bn tem fator primo novo.

PROBLEMA 12
Prove que existem infinitos pares de racionais (x, y) tais que y 2 = x3 − 5x + 8.

Solução
Primeiro, note que (1, 2) é uma solução da equação diofantina dada. Agora, considerando o gráfico da relação
y 2 = x3 − 5x + 8, trace a reta que passa por (1, 2) e é tangente a essa curva, ou seja, escolha racionais a e b
tais que a reta é y = ax + b. Assim, 2 = a · 1 + b e (ax + b)2 = x3 − 5x + 8 tem 1 como raiz dupla. Logo
(ax + 2 − a)2 = x3 − 5x + 8 e, pelas relações entre coeficientes e raı́zes, sendo r a outra raiz, a2 = 1 + 1 + r e
a2 − 4a − 4 = r, de modo que a2 = r + 2 e r + 2 − 4a − 4 = r ⇐⇒ a = −1/2. Com isso, r = a2 − 2 = −7/4,
e b = 2 − a = 5/2. logo y = −x/2 + 5/2 é a reta tangente, para x = −7/4 obtemos y = 27/8 e obtemos outra
solução racional (−7/4, 27/8).

− 74 , 27
% &
8
3

2
(1, 2)

−3 −2 −1 1 2 3 4

−1

−2

−3

Vamos generalizar essa ideia: sendo P = (x0 , y0 ) um ponto com coordenadas racionais sobre a curva,
traçamos a reta y − y0 = a(x − x0 ) que passa por P e é tangente à curva em P . Com isso,

(a(x − x0 ) + y0 )2 = x3 − 5x + 8,

e, sendo r a outra raiz, temos a2 = 2x0 + r, x20 r = −8 + (ax0 + y0 )2 = −8 + a2 x20 − 2ax0 y0 + y02 = −8 +
3x2 −5
(2x0 + r)x20 − 2ax0 y0 + (x30 − 5x0 + 8) = 3x30 + rx20 − 2ax0 y0 − 5x0 ⇐⇒ a = 2y0 0 , que é racional. Com
isso, o novo ponto tem coordenada x dada por r = a2 − 2x0 , que também é racional e a coordenada y dada
por y = a(r − x0 ) + y0 , que também é racional. Com isso, obtemos sempre um novo ponto racional ao traçar a
tangente. . . a não ser que obtenhamos um ciclo. Provemos que isso não acontece.
2
−5n2
Note que se x0 = m/n, mdc(m, n) = 1, então a = 3m2mn . Seja ν2 (n) a quantidade de fatores 2 em n. No
que seria a segunda iteração, x0 = −7/4, e obtemos ν2 (n) = 2. Suponha que ν2 (n) > 0. Então ν2 (m) = 0 e
3m2 − 5n2 é ı́mpar, ou seja, nenhum fator 2 cancela. Com isso, o denominador de a tem ν(n) + 1 fatores 2, ou
seja, sempre aumenta. Finalmente, r = a2 − 2x0 tem 2ν2 (n) + 2 fatores 2 no denominador, pois 2x0 = −2m/n
soma um número par no numerador de r, e não cortamos fatores 2. Com isso, como os denominadores dos
novos pontos têm mais fatores 2 do que o ponto anterior, os pontos não podem se repetir.
Observação: curvas do tipo y 2 = x3 + Ax + B são curvas elı́pticas, e são bastante usadas em teoria dos
números moderna. A quantidade de pontos com coordenadas racionais sobre curvas elı́pticas pode ser finita
nula, finita não nula – por exemplo, y 2 = x3 + px, p primo congruente a 9 ou 13 módulo 16 – ou infinita, como
no nosso problema. Sabe-se que a quantidade de pontos com coordenadas inteiras, no caso em que x3 + Ax + B
não tem raiz dupla nem tripla, é finita.

Problemas gerais

PROBLEMA 13
Seja P um ponto no interior do triângulo ABC tal que
AP + BP BP + CP CP + AP
= = .
AB BC CA
As retas AP, BP, CP cortam o circuncı́rculo de ABC novamente em A′ , B ′ , C ′ . Prove que os incı́rculos dos
triângulos ABC e A′ B ′ C ′ coincidem.

Solução
Primeiro note que, sendo 2p = AB + BC + CA,

AP + BP BP + CP CP + AP 2(AP + BP + CP ) AP + BP + CP
= = = =
AB BC CA 2p p
⇐⇒ AP : BP : CP = (p − a) : (p − b) : (p − c).

Em outras palavras, P é a interseção dos cı́rculos de Apolônio correspondentes aos pontos de tangência D
sobre BC, E sobre CA e f sobre AB do incı́rculo no triângulo ABC.

F O
P I

D′ X B D C

Seja DD′ o diâmetro e X o centro do cı́rculo de Apolônio correspondente. Inverta a figura por esse cı́rculo.
Então B é levado em C, e concluı́mos que XP 2 = XB · XC = XD2 , ou seja, as potências de X com relação
ao ponto P , ao circuncı́rculo e ao incı́rculo são iguais. Isso também vale para os centros Y e Z dos outros dois
cı́rculos de Apolônio, logo XY Z é o eixo radical desses três cı́rculos, e além disso os três centros P , I (incentro)
e O (circuncentro) são colineares.
Consideremos agora a figura toda:
B′

N E

C′ O
F P I

B D C

A′

Agora vejamos a semelhança entre BP C e C ′ P B ′ . Ela leva a projeção de P no lado BC à projeção de P


sobre B ′ C ′ , e leva o ponto médio de BC ao ponto médio de B ′ C ′ ; esses pontos médios são projeções de O sobre
esses lados. Com isso, as projeções de I sobre BC e B ′ C ′ são correspondentes. Sendo N a projeção de I sobre
B ′ C ′ , temos também da semelhança ∠IN P = ∠IDP . Além disso, considerando o cı́rculo de Apolônio, P D é
bissetriz de ∠BP C e, da semelhança, P N é bissetriz de ∠C ′ P B ′ , e assim D, P e N são colineares, ou seja,
∠IP N e ∠IP D são suplementares, e têm o mesmo seno. Assim, pela lei dos senos,
IN IP IP ID
= = = =⇒ IN = ID.
sen ∠IP N sen ∠IN P sen ∠IDP sen ∠IP D
Logo o lado B ′ C ′ é tangente ao incı́rculo, e analogamente os lados A′ B ′ e A′ C ′ também, e o problema
terminou.

PROBLEMA 14
Suponha que as casas de um tabuleiro n × n são pintadas de preto e branco de modo que cada casa preta
tem uma quantidade par de casas vizinhas (lado comum) brancas. Prove que é possı́vel pintar todas as casas
brancas de vermelho ou azul de modo que cada casa preta tenha uma quantidade igual de casas vizinhas azuis
e vermelhas.

Solução
Considere o grafo G cujos vértices são as casas brancas com alguma casa preta vizinha e ligue duas casas se
elas têm exatamente um vértice em comum. Note que cada casa preta com quatro brancas vizinhas tem todas
as casas brancas ligadas em ciclo.
Agora, considere uma casa preta com exatamente duas brancas vizinhas. Essas duas casas brancas ou estão
ligadas em G ou são opostas. Construa o grafo H colocando em G arestas tracejadas correspondentes a essas
casas brancas opostas. Note que o problema é equivalente que podemos pintar H de duas cores, vermelho e
azul, de modo que vértices ligados por aresta tenha cores diferentes. Em outras palavras, H deve ter número
cromático 2. Isso é equivalente a provar que H é bipartido (se H é bipartido, basta pintar cada classe de uma
cor; se dá para pintar, considere as cores dos vértices, e o grafo com classes de cada cor é bipartido).

Cada aresta corresponde a mudar a paridade das coordenadas das duas casas. O grafo G é bipartido, pois
se há ciclo, precisamos mudar a paridade uma quantidade par de vezes, e a quantidade de arestas (e portanto
vértices) é par. Agora vamos ajeitar H. Para isso basta provar que todo ciclo tem uma quantidade par de
arestas tracejadas.
Note que cada aresta tracejada está associada a uma única casa preta. Vamos fazer uma sequência de casas
pretas, a partir de uma casa preta com aresta tracejada. Essa casa não pode estar no canto do tabuleiro. Como
ela tem duas casas brancas vizinhas, ela também tem pelo menos uma casa preta vizinha. Vá para essa casa;
se ela não está na borda do tabuleiro, ela tem mais uma casa preta vizinha; e caso a casa preta em que estamos
tenha todas as vizinhas pretas, continue na mesma direção; continue esse procedimento até chegar ao bordo do
tabuleiro ou completar um ciclo de casas pretas. Repita o procedimento com toda aresta tracejada. Como toda
casa preta tirando as da borda têm uma quantidade par de vizinhas pretas, podemos dividir o tabuleiro em
várias regiões com essas linhas pretas; de fato, suponha que duas dessas linhas se cruzem: para isso acontecer,
a casa preta deve ter todas as vizinhas pretas, e aı́ elas se cruzam.

Agora vamos mostrar que é possı́vel pintar as regiões de duas cores com indução sobre as linhas. Se só tem
uma linha, só há duas regiões, e é só pintá-las de cores diferentes; se há mais, retire uma linha, pinte (o que
é possı́vel pela hipótese de indução), coloque a linha de volta, dividindo o tabuleiro (inteiro) em duas regiões;
mantenha as cores de uma região e troque todas as cores da outra região – por hipótese de indução não há
problemas dentro de cada região e, como trocamos as cores, na nova linha as cores são diferentes.
Como cada aresta tracejada liga duas regiões diferentes, e pintamos as regiões de duas cores diferentes, a
quantidade de arestas tracejadas é par, e o problema acabou.

PROBLEMA 15
Sejam A = A(x, y) e B = B(x, y) polinômios de duas variáveis com coeficientes reais. Suponha que A(x, y)/B(x, y)
é um polinômio em x para infinitos valores de y e é um polinômio em y para infinitos valores de x. Prove que
B divide A, ou seja, existe um polinômio C de coeficientes reais tal que A = B · C.

Solução
Primeiro considere A e B como polinômios em x, e divida A por B, obtendo' A = B · Q + R, com ' o grau em x de
n m
R menor do que o grau em x de B (sendo mais especı́fico, escrevemos A = k=0 Ak (y)xk , B = k=0 Bk (y)xk ;
k
os polinômios Q e R são somas de produtos de funções racionais de y com x . Temos A/B = Q + R/B. Como
A/B e Q são polinômios em x para infinitos valores de y, R/B também o é. Suponha, por absurdo que R não
é nulo.
Agora, considere o coeficiente lı́der de B, um polinômio Bm (y) em y. Há infinitos valores de y que tornam
R/B polinômio em x, e, tirando possivelmente os que zeram Bm (y), sobram infinitos valores de y para os quais
R/B é um polinômio em x, mas o coeficiente lı́der de B não some. Mas o grau de R é menor do que o de B,
então para R/B poder ser polinômio R deve ser nulo.
Com isso, A = B · Q, em que Q é um polinômio em x cujos coeficientes são funções racionais em y. Ou seja,
Q = F (x, y)/U (y). Trocando x por y, obtemos A = B · P com P = G(x, y)/V (x). Logo, como P = Q = A/B,

F (x, y) G(x, y)
= ⇐⇒ F (x, y)V (x) = G(x, y)U (y).
U (y) V (x)

Como U (y) e V (x) não têm fatores comuns, U (y) divide F (x, y), de modo que Q = F/U é um polinômio de
duas variáveis, completando a demonstração.

PROBLEMA 16
Para m inteiro maior do que 1, dizemos que a é m-poderoso se mdc(a, m) = 1 e existe x inteiro positivo tal que
xx − a é múltiplo de m. Prove que se a é nn -poderoso, então também é n(n ) -poderoso.
n

Solução
Sejam p1 < p2 < . . . < pk os fatores primos de n. Provaremos que se existe x tal que xx ≡ a (mod pr1 . . . prk )
com pr1 ≥ pk então existe y tal que y y ≡ a (mod pr+1 1 . . . pr+1
k ). Ou seja, indutivamente obtemos zz ≡ a
N N z nn
(mod p1 . . . pk ) para todo N ≥ r, e escolhendo N suficientemente grande obtemos z ≡ a (mod n ). Como
nn implica r ≥ n, a hipótese é verdadeira, e o problema acabaria.
Vamos provar o fato então. Seja M = mmc((pi − 1)pri , 1 ≤ i ≤ k) o mmc dos φ(pr+1 ). Começamos
escolhendo y = x + tM , para manter a conta módulo pr1 . . . prk . De fato, y y = (x + tM )x (x + tM )tM ≡ (x + tM )x
(mod pr+1
1 . . . pr+1 2
k ). Note que M ≡ 0 (mod p1
r+1
. . . pr+1
k ), logo abrindo com o binômio de Newton temos
" #
x x−1
y y ≡ xx + x tM = xx (1 + tM ) (mod pr+1 1 . . . pr+1
k ).
1

Agora é só ajeitar t para obter xx (1 + tM ) ≡ a (mod pr+1


1 . . . pr+1 x r r
k ). Mas já temos x = a + up1 . . . pk , e
fazendo a conta temos

a + taM + upr1 . . . prk + uaM pr1 . . . prk ≡ a (mod pr+1


1 . . . pr+1
k ).

Mas M é múltiplo de pr1 pr2 . . . prk , e como pi − 1 < pk ≤ prj , o mmc não tem mais do que r de cada fator pi ,
e M/(pr1 . . . prk ) = v com mdc(v, p1 . . . pk ) = 1. Com isso, cortando pr1 . . . prk temos

tav + u ≡ 0 (mod p1 . . . pk ) ⇐⇒ t ≡ −u(av)−1 (mod p1 . . . pk ),

o que é possı́vel, completando a solução.


Quarta Lista de Preparação para a LVIII IMO
e XXVII Olimpı́ada Iberoamericana de Matemática
Nı́vel III
Soluções

Prazo: 31/03/2017, 23:59 de Brası́lia

Álgebra

PROBLEMA 1
Sejam n e k inteiros positivos com k ≤ n − 2. O valor absoluto da soma de quaisquer k dos n números reais
a1 , a2 , . . . , an é menor ou igual a 1. Sabendo que |a1 | ≥ 1, prove que, para 2 ≤ i ≤ n,

|a1 | + |ai | ≤ 2.

Solução
Podemos supor sem perdas que a1 ≥ 1 (caso contrário, trocamos os sinais de todos os números). Agora suponha
também que a2 ≥ a3 ≥ . . . ≥ aj > 0 ≥ aj+1 ≥ . . . an . Temos a1 + a2 + · · · + ai > 1 para 2 ≤ i ≤ j, então j < k.
Como k ≤ n − 2, há pelo menos dois números negativos.
Vamos provar que a1 − an ≤ 2. Como |an | é o maior entre os negativos, isso resolve o problema para
ai negativo. Mas isso vem de a1 + an−k+1 + · · · + an−1 ≤ 1 e an−k+1 + an−k+2 + · · · + an ≥ −1 ⇐⇒
−an−k+1 − an−k+2 − · · · − an ≤ 1, e somamos as duas desigualdades.
Se só a1 é positivo, é só provarmos que a1 − an ≤ 2, o que já foi feito. Se mais de um número é positivo,
basta provarmos que a1 + a2 ≤ 2, já que a2 é o maior positivo, tirando possivelmente a1 . Mas isso vem de
a1 + a2 + an−k+1 + · · · + an−2 ≤ 1 e an−k+1 + · · · + an ≥ −1, o que implica a1 + a2 − an−1 − an ≤ 2. Como
−an−1 e −an são positivos (há pelo menos dois negativos), o resultado segue.

PROBLEMA 2
Um número n é saboroso se existem 2n números reais x1 , . . . , x2n , não todos iguais, tais que a soma de quaisquer
n dos números é igual ao produto dos outros n números. Encontre todos os números saborosos.

Solução
Resposta: n par.
Suponha, sem perdas, que x1 ̸= x2 . Então x1 x3 x4 . . . xn+1 = x2 + xn+2 + · · · + x2n e x2 x3 x4 . . . xn+1 =
x1 + xn+2 + · · · + x2n . Subtraindo encontramos x3 x4 . . . xn+1 (x1 − x2 ) = x2 − x1 , ou seja, x3 x4 . . . xn+1 = −1.
Podemos escolher quaisquer n − 1 ı́ndices, então x3 = x4 = · · · = x2n = x e xn−1 = −1, o que só é possı́vel se n
é par e x = −1.
Para n par, basta tomar x1 = n e x2 = x3 = · · · = x2n = −1. O produto é 1 se só escolhemos −1 para
o produto, e a soma é n + (n − 1)(−1) = 1; se escolhemos n para o produto, ele é igual a −n e a soma é
n(−1) = −n.

PROBLEMA 3
Encontre o maior valor real de c para o qual existe um polinômio P não constante tal que

P (x2 ) = P (x − c)P (x + c)

para todo x real.

Solução
Resposta: 1/2.
Seja r uma raiz. Então, fazendo x → r ± c, temos que (r − c)2 e (r + c)2 são raı́zes. Se |r| < |r − c|2 ,
então iterar a função r → (r − c)2 aumenta o módulo das raı́zes, e conseguimos uma sequência infinita de
raı́zes, absurdo. Analogamente não podemos ter |r| < |r − c|2 , de modo que |r| = |r − c|2 . Do mesmo modo,
|r| = |r + c|2 e

2|r| = |r − c|2 + |r + c|2 = (rr − rc − rc + c2 ) + (rr + rc + rc + c2 ) = 2|r|2 + 2c2 .



2
Logo |r|2 − |r| + c2 = 0 ⇐⇒ |r| = 1± 1−4c2 e logo 1 − 4c2 ≥ 0 =⇒ c ≤ 1/2.
Vejamos se existe um polinômio para c = 1/2. Para ocorrer |r + 1/2| = |r − 1/2|, devemos ter r na mediatriz
de 1/2 e −1/2, que é o eixo imaginário. Logo, observando que 1 − 4c2 = 0, r = ±i/2. De fato, P (x) = x2 + 1/4
funciona: P (x − 1/2)P (x + 1/2) = ((x − 1/2)2 + 1/4)((x + 1/2)2 + 1/4) = (x2 + 1/2)2 − x2 = x4 + 1/4 = P (x2 ).
Combinatória

PROBLEMA 4
Recortaldo corta, de um tabuleiro 100 × 100, 1950 retângulos 1 × 2, sempre cortando exatamente nas linhas do
tabuleiro. Prove é possı́vel cortar um T-tetraminó (uma peça formada por uma casa e três casas vizinhas a essa
casa) do que sobrou do tabuleiro.

Solução
Suponha que os dominós são recortados em alguma ordem. Defina o preço de uma casa não recortada como
a quantidade de vizinhos não recortados, menos 2. Queremos que, após 1950 cortes, sobre pelo menos uma
casa com preço positivo, que vai ser o centro do T-tetraminó desejado (essa casa vai ter pelo menos três casas
vizinhas não recortadas).
O preço total inicial é 982 · 2 + 98 · 4 · 1 = 98(196 + 4) = 19600. Cada corte tira duas casas, e cada uma é
vizinha de quatro outras, dando um total de no máximo 10 a menos de preço (pode ser que alguns vizinhos já
estão recortados). Com isso, o preço total após 1950 cortes é pelo menos 19600 − 1950 · 10 = 100, completando
a demonstração.

PROBLEMA 5
Um bazar tem uma máquina, o mudador de carpetes. Ele pega um carpete de dimensões a × b e devolve um
carpete de dimensões a1 × 1b ou dois carpetes de dimensões c × b e ac × b, em que c pode ser escolhido. É possı́vel,
a partir de um carpete com ambas as dimensões maiores do que 1, obter, através de uma quantidade finita
de operações na máquina, um conjunto de carpetes, cada um com uma dimensão maior do que 1 e a outra
dimensão menor do que 1?

Solução
Resposta: não.
Diremos que um carpete é grande quando ambas suas dimensões são maiores do que 1 e é pequeno quando
ambas suas dimensões são menores do que 1. Provaremos que a quantidade total de carpetes pequenos e grandes
não diminui, o que nos prova que a resposta do problema é negativa.
De fato, se não fazemos a operação em um carpete grande ou pequeno, a quantidade não diminui; a primeira
operação transforma um carpete grande em um pequeno e vice-versa, não alterando o total. Consideremos a
segunda operação. Se o carpete é grande, devemos ter c < 1, mas aı́ ac > 1, e um dos carpetes é grande; se é
pequeno, então c > 1 e ac < 1, e um dos carpetes é pequeno, completando a demonstração.

PROBLEMA 6
Há n pontos azuis e n pontos vermelhos na borda de um cı́rculo. Um par de pontos, um de cada cor, é equilibrado
se pelo menos um dos dois arcos ligando os dois pontos tem a mesma quantidade de pontos azuis e vermelhos.
Em particular, dois pontos vizinhos de cores diferentes são equilibradas. Sabe-se que existe um ponto vermelho
em exatamente 10 pares equilibrados. Prove que existe um ponto azul em exatamente 10 pares equilibrados.

Solução
Seja P um ponto vermelho que está em exatamente 10 pares equilibrados. Sejam P1 , P2 , . . . , P2n o pontos no
sentido horário, com P1 = P , e veja os ı́ndices módulo 2n. Seja di a diferença entre a quantidade de pontos
vermelhos e azuis, nessa ordem, entre os pontos P1 , P2 , . . . , Pi ; di pode ser negativo e, em particular, d1 = 1 e
d2n = 0. Agora, o par de pontos {P, Pi } é equilibrado quando di = 0, e sendo Pi azul, di−1 = 1. Note que há
exatamente 10 “descidas” di−1 = 1 → 0 = di , e podemos fazer isso ciclicamente também (ou seja, ver os ı́ndices
de di módulo 2n também).
Como d2n = 0, a quantidade de “subidas” dj−1 = 0 → dj = 1, j = 1, 2, . . . , 2n, também é 10. Um jeito de
verificar isso é ligar os pontos (i, di ) e (i + 1, di+1 ); esses segmentos têm coeficientes angulares ±1; as descidas
correspondem a ir do semiplano y ≥ 1/2 para o semiplano y ≤ 1/2, e como d2n = 0 e temos uma linha contı́nua,
temos que ter a mesma quantidade de cruzamentos com a reta y = 1/2. Além disso, Pj é vermelho.
Agora, seja Pi um dos 10 pontos azuis com di = 0. Quando {Pi , Pj } é equilibrado? Entre 1 e i há a mesma
quantidade de pontos de cada cor; entre i e j também deve haver essa mesma quantidade, contando i e j; parece
que dj = 0, mas o ponto Pi está sendo contado duas vezes, ou seja, há um ponto vermelho a mais. Assim,
{Pi , Pj } é equilibrado se, e somente se, dj = 1 e Pj é vermelho, ou seja, dj−1 = 0. Mas isso corresponde à
subidas, e provamos que há exatamente 10 subidas; portanto cada um desses pontos azuis Pi está em exatamente
10 pares equilibrados, e o problema acabou.
Geometria

PROBLEMA 7
Seja ω um cı́rculo de diâmetro OI. Construa uma função bijetora f : ω \ {I, O} → R \ {0} com a seguinte
propriedade: para todos pontos distintos A, B, C, D diferentes de O e I, f (A)f (B) = f (C)f (D) se, e somente
se, AB, CD e OI têm um ponto em comum ou são paralelos.
Solução
Considerando que ω é o cı́rculo unitário de centro K = 0 no plano complexo com O em −1 e I em 1, a corda
a+b
AB é dada por z + zab = a + b, cuja interseção com OI, o eixo dos reais, é tal que z = z ⇐⇒ z = 1+ab , com
AB ∥ OI quando ab = −1. Com isso, AB e CD se cortam sobre OI ou são ambos paralelos a OI se, e somente
se,
(a + b) : (1 + ab) = (c + d) : (1 + cd).
Agora, sendo a = α2 , b = β 2 , c = γ 2 e d = δ 2 , temos, dividindo a primeira proporção por αβ,

(a + b) : (1 + ab)
= (α/β + β/α) : (αβ + αβ)
∠OKA − ∠OKB ∠OKA + ∠OKB
= ℜ(α/β) : ℜ(αβ) = cos : cos
! 2 " 2! "
∠OKA ∠OKB ∠OKA ∠OKB ∠OKA ∠OKB ∠OKA ∠OKB
= cos cos + sen sen : cos cos − sen sen
2 2 2 2 2 2 2 2
= (1 + tan ∠OIA tan ∠OIB) : (1 − tan ∠OIA tan ∠OIB).

Então, AB e CD se cortam sobre OI ou são ambos paralelos a OI se, e somente se,

(1 + tan ∠OIA tan ∠OIB) : (1 − tan ∠OIA tan ∠OIB) = (1 + tan ∠OIC tan ∠OID) : (1 − tan ∠OIC tan ∠OID)

⇐⇒ (1+tan ∠OIA tan ∠OIB) : (1+tan ∠OIC tan ∠OID) = (1−tan ∠OIA tan ∠OIB) : (1−tan ∠OIC tan ∠OID).
Considerando que x : y = z : w = (x + z) : (y + w) = (x − z) : (y − w), obtemos

2 : 2 = 2 tan ∠OIA tan ∠OIB : 2 tan ∠OIC tan ∠OID ⇐⇒ tan ∠OIA tan ∠OIB = tan ∠OIC tan ∠OID,

e podemos tomar f (X) = tan ∠OIX, com ∠OIX orientado (se IO,# IX estão
$ no sentido anti-horário, ∠OIX > 0;
caso contrário, ∠OIX < 0). Como ∠OIX assume cada valor de − π2 , π2 \ {0} exatamente uma vez, a imagem
de f é R \ {0} e f é injetora; ou seja, f é bijetora.

PROBLEMA 8
Seja ω o incı́rculo de ABC (AB < AC). O A-excı́rculo ωA é tangente a BC em D. Um ponto variável X é
escolhido sobre o segmento AD de modo que DX não tem pontos em comum com ω. As retas tangentes a ω
que passam por X cortam o lado BC em Y e Z. Prove que XY + XZ não depende da escolha de X.

Solução
F
A

T
I X

B E D C
Y Z

Primeiro note que ω é o Z-exincı́rculo de XY Z. É bem conhecido que T , a interseção de AD e ω mais


próxima de A, é o ponto diametralmente oposto ao ponto de tangência E de ω em BC. Além disso, a homotetia
que leva ω ao Y -exincı́rculo ωX de XY Z tem centro X e leva a tangente a ω por T , que é paralela a BC à
tangente a ωX por uma reta paralela a BC, ou seja, a própria reta BC. Com isso, T é levado a D, e portanto
ωX tangencia BC em D.
Portanto Y D = ZE = pXY Z = XY +XZ+Y 2
Z
, de modo que DE = Y D + ZE − Y Z = XY + XZ. Como D e
E não dependem de X, o problema está resolvido.

PROBLEMA 9
As áreas dos retângulos P e Q são iguais, mas a diagonal de P é maior do que a diagonal de Q. O retângulo Q
pode ser coberto por duas cópias de P . Prove que P pode ser coberto por duas cópias de Q.
Solução
Por conveniência, suponha sem perdas que em cada retângulo a√largura é menor ou igual ao comprimento.
Como, fixado xy = k, x2 + y 2 = x2 + k 2 /x2 é decrescente para x ≤ P , a largura de P é menor do que a largura
de Q, e o comprimento de P é maior do que o comprimento de Q. Se duas cópias de P cobrem Q, então essas
cópias cobrem o cı́rculo de diâmetro igual à largura de Q, e portanto a largura de P é maior ou igual à metade
da largura de Q. Mas isso quer dizer que o comprimento de Q é maior ou igual à metade do comprimento de
P , e podemos cobrir Q com duas cópias de Q.
Teoria dos Números

PROBLEMA 10
Encontre todos os polinômios P , com coeficientes inteiros, tais que n divide P (2n ) para todo inteiro positivo n.

Solução
Resposta: somente o polinômio nulo.
Como 2pk ≡ 2k (mod p) e, para todo polinômio P de coeficientes inteiros e a e B inteiros, a−b | P (a)−P (b),
p | 2kp − 2k | P (2kp ) − P (2k ). Mas p | kp | P (2kp ), logo p | P (2k ) para todo primo p, ou seja, P (2k ) = 0 para
todo inteiro positivo k. Logo P tem infinitas raı́zes, e só pode ser o polinômio nulo.

PROBLEMA 11
Seja n > 1 inteiro e 1 = d1 < d2 < . . . < dk = n todos os seus divisores positivos. Encontre todos os valores de
n para os quais
mdc(d1 , d2 ) + mdc(d2 , d3 ) + · · · + mdc(dk−1 , dk ) = n − 2.

Solução
Resposta: n = 3 é a única solução.
Primeiro, veja que mdc(di−1 , di ) ≤ di −di−1 . Note que se somarmos essas desigualdades obtemos mdc(d1 , d2 )+
· · · + mdc(dk−1 , dk ) ≤ dk − d1 = n − 1, ou seja, a igualdade acima é bem apertada! De fato, devemos ter
mdc(di−1 , di ) = di − di−1 para todo i exceto um, i = t, para o qual mdc(dt−1 , dt ) = dt − dt−1 − 1. Nesse caso,
esse mdc só pode ser 1, pois ele divide dt , dt−1 e dt − dt−1 − 1. Com isso, dt − dt−1 = 2, ou seja, dt−1 e dt são
ı́mpares consecutivos.
Agora considere dm = n/dt , de modo que dm+1 = n/dt−1 . Temos dm+1 − dm = dt dnt−1 (dt − dt−1 ), e temos
n = dt dt−1 . Logo n é ı́mpar e não podemos ter mdc(di − di−1 ) = di − di−1 , pois di − di−1 é par. Com isso,
k = 2, n é primo, d1 = 1 e n = d2 = 1 + 2 = 3. Pode-se verificar que n = 3 dá certo.

PROBLEMA 12
Determine se existe um inteiro positivo a tais que x2 + 3 e (x + a)2 + 3 são primos entre si para todo inteiro
positivo x.

Solução
Resposta: não.
Primeiro note que a deve ser ı́mpar, já que se x é ı́mpar então x2 + 3 é par e (x + a)2 + 3 deve ser ı́mpar,
ou seja, x + a é par.
Vamos encontrar um primo p que divide x2 + 3 e (x + a)2 + 3 para algum x. Então p divide (x + a)2 + 3 −
2
(x + 3) = a(2x + a). Vamos fazer com que p divida 2x + a. Logo
2x ≡ −a (mod p) =⇒ 4(x2 + 3) ≡ a2 + 12 (mod p).
Assim, p deve dividir a2 + 12. Escolha então p como um fator primo qualquer de a2 + 12. Como a é ı́mpar,
p é ı́mpar também. Agora é só fazer conta para ver que dá para voltar os passos: escolha x inteiro positivo tal
que 2x + a ≡ 0 (mod p). Então
4(x2 + 3) ≡ a2 + 12 ≡ 0 (mod p)
4((x + a)2 + 3) ≡ (2a + 2x)2 + 12 ≡ a2 + 12 ≡ 0 (mod p),
e portanto não existe a nas condições do enunciado.
Problemas gerais

PROBLEMA 13
Determine se existem dois conjuntos infinitos S e T de inteiros positivos tais que todo inteiro positivo n pode
ser escrito unicamente na forma
n = s 1 t1 + s 2 t2 + · · · + s k tk
em que k pode mudar para cada valor de n, s1 < s2 < . . . < sk pertencem a S e t1 , t2 , . . . , tk pertencem a T .
Note que t1 , t2 , . . . , tk não são necessariamente distintos nem ordenados.
Solução
Resposta: sim.
Dizemos que um par de conjuntos finitos (S, T ) é N -cobertor se todo inteiro positivo n com n < N pode ser
escrito unicamente na forma
n = s 1 t1 + s 2 t2 + · · · + s k tk ,
e todo número que pode ser expresso nessa forma é menor do que N . Se um par de conjuntos é N -cobertor
para algum N , diremos simplesmente que ele é cobertor.
Vamos construir duas sequências (S0 , S1 , . . .) e (T0 , T1 , . . .) de conjuntos tais que Si ⊆ Si+1 e Ti ⊆ Ti+1
para % todo i inteiro % não negativo e (Si , Ti ) e (Si , Ti+1 ) são cobertores de números cada vez maiores; com isso,
S = i≥0 Si e T = i≥0 Ti \ {0} são a solução do problema, já que para todo m inteiro existe N tal que m < N
e (Si , Ti ) é N -cobertor.
Começamos com S0 = {1} e T0 = {0, 1}, de modo que (S0 , T0 ) é 2-cobertor. Agora, dado um par (S, T ) que
é N -cobertor, vamos construir dois pares (S ′ , T ) e (S, T ′ ) que são N 2 -cobertores com S ⊆ S ′ e T ⊆ T ′ . Por
exemplo, podemos tomar

S ′ = S ∪ {xN : x ∈ S}, T ′ = {N x + y : x, y ∈ T }.

Todo número m < N 2 pode ser escrito de forma única como pN + q, 0 ≤ p < N e 0 ≤ q < N ; tomando as
representações p = s1 t1 + · · · + sk tk e q = s1 u1 + s2 u2 + · · · + sk uk (em que si ∈ S, ti , ui ∈&T e tomamos alguns
ti = 0 ou ui = 0 para ajeitar os ı́ndices dos si ’s), obtemos uma representação única como si (N ti + ui ), si ∈ S
e N ti + ui ∈ T ′ e uma representação única como si ui + (N si )ti , si , N si ∈ S ′ (veja que 1 ∈ S =⇒ 1 ∈ S ′ )
& &
e ti ∈ T . Como p e q nunca ultrapassam N nas representações, m = N p + q ≤ N (N − 1) + N − 1 < N 2 .
Agora podemos construir a sequência com as seguintes operações: (S0 , T0 ) → (S0 , T1 ) → (S1 , T1 ) → . . . →
(Si , Ti ) → (Si , Ti+1 ) → (Si+1 , Ti+1 ) → . . ., concluindo a demonstração.

PROBLEMA 14
Encontre todas as funções f dos reais positivos nos reais positivos tais que, para a, b, c reais positivos distintos
quaisquer, a, b, c podem ser lados de um triângulo se, e somente se, f (a), f (b), f (c) podem ser lados de um
triângulo.

Solução
Seja a um real positivo qualquer. Se para algum x > 1 temos f (xa) > f (a) ou f ((x + 1)a) > f (a) então,
sabendo que a, xa, (x + 1)a não são lados de triângulo, f (a) ≤ |f ((x + 1)a) − f (xa)|. Tomando b tal que
xa, (x + 1)a, b são lados de um triângulo, ou seja, a = (x + 1)a − xa < b < (x + 1)a + xa = (2x + 1)a, temos
f (b) > |f ((x + 1)a) − f (xa)| ≥ f (a) =⇒ f (a) < f (b) para todo b no intervalo ]a, (2x + 1)a[.
Seja n > 2 um natural. Suponha que a condição de cima não acontece para x = n e para x = n + 12 ,
ou seja, f (na), f ((n + 1)a) < f (a) e f ((n + 12 )a), f ((n + 23 )a) < f (a). Como esses trios não são lados de
triângulo o maior comprimento é maior que ou igual à soma dos outros dois, logo f (a) ≥ f (na) + f ((n + 1)a) e
f (a) ≥ f ((n + 21 )a) + f ((n + 23 )a). Somando temos
!! " " !! " "
1 3
2f (a) ≥ f (na) + f n+ a + f ((n + 1)a) + f n+ a .
2 2

Por outro lado, a, na, (n + 21 )a e a, (n + 1)a, (n + 23 )a são lados de triângulo, de modo que f (a) < f (na) +
f ((n + 12 )a) e f (a) < f ((n + 1)a) + f ((n + 32 )a); somando obtemos
!! " " !! " "
1 3
2f (a) < f (na) + f n+ a + f ((n + 1)a) + f n+ a
2 2

gerando um absurdo.
Logo para todo n > 2 a condição é satisfeita para x = n ou x = n + 21 . Isso usado no argumento anterior
prova que a função f é crescente, já que para todo b > a > 0 existe x de uma das formas anteriores tal que
(2x + 1)a > b, e para b ∈ ]a, (2x + 1)a[ temos f (b) > f (a) > 0.
A sequência f ( n1 ) é monótona e limitada e portanto admite um limite L. Se L > 0 então para k grande
temos 2L > f ( 21k ) > f ( 2k+1
1 1
) > f ( 2k+2 ) > L, de modo que f ( 21k ), f ( 2k+1
1 1
), f ( 2k+2 ) formariam lados de triângulo,
1 1 1
enquanto 2k , 2k+1 , 2k+2 não formam. Então L = 0 e para ϵ pequeno temos f (ϵ) próximo de zero.
Agora vamos provar que f é contı́nua. Dado ϵ > 0 existe α > 0 tal que f (α) < ϵ e para 0 < |x − x0 | < α
temos que x, x0 , α são lados de triângulo |f (x) − f (x0 )| < f (α) < ϵ. Com isso, conseguimos fazer com que f (x)
fique arbitrariamente próximo de f (x0 ) para todo x próximo de x0 , o que mostra que f é contı́nua.
Como a, b, a + b não são lados de triângulo e a, b, a + b − ϵ são, temos f (a + b − ϵ) < f (a) + f (b) ≤ f (a + b) e
como f é contı́nua f (a + b) = f (a) + f (b). Como é uma equação de Cauchy e a função é crescente concluı́mos
que existe uma constante real positiva c tal que f (x) = x · c para todo x real positivo. É fácil observar que as
condições são satisfeitas para todo real positivo c.
PROBLEMA 15
Seja n ≥ 2. Defina
X = {(a1 , a2 , . . . , an ) | ak ∈ {0, 1, 2, . . . , k}, k = 1, 2, . . . , n}.
Para quaisquer dois elementos s = (s1 , s2 , . . . , sn ) e t = (t1 , t2 , . . . , tn ) de X, defina

s ∨ t = (max{s1 , t1 }, max{s2 , t2 }, . . . , max{sn , tn })


s ∧ t = (min{s1 , t1 }, min{s2 , t2 }, . . . , min{sn , tn }).

Encontre o maior valor de |A|, A ⊂ X e A ̸= X, tais que, para quaisquer s, t ∈ A, s ∨ t ∈ A e s ∧ t ∈ A.

Solução
Resposta: (n + 1)! − (n − 1)!.
Um exemplo que dá certo é obter A tirando todos os elementos de X com an = n e an−1 = 0; de fato, se
aplicarmos ∨ em dois elementos quaisquer de A teremos an < n e se aplicarmos ∧ em dois elementos quaisquer
de A teremos an−1 > 0. Há (n − 1)! elementos nessas condições, logo o maior valor de |A| é pelo menos
(n + 1)! − (n − 1)!.
Como é usual em Álgebra Linear, considere os vetores elementares xk = (0, 0, . . . , 0, k, 0, . . . , 0) em que a
única entrada não nula é a k-ésima, e ela é igual a k. Também chame os elementos que têm no máximo uma
entrada não nula de bacanas. Como

(a1 , . . . , an ) = (a1 , 0, . . . , 0) ∨ (0, a2 , . . . , 0) ∨ . . . ∨ (0, 0, . . . , an ),

é fácil de ver que se A contém todos os vetores bacanas então A contém X, o que implicaria A = X, absurdo.
Provaremos algo um pouco mais forte: se A tem |A| máximo e contém todos os vetores elementares então A
contém X. Basta então provar que todo vetor bacana está contido em A também. De fato, A contém o vetor
nulo (basta tomar dois vetores elementares e usar ∧). Se A não contém um vetor v cuja única entrada não nula
é ak na entrada k, então perdemos uma possibilidade para a k-ésima entrada de qualquer vetor de A (se usamos
k n
∧ com xk e algum vetor que tenha ak na entrada k obtemos v) e temos |A| ≤ k+1 (n + 1)! ≤ n+1 (n + 1)! =
(n + 1)! − n! ≤ (n + 1)! − (n − 1)!, absurdo.
Assim, A não contém algum dos vetores elementares xk . Tome B = {(a1 , . . . , an ) ∈ A | ak = k}. Então
existe j ̸= k tal que aj ̸= 0 para todo a ∈ B pois se houvesse para toda coordenada poderı́amos usar ∧ e obter
tudo zero exceto ak , que tem que ser k, já que todo elemento de B tem ak = k. Com isso, perdemos todos os
vetores com aj = 0 e ak = k, e obtemos

(n + 1)! (n + 1)!
≥ = (n − 1)!
(j + 1)(k + 1) n(n + 1)
vetores que não estão em B, e portanto não estão em A também. Com isso, |A| ≤ (n + 1)! − (n − 1)!.

PROBLEMA 16
O quadrilátero convexo ABCD é cı́clico e admite uma circunferência Γ que tangencia as semirretas AB, BC,
AD, DC em X, Y, Z, T , respectivamente, de modo que os pontos de tangência não pertencem aos lados (ou seja,
Γ é uma espécie de excı́rculo). Seja P a interseção das diagonais AC e BD. O cı́rculo Ω passa por A e B e é
tangente externamente a Γ em S. Prove que SP ⊥ ST .

Solução

C S

P
Y

A D Z
Primeiro ignore que ABCD é cı́clico por um momento, e considere Γ como cı́rculo de referência. Uma boa
figura sugere qye P , X e T são colineares. De fato, pensando projetivamente, isso é equivalente a provar que
a polar de P passa pelo polo de XT . A polar de P passa pela interseção das polares XZ de A e Y T de C,
e pela interseção das polares XY de B e ZT de D. Mas pelo teorema de Pascal em XXY T T Z, os pontos
correspondentes a XX ∩ ZZ, XY ∩ T Z e Y T ∩ XZ são colineares, que é o que querı́amos provar. Analogamente
P está em Y Z, e P é a interseção de XT e Y Z.
Aplique agora uma inversão ρ de polo P que fixa Γ. Temos ρ(T ) = X, ρ(Y ) = Z. Sendo ρ(Q) = Q′ para
todo ponto Q, a reta ABX vai para o cı́rculo A′ B ′ T P . Além disso, ∠P A′ B ′ = ∠P BA e, sendo ABCD cı́clico,
∠P A′ B ′ = ∠P CD, e portanto A′ B ′ ∥ CD. Agora, AB é tangente a Γ em X, o que quer dizer que o cı́rculo
A′ B ′ T P é tangente a Γ em T . Com isso, sendo A′ B ′ ∥ CD, e CD tangente a Γ em T , e A′ B ′ corda, T A′ = T B ′ .

B′

O T′
T
B

C S

P
A D

A

Logo, sendo U tal que T U é diâmetro de Γ, o circuncı́rculo de U A′ B ′ é tangente internamente a Γ em U .


Desinvertendo, obtemos um cı́rculo que passa por A e B e é tangente externamente a Γ em U ′ , ou seja, Ω. Logo
S = U ′ , e ∠P ST = ∠P T ′ S ′ = ∠P XU = ∠T XU = 90◦ .

Você também pode gostar