Atividade de Leitura 002 - Ana Clara Pontes Branco

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Um Convite à Filosofia de Marilena de Souza

Chauí:

Comentário sobre a palestra.

Ana Clara Pontes Branco


Professor Dr.: Silvio Rosa Filho
Introdução à História da Filosofia

Setembro de 2021
“Um Convite à Filosofia”, assim foi intitulada a palestra ministrada pela
escritora e filósofa, Profa. Dra. Marilena de Souza Chauí, no ano de 1999,
tendo como foco, os alunos recém chegados no curso de filosofia, na
Universidade de São Paulo (USP). Sua aula inaugural, traz como temática
central, a discussão sobre a importância da formação do pensamento, para a
realização da análise estrutural de textos. Em outros termos, através de um
discurso repleto de exemplificações, e comparações com a atualidade, a
filósofa foi capaz de transmitir o papel fundamental, que a análise estrutural
contém, para o departamento de filosofia, e, me arisco a dizer, para outras
tantas áreas, que fundamentam a formação e o crescimento do pensamento.

Expondo primeiramente os passos argumentativos, que conduziram até


a ideia central do discurso, pode-se iniciar destacando a questão que teria sido
indagada nos primórdios do desenvolvimento da filosofia, e vem sendo
formulada e respondida de formas variáveis, tal questão seria: “A filosofia pode
ser ensinada?”. Após abordar esse ponto, Marilena Chauí trata sobre as
diversas vertentes que a resposta para esse questionamento poderia levar.
Aludindo a princípio sobre a relação do mesmo com o idealismo alemão, em
que a resposta seria focada no lado da negação, ou seja, não, não se poderia
ensinar ou aprender filosofia, só se poderia ensinar ou aprender a filosofar.
Embora essa tenha sido a resposta perpetuada e cristalizada durante muitos
anos, ela não possui o mesmo sentido para todos, e outras visões acerca
dessa indagação foram surgindo.

Para alguns, a filosofia não teria objeto de estudo, seria apenas o


“pensar por pensar”, logo, se diz que não se pode ensinar filosofia, e sim,
apenas a filosofar. Já outros, no entanto, entendem que a filosofia possui uma
história, e seu objeto de estudo está em constante mudança, conforme os anos
se passam. Diante disso, se era pretendido ensinar a filosofar, não se saberia o
que ensinar. Portanto, se ensinaria então, uma maneira de pensar, e não os
conteúdos propriamente associados a filosofia. Ainda há outros que não
concordam com nenhuma das visões anteriores, e defendem que a filosofia
não possui território próprio e exclusivo, isso, porém, não significaria que essa
não tem objeto, mas sim, seria a busca da origem e do sentindo do existente.
Logo, quando se ensina a filosofar, se estaria realizando um movimento dentro
desse território, ocupado não somente pela filosofia, como também pela própria
vida cotidiana, isso significa que o objeto dessa área, não seria um termo que
marcaria ou limitaria seu território.

Sendo assim, a própria filosofia seria o acolhimento de todas essas


multiplicidades e perspectivas, acerca dos diferentes meios pelos quais essa
área pode ser ensinada. É a partir desse momento, que Marilena Chauí aborda
sobre a História da Filosofia, tendo como foco primeiramente, esse
departamento dentro da Universidade de São Paulo, expondo que o mesmo,
não entende esse campo, como algo que deve seguir uma sequência
cronológica de doutrinas e sistemas, e por isso, não haveria problema em
realizar o debate de diferentes autores, em diferentes períodos da história,
afinal, a própria linha histórica da filosofia, não é panorâmica. Ou seja, se
trataria de uma área com estudos monográficos, se dedicando a um pensador,
a um período, ou ainda a um assunto, em específico.

É a partir desse comentário, que a filósofa começa a sua abordagem


acerca de outro passo argumentativo, que visa demonstrar a importância do
papel do corpo docente, dentro da formação de pensamento dos estudantes.
Marilena Chauí apresenta como um dos principais objetivos buscados pelos
professores, a realização da transição de um pensamento focado
sistematicamente, acomodado nos meios de comunicação em massa, e ao
senso comum, para algo que seria de fato baseado em pensamentos tidos por
filósofos, cientistas, artistas, entre outras figuras. Melhor dizendo, um dos
principais focos do corpo docente, seria justamente o descolamento dos
estudantes de seu cotidiano, fundado pelo mercado e pelos meios midiáticos, e
fazer com que os próprios desenvolvam sua formação de pensamento, que, em
minha perspectiva, é um aspecto fundamental para a análise estrutural de
texto.

Outra vertente argumentativa, teria sido a respeito das três versões


hegemônicas da história do departamento de filosofia da USP, sendo a
primeira etapa, conhecida como heroica, na qual se teria possuído acesso ao
verdadeiro trabalho filosófico, justamente porque aprendemos a fazer a análise
estrutural de texto. Em outras palavras, essa etapa aborda que o conhecimento
rigoroso da filosofia, se faz pela análise estrutural, que seria, por sua vez,
voltada para a perspectiva obtida principalmente pelo pensador Victor
Goldschmidt, que trouxe em seu ensaio intitulado como "Tempo histórico e
tempo lógico na interpretação dos sistemas filosóficos", a ideia da importância
sobre a união lógica entre a doutrina e o método, no âmbito das obras
filosóficas, com a admissão de um certo tempo lógico. Logo, essa versão
estaria associada à percepção e a compreensão de uma doutrina filosófica,
como um sistema que possui uma arquitetura interna, responsável por
acompanhar os movimentos da obra estudada, assim como suas articulações,
permanências, ou alterações de conceitos.

Partindo para as outras duas etapas, tem-se a versão política que,


coordenada por Paulo Arantes, teve a busca pela exibição da paixão francesa
medieval, através da análise de texto, e pela ideia de se ver a filosofia como
um discurso, afinal, para o filósofo, esse departamento seria a última expressão
da ideologia francesa. Paulo Arantes ainda buscou demonstrar que almejava
que essa área pudesse gozar da mesma autonomia que as artes possuíam,
principalmente a literatura. Pois, nessa versão, a arte só se tornaria moderna a
partir do momento em que é vista como autônoma. Já na versão autocrítica,
compreendida como a etapa de Oswaldo Porchat, haveria a consideração de
um equívoco no departamento, ao ter dado à História da Filosofia o lugar e a
ênfase que ele deu, pois tal área como nós a fazemos, com leituras e análises
internas de textos, se torna um obstáculo ao esforço pessoal dos estudantes,
para formular problemas, e encontrar argumentos para a solucioná-los.

Abordando agora sobre um dos principais argumentos dado pela


autora, focado em uma concepção mais pedagógica, Marilena Chauí afirma
que devido aos meios de comunicação, que a sociedade capitalista passou a
consumir desenfreadamente, os jovens acabaram por perder o acesso a uma
das formas primordiais de expressão, a linguagem, vista como um meio pelo
qual ocorre a transmissão do sentido, de tornar aquilo que está ausente,
presente. Logo, a importância da análise estrutural sobre os textos, tem como
objetivo, garantir o acesso dos estudantes ao mundo da expressão, ou seja, ao
espaço da linguagem. Acredito que, sem dúvidas, esse seria um dos principais
assuntos que sustentam a análise estrutural.
Para exemplificar melhor o discurso da autora a respeito da linguagem,
vejo a importância de citar a obra desenvolvida pela própria Marilena Chauí,
intitulada como Convite à Filosofia, em que, além de abordar sobre uma
introdução ao universo que engloba a filosofia , a autora dedica o quinto capítulo
de seu livro, especialmente para tratar da linguagem e, através de duas linhas
principais de pensamento, sendo elas, a platônica e a aristotélica, ela foi capaz
de traçar e demonstrar as concepções para a origem da linguagem, e a sua
relevância para as relações entre os indivíduos. Tal pensamento fica explícito
na seguinte frase da obra: “A linguagem é, assim, a forma propriamente
humana da comunicação, da relação com o mundo e com os outros, da vida
social e política, do pensamento e das artes.” (CHAUÍ, 1994, pg. 173).
Passando esse entendimento para o âmbito filosófico e pedagógico, a
linguagem tornaria os docentes aptos para acolher as inquietações intelectuais,
daqueles que procuram a expressão de seu próprio pensamento, ou de outra
figura.

Já no encerramento de sua palestra, a professora foca na


temporalidade encontrada no interior de uma análise estrutural, sendo assim,
ela destaca a diferença temporal existente entre o leitor e o filósofo que está
sendo estudado, ressaltando que, o primeiro contato do legente com a obra,
seria de extrema importância, pois, seria um encontro ingênuo, mas que de fato
provocaria indagações. Pouco a pouco, esse estado de admiração vai se
tornando então uma vigilância, visto que, aquelas questões que são impostas
pelo filósofo, já não são capazes de confundir mais o seu leitor. Todavia,
quando o texto começa a tomar tal proporção, acaba por causar novas
questões para seu leitor, o que pode levar o mesmo à escrita de seu próprio
texto, buscando articular com palavras que o aproxime e o distancie dos
pensamentos do filósofo estudado, simultaneamente, realizando assim, o
desenvolvimento de um texto distinto que, todavia, possui sua certa relação
com o aquele que foi lido.

Após abordar a temática central que a filósofa propôs ao longo de sua


palestra, e os argumentos responsáveis por nos guiarem até tal ideia, vale
ressaltar que, ao longo de seu discurso, foi possível obter uma compreensão
acerca da formação de pensamento, que a realização da análise estrutural
acaba exigindo. Tal afirmação se tornou explícita para mim, quando o conceito
de linguagem foi dito pela autora. Marilena Chauí transmitiu a influência que
este meio de comunicação tem, não somente para análise estrutural, como
também para as relações de um indivíduo. Vale ainda comentar que, em
diversas passagens de seu livro (Um Convite à Filosofia) é possível notar a
importância que a autora dá a formação do pensamento, principalmente dentro
de uma interpretação voltada para a realidade socioeconômica e política
brasileira, tal como pode ser observado na seguinte frase:

“Sabemos que os poderosos têm medo do pensamento, pois o poder


é mais forte se ninguém pensar, se todo mundo aceitar as coisas
como elas são, ou melhor, como nos dizem e nos fazem acreditar que
elas são. (CHAUÍ, 1994, pg. 38).

Ou seja, para a autora, a formação de pensamento e análise estrutural, tendo


como base figuras relevantes, seja no meio filosófico, científico, artístico, etc.
Seria de extrema importância para sabermos como lidar com a realidade em
que nos encontramos, e até mesmo saber como confrontá-la, não se deixando
cair então, no meio da alienação.

Partindo para minhas considerações finais acerca do itinerário desse


curso, além dos diversos autores, períodos e conceitos que foram abordados
ao longo do semestre, acredito que duas concepções foram primordiais para o
desenvolvimento das aulas, sendo a primeira, a análise estrutural de obras
que, resultou em uma mudança no interior de minha perspectiva, quanto à
leitura de textos, sejam eles de cunho filosófico ou não. Se tratando de uma
melhor compreensão acerca dessa interpretação, não poderia deixar de citar o
filósofo, Victor Goldschmidt que, através do seu entendimento, soube
demonstrar a importância, e a associação da análise interna ao tempo lógico.
Assim como é destacado pela própria Marilena Chauí, através dessa
interpretação, cria-se questionamentos, o que leva o indivíduo a desenvolver
sua formação de pensamento, elemento fundamental, principalmente para
compreender e até se contrapor sobre os meios midiáticos.

Outro assunto que também fundamentou nosso curso, teria sido o


problema que envolve o termo “autonomia”, especialmente quando se trata do
meio filosófico, tal obstáculo é divulgado principalmente pelo filósofo Bento
Prado Jr. que, através do seu ensaio intitulado “O Problema da Filosofia no
Brasil”, traz como temática central, a ideia de que não existe um conjunto de
obras que, componha de fato, alguma tradição autônoma do pensamento
filosófico brasileiro, mas sim, apenas obras separadas, sendo que, nesse
contexto, a autonomia é vista como uma exigência para o pensamento
filosófico, o que nos leva a não conseguir marcar o nascimento da filosofia no
Brasil. Bento Prado ainda destaca a visão de dois outros filósofos, João Cruz
Costa, que examina a filosofia brasileira, como sendo vítima do historicismo,
defendendo assim, que se pode ter uma história própria na filosofia brasileira. E
a perspectiva do filósofo Álvaro Vieira Pinto, o qual aborda sobre o
psicologismo, argumentando que podemos ter um pensamento próprio na
filosofia brasileira. Vale ressaltar aqui, que em ambos os exames, é recusado a
autonomia à filosofia, isso se deve principalmente devido ao pragmatismo
acumulado do processo colonial, ou ainda devido à prática desenvolvimentista.

Acredito que, ao longo do discurso feito por Marilena Chauí, é possível


estabelecer diversas ligações com o ensaio realizado por Bento Prado,
principalmente quando retornamos a questão da linguagem. Enquanto Chauí
traz essa expressão como sendo primordial para os jovens terem acesso ao
principal meio de comunicação, especialmente tendo em vista a atualidade, em
que o meio capitalista passou a tomar grandes proporções e prejudicar de fato
as relações entre os indivíduos. Bento Prado realiza algo similar, ao
estabelecer uma ligação, com a importância da análise estrutural, para se
saber como sair da linguagem universal, tal afirmação é feita na seguinte frase
de seu ensaio, já citado anteriormente:

[...] é preciso “descascar” as obras filosóficas para ler o seu


sentido verdadeiro. Por debaixo de sua linguagem
universalizante e de sua aparente intenção teórica é preciso
desenterrar a intenção prática imediata e a referência a uma situação
histórica precisa. (JÚNIOR, 2000, pg. 04)

Ou seja, assim como a filósofa, Bento Prado demonstra a importância que a


interpretação estrutural possui para se compreender de fato, o pensamento que
o filósofo estudado busca transmitir.
Por fim, vale destacar a frase que, não somente foi responsável por
demonstrar um dos principais pensamento do filósofo Bento Prado, como
também, foi responsável por trazer a essência de nossas aulas:  "A filosofia do
senso comum quer que pensemos como de fato pensamos. A questão da
filosofia é outra -por que pensamos assim? Mais precisamente -por que já não
podemos pensar exatamente assim?". Tal frase nos leva a uma reflexão
quando lida em voz alta, e ecoada em nosso interno. Para o escritor, o que
importa não é tanto o “porquê” pensamos, mas sim o “porquê” de assim
pensarmos. Para ele, não importaria até então o que fizeram com o seu
pensamento, mas sim, o que você mesmo faz com o que fizeram com seu
pensamento.

Por fim, após abordar essa grande questão e, tendo agora como base,
a palestra ministrada por Marilena Chauí, proponho a seguinte reformulação da
frase de Bento Prado:  "Os meios de comunicação em massa quer que
pensemos como de fato pensamos. A questão da formação de pensamento é
outra -por que pensamos assim? Mais precisamente -por que já não podemos
pensar exatamente assim?". Logo, acredito que através da palestra, a filósofa
não somente demonstrou a importância que uma das formas mais utilizadas
para a expressão possui, dentro da análise estrutural de um certo autor
estudado, como também, o papel fundamental que a formação de pensamento
obteve e que, em nossa atualidade, possui uma responsabilidade significativa
no cotidiano da sociedade brasileira.
REFERÊNCIAS

Convite à Filosofia. Direção: Bruno Rosa. São Paulo: [s. n.], 1999. Disponível
em: https://www.youtube.com/watch?v=zReUWviuaFw&t=5s. Acesso em: 5
ago. 2021.
CHAUÍ, Marilena de Souza. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 2000.
Disponível em:
https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/533894/mod_resource/content/1/
ENP_155/Referencias/Convitea-Filosofia.pdf. Acesso em: 1 set. 2021.
PRADO JÚNIOR, Bento. Alguns Ensaios: Filosofia, Literatura e Psicanálise. 2ª
ed. São Paulo, Paz e Terra, 200, p. 153-171.
GOLDSCHMIDT, Victor. “Tempo histórico e tempo lógico na interpretação dos
sistemas filosóficos”: A religião de Platão. São Paulo: Difusão Européia do
Livro, 1963, pp. 139-147.

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