Escravidao Mercado Interno e Exportacoes

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS


DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA ECONÔMICA

MARCELO LOYOLA DE ANDRADE

Escravidão, mercado interno e exportações na


economia de Ilhéus, 1850-1888

Versão corrigida

São Paulo
2019
MARCELO LOYOLA DE ANDRADE

Escravidão, mercado interno e exportações na


economia de Ilhéus, 1850-1888

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação


em História Econômica do Departamento de
História da Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas da Universidade de São Paulo,
como requisito parcial para a obtenção do título
de Doutor em História.

Área de Concentração: História Econômica


Orientador: Prof. Dr. Horacio Gutiérrez

Versão corrigida

São Paulo
2019
Aos meus pais, José Furtado de Andrade e Dalva Loiola
de Andrade
AGRADECIMENTOS

Durante a realização desta pesquisa contei com a colaboração de diversas pessoas e


instituições, às quais quero agradecer pelas diferentes contribuições, todas importantes para o
desenvolvimento e conclusão da tese.
Agradeço ao Programa de Pós-Graduação em História Econômica da Universidade de
São Paulo (FFLCH-USP) que ofereceu condições ideais ao desenvolvimento da pesquisa.
Agradeço ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Pesquisa (CNPq), pelo
apoio financeiro, essencial para a realização da pesquisa.
Agradeço ao professor Dr. Horacio Gutiérrez, que foi o meu orientador. As suas
arguições críticas feitas desde o projeto de pesquisa até a entrega do trabalho final foram
fundamentais durante todo o processo de desenvolvimento da tese. Ademais, contei com sua
paciência e auxílio com o uso do SPSS, programa computacional de processamento de dados,
que ele me ensinou a utilizar. Essa ferramenta permitiu obter ganhos substanciais no
cruzamento das informações dos inventários de Ilhéus, sendo muito importante para os
resultados alcançados na pesquisa. Espero que em alguma medida essa tese retribua suas
contribuições, os erros e imperfeições que possam constar no trabalho são, obviamente,
responsabilidades minhas.
Outrossim, durante os eventos realizados no Centro de Estudos de Demografia
Histórica da América Latina (CEDHAL-USP) pude contar com as suas intervenções e de
outros professores em vários assuntos, o que contribuiu para ampliar o meu conhecimento da
historiografia e metodologias de pesquisa. Agradeço aos funcionários deste centro pela
atenção, respeito e carinho que sempre me ofereceram, agradeço aos estudantes de pós-
graduação, professores e demais pesquisadores deste centro, onde encontrei um ambiente
acadêmico saudável e profícuo, muito importante na minha formação.
Agradeço aos professores Dr. José Flávio Motta e Dra. Luciana Suarez Lopes, que
participaram do exame de qualificação e ofereceram críticas e sugestões valiosas para a tese.
Agradeço aos professores que participaram da defesa, Dra, Enidelce Bertin, Dr. Marcelo
Henrique Dias e Dra. Luciana Suarez Lopes, pela leitura atenta, pelas críticas e comentários
importantes sobre o trabalho final.
Agradeço aos amigos de pós-graduação que convivi ao longo da trajetória de pesquisa.
Breno Aparecido Servidone Moreno e Fernando Antônio Alves da Costa se tornaram
especiais, colaboraram com críticas e sugestões desde o mestrado. As discussões realizadas
em nosso grupo de estudo foram importantes para melhorar a minha compreensão sobre
muitas questões abordadas na tese. O Breno forneceu seu Banco de Dados e me ajudou nas
instruções de uso, além de auxiliar nas dúvidas que surgiram durante a transcrição dos
inventários post mortem de Ilhéus.
Agradeço ao Arquivo Público do Estado da Bahia (APEB) e a seus funcionários, onde
sempre fui recebido com atenção e respeito por todos. Durante as visitas ao acervo contei com
a colaboração especial de Cícero Neto, que foi estagiário da instituição e me ajudou na busca
pelos inventários de Ilhéus, se tornando amigo, agradeço a sua colaboração na coleta de
fotografias e na transcrição de alguns documentos.
Agradeço aos primos Rosilene Catarino e Armando Cabrera, que me receberam várias
vezes em Salvador, oferecendo hospedagem confortável em sua casa durante as minhas
estadias na cidade para coleta de fontes primárias no APEB.
Agradeço aos meus pais José Furtado de Andrade e Dalva Loiola de Andrade, pelo
apoio aos meus estudos. A colaboração deles durante a minha permanência em São Paulo foi
muito importante para que eu pudesse desenvolver a pesquisa e concluir a tese. Agradeço a
minha irmã Milena Loyola de Andrade, pela leitura dos capítulos e correção de erros de
ortografia. Agradeço a Marcele, minha filha, que acompanhou de perto os últimos anos de
transcrição de documentos, cálculos e redação da tese, oferecendo apoio e compreensão nas
horas de angústia. Minha irmã Manuela também foi companheira nesse processo, oferecendo
ajuda e compreensão nas horas difíceis. De modo geral, direta ou indiretamente, toda minha
família colaborou para que eu pudesse realizar esse trabalho, minha mãe foi fundamental
nessa trajetória. Espero que essa tese seja a retribuição maior pela contribuição de todos.
RESUMO

Esta pesquisa insere-se no campo de estudo da História econômica, na vertente


relacionada ao trabalho escravo e o objetivo principal é analisar a escravidão, o mercado
interno e as exportações na economia de Ilhéus entre 1850 e 1888. Esta comarca, localizada
no sul da Bahia, se tornou uma das principais áreas produtoras de cacau do Brasil no século
XX e pretendemos investigar as origens deste processo, tentando entender as características
dos produtores e não produtores de cacau, como a composição da riqueza, a estrutura da posse
de escravos e o perfil demográfico da população escravizada. Outros objetivos consistem em
analisar o mercado interno e as exportações para conhecermos as peculiaridades desta
economia, avaliando, entre outras questões, as atividades de subsistência e exportação, a
circulação de mercadorias, o sistema de crédito, o acesso a terras e a presença do trabalho
escravo. Para alcançarmos os objetivos propostos utilizamos as seguintes fontes documentais:
345 inventários post-mortem, Livros de cobrança de impostos da Câmara Municipal, Livro de
classificação dos escravos para libertação pelo fundo de emancipação, Falas e Relatórios de
presidentes de província, Recenseamento Geral do Império do Brasil de 1872 e relatos de
viajantes estrangeiros. Ao compulsarmos os informes desta documentação pretendemos
apresentar algumas conclusões sobre as particularidades da escravidão e da economia de
Ilhéus no período assinalado e inserir o estudo entre as pesquisas históricas desenvolvidas
recentemente.

Palavras-chave: Ilhéus, escravidão, economia, cacau.


ABSTRACT

This research is inserted in the field of economic history study, focused on slave labor.
The main goal is to analyze slavery, the domestic market and exports in Ilhéus economy
between 1850 and 1888. This region is located in the south of Bahia state and became one of
the main cocoa producing areas of Brazil in the twentieth century. We investigate the origins
of this process assessing the characteristics of cocoa producers and non-producers, such as
wealth composition, structure of slaveholding and the demographic profile of the enslaved
population. Other goals consist in the domestic market and exports analysis to comprehend
the peculiarities of this economy, appraising, inter alia, subsistence and export activities,
circulation of goods, credit system, access to land and the presence of labor slave. To achieve
the proposed objectives, we use the following sources: 345 post-mortem inventories, city
council tax collection books, classification slaves for liberation by the emancipation fund,
Provincial Speeches and Reports, 1872 Brazil Empire’s Census and reports from foreign
travelers. By compiling the reports of such collection, we intend to present some conclusions
about the particularities of slavery and the economy of Ilhéus in the period indicated and to
insert the study among the historical researches recently developed.

Keywords: Ilhéus, slavery, economy, cocoa.


LISTA DE FIGURAS, QUADROS, GRÁFICOS E TABELAS

Figura 1.1 - Mapa do sul da comarca de Ilhéus, 1800...........................................................................36

Quadro 2.1 - Exportações do município de Ilhéus, 1870-1888.............................................................87


Quadro 3.1 - Quadro de ocupações dos inventariados. Ilhéus, 1850-1888.........................................102

Gráfico 1.1 - Gado vacum abatido. Ilhéus, 1864-1888.........................................................................52


Gráfico 1.2 - Gado suíno abatido. Ilhéus, 1872-1885............................................................................55

Gráfico 2.1 - Exportações de cacau (em arrobas). Ilhéus, 1871-1885...................................................66


Gráfico 2.2 - Exportações de café (em arrobas). Ilhéus, 1871-1885.....................................................68
Gráfico 2.3 - Exportações de cacau (em arrobas). Bahia. 1872-1876...................................................73
Gráfico 2.4 - Exportações de cachaça (em litros). Ilhéus, 1870-1878...................................................76
Gráfico 2.5 - Exportações de cachaça (em litros). Bahia, 1872-1876...................................................77
Gráfico 2.6 - Exportações de madeira jacarandá (em paus). Ilhéus, 1870-1879...................................80
Gráfico 2.7 - Exportações de piaçava (em molhos). Ilhéus, 1879-1888................................................83
Gráfico 2.8 - Exportações de couros secos ou salgados (em unidades). Ilhéus, 1878-1888.................85

Gráfico 3.1 - Distribuição espacial dos inventariados. Ilhéus, 1850-1888............................................92


Gráfico 3.2 - Distribuição dos inventários por décadas segundo a presença de escravos.
Ilhéus, 1850-1888...................................................................................................................................94
Gráfico 3.3 - Distribuição dos inventários com presença de culturas. Ilhéus, 1850-1888..................113
Gráfico 3.4 - Distribuição dos cacaueiros segundo o estado da planta. Ilhéus, 1850-1888.................117
Gráfico 3.5 - Distribuição dos inventários com presença de terras. Ilhéus, 1850-1888......................124

Gráfico 5.1 - Distribuição das classificações dos escravos por anos. Ilhéus, 1874-1886....................176
Gráfico 5.2 - Distribuição dos principais ofícios dos escravos inventariados. Ilhéus, 1850-1888......197

Gráfico 6.1 - Distribuição dos inventários segundo a presença de imóveis. Ilhéus, 1850-1888.........204
Gráfico 6.2 - Distribuição dos inventários segundo a presença de bens móveis.
Ilhéus, 1850-1888.................................................................................................................................212
Gráfico 6.3 - Principais madeiras utilizadas na fabricação dos móveis de casas e sobrados.
Ilhéus, 1850-1888.................................................................................................................................219
Gráfico 6.4 - Distribuição dos inventários segundo a presença de animais. Ilhéus, 1850-1888.........222

Gráfico 7.1 - Distribuição dos inventários por décadas segundo a presença de dívidas ativas.
Ilhéus, 1850-1888.................................................................................................................................231
Gráfico 7.2 - Distribuição dos inventários por décadas segundo a presença de dívidas passivas.
Ilhéus, 1850-1888.................................................................................................................................240

Tabela 1.1 - Porcentagem da receita total das exportações dos principais produtos. Província da Bahia,
1853-1860..............................................................................................................................................39
Tabela 1.2 - População livre e escrava. Vilas do sul da Bahia, 1872....................................................41
Tabela 1.3 - Porcentagem da receita total das exportações dos principais produtos.
Província da Bahia, 1873-1877..............................................................................................................42
Tabela 1.4 - Principais fornecedores do gado vacum abatido. Ilhéus, 1864-1888................................53
Tabela 1.5 - Principais fornecedores do gado suíno abatido. Ilhéus, 1872-1885..................................56
Tabela 1.6 - Relação das madeiras exploradas. Ilhéus, 1863.................................................................59
Tabela 1.7 - Principais exploradores de madeiras. Ilhéus, 1863............................................................60

Tabela 2.1 - Principais exportadores de cacau (em arrobas). Ilhéus, 1871-1885..................................69


Tabela 2.2 - Principais exportadores de café (em arrobas). Ilhéus, 1871-1885.....................................72
Tabela 2.3 - Principais exportadores de cachaça (em litros). Ilhéus, 1870-1878..................................75
Tabela 2.4 - Principais exportadores de madeira jacarandá (em paus). Ilhéus, 1870-1879..................80
Tabela 2.5 - Principais exportadores de piaçava (em molhos). Ilhéus, 1879-1888...............................84
Tabela 2.6 - Principais exportadores de couros secos ou salgados. Ilhéus, 1878-1888.........................86

Tabela 3.1 - Distribuição dos bens inventariados por décadas (valores em réis).
Ilhéus, 1850-1888...................................................................................................................................96
Tabela 3.2 - Classificação das fortunas inventariadas. Ilhéus, 1850-1888............................................99
Tabela 3.3 - Distribuição das ocupações principais e secundárias dos inventariados.
Ilhéus, 1850-1888.................................................................................................................................104
Tabela 3.4 - Distribuição dos inventários segundo ocupação principal e montante da riqueza.
Ilhéus, 1850-1888.................................................................................................................................106
Tabela 3.5 - Distribuição dos inventariados por décadas segundo ocupação principal.
Ilhéus, 1850-1888.................................................................................................................................107
Tabela 3.6 - Distribuição dos inventariados por décadas segundo a porcentagem da soma da riqueza.
Ilhéus, 1850-1888.................................................................................................................................108
Tabela 3.7 - Distribuição dos inventariados por ocupação principal e posse de escravos.
Ilhéus, 1850-1888.................................................................................................................................109
Tabela 3.8 - Distribuição dos inventariados por décadas segundo a ocupação principal e posse de
escravos em porcentagem Ilhéus, 1850-1888.......................................................................................110
Tabela 3.9 - Distribuição das culturas nos inventários por décadas. Ilhéus, 1850-1888.....................116
Tabela 3.10 - Distribuição das plantações de cacau por faixas de tamanho das plantações.
Ilhéus, 1850-1888.................................................................................................................................118
Tabela 3.11 - Distribuição das plantações de cacau por décadas segunda faixas de tamanho das
plantações (FTP). Ilhéus, 1850-1888....................................................................................................119
Tabela 3.12 - Distribuição dos inventariados segunda a presença de terras e ocupação principal.
Ilhéus, 1850-1888.................................................................................................................................125
Tabela 3.13 - Distribuição dos inventários com terras por décadas segundo a ocupação principal dos
inventariados. Ilhéus, 1850-1888..........................................................................................................126
Tabela 3.14 - Distribuição dos registros de terras segundo o modo de aquisição.
Ilhéus, 1850-1888.................................................................................................................................127

Tabela 4.1 - Distribuição dos escravistas inventariados por faixas de tamanho da posse de escravos
(FTP). Ilhéus, 1850-1888......................................................................................................................134
Tabela 4.2 - Distribuição dos escravos segundo a ocupação principal dos escravistas.
Ilhéus, 1850-1888.................................................................................................................................136
Tabela 4.3 - Distribuição dos escravistas inventariados por faixas de tamanho da posse de escravos
(FTP) e ocupação principal. Ilhéus, 1850-1888....................................................................................137
Tabela 4.4 - Produtores de cacau segundo a posse de escravos. Ilhéus, 1850-1869...........................138
Tabela 4.5 - Produtores de cacau segundo a posse de escravos. Ilhéus, 1870-1879...........................139
Tabela 4.6 - Produtores de cacau segundo a posse de escravos. Ilhéus, 1880-1888...........................140
Tabela 4.7 - Relação dos maiores escravistas inventariados. Ilhéus, 1850-1888................................142
Tabela 4.8 - Distribuição dos escravistas do Livro de classificação por faixas de tamanho
da posse de escravos (FTP). Ilhéus, 1874-1886....................................................................................147
Tabela 4.9 - Relação dos maiores escravistas (20 ou +) do Livro de classificação dos escravos.
Ilhéus, 1874-1886.................................................................................................................................148
Tabela 4.10 - Distribuição dos escravos por décadas, segundo origem e sexo. Ilhéus, 1850-1888....154
Tabela 4.11 - Distribuição da população escrava por faixas etárias. Ilhéus, 1850-1888.....................155
Tabela 4.12 - Distribuição da população escrava por origem e faixas etárias. Ilhéus, 1850-1888......156
Tabela 4.13 - Distribuição da população escrava por origem e ocupação principal dos escravistas.
Ilhéus, 1850-1888.................................................................................................................................157
Tabela 4.14 - Preços dos escravos por faixas etárias. Ilhéus, 1850-1859............................................160
Tabela 4.15 - Preços médios dos escravos por faixas etárias e sexos. Ilhéus, 1850-1859...................161
Tabela 4.16 - Preços dos escravos por faixas etárias. Ilhéus, 1860-1869............................................163
Tabela 4.17 - Preços médios dos escravos por faixas etárias e sexos. Ilhéus, 1860-1869...................164
Tabela 4.18 - Preços dos escravos por faixas etárias. Ilhéus, 1870-1879............................................165
Tabela 4.19 - Preços médios dos escravos por faixas etárias e sexos. Ilhéus, 1870-1879...................166
Tabela 4.20 - Preços dos escravos por faixas etárias. Ilhéus, 1880-1888............................................166
Tabela 4.21 - Preços médios dos escravos por faixas etárias e sexos. Ilhéus, 1880-1888...................168

Tabela 5.1 - População escrava por faixas etárias. Ilhéus, 1874-1886................................................177


Tabela 5.2 - População escrava por sexos e faixas etárias. Ilhéus, 1874-1886....................................177
Tabela 5.3 - População escrava por sexo e aptidão para o trabalho. Ilhéus, 1874-1886.....................178
Tabela 5.4 - Profissão dos escravos de acordo com o sexo. Ilhéus, 1874-1886..................................179
Tabela 5.5 - População escrava por sexo e estado conjugal. Ilhéus, 1874-1886.................................180
Tabela 5.6 - Distribuição das escravas por estado conjugal e quantidade de filhos.
Ilhéus, 1874-1886.................................................................................................................................181
Tabela 5.7 - Escravas casadas segundo a condição social dos cônjuges e presença de filhos.
Ilhéus, 1874-1886.................................................................................................................................185
Tabela 5.8 - Escravas casadas com filhos menores escravos e ingênuos segundo a condição social do
cônjuge. Ilhéus, 1874-1886...................................................................................................................186
Tabela 5.9 - Distribuição das escravas segundo o estado conjugal e a presença de filhos menores
escravos e ingênuos. Ilhéus, 1874-1886...............................................................................................187
Tabela 5.10 - Distribuição das crianças escravas e ingênuas por faixas de tamanho da posse de
cativos. Ilhéus, 1874-1886...................................................................................................................188
Tabela 5.11 - População escrava segundo o sexo e a ocupação principal dos escravistas.
Ilhéus, 1850-1888.................................................................................................................................190

Tabela 6.1 - Distribuição dos registros de imóveis nos inventários. Ilhéus, 1850-1888.....................205
Tabela 6.2 - Distribuição dos registros de bens móveis nos inventários. Ilhéus, 1850-1888..............213
Tabela 6.3 - Porcentagem dos investimentos alocados em bens móveis por décadas.
Ilhéus, 1850-1888.................................................................................................................................214
Tabela 6.4 - Distribuição das canoas inventariadas. Ilhéus, 1850-1888..............................................216
Tabela 6.5 – Distribuição dos animais nos inventários. Ilhéus, 1850-1888........................................224

Tabela 7.1 - Dívidas ativas segundo a ocupação principal dos inventariados. Ilhéus, 1850-1859......232
Tabela 7.2 - Dívidas ativas segundo a ocupação principal dos inventariados. Ilhéus, 1860-1869......233
Tabela 7.3 - Dívidas ativas segundo a ocupação principal dos inventariados. Ilhéus, 1870-1879......235
Tabela 7.4 - Dívidas ativas segundo a ocupação principal dos inventariados. Ilhéus, 1880-1888......236
Tabela 7.5 - Dívidas passivas segundo a ocupação principal dos inventariados.
Ilhéus, 1850-1859.................................................................................................................................241
Tabela 7.6 - Dívidas passivas segundo a ocupação principal dos inventariados.
Ilhéus, 1860-1869.................................................................................................................................243
Tabela 7.7 - Dívidas passivas segundo a ocupação principal dos inventariados.
Ilhéus, 1870-1879.................................................................................................................................245
Tabela 7.8 - Dívidas passivas segundo a ocupação principal dos inventariados.
Ilhéus, 1880-1888.................................................................................................................................247
MOEDAS, PESOS E MEDIDAS

A unidade básica da moeda no Brasil imperial foi o real (réis no plural). A soma de um
réis era geralmente escrita Rs.$001. Somas maiores, como cem réis, Rs. $100, um mil-réis era
escrito Rs. 1$000. Um milhar de mil-réis equivalia a um conto de réis (ou simplesmente um
conto), escrito Rs. 1:000$000. Em nosso estudo utilizaremos as seguintes descrições dessas
moedas.

Um Réis = Rs. $001 ou 0,001


Cem Réis = Rs. $100 ou 0,100
Mil Réis = Rs. 1$000 ou 1,000
Um conto de Réis = Rs. 1.000$000 ou 1.000,000

Sobre pesos e medidas

1 Arroba = 14,746 quilogramas (Kg)


1 Canada (na Bahia) = 6,85 litros (Lt)
1 Braça = 2,2 metros
1 Tarefa = 30 braças por 30 braças
1 Légua = 6.600 metros
1 Palmo = 0,22 metro (22 centímetros)
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.......................................................................................................................16

CAPÍTULO I – A COMARCA DE ILHÉUS (1850-1888): TERRITÓRIO,


POPULAÇÕES E MERCADO INTERNO

1.1 - Introdução.........................................................................................................................31
1.2 - Território, populações e mudanças econômicas. Ilhéus, 1850-1888...............................34
1.3 - O mercado interno. Ilhéus, 1850-1888 ...........................................................................46
1.3.1 - As casas de negócios. Ilhéus, 1874-1888......................................................................47
1.3.2 - O gado vacum abatido. Ilhéus, 1864-1888....................................................................51
1.3.3 - O gado suíno abatido. Ilhéus, 1872-1885......................................................................55
1.3.4 - A exploração de madeiras. Ilhéus, 1863 .......................................................................57

CAPÍTULO II – EXPORTAÇÕES E POSSE DE ESCRAVOS. ILHÉUS, 1850-1888

2.1 - Introdução ........................................................................................................................63


2.2 - Exportações de cacau, café e posse de escravos. Ilhéus, 1871-1885...............................65
2.3 - Exportações de cachaça e posse de escravos. Ilhéus, 1870-1878.....................................74
2.4 - Exportações de jacarandá e posse de escravos. Ilhéus, 1870-1879..................................79
2.5 - Exportações de piaçava e posse de escravos. Ilhéus, 1879-1888.....................................81
2.6 - Exportações de couros e posse de escravos. Ilhéus, 1878-1888.......................................84

CAPÍTULO III – A COMPOSIÇÃO DA RIQUEZA NOS INVENTÁRIOS POST


MORTEM. ILHÉUS, 1850-1888

3.1 - Introdução.........................................................................................................................89
3.2 - Escravos e cacaueiros no conjunto dos bens inventariados..............................................91
3.3 - Os produtores de cacau e as hierarquias sociais nos inventários......................................99
3.4 - As plantações de cacau e outras culturas nos inventários...............................................113
3.5 - As terras nos inventários.................................................................................................123
CAPÍTULO IV – ESCRAVIDÃO NA ECONOMIA DE ILHÉUS, 1850-1888

4.1 - Introdução.......................................................................................................................131
4.2 - A estrutura da posse de escravos....................................................................................133
4.3 - Crioulos e africanos no trabalho escravo........................................................................152
4.4 - Os preços dos escravos...................................................................................................159

CAPÍTULO V – AS ESCRAVAS E SEUS FILHOS NA ECONOMIA DE ILHÉUS,


1850-1888

5.1 - Introdução.......................................................................................................................172
5.2 - A população escrava classificada para libertação. Ilhéus, 1874-1886............................174
5.3 - As escravas casadas e seus filhos. Ilhéus, 1874-1886....................................................182
5.4 - As escravas solteiras e seus filhos. Ilhéus, 1874-1886...................................................187
5.5 - Trabalhar e criar os filhos: as escravas nos inventários de Ilhéus, 1850-1888...............190

CAPÍTULO VI – O CACAU NO TEMPO DAS CANOAS, DOS CARROS DE BOI E


DO TRABALHO ESCRAVO. ILHÉUS, 1850-1888
6.1 - Introdução.......................................................................................................................201
6.2 - Os imóveis nos inventários.............................................................................................203
6.3 - Os bens móveis nos inventários......................................................................................211
6.4 - Os animais nos inventários.............................................................................................221

CAPÍTULO VII – CREDORES E DEVEDORES NA ECONOMIA DE ILHÉUS, 1850-


1888
7.1 - Introdução.......................................................................................................................229
7.2 - As dívidas ativas nos inventários....................................................................................231
7.3 - As dívidas passivas nos inventários................................................................................240

CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................................................251
FONTES E BIBLIOGRAFIA..............................................................................................257
APÊNDICE METODOLÓGICO........................................................................................277
ANEXOS................................................................................................................................285
16

INTRODUÇÃO

Meu senhor, nós queremos paz e não queremos guerra;


se meu Senhor também quiser a nossa paz há de ser
nesta conformidade, se quiser estar pelo que nós
quisermos [...]1

Esta pesquisa insere-se no campo de estudo da História Econômica, na vertente


relacionada ao tema do trabalho e o objetivo principal é analisar a escravidão, o mercado
interno e as exportações na economia de Ilhéus, comarca localizada no sul da Bahia, que se
tornou uma das principais áreas de cultivo de cacau do Brasil durante o século XX, onde foi
instalado no período colonial o Engenho Santana, conhecido na historiografia como o
engenho das revoltas2.
Por muito tempo este engenho serviu como principal entrada para o estudo da
escravidão na localidade, sendo uma das unidades açucareiras investigadas por Stuart
Schwartz para revelar os segredos internos da Bahia colonial, em estudo que virou marco na
historiografia3. A obra deste autor, publicada no Brasil em 1988, motivou novas pesquisas e
aos poucos surgiram pessoas interessadas em estudar a escravidão em Ilhéus, mas ainda
contamos com poucas pesquisas4.
A maioria dos estudiosos optou por analisar o século XX, período de esplendor da
economia cacaueira, com muitos trabalhos na área de literatura, abordando as relações sociais
e econômicas desenvolvidas na região, o que influenciou grandemente a história de Ilhéus e
provocou distanciamento dos estudiosos em relação aos períodos colonial e imperial5. Soma-
se a isso o fato de Ilhéus não ter se tornado uma zona típica de plantation açucareira, como
ocorreu com o recôncavo baiano.
A nossa proposta nessa tese é analisar a segunda metade do século XIX tentando
entender as relações escravistas que se desenvolveram nesta localidade, bem como as
mudanças que ocorreram na economia baiana durante o crescimento do cultivo do cacau.

1
Tratado de paz proposto pelos escravos do Engenho Santana. In: SCHWARTZ, Stuart B. Escravos, roceiros e
rebeldes. Tradução Jussara Simões. Bauru – SP: EDUSC, 2001. p. 119. (Atualizamos a grafia para o português
atual de todos os documentos citados na tese)
2
Sobre as revoltas escravas do Engenho Santana ver, entre outros, REIS, João José. Resistência escrava em
Ilhéus: um documento inédito. Anais do Arquivo público do Estado da Bahia. v. 44, p. 285-297, 1979;
SCHWARTZ, Stuart B. Escravos, roceiros e rebeldes. Tradução Jussara Simões. Bauru – SP: EDUSC, 2001.
3
SCHWARTZ, Stuart B. Segredos internos: engenhos e escravos na sociedade colonial, 1550-1835. Tradução
Laura Teixeira Motta. São Paulo, Companhia das Letras, 1988.
4
Algumas delas serão discutidas nas próximas páginas.
5
Sobre a influência da literatura na história de Ilhéus ver discussão na obra de MAHONY, Mary Ann. The
World caca made: Society, politics and history in Southern Bahia, Brazil, 1822-1889. Ph. D. dissertation, Yale
University, 1996.
17

Nesse contexto, de expansão do capitalismo industrial, a demanda por matérias primas


produzida na América aumentou e em Ilhéus o cultivo do cacau se destacou entre as culturas
de exportação, devido às condições naturais favoráveis à planta e à paulatina valorização do
produto no exterior, onde era utilizado na fabricação do chocolate.
A escolha por Ilhéus como objeto de estudo decorreu do fato desse contexto ainda ter
sido pouco explorado pela historiografia e devido a esta localidade já ter sido investigada em
nossa pesquisa de mestrado, quando tratamos das alforrias, assim, essa tese dá continuidade a
esse trabalho6.
Durante a segunda metade do século XIX a economia de Ilhéus se desenvolveu e as
relações escravistas se modificaram junto com as transformações políticas e socioeconômicas
que ocorreram na Bahia e no Brasil e essa temática merece aprofundamentos. Apesar da
existência de estudos abordando o tema não conhecemos todas as características dos
produtores de cacau, como a estrutura da posse de escravos, composição da riqueza, o perfil
demográfico da população cativa, dentre outros informes que pretendemos abordar na tese.
Desse modo, a pesquisa justifica-se pelas amplas possibilidades que o campo de
estudo acerca da escravidão em Ilhéus e no sul da Bahia apresenta. É importante ressaltar que
os primeiros trabalhos específicos sobre a história de Ilhéus começaram a surgir após a
abolição, quando o cacau já respondia não só pela quase totalidade das receitas das áreas em
torno da vila, como também pela primazia nas exportações do Estado da Bahia.
Nesse contexto, os coronéis do cacau, que também controlavam a política local,
influenciaram significativamente a construção na História do mito dos desbravadores,
ressaltando a bravura de alguns homens que a partir dos seus esforços elevaram o município a
um lugar de destaque no cenário nacional7. O resultado disso é que o período colonial e
imperial, assim como o tema da escravidão, tem sido pouco explorado8.
O primeiro historiador que se propôs a realizar um estudo com certo rigor
metodológico e voltado para a capitania e comarca de Ilhéus foi João da Silva Campos.
Incumbido por Eusínio Lavigne – intendente da cidade na década de 1930 – de escrever a
“história de Ilhéus”, o autor consultou ampla documentação, sobretudo relatórios de
autoridades clericais e seculares e memoriais de viajantes. Apesar da riqueza de informações
6
ANDRADE, Marcelo Loyola de. Nos labirintos da liberdade. Das alforrias na lavoura cacaueira (Ilhéus-BA,
1810-1850) à discussão historiográfica acerca das manumissões no Brasil do século XIX. Dissertação (Mestrado
em História) - FFLCH/USP, São Paulo, 2013.
7
Ver, entre outros, BARROS, Francisco Borges de. Memória sobre o município de Ilhéus. 3 ed. – Ilhéus, Ba:
Editus; Fundação cultural de Ilhéus, 2004; HEINE, Maria Luiza. Jorge Amado e os coronéis do cacau. Ilhéus-
Ba: Editus, 2004.
8
Ver discussão historiográfica em DIAS, Marcelo Henrique. A capitania de São Jorge dos Ilhéus: economia e
administração. In: DIAS e CARRARA (Org.), op. cit., p. 50-60.
18

que a obra apresenta, cobrindo longo período da história de Ilhéus, o tema da escravidão não
recebeu a devida atenção do autor. Adotando um formato próximo ao da crônica, ele procurou
selecionar das fontes os “fatos mais importantes”, obedecendo à ordem cronológica dos
acontecimentos9.
Não obstante a importância deste livro, nas décadas posteriores à sua primeira
publicação (1937) o foco dos estudos continuou no século XX, sendo que a partir dos anos
oitenta começaram a surgir estudiosos interessados nos períodos colonial e imperial. Entre os
que se dedicaram ao tema da escravidão destaca-se o brasilianista Stuart B. Schwartz
(1988)10. Interessado nas relações de produção nos engenhos baianos, Schwartz conclui que a
economia do açúcar não prosperou em Ilhéus, assim como em Porto Seguro e Espírito Santo,
em razão da contínua e eficaz resistência dos aimorés. No entanto, a sua obra, que se tornou
um clássico, abrange o período colonial, ficando de fora de suas investigações boa parte do
século XIX, sobretudo o período de expansão do cultivo de cacau, ou seja, a partir da década
de 1850.
Ademais, o engenho Santana, localizado em Ilhéus e focalizado pelo autor, era uma
unidade produtiva atípica naquele contexto. Além de ser administrado pelos jesuítas do
colégio de Santo Antão de Lisboa até a sua expulsão do Brasil, era uma propriedade agrícola
de grandes dimensões, chegando a possuir 182 cativos em 1752 e em torno de trezentos
quando da revolta dos escravos na primeira metade do século XIX11.
A resistência escrava no sul da Bahia também foi objeto de estudo de João José Reis,
em artigo publicado em 199612. O autor analisou o ato da devassa do quilombo do Oitizeiro
(1806), localizado nas matas próximas da vila de São Miguel da Barra do Rio de Contas,
vizinha de Ilhéus. Além de apontar os problemas da expedição, João J. Reis destaca a
existência de lavradores que acoitavam quilombolas, segundo o autor não por uma
solidariedade desinteressada, mas pelo desejo de utilizar a sua mão de obra 13. Valdinéia de
Jesus Sacramento também se dedicou ao estudo dos quilombos dessa região e ressaltou que o
Oitizeiro fazia parte de uma verdadeira confederação composta por outros quilombos e

9
CAMPOS, João da Silva. Crônicas da capitania de São Jorge dos Ilhéus. 3 ed – Ilhéus; Ba: Editus, 2006.
10
SCHWARTZ, Stuart B. Segredos Internos: engenhos e escravos na sociedade colonial, 1550-1835. Tradução
de Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, 1988.
11
Ibidem., p. 142-143.
12
REIS, João José. Escravos e coiteiros no Quilombo do Oitizeiro, Bahia, 1806. In: REIS, J.J.; GOMES, Flávio
dos Santos (Org.) Liberdade por um fio: História dos quilombos no Brasil. Cia das Letras, 1996.
13
Ibidem., p. 348.
19

mocambos espalhados naquela parte da costa, destacando a existência de uma rede extensa de
relações comerciais entre eles e a população local, incluindo escravos e libertos14.
Esses estudos, ao privilegiarem o tema da resistência escrava, acabaram apontando
outras questões importantes no entendimento da escravidão em Ilhéus, entre elas a da
utilização do trabalho escravo nas diferentes lavouras, que eles não analisaram. Mary Ann
Mahony foi a pesquisadora que mais se aprofundou nesse assunto15. Ao investigar diversas
fontes cartoriais e eclesiásticas, dentre outras, a autora ressaltou a importância do trabalho
escravo na cultura do cacau e destacou que a reprodução natural era estimulada por alguns
escravistas. O seu estudo avançou nessas investigações e contribuiu significativamente para
descortinar o mito dos “coronéis desbravadores”. Além de evidenciar que alguns deles eram
escravistas, ela identificou que, na luta contra os seus inimigos políticos na Primeira
República, eles procuraram negar suas origens escravistas, apropriando-se desse discurso para
acusar seus opositores de velhos coronéis escravocratas e conservadores16.
O trabalho de Mahony trouxe considerável contribuição para o entendimento da
escravidão em Ilhéus, seu estudo se tornou pioneiro nessa investigação e continua sendo
referência obrigatória para quem pretende estudar a escravidão no sul da Bahia. No entanto,
mesmo considerando que as fontes documentais que pretendemos analisar também foram
utilizadas por Mahony, o estudo sistemático dessas fontes e seu uso mais aprofundado
permitem examinar novas problemáticas e temas.
Ainda que a autora forneça informações a respeito de algumas fazendas e sua
população cativa, não contamos com dados sobre a composição demográfica das escravarias
(sexo, origem, idade) e nem econômicos (preços dos cativos, do cacau, da terra, entre outros).
A proibição do tráfico atlântico de africanos, em 185017, coincide com o período de
crescimento do cultivo do cacau em Ilhéus, o que coloca essas questões em relevo,
principalmente porque não sabemos como os donos de escravos desta localidade lidaram com
elas nas décadas seguintes de vigência da escravidão no Brasil.

14
SACRAMENTO, Valdinéia de Jesus. Mergulhando nos Mocambos do Borrachudo – Barra do Rio de Contas
(século XIX). Dissertação (Mestrado em Estudos Étnicos e Africanos) - CEAO/FFCH/UFBA, Salvador, 2008.
15
MAHONY, Mary Ann. The world cacao made: society, politics and history in Southern Bahia, Brasil 1822-
1889. Ph. D. dissertation, Yale University, 1996.
16
MAHONY, Mary Ann. Um passado para justificar o presente: memória coletiva, representação histórica e
dominação política na região cacaueira da Bahia. Tradução Ana Cláudia Cruz da Silva. In: Cadernos de Ciências
Humanas – Especiaria - Universidade Estadual de Santa Cruz. Ilhéus: Editus, v. 10, n. 18, p. 737-793, 2009.
17
BRASIL. Lei nº 581, de 4 de setembro de 1850. Estabelece medidas para a repressão do tráfico de africanos
neste império. In: Coleção das Leis do Império do Brazil. Disponível em:
<https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao/doimperio>. Acesso em: 24 mar. de 2018.
20

No que se refere aos bens dos escravistas, um tema importante, que não foi abordado
por Mahony, e que pretendemos tratar na tese, diz respeito ao conhecimento da composição
de seus patrimônios. Não sabemos, por exemplo, qual parcela estava comprometida com
escravos e cacau, nem se essa composição sofreu alterações durante a expansão do cultivo do
fruto.
Ainda no que diz respeito aos estudos recentes sobre o passado escravista de Ilhéus,
vale destacar o livro organizado por Marcelo Henrique Dias e Ângelo Alves Carrara - Um
Lugar na História: a capitania e comarca de Ilhéus antes do cacau.18 Mesmo não tratando
exclusivamente da escravidão, essa obra reúne textos que trouxeram consideráveis
contribuições para a história colonial e imperial de Ilhéus. O único artigo dedicado ao tema da
escravidão é o de Fernanda Amorim da Silva, que tratou das alforrias em Ilhéus entre 1710 e
1758.19 Esse assunto também foi abordado em nossa pesquisa de mestrado, porém num
período diferente, ou seja, entre 1810 e 185020. Além de quantificar e qualificar as alforrias e
os libertos, neste estudo também utilizamos inventários post-mortem, testamentos e outras
escrituras lançadas nos Livros de Notas como fontes complementares, o que nos permitiu
adentrar nas relações escravistas desenvolvidas na localidade na segunda metade do século
XIX21.
Afora o estudo já citado de Mary Ann Mahony, outros autores se dedicaram ao tema
da escravidão em Ilhéus do ponto de vista da sua história social. Ronaldo Lima da Cruz,
valendo-se, principalmente, de processos crimes, ações de liberdade e correspondência de
juízes, centrou análise nas tensões e conflitos entre senhores, escravos e a justiça local nos
anos finais da escravidão e no pós-abolição em Ilhéus (1880-1900)22. Alane Fraga do Carmo,
por sua vez, se dedicou ao estudo da escravidão numa colônia estrangeira, a colônia
Leopoldina, localizada ao sul da Bahia e que, segundo a autora, chegou a possuir mais de cem
escravos, utilizados na produção de café23. Victor Gonçalves dos Santos, utilizando fontes
eclesiástica e judiciária analisou os temas da alforria e família escrava em Ilhéus no século

18
DIAS, Marcelo Henrique; CARRARA, Ângelo Alves (Org.). Um lugar na História: a capitania e comarca de
Ilhéus antes do cacau. Ilhéus: Editus, 2007.
19
SILVA, Fernanda Amorim da. Cultivando a liberdade – Alforrias em Ilhéus (1710-1758). In: DIAS e
CARRARA (Org.), op. cit., p. 117-168.
20
ANDRADE, Marcelo Loyola. Op. cit.
21
Ibid., p. 184-197. (Apêndice)
22
CRUZ, Ronaldo Lima da. Conflitos e Tensões: conquistas de escravizados e libertos no Sul da Bahia, 1880-
1890. Dissertação (Mestrado em História) - FCHS/UNESP, Franca, 2012.
23
CARMO, Alane Fraga do. Colonização e escravidão na Bahia: A Colônia Leopoldina (1850-1888).
Dissertação (Mestrado em História) - FFCH/ UFBA, Salvador, 2010.
21

XIX, destacando o compadrio, as formas de libertação e os arranjos familiares constituídos


pelos escravos24.
Como podemos perceber pelos estudos brevemente discutidos, não existem pesquisas
voltadas para a análise dos aspectos econômicos e demográficos da escravidão em Ilhéus, que
serão os focos principais de nossa pesquisa. Para esta finalidade serão de muita importância os
estudos que trataram deste assunto em outras localidades. Assim, discutiremos a seguir
algumas obras históricas sobre a escravidão brasileira que, a nosso ver, são de muita
pertinência para os temas que pretendemos desenvolver na tese, bem como em relação à
metodologia e fontes que embasaram a pesquisa.
Os estudos acerca da composição do patrimônio com base em inventários post-mortem
não é algo novo entre os historiadores do Brasil. A obra de Alcântara Machado, Vida e morte
do bandeirante, lançada em 1929, é precursora nesse tipo de investigação, trazendo à tona o
conhecimento de diversos aspectos da vida material desses homens25. Posteriormente outros
pesquisadores investigaram longas séries de inventários post-mortem, como Zélia Cardoso de
Mello, por exemplo. Seu estudo, intitulado Metamorfoses da Riqueza se tornou referência no
assunto. A autora adotou procedimentos metodológicos de quantificação dos inventários
coletados com o objetivo de entender o processo de transformação social impulsionado pela
cafeicultura, sobretudo as mudanças nas formas de acumulação da riqueza em São Paulo
durante o período de 1845 até 189526.
O método de Zélia Cardoso consistiu na agregação de todos os bens de indivíduos
inventariados, excluídos aqueles com baixo nível de riqueza. A autora considerou os dados de
746 inventários e desagregou os patrimônios em uma variedade de 8 grupos de ativos:
imóveis, animais, escravos, utensílios e máquinas, valores mobiliários (ações e dinheiro),
plantações e dívidas, constatando que a expansão da cafeicultura paulista causou impacto nas
formas de acumulação da riqueza.

24
SANTOS, Victor Gonçalves dos. Escravos e senhores nas terras do cacau: alforrias e família escrava (São
Jorge dos Ilhéos, 1806-1888). Dissertação (Mestrado em História). FFCH-UFBA, 2014.
25
MACHADO, Alcântara. Vida e morte do bandeirante. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo,
2006. p. 30.
26
MELLO, Zélia Maria Cardoso de. Metamorfoses da Riqueza: São Paulo, 1845/1895. São Paulo: Hucitec,
1990. p. 26-29. Outros estudos analisando a composição da riqueza em São Paulo a partir de inventários post-
mortem apareceram posteriormente. Cf. SAMARA, Eni de Mesquita. A família na sociedade paulista do século
XIX (1800-1860). Tese (Doutorado em História) – FFLCH/USP, São Paulo, 1980; ARAÚJO, Maria Lucília
Viveiros. Os caminhos da riqueza dos paulistanos na Primeira Metade do Oitocentos. São Paulo: Hucitec:
Fapesp, 2006; MARCONDES, Renato Leite. A arte de acumular na economia cafeeira: Vale do Paraíba, século
XIX. Lorena: Editora Stiliano, 1998. LOPES, Luciana Suarez. Sob os olhos de São Sebastião. A cafeicultura e as
mutações da riqueza em Ribeirão Preto, 1849-1900. Tese (Doutorado em História) – FFLCH/USP, São Paulo,
2005.
22

Enquanto até a década de 1850 a ordem de importância dos ativos era escravos,
dívidas ativas e imóveis, pouco antes do final da escravidão, entre 1881/87, esta se alterou
bastante, sendo que imóveis, dívidas ativas e valores mobiliários (ações, apólices etc.)
passaram a ser os itens mais representativos da riqueza, já os escravos, que outrora eram
elemento central, desapareceu do topo dos componentes mais significativos, num processo
que a autora classificou com transição da riqueza cativa para a riqueza liberta27.
A maioria dos estudos pautados neste método concentra-se na região sudeste do
Brasil, sendo que outros estudiosos também analisaram as mudanças nas formas de
acumulação da riqueza durante a expansão cafeeira nesta região do Brasil28.
Para o caso da Bahia no século XIX, em particular o centro urbano de Salvador e suas
imediações, a temática da composição da riqueza, entre várias outras questões, foi abordada
por Kátia Maria de Queirós Mattoso, em estudo que se tornou clássico na historiografia. Com
base em 1.115 inventários post-mortem, subdivididos em dois grandes períodos, 1801-1850 e
1851-1889, a autora traçou como objetivo a caracterização dos bens dos indivíduos
inventariados na localidade29.
Neste estudo Kátia M. de Q. Mattoso evidenciou a pluralidade de possibilidades de
investimentos vivenciada pelos habitantes de Salvador. Dentre os 10 grupos de ativos
estabelecidos, ela destacou que bens imobiliários (35,64%), depósitos bancários (16,67%),
ações e apólices (12,43%) dívidas em ativo (16,07%) e escravos (7,24%) foram os mais
representativos da riqueza inventariada na localidade entre 1800 e 1889. Ademais, constatou
que a categoria com maior destaque em Salvador foi a dos grandes comerciantes. Eles
possuíam as maiores fortunas da cidade em ambos períodos contemplados. Para 1801-1850
eram 6,8% dos inventariados e detinham 23,5% da fortuna total, ao passo que os índices
correlatos para 1851-1889 foram de 11,2% e 35,4%, respectivamente30.
Outros pesquisadores também recorreram aos inventários post mortem e outras fontes
para estudar diferentes aspectos da escravidão e da economia em outras áreas da Bahia e do
Nordeste31. A quantidade de pesquisa é grande e não temos a pretensão de realizar uma

27
MELLO, op. cit., 63-104.
28
Sobre discussão historiográfica ver, entre outros, COSTA, Fernando Antônio Alves da. Em distantes
paragens: demografia, riqueza, escravidão e mercado em Santa Rita do Turvo na segunda metade do Oitocentos.
Tese (Doutorado em História) – FFLCH/USP, São Paulo, 2014 (Cap. I – O estudo da riqueza como instrumento
para a análise das formações sociais e econômicas do passado brasileiro)
29
MATTOSO, Kátia Maria de Queirós. Bahia, século XIX: uma província no Império. Rio de Janeiro: Editora
Nova Fronteira, 1992. p. 602-652.
30
Ibid., p. 631.
31
Para outras áreas do nordeste brasileiro ver, entre outros, VERSIANI, Flávio Rabelo e VERGOLINO, José
Raimundo Oliveira. Posse de Escravos e Estrutura da Riqueza no Agreste e no Sertão de Pernambuco: 1777-
1887. Estudos Econômicos. São Paulo: IPE/USP, v. 33, n. 2, p. 353-393, abr./jun., 2003.
23

discussão historiográfica exaustiva, comentaremos algumas obras que consultamos para a


realização do nosso estudo32.
Maria José de Souza Andrade se debruçou principalmente em inventários post mortem
para revelar as características da mão de obra escava em Salvador entre 1811 e 1888. Sua
obra, publicada em 1988, analisa as nuances relacionadas com a origem, ocupação e preços
dos escravos, segmentando-os em diferentes faixas etárias de acordo com os sexos. A autora
oferece um panorama amplo, detalhado e crítico dos cativos da capital baiana em diferentes
contextos socioeconômicos do século XIX, reconhecendo-os como importante força de
trabalho e mercadoria altamente comercializável33.
Maria de Fátima Novaes Pires também utilizou inventários post mortem, Livros de
Notas e outras fontes em seus estudo sobre tráfico interprovincial e alforrias em Caetité e Rio
de Contas (1860-1920). Embora o foco de suas análises sejam o comércio e alforrias de
escravos, a autora realizou estudo da riqueza segmentando o patrimônio dos inventariados em
diferentes tipos de bens para explicar as características da escravidão nas aludidas localidades.
Sobre essa questão a autora destacou a importância dos escravos, gado vacum, imóveis e
dívidas ativas no patrimônio das famílias inventariadas. Ademais, sua obra também analisa o
preço dos escravos traficados34.
Erivaldo Fagundes Neves realizou ampla discussão historiográfica sobre o cativeiro na
Bahia em seu estudo sobre a escravidão, pecuária e policultura no alto sertão da Bahia no
século XIX. O autor utilizou ampla série de inventários post mortem, Livros de Notas e outras
fontes para explicar diversos aspectos da escravidão na aludida região. Suas análises
mostraram as diferentes ocupações e origens dos escravos, bem como as famílias, o tráfico de
cativos e apontou alguns aspectos da população escrava nas diferentes fontes compulsadas35.
Wellington Castellucci Junior analisou o quotidiano de escravos e forros na Ilha de
Itaparica entre 1860-1888. Os inventários post mortem serviram como fontes complementares
em seu estudo, que se pauta, principalmente, em testamentos e processos crimes. As suas
análises demonstraram os arranjos de sobrevivência e os conflitos de escravos e forros na
localidade, sendo a pesca da baleia uma das atividades econômicas mais importante da Ilha na
época. Segundo o autor muitos cativos e libertos envolvidos nesta e em outras atividades
32
Para uma discussão historiográfica da escravidão na Bahia ver, entre outros, NEVES, Erivaldo Fagundes.
Escravidão, pecuária e policultura: alto sertão da Bahia, século XIX. Feira de Santana: UEFS Editora, 2012.
(Capítulo I – Historiografia da escravidão na pecuária, na policultura e alhures).
33
ANDRADE, Maria José de Souza Andrade. A mão de obra escrava em Salvador. São Paulo: Corrupio, 1988.
34
PIRES, Maria de Fátima Novaes. Fios da vida: tráfico interprovincial e alforrias nos Sertoins de Sima-BA
(1860-1920). São Paulo: Annablume, 2009. p. 131-132.
35
NEVES, Erivaldo Fagundes Neves. Escravidão, pecuária e policultura: alto sertão da Bahia, século XIX. Feira
de Santana: UEFS Editora, 2012.
24

(roças) conseguiam pecúlio para a compra da alforria, extraindo do animal a carne, óleo para
uso como argamassa, fabricação de azeite, dentre outras utilidades, além de servir para
exportação36.
Mônica Duarte Dantas estudou diversos aspectos das relações sociais na Comarca de
Itapicuru, norte da Bahia, no século XIX. Embora não aborde exclusivamente o tema da
escravidão a autora consultou ampla documentação cartorial, eclesiástica, judicial, dentre
outras, incluindo inventários post mortem, evidenciando as características dos moradores da
localidade, como riqueza, posse de escravos e as redes comerciais estabelecidas com Salvador
e outras províncias do Império durante a formação do arraial de canudos37.
Outro tema que pretendemos analisar na tese diz respeito à estrutura da posse de
escravos. Sobre esse assunto a historiografia conta com bom número de trabalhos, a maior
deles dedica-se à investigação do tema na região sudeste38.
Francisco Vidal Luna, com base nos documentos manuscritos conhecidos como
Maços de População, produzidos nos anos de 1777, 1804 e 1829, contempla vinte e cinco
localidades paulistas, analisando as características demográficas da população cativa (sexo,
idade, estado conjugal e origem) e relacionando-as com a variável tamanho do plantel39.
Ricardo Salles, por sua vez, com base em inventários post-mortem estudou diversos
aspectos econômicos e demográficos da escravidão em Vassouras, no Vale do Paraíba,
província do Rio de Janeiro, entre 1821-1880.40 O autor fragmentou as análises dos
inventários em períodos de quinze anos, ao longo do qual ocorreu a expansão do cultivo do
café na região, bem como o aumento da concentração da propriedade escrava. De acordo com
Salles, entre 1836 e 1865 os megas proprietários, que detinham a posse de pelo menos cem
cativos, representavam entre 9 e 11% dos donos de escravos, no entanto, durante esse período
passaram a possuir praticamente metade dos cativos de Vassouras, considerada o coração do
Império pelo autor.41

36
CASTELLUCCI JUNIIOR, Wellington. Pescadores e roceiros: escravos e forros em Itaparica na segunda
metade do século XIX, 1860-1888. São Paulo: Annablume: Fapesp; Salvador: Fapesb, 2008. p.184-187.
37
DANTAS, Monica Duarte. Fronteiras movediças: relações sociais na Bahia do Século XIX: (a comarca de
Itapicuru e a formação do arraial de Canudos). São Paulo: Aderaldo & Rothschild: Fapesp, 2007. p. 42 e 49.
38
Uma discussão historiográfica sobre a estrutura da posse de escravos no Brasil pode ser vista em MOTTA,
José Flávio. Corpos escravos, vontades livres: posse de cativos e família escrava em Bananal (1801-1829). São
Paulo: FAPESP: Annablume, 1999. (Capítulo II – Historiografia e estrutura da posse de escravos)
39
LUNA, Francisco Vidal. Características demográficas dos escravos de São Paulo (1777-1829). Estudos
Econômicos. São Paulo: IPE-USP, n. 22, v. 3, p. 443-483, set./dez., 1992.
40
SALLES, Ricardo. E o Vale era o escravo. Vassoura, século XIX. Senhores e escravos no coração do Império.
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008. Para o Vale do Paraíba paulista ver, por exemplo, MORENO, Breno
Aparecido Servidone. Demografia e trabalho escravo nas propriedades rurais cafeeiras de Bananal, 1830-1860.
Dissertação (Mestrado em História) - FFLCH/USP, São Paulo, 2013.
41
SALES, op. cit., p. 157-158.
25

Outra contribuição relevante para a historiografia, e de muita pertinência para a nossa


tese, é a obra de Laird W. Bergad a respeito da demografia da escravidão em Minas Gerais
entre 1720 e 1888.42 O autor se apoiou em dados obtidos de longas séries de inventários post
mortem, a partir das quais teceu análises quantitativas e qualitativas relevantes sobre preços
dos escravos, origem, faixas etárias, estrutura da posse de cativos e outras variáveis que o
autor relacionou com as diferentes atividades econômicas desenvolvidas do decurso do
período 1720-1888, numa das maiores regiões escravocratas do Brasil, a província mineira43.
No caso da Bahia Stuart B. Schwartz, entre outros, analisou a estrutura da posse de
escravos nos engenhos de açúcar com base no censo de 1816-1817. Para o caso das vilas de
São Francisco e Santo Amaro, o autor destacou que os grandes engenhos, com mais de uma
centena de cativos eram atípicos, compondo apenas uma pequena fração do total das
propriedades e possuindo cerca de 17% dos escravos dos engenhos44.
Bert J. Barickman estendeu as análises sobre a posse de escravos no Recôncavo para
outras culturas no período 1780-186045. O autor pesquisou diversos documentos, incluindo
mais de quinhentos inventários post mortem, Livros de contas do Celeiro Público de Salvador,
correspondências, relatos e cartas de viajantes, dentre outras fontes que lhes permitiram
estabelecer um contraponto entre a principal cultura de exportação (cana de açúcar) e outras
destinadas ao abastecimento interno, como mandioca e café, além do fumo que também servia
para exportação. Ao discutir a utilização do trabalho escravo nas diferentes culturas, as
oscilações nos preços dos cativos e dos produtos de exportação e abastecimento interno o
autor evidenciou a dependência da economia agroexportadora em relação às culturas de
subsistência, mostrando as redes de circulação de mercadorias destinadas ao abastecimento da
capital baiana.
Muitos desses trabalhos, pautados em técnicas de investigação da demografia
histórica, ou utilizando as ferramentas deste campo de estudo, realçaram a concentração de
escravos em diferentes regiões do Brasil no período colonial e imperial, mas também

42
BERGAD, Laird W. Escravidão e história econômica: demografia de Minas Gerais, 1720-1880. Tradução de
Beatriz Sidou. Bauru, SP: EDUSC, 2004.
43
BERGAD, Laird W. Escravidão e história econômica: demografia de Minas Gerais, 1720-1880. Tradução de
Beatriz Sidou. Bauru, SP: EDUSC, 2004.
44
SCHWARTZ, op. cit. p. 364-365.
45
BARICKMAN, Bert J. Um contraponto baiano: açúcar, fumo, mandioca e escravidão no Recôncavo, 1780-
1860. Tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. Ver também, do
mesmo autor. Até a véspera: o trabalho escravo e a produção de açúcar nos engenhos do recôncavo baiano
(1850-1881). Afro-Ásia, n. 21-22, p. 177-238, 1998-1999.
26

relativizou a suposta predominância das plantations na economia escravista brasileira,


postulado defendido por Caio Prado Junior46.
Outros estudos voltaram-se para análises sistemáticas das características demográficas
dos escravos de regiões com economias dedicadas ao abastecimento interno, ou que não
estavam conformadas por grandes latifúndios escravistas com culturas de exportação.
Horacio Gutiérrez ressaltou as características demográficas da população escrava do
Paraná entre 1800-1830, uma economia não exportadora, dedicada principalmente à pecuária.
Nesse estudo o autor constatou relativo equilíbrio entre os escravos e elevando número de
crianças, admitindo que na aludida localidade a reprodução natural dos cativos foi o principal
meio para se manter a posse de escravos47.
Outros estudiosos também realizaram pesquisas como o intuito de identificar as
características demográficas da escravidão em áreas de abastecimento. Em muitos casos
constatou-se significativo percentual de mulheres e crianças na população escrava. Assim, no
bojo dos avanços da historiografia recente surgiram historiadores interessados em estudar as
escravas, sendo que essa temática também será abordada em nossa tese.
Assim, consideramos relevante discutir alguns autores que trataram do assunto,
especialmente aqueles que abordaram os espaços de trabalho das mulheres escravas. Entre
muitos estudos existentes na atualidade destacamos o de Maria Odila Leite da Silva Dias, que
tratou das negras de tabuleiro e de ganho na cidade de São Paulo durante o século XIX.
Utilizando como fontes principais as atas da Câmara Municipal de São Paulo, além de outros
ofícios, a autora identificou que elas tinham presença significativa nas atividades menos
rentáveis e lucrativas da cidade, principalmente no comércio ambulante de gêneros de
primeira necessidade48.
Cecilia Moreira Soares investigou as mulheres negras em Salvador no século XIX a
partir das ações cíveis, bem como Livro de posturas e licenças municipais, dentre outras
fontes. A autora destacou o cotidiano das ganhadeiras na capital baiana, ressaltando os
acordos que elas estabeleciam com seus senhores, os quais estabeleciam determinadas
quantias que elas deveriam entregar. As ganhadeiras, assim como as libertas, circulavam pela
cidade vendendo diversos produtos de primeira necessidade, enfrentando os agentes da
fiscalização municipal e os conflitos na disputa por pontos estratégicos de venda. Ademais,

46
PRADO JUNIOR, Caio. Formação do Brasil contemporâneo. Colônia. 20ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1987.
47
GUTIÉRREZ, Horacio. Demografia escrava numa economia não-exportadora: Paraná, 1880-1830. Estudos
Econômicos. São Paulo: IPE-USP, n. 17, v. 2, p. 297-314, maio/ago. 1987.
48
DIAS, Maria Odila L. da Silva. Nas fímbrias da escravidão urbana: negras de tabuleiro e de ganho. Estudos
Econômicos. São Paulo: IPE-USP, n.15 (número especial), p. 89-109, 1985.
27

ressaltou o papel das escravas domésticas, cozinheiras, lavadeiras, engomadeiras, dentre


outras ocupações49.
Sandra Lauderdale Graham estudou diversos aspectos relacionados à vida e ao
trabalho das escravas no Rio de Janeiro entre 1860 e 1910. A autora analisou o mundo das
criadas, as diversas ocupações que elas desempenhavam no serviço doméstico e como
vendeiras nas ruas, bem como as relações estabelecidas com os seus patrões50.
Os estudos históricos sobre as escravas e forras no Brasil cresceram nas últimas
décadas contribuindo de modo significativo para ampliar o conhecimento histórico dos papeis
desempenhados pelas mulheres negras na sociedade escravista e pós-abolição51. Muitos
pesquisadores voltaram-se para análise da presença delas nos espaços urbanos, em nossa tese
abordaremos alguns aspectos das escravas que na maior parte das vezes encontravam-se no
serviço de lavoura, outras desempenhavam serviços domésticos e certamente elas circulavam
pelas vilas, desenvolvendo diversas atividades econômicas e formando pecúlio, nos dias de
trabalho e durante as folgas.
De maneira geral, os estudos brevemente discutidos revelaram a importância do
trabalho escravo nos mais variados espaços socioeconômicos do Brasil colonial e durante o
Império. A nossa tese investiga a presença da escravidão na formação da economia cacaueira
de Ilhéus entre os anos de 1850 e 1888. Nesse período o sistema escravista passou por
mudanças que aos poucos culminaram com o fim da instituição servil no país. Já salientamos
nas primeiras páginas desta introdução que alguns trabalhos analisaram a presença do
cativeiro em Ilhéus, mas ainda não contamos com pesquisas aprofundadas em série de
inventários post mortem para avaliar quantos produtores de cacau tinham escravos, qual o
perfil demográfico de suas escravarias e qual o montante de suas fortunas no conjunto da
população.
Esse é o objetivo principal do nosso estudo. Para tanto recorremos a 345 processos de
inventários, incluindo partilha amigável, arrecadação e arrolamento de bens de antigos
moradores de Ilhéus, Livros de cobrança de impostos da Câmara municipal, Livro de
classificação dos escravos para libertação pelo fundo de emancipação do município (1874-

49
SOARES, Cecília Moreira. Mulher Negra na Bahia no século XIX. Dissertação (Mestrado em História).
FFCH-UFBA. Salvador, 1994.
50
GRAHAM, Sandra Lauderdale. Proteção e Obediência: criadas e seus patrões no Rio de Janeiro, 1860-1910.
Tradução Viviam Bosi. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.
51
Um painel denso e atualizado sobre o tema, com 20 artigos de especialistas, pode ser visto em: XAVIER,
Giovana; FARIAS, Juliana Barreto e GOMES, Flávio (Org.). Mulheres negras no Brasil escravista e do pós-
emancipação. São Paulo: Selo Negro, 2012.
28

1886), Recenseamento Geral do Império do Brasil (1872), relatos de viajantes estrangeiros e


a bibliografia atinente ao tema.
No primeiro capítulo abordamos o território da comarca de Ilhéus, a população, o
mercado interno e os produtos de exportação da província da Bahia. As fontes primárias que
servem de suportes para as análises são: Recenseamento Geral do Império do Brasil de
187252; Livros de cobrança de impostos da Câmara Municipal de Ilhéus53 e relatos de
viajantes estrangeiros54. Pretendemos explicar as características populacionais e
socioeconômicas do território no período do nosso estudo, os produtos que circulavam no
mercado interno de Ilhéus e o lugar do cacau nas exportações da Bahia.
No segundo capítulo dedicamos atenção especial às exportações realizadas por Ilhéus,
sendo as fontes de pesquisa os Livros de cobrança de impostos, particularmente os que
serviram para o registro de impostos sobre os produtos destinados para fora do município,
quais sejam: exportações de cacau e café; exportações de cachaça; exportações de madeira
jacarandá; exportações de piaçava e exportações de couros55. O objetivo é analisar as
exportações realizadas por Ilhéus a partir desta documentação e discutir o comportamento da
economia, averiguando se houve crescimento ou declínio dos produtos exportados,
especialmente cacau. Ademais, discutiremos a possibilidade de alguns produtos não terem
sido tributados pelo município e, portanto, escaparem da nossa análise, além dos próprios
limites da fiscalização.
Assim, nos dois primeiros capítulos da tese abordamos aspectos relacionados com o
território da comarca de Ilhéus, os produtos que circulavam no mercado interno,

52
Recenseamento Geral do Império do Brazil de 1872. Disponível em: <http://www.biblioteca.ibge.gov.br>.
Acesso em 15 de fev. 2018.
53
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre casas de negócios. Maço 5455. Ilhéus, 1874-1892;
Livro de imposto sobre gado vacum abatido. Maço 5442. Ilhéus, 1862-1879; Livro de imposto sobre gado vacum
abatido. Maço 5451. Ilhéus, 1879 – 1888; Livro de imposto sobre gado suíno abatido. Maço 5447. Ilhéus, 1872-
1885; Livro de lançamento dos rendimentos relativos a direitos de madeira. Maço 5438. Ilhéus, 1862-1870.
54
SPIX, Joham B. Von; MARTIUS, Karl F. P. Von. Viagem pelo Brasil 1817 – 1820. Tradução Lúcia Furquim
Lahmeyer. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1981; WIED-
NEUWIED, Maximiliano Príncipe de. Viagem ao Brasil. Tradução de Edgar Sussekind de Mendonça e Flávio
Poppe de Figueiredo. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1989;
AVÉ-LALLEMANT, Robert. Viagens pelas províncias da Bahia, Pernambuco, Alagoas e Sergipe: 1859. Belo
Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1980.
55
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de cacau e café. Maço 5459. Ilhéus, 1871-
1885; Livro de imposto sobre exportação de aguardente de cana (cachaça). Maço 5441. Ilhéus, 1870-1878; Livro
de imposto sobre exportação de Jacarandá. Maço 5443. Ilhéus, 1870-1879; Livro de imposto sobre exportação de
piaçava. Maço 5458. Ilhéus, 1879-1888; Livro de imposto sobre exportação de couros secos ou salgados. Maço
5456. Ilhéus, 1879-1888.
29

especialmente nas casas de negócios, a economia de exportação e a fiscalização existente na


época. Desse modo, esperamos avaliar o peso do cacau no contexto histórico, tanto em
relação à província, quanto em relação à Ilhéus.
No terceiro capítulo da tese tratamos da composição da riqueza nos inventários post
mortem dos moradores da localidade. Os objetivos consistem em analisar a importância dos
cacaueiros e dos escravos no patrimônio dos inventariados para sabermos a proporção dos
envolvidos com o cultivo de cacau e a posse de escravos, dentre outros bens que compunham
o patrimônio das famílias inventariadas. Outrossim, analisamos as diferenças das riquezas
destas famílias segmentando-as em diferentes grupos a partir das atividades econômicas que
praticam, o que possibilitará entender os que detinham as maiores e menores fortunas. As
análises incluem também o estudo das culturas, calculando-se o número de cacaueiros por
décadas para averiguarmos se houve expansão do cultivo desta e de outras culturas. Ademais,
avaliamos a presença de terras entre os inventariados, tentando saber a proporção dos que
tinham acesso a este bem e o tamanho das propriedades.
No quarto capítulo tratamos exclusivamente da escravidão, concentrando atenção nos
inventários com presença de escravos. Inicialmente investigamos a estrutura da posse para
sabermos se os produtores de cacau eram grandes escravistas ou não, ou seja, estamos
interessados em identificar o tamanho da escravaria deles e dos demais inventariados. Depois
averiguamos as origens dos escravos por sexos e faixas etárias e no último tópico analisamos
os preços dos cativos. De modo geral, tentamos explicar neste capítulo as características dos
escravos e da escravidão em Ilhéus na segunda metade do século XIX.
No quinto capítulo abordamos as escravas, que foram importantes não apenas como
força de trabalho, mas também como mães. Muitas delas geraram filhos utilizados pelos
escravistas para manutenção do cativeiro em Ilhéus. Tal constatação pôde ser identificada
observando o perfil demográfico da população cativa, em que a presença de mulheres e
crianças foi marcante. Assim, dedicamos um capítulo para o estudo dessas mulheres, onde
tratamos dos aspectos demográficos, como estado conjugal e presença de filhos, e o mundo do
trabalho, investigando as ocupações e alguns dilemas que elas enfrentaram no cativeiro junto
com os filhos, ou separadas delas e de outros familiares.
No sexto capítulo analisamos os imóveis, os bens móveis e os animais descritos nos
inventários post mortem de Ilhéus. A proposta é investigar como a economia cacaueira estava
estruturada nessa época, se havia muitas casas de beneficiar cacau entre os imóveis dos
inventariados, os tipos de moradias, as casas de farinha, as casas de negócios, entre outros
aspectos que podem revelar a situação da economia de Ilhéus no período. Ao tratarmos dos
30

bens móveis podemos verificar a presença desses aspectos, conferindo os tipos de móveis das
casas e lavouras, os tipos de embarcações, a presença de armas, dinheiro e outros bens móveis
que possam demonstrar ou não a riqueza dos inventariados. Com essa mesma preocupação
analisamos os animais, queremos saber se havia muitos burros de cargas, se eram utilizados
no transporte de cacau e outras mercadorias, se a pecuária tinha importância, o tipo de animal
que predominou entre os inventariados e se eles guardam relação com o desenvolvimento da
economia cacaueira.
No último capítulo da tese analisamos as dívidas ativas e passivas declaradas nos
inventários. O objetivo é verificar se houve expansão do sistema de crédito no período do
nosso estudo, se essas dívidas estavam concentradas ou disseminadas entre os inventariados e
qual o lugar dos produtores de cacau nesse sistema. Desse modo, o último capítulo da tese
discute aspectos internos e externos relacionados com o processo de desenvolvimento da
economia cacaueira. Estamos interessados em saber se havia relações entre os inventariados
de Ilhéus com a praça de Salvador, quais eram as características dessas relações e o impacto
disso na economia local. Desse modo, pretendemos explicar alguns aspectos da dinâmica
econômica e escravista de Ilhéus entre os anos de 1850-1888, bem como as nuances
relacionadas com a formação da economia cacaueira.
31

CAPÍTULO I
A COMARCA DE ILHÉUS (1850-1888): TERRITÓRIO, POPULAÇÕES E
MERCADO INTERNO

1.1 - Introdução

Os estudos históricos sobre a escravidão na Bahia tiveram avanços consideráveis nas


últimas décadas, incluindo várias comarcas importantes nas pesquisas, extrapolando as
análises para além da capital (Salvador) e do Recôncavo. Parte desse avanço é resultado do
crescimento dos cursos de pós-graduação no país, que motivou a incorporação de novos
espaços ao campo dos estudos, com aplicação de metodologias renovadas, o que contribuiu
para potencializar a historiografia brasileira, particularmente os estudos sobre escravidão.
Desde as comemorações do centenário da abolição (1988) até o presente, é notório o
crescimento do número de pesquisas abrangendo distintas localidades, com temas e
problemas diversos56.
Porém, algumas áreas da Bahia têm sido pouco exploradas do ponto de vista da
pesquisa histórica sobre escravidão e economia. Isso ocorre, por exemplo, com muitas
localidades do sul da província, entre as quais Valença, Camamú, Maraú, Barra do Rio de
Contas (Itacaré), Ilhéus, Canavieiras, Belmonte, Prado, Alcobaça, Caravelas, dentre outras.
Em parte, isso deve-se ao fato dessa área não ter se tornado uma zona típica de plantation
açucareira, como aconteceu com o Recôncavo baiano. Aprofundar o conhecimento dessas
áreas contribuirá, evidentemente, para a melhor compreensão não apenas da localidade
escolhida, mas da dinâmica econômica de toda a região.
Durante o século XIX essa parte da província se desenvolveu economicamente, devido
ao aumento do número de engenhos, ao crescimento do cultivo do café e cacau, que ganharam
importância como produto de exportação, este último servindo de matéria-prima na fabricação

56
Para discussão historiográfica ver, entre outros, SILVA, Paulo Santos. A Historiografia Baiana nos últimos 50
anos. In: GLEZER, Raquel. Do passado para o futuro: edição comemorativa dos 50 anos de Anpuh. São Paulo:
Contexto, 2011. p. 85-105.; LEAL; Maria das Graças de Andrade.; MOREIRA, Raimundo Nonato Pereira;
CASTELLUCCI JUNIOR, Wellington. (Org.) Capítulos de História da Bahia: novos enfoques, novas
abordagens. São Paulo. Annablume, 2009. Para uma avaliação das pesquisas sobre escravidão na Bahia ver,
entre muitos, REIS, João José; AZEVEDO, Elciene (Org.). Escravidão e suas sombras. Salvador: EDUFBA,
2012.; SAMPAIO, Gabriela dos Reis; CASTILHO, Lisa Earl; ALBUQUERQUE, Wlamyra (Org.). Barganhas e
querelas da escravidão: tráfico, alforria e liberdade (séculos XVIII e XIX). Salvador: EDUFBA, 2014; FRAGA
FILHO, Walter. Encruzilhadas da liberdade: história de escravos e libertos na Bahia (1870-1910). Campinas,
SP: Editora da Unicamp, 2006.; PIRES, Maria de Fátima Novaes; SANTANA, Napoliana Pereira; SANTOS,
Paulo Henrique Duarte (Org.). Bahia: escravidão, pós abolição e comunidades quilombolas: estudos
interdisciplinares. Salvador: EDUFBA, 2018; NEVES, Erivaldo Fagundes. Escravidão, pecuária e policultura:
alto sertão da Bahia, século XIX. Feira de Santana: UEFS Editora, 2012.
32

do chocolate, cujo consumo aos poucos se difundia entre a população da Europa e dos
Estados Unidos.
A comarca de Ilhéus apresentava condições naturais favoráveis ao cultivo do cacaueiro
e se tornou uma das principais áreas de produção nacional no século XX, contribuindo para
tornar o Brasil um dos maiores fornecedores mundiais do fruto. Investigar o período 1850-
1888 a partir de documentos sobre escravidão e economia pode contribuir para ampliar o
conhecimento da história de Ilhéus e do sul da Bahia.
Esse capítulo aborda o assunto analisando as características do território e da
população, bem como o mercado interno na segunda metade do século XIX. Nosso interesse é
explorar os grupos sociais envolvidos, as mercadorias que circulavam, a cobrança de impostos
e a presença do trabalho escravo.
A nossa hipótese é que neste período a comarca de Ilhéus iniciou uma fase de
crescimento econômico, devido à disseminação da lavoura cacaueira, mas também pelo
incremento de outras culturas, pela diversificação das atividades e pela intensificação das
relações comerciais com outras partes do Império, especialmente Salvador, capital da Bahia.
Esse processo está ligado à expansão do capitalismo industrial na Europa, que se abasteceu de
mercadorias baratas produzidas na América com uso do trabalho escravo para desenvolver as
indústrias, ampliando e diversificando a oferta de produtos em escala mundial57.
Para provar nossa hipótese utilizamos como fontes primárias Falas e Relatórios de
presidentes de província, particularmente os quadros de exportações, Livros de cobrança de
impostos da Câmara de Ilhéus, Livro de classificação dos escravos para libertação pelo
fundo de emancipação (1874-1886), inventários post mortem e o Recenseamento Geral do
Império do Brasil de 187258. Essa documentação, tomada em conjunto, permite entender parte
das relações desenvolvidas no mercado interno de Ilhéus e avançar no tema da escravidão.

57
Sobre o assunto ver, entre muitos, WILLIAMS, Eric. Capitalismo e escravidão. Tradução Denise Bottmann,
São Paulo: Companhia das Letras, 2012; TOMICH, Dale W. Pelo prisma da escravidão: trabalho, capital e
economia mundial. Tradução de Paula Danesi. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2011.
58
Utilizamos basicamente duas falas de presidentes de província, quais sejam: Fala que recitou o presidente da
província da Bahia, Dr. João Maurício Wanderley, na abertura da Assembleia Legislativa em 1º de março de
1853. Bahia, Typ. Const. De Vicente Ribeiro Moreira, 1853; Fala com que abriu no dia 1º de maio de 1878 a 57 a
legislatura da Assembleia Legislativa Provincial da Bahia o Sr. Barão Homem de Mello. Bahia, Typ. do Diario,
1878. Disponíveis em: <http://www-apps.crl.edu/brazil/provincial>, acesso em 10 de mar. 2018. APEB, SCP.
Livros de cobrança de imposto da Câmara de Ilhéus. Maço 5455 – Casas de Negócios (1874-1892); Maço 5442 e
5451 – Gado Vacum abatido (1862- 1879) e (1879-1888), respectivamente; Maço 5447 – Gado Suíno abatido
(1872-1885); Maço 5438 – Rendimento relativo a direitos de Madeira (1862-1870). APEB, SCP. Livro de
classificação dos escravos para serem libertos pelo fundo de emancipação. Fundo: Tesouraria Provincial. Lv.
7008. Ilhéus, 1874-1886; Recenseamento Geral do Império do Brazil, 1872. Disponível em:
<http://www.biblioteca.ibge.gov.br>, acesso em 15 de fev. 2018; APEB, SJ. 345 processos de inventários (Ver
listagens de inventários e de livros de impostos em anexo).
33

A primeira seção privilegia o espaço geográfico da comarca, analisamos o território, as


populações e o lugar do cacau na pauta das exportações da Bahia entre 1850-1888. A proposta
é oferecer um panorama dos grupos sociais e da economia provincial no período, destacando
as mudanças nas exportações, bem como a participação do cacau e de outros produtos
despachados por Ilhéus nesse contexto.
Na segunda seção dedicamos atenção às atividades voltadas para o mercado interno
com base nos Livros de cobranças de impostos, que permitem análises sistemáticas de
determinados produtos, contendo nomes das pessoas envolvidas, as quantidades e o valor dos
impostos pagos ao longo dos meses, durante anos. Utilizaremos os seguintes documentos:
Livro de imposto sobre Casas de Negócio (1874-1892); Livro de imposto sobre abatimento de
Gado Vacum (1862-1879) e (1879-1888); Livro de imposto sobre abatimento de Gado Suíno
(1872-1885); Livro de imposto relativo a direito de exploração de madeiras (1862-1870)59.
Analisamos o mercado interno de Ilhéus a partir desta documentação e cruzando as
informações das outras fontes, que tomadas em conjunto propiciam o desenvolvimento do
tema.
Outros objetivos deste capítulo consistem em analisar a presença de escravos na
população. Alguns Livros de cobrança de impostos foram preenchidos na mesma época da
classificação dos escravos para concorrerem à libertação pelo fundo de emancipação, feita em
Ilhéus entre os anos de 1874 e 1886, contendo nomes dos cativos e de seus proprietários, entre
outras informações. Isso permitiu encontrar pessoas envolvidas nas atividades econômicas
que classificaram escravos para libertação60. Sempre que possível vamos evidenciar essas
ligações.
A metodologia pauta-se, principalmente, em análises quantitativas, com apresentações
de gráficos e tabelas a respeito dos produtos, das pessoas envolvidas e dos impostos pagos ao
longo dos anos. Todavia, também procederemos a uma abordagem qualitativa do processo
histórico, relacionando escravidão e desenvolvimento econômico.

59
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre casas de negócios. Maço 5455. Ilhéus, 1874-1892;
Livro de imposto sobre gado vacum abatido. Maço 5442. Ilhéus, 1862-1879; Livro de imposto sobre gado vacum
abatido. Maço 5451. Ilhéus, 1879 – 1888; Livro de imposto sobre gado suíno abatido. Maço 5447. Ilhéus, 1872-
1885; Livro de Lançamento dos rendimentos relativos a direitos de madeira. Maço 5438. Ilhéus, 1862-1870.
60
APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos pelo fundo de emancipação. Lv. 7008.
Ilhéus, 1874-1886.
34

1.2 - Território, populações e mudanças econômicas. Ilhéus, 1850-1888

A vila de Ilhéus foi fundada em 1535 e funcionou como sede da capitania durante todo
o período colonial. Esta capitania, São Jorge dos Ilhéus, possuía um território de
aproximadamente 50 léguas, limitando-se ao norte com a capitania da Bahia e ao sul com a
capitania de Porto Seguro61. A vila sede concentrava as principais estruturas do
funcionamento da política, administração e economia, abrigava a Igreja matriz e o principal
porto de exportação, situado na baía do pontal, confluência de três grandes rios (Cachoeira,
Almada e Fundão)62.
Não obstante a importância de Ilhéus outras vilas foram fundadas nesse território
durante o período colonial e no decorrer do século XIX. Muitas delas se desenvolveram a
partir da instalação de aldeamentos indígenas e de alguns engenhos. Além da produção de
açúcar e aguardente os habitantes se dedicavam às atividades de subsistência e abastecimento
interno, principalmente a exploração de madeiras, fabricação de farinha, extração de piaçava,
pesca, produção de melado, aguardente, dentre outras atividades63.
Incialmente os jesuítas foram os principais colonizadores daquele espaço, se tornaram
donos do Engenho Santana, localizado nas proximidades da vila de Ilhéus, da maior parte das
terras e da mão de obra disponível, os índios aldeados. Contudo, após as reformas pombalinas
eles foram expulsos (1761), e a partir de então o território passou a ser ocupado de forma mais
intensiva por particulares. Esse processo foi marcado por guerras e conflitos envolvendo
catequização e escravização dos povos indígenas e africanos, muitos capturados nas “guerras
justas”, trabalhando nos aldeamentos, vendidos como escravos, outros trazidos da África,
forçados a trabalhar nos engenhos, alambiques, casas de farinha, na extração de madeiras e no
cultivo da terra64.

61
CAMPOS, João da Silva. Crônica da capitania de São Jorge dos Ilhéus. 3 ed. Ilhéus, Ba: Editus, 2006. p.23-
26.
62
Sobre o porto de Ilhéus ver, entre outros, SANTOS, Flávio Gonçalves dos. A Baía do Pontal – Ilhéus: relações
do porto com a cidade (1911-1971). Revista Crítica Histórica, v.7, n.13, p.1-19, 2016; ROSADO, Rita de Cássia
Santana de Carvalho. O porto flúvio-marítimo de Ilhéus (1911-2010). In: SANTOS, Flávio Gonçalves dos.
(Org.) Portos e cidades: movimentos portuários, Atlântico e diáspora africana. Ilhéus: Editus, 2011. p.15-52.
63
DIAS, Marcelo Henrique. A capitania de São Jorge dos Ilhéus: economia e administração. In: DIAS, Marcelo
Henrique; CARRARA, Angelo Alves (Org.). Um lugar na História: a capitania e comarca de Ilhéus antes do
cacau. Ilhéus: Editus, 2007. p. 59.
64
Ver, entre outros, SCHWARTZ, Stuart. Segredos internos: engenhos e escravos na sociedade colonial.
Tradução Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, 1988.
PARAÍSO, Maria Hilda Baqueiro. O tempo da dor e do trabalho: a conquista dos territórios indígenas nos
sertões do leste. Tese (Doutorado em História). FFLCH-USP. São Paulo 1998; MARCIS, Teresinha. A
integração dos índios como súditos do rei de Portugal: uma análise do projeto, doas autores e da implementação
na Capitania de Ilhéus, 1758-1822. Tese (Doutorado em História). FFCH-UFBA, Salvador, 2013.
35

No bojo das reformas ilustradas a Coroa portuguesa incentivou o desenvolvimento de


várias atividades econômicas com o objetivo de aumentar a exploração do território, que foi
integrado como comarca à capitania real da Bahia, mantendo-se os limites geográficos de
antes.
Em 1789, o ouvidor da comarca, Manoel Ferreira da Câmara, em seu Ensaio de
descrição física e econômica da Comarca dos Ilhéos na América, apresentado na Academia
de Ciências de Lisboa, ressaltou as potencialidades do território e a viabilidade econômica de
diversas culturas, inclusive do cacau e café65.
No século XIX vários estrangeiros visitaram o Brasil em missões científicas e
artísticas, fazendo anotações sobre a população, o modo de vida dos habitantes, a flora e a
fauna. Apesar do olhar enviesado pelos princípios europeus de civilização, não pouparam
elogios sobre a riqueza natural, a diversidade e exuberância da paisagem de várias regiões,
inclusive do sul da Bahia66.
Após a emancipação política da antiga colônia, em 1822, ocorreram mudanças na
administração dos territórios e no caso da Bahia, que se tornou província, surgiram várias
comarcas. Assim, na segunda metade do século XIX, a comarca de Ilhéus passou a ser
conformado por duas vilas litorâneas: a vila de Ilhéus e a vila de Olivença67.
A primeira possuía apenas uma freguesia, que preservou o mesmo nome da vila (São
Jorge dos Ilhéus) e limitava-se ao norte com a vila de São Miguel da Barra do Rio de Contas
(Itacaré), e ao sul com a vila de Olivença, cujo território incluía a freguesia de Una, que fazia
fronteira com a vila de Canavieiras, esta última pertencia à comarca de Ilhéus, mas após os
desmembramentos passou a integrar a comarca de Porto Seguro. Este território, com
aproximadamente 150 km de costa, contendo duas vilas e duas freguesias, com várias
povoações no litoral e no interior, é o espaço privilegiado em nosso estudo. O mapa a seguir
permite a visualização deste espaço.

65
Manuel Ferreira da Câmara, “Ensaio de descrição fízica e econômica da Comarca de São Jorge dos Ilhéos”, In:
Memórias Econômicas da Academia das Sciencias da Lisboa. n.1, p. 304-350, 1789.
66
Sobre o assunto ver, entre outros, AUGEL, Moema Parente. Visitantes estrangeiros na Bahia Oitocentista.
Prefácio de Américo Jacobina Lacombe. São Paulo: Cutix; [Brasília]: INL, 1980.
67
Cf. Quadro de relação das comarcas da Província da Bahia, com cidades, vilas e divisão judiciária,
apresentado na fala do presidente da província, Dr. João Maurício Wanderley, na abertura da Assembleia
Legislativa em 1º de março de 1853. Bahia, Typ. Const. De Vicente Ribeiro Moreira, 1853. Disponível em:
<http://www-apps.crl.edu/brazil/provincial>. Acesso em 10 de mar. 2018.
36

Figura 1.1 - Mapa do Sul da comarca de Ilhéus, 1800

Fonte: DIAS, Marcelo Henrique. Economia, sociedade e paisagens da capitania e comarca de Ilhéus no
período colonial. Tese (Doutorado em História) - ICHF/ UFF, Niterói, 2007. p. 408.

O mapa da Figura 1.1 mostra a vila de Ilhéus e várias povoações localizadas nas
margens dos rios. Entre elas existiam aldeias indígenas, como a Aldeia do Almada e a Aldeia
37

Camacã, por exemplo. Outra, igualmente importante, era a Aldeia indígena de Nossa Senhora
das Escadas de Olivença, que originou a vila de Olivença68, ao sul da vila de Ilhéus. Vários
estudiosos analisaram a presença indígena nessa região, ressaltando a exploração, os conflitos
e a resistências desses povos, dentre outras questões.69
Ainda na primeira metade do século XIX, como parte das mudanças que visavam
promover a maior exploração do território da comarca de Ilhéus a Aldeia do Almada foi
transferida para o distrito de Cachoeira de Itabuna, distante cerca de 30 Km do litoral, que se
ligava à Ilhéus pelo rio Cachoeira. Nesse distrito foi instalada a Aldeia de São Pedro de
Alcântara dos índios Guerens e os nativos foram utilizados nos trabalhos de abertura de
estradas, exploração de madeiras e nas atividades agrícolas70.
Além dos indígenas, existiam diversos quilombos nesta comarca e em outras vilas do
sul da Bahia. O cronista João da Silva Campos fornece informações sobre vários desses
grupos71. O historiador João José Reis analisou a devassa promovida contra um quilombo
localizado nessa área em 1806, o quilombo do Oitizeiro72. Valdinea de Jesus Sacramento
também abordou a organização e funcionamento desse quilombo, comprovando a existência
de uma verdadeira confederação de mocambos espalhados nas matas entre Ilhéus e Barra do
rio de Contas73.
No decorrer do século XIX a ocupação deste espaço foi ampliada e os conflitos
aumentaram. Muitos grupos foram mortos no confronto com os colonizadores, outros
escravizados, além do avanço do desmatamento e expansão da fronteira agrícola com cultivo
de cacau, café, cana de açúcar, exploração de madeiras e outras atividades.

68
Sobre Olivença ver, por exemplo, MARCIS, Teresinha. A “hecatombe de Olivença”: construção e
reconstrução da identidade étnica, 1904. Dissertação (Mestrado em História) – FFCH/UFBA. Salvador, 2004.
69
Ver, entre muitos, FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro de; PARAÍSO, Maria Hilda Baqueiro, Caminhos
ao encontro do mundo: a capitania, os frutos de ouro e a princesa do sul - Ilhéus, 1534-1940. Ilhéus: Editus,
2001. MOTT, Luiz. Os índios do sul da Bahia: população, economia e sociedade, 1740-1854. In: Cultura
(Salvador, BA, Fundação Cultural do Estado da Bahia). n.1, v.1, p.93-120, 1998. MARCIS, Teresinha. A
integração dos índios como súditos do rei de Portugal: uma análise do projeto, dos autores e da implementação
na Capitania de Ilhéus, 1758-1822. Tese (Doutorado em História). FFCH-UFBA, Salvador, 2013.
70
Ver, entre outros, SILVA, Ayalla Oliveira. Camacâs, guerens, pataxós e o aldeamento de São Pedro de
Alcântara: trabalho, relações interétnicas e ocupação territorial de Cachoeira de Itabuna, sul da Bahia (1814-
1877). Dissertação (Metrado em História). ICHS-UFRRJ. Rio de Janeiro, 2015.
71
“Nas matas de Cairu, de Camamu, do rio de Contas e de Ilhéus nunca deixaram de existir tais coiós de
escravos fugidos, apesar de, por muitas vezes, serem eles destruídos, e aprisionados os seus moradores. Logo se
refaziam e entravam os negros de novo a apavorar as vilas, fazendas, engenhos e roças”. CAMPOS, João da
Silva. Crônica da capitania de São Jorge dos Ilhéus. 3 ed. Ilhéus-Ba: Editus, 2006. p. 339
72
REIS, João José. Escravos e coiteiros no quilombo do Oitizeiro-Bahia, 1806. In: REIS, João José; GOMES,
Flávio dos Santos (Org.). Liberdade por um fio: história dos quilombos no Brasil. São Paulo: Companhia das
Letras, 1996, p. 332-372.
73
SACRAMENTO, Valdinéia de Jesus. Mergulhando nos Mocambos do Borrachudo – Barra do Rio de Contas
(século XIX). Dissertação (Mestrado em Estudos Étnicos e Africanos) - CEAO/FFCH/UFBA, Salvador, 2008.
38

Em nossa pesquisa analisamos 345 inventários post mortem dos moradores de Ilhéus,
abertos entre 1850 e 1888, além de vários Livros de cobrança de impostos, o que permitiu
constatar a existência dessa ocupação. Ao longo das décadas encontramos mais duas centenas
de propriedades particulares localizadas nas margens dos rios: no rio Almada, próximo da vila
de Ilhéus; no rio Cururupe, próximo da vila de Olivença; no rio Maruim, próximo de Una; e
muitas no rio Cachoeira de Itabuna, dentre outras localizadas no litoral.
Além destas, encontramos donos de engenhos e negociantes que se estabeleceram no
território durante o século XIX. Afora o Santana, erguido no período colonial e com 260
escravos trabalhando na produção de açúcar em 181974, localizamos o Engenho Conceição de
Itacanoeiras75; o Engenho Castelo Novo, nas proximidades do rio Almada76; o Engenho
União 77; dentre outros.
Assim, notamos que o processo de ocupação do território se intensificou. Essas
mudanças estavam relacionadas com as transformações da economia provincial durante a
primeira metade do século XIX, que alcançou crescimento econômico devido ao aumento do
número de engenhos e das exportações de açúcar, fenômeno motivado pelo vácuo deixado na
economia mundial após a rebelião escrava de Saint Domingue (atual Haiti) em 179178.
Segundo Bert J. Barickman as exportações de açúcar feitas a partir do porto de
Salvador passaram de 500 mil arrobas anuais em 1789 para aproximadamente 4 milhões em
torno de 185079. Este mesmo autor ressaltou a ampliação dos engenhos em diversas áreas da
província, inclusive nos municípios litorâneos ao sul do Recôncavo, entre eles Ilhéus, sendo
que nessa região existiam 17 engenhos em 1842 e no ano de 1873 esse número chegou a 4280.
Nesse contexto o tráfico atlântico de africanos cresceu81, entre os anos de 1800-1850, segundo

74
SCHWARTZ, Stuart. Escravos, roceiros e rebeldes. Tradução Jussara Simões. Bauru: SP: EDUSC, 2001. p.
109.
75
APEB, Seção Judiciária. Inventários. Ilhéus. Maria Luíza da Santíssima Trindade. Est. 02, Cx. 783, Maço
1250, Doc. 08, 09 de out. 1850.
76
APEB, Seção Judiciária. Inventários. Ilhéus. Maria José Leola Del Rey e Carolina Leola Del Rey. Est. 02, Cx.
786, Maço 1253, Doc. 06, 28 de fev. 1861.
77
APEB, Seção Judiciária. Inventários. Ilhéus. Alferes José Antônio de Guimarães Basto. Est. 02, Cx. 738,
Maço 1203, Doc. 12, 10 de fev. 1875.
78
De acordo com Stuart B. Schwartz “entre 1817 e 1828 foram instalados 110 novos engenhos na Bahia e na
década seguinte entraram em operação mais 220 unidades”. SCHWARTZ, Stuart B. Segredos Internos:
engenhos e escravos na sociedade colonial, 1550-1835. Tradução de Laura Teixeira Motta. São Paulo:
Companhia das Letras, 1988. p. 345-346.
79
BARICKMAN, Bert J. Um contraponto baiano: açúcar, fumo, mandioca e escravidão no Recôncavo, 1780-
1860. Tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. p. 72-73.
80
Ibidem., p. 80.
81
Sobre o tráfico de escravos na Bahia ver, entre muitos, VERGER, Pierre. Fluxo e Refluxo do tráfico de
escravos entre o Golfo do Benin e a Bahia de todos os Santos: dos séculos XVII a XIX. Salvador: Currupio,
2002.
39

estimativa de Barickman, uma média de 9.500 africanos foi desembarcada anualmente em


Salvador para serem vendidos como escravos em diversas regiões82.
Nessa época o cacau não adquiriu importância significativa no comércio exterior da
província, cujos principais produtos de exportação eram açúcar e fumo. O cultivo do cacau e
do café cresceu lentamente no sul da província, que apresentava condições naturais favoráveis
e abundância de terras virgens, porém com pouca disponibilidade de mão de obra. A Tabela
1.1 apresenta os percentuais das receitas arrecadadas pela província com exportações dos
principais produtos.

Tabela 1.1 - Porcentagem da receita total das exportações dos principais


produtos. Província da Bahia, 1853-1860
Produtos/Anos 1853 1854 1855 1856 1857 1858 1859 1860
Açúcar 66,5 59,5 53,6 49,4 50,3 43,8 56,8 26,6
Fumo 8,2 17,0 14,1 12,8 16,7 14,4 15,9 21,9
Algodão 3,6 0,8 1,1 2,0 2,1 1,1 0,4 0,6
Café 3,3 4,7 8,6 8,0 6,8 8,9 6,0 9,3
Aguardente 2,7 4,1 6,1 4,1 3,0 4,4 2,7 1,2
Cacau 0,3 0,6 0,5 0,9 0,8 2,3 0,8 1,6
Couros 2,4 4,3 5,6 5,6 5,5 7,2 3,7 6,7
Ouro * * * * - * 0,2 0,3
Madeira 1,0 2,1 1,2 0,7 0,9 1,4 1,6 3,6
Diamantes 11,5 5,6 8,1 15,2 13,0 10,1 9,9 14,5
Soma 99,5 98,7 98,9 98,7 99,1 93,6 98,0 86,3
Fonte: BARICKMAN, Bert J. Um contraponto baiano: açúcar, fumo, mandioca e escravidão no Recôncavo,
1780-1860. Tradução Maria Luiza Borges. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. p. 56-57. (Adaptado)

A Tabela 1.1 mostra que o açúcar era o principal produto da economia baiana, o que
gerava as maiores receitas de exportação. O fumo aparece em segundo lugar, sendo que
juntos, esses dois produtos dominavam a pauta das exportações da Bahia, ao passo que nesta
conjuntura as receitas provenientes das exportações de cacau eram praticamente
insignificantes, demonstrando a pouca relevância deste produto naquele contexto.
Na segunda metade do século XIX a economia açucareira enfrentou problemas que já
estavam se agravando desde a década de 1830, devido à concorrência com o açúcar cubano,
que contava com engenhos a vapor e técnicas de fabricação sofisticadas, o que garantia um
produto de qualidade superior ao produzido na Bahia. Ademais, com a proibição do tráfico
atlântico de africanos (1850) a situação se tornou mais aguda pela falta de braços para a

82
BARICKMAN, Op. cit., p. 228.
40

lavoura e pelo comércio interprovincial de cativos, que ensejou vendas de escravos a preços
elevados para o Centro Sul do Império.

A venda de negros para as fazendas de café era, por sua vez, forçada pela
escassez de recursos dos senhores de engenho para manter a própria
escravaria, para o custeio de sua indústria, bem como para obter dinheiro
com que cobrir os prejuízos ocasionados por diversos fatores conhecidos83.

Além das dificuldades enfrentadas pela economia de exportação surgiram problemas


relacionados com o abastecimento interno, principalmente a escassez de alimentos de
primeira necessidade, que provocou revolta e motins na capital, somaram-se a isso as
epidemias de cólera entre 1855 e 1856, que desorganizou o comércio e agravou o problema da
fome84.
Nesse contexto o governo provincial incentivou ainda mais a ocupação e exploração
do território do sul da Bahia, estimulando o desbravamento das matas, abertura de estradas e o
estabelecimento de colônias agrícolas. Henrique Jorge Buckingham Lyra analisou o processo
de formação dessas colônias, relacionando-o com a “crise” de mão de obra na província.
Segundo o autor “a proliferação de colônias agrícolas parece ter acontecido em resposta à
proibição do tráfico de escravos”85. Mesmo questionando alguns pontos da propalada crise de
mão de obra, Henrique J. B. Lyra ressaltou que as comarcas do sul da Bahia se apresentavam,
até o final do século XIX, como uma área em potencial para a expansão agrícola, seu estudo
revelou o contingente das famílias estabelecidas, nacionais e estrangeiras, e os produtos
cultivados por elas, entre os quais cacau e café86.
Desse modo, entre 1850 e 1888, baliza temporal do nosso estudo, o território da
comarca de Ilhéus vivenciou um processo de crescimento populacional e expansão das
atividades econômicas, o cultivo do cacau foi uma dessas atividades, que se desenvolveu
junto com o crescimento do mercado interno, da exploração de madeiras, do cultivo do café,
produção de farinha de mandioca, açúcar, aguardente, dentre outros artigos.
Os dados sobre a população de Ilhéus são escassos e as informações dispersas, o que
dificulta o trabalho do historiador interessado em conhecer o contingente demográfico do

83
AZEVEDO, Thalles Olímpio Góes de. A economia Baiana em torno de 1850. Revista Planejamento.
Salvador, n.5., v.4, p. 7-18, out./dez., 1977. p. 15.
84
PINHO, José Ricardo Moreno. Açambarcadores e famélicos: fome, carestia e conflitos em Salvador (1858-
1878). Salvador: EDUNEB; Câmara Municipal de Salvador, 2016. p. 145.
85
LYRA, Henrique Jorge Buckingham. A crise de mão de obra e a criação de colônias agrícolas na Bahia: 1850-
1889. In: DIAS, Marcelo Henrique; CARRARA, Ângelo Alves. Um lugar na história: a capitania e comarca de
Ilhéus antes do cacau: Ilhéus; Editus, 2007. p. 234.
86
LYRA, Op. cit., p. 254-305.
41

território. Os naturalistas Spix e Martius, quando passaram por Ilhéus em 1818 informaram
que a vila e toda a sua freguesia possuía apenas 2.400 almas87. Mary Ann Mahony, com base
em Livros de batismos, estimou cerca de 500 escravos nos anos 1820 e em torno de 700 nos
anos 1840, mas concorda que esses números podem estar subestimados88.
O primeiro Recenseamento Geral do Império do Brasil, realizado em 1872, é a fonte
mais segura de que dispomos.

Tabela 1.2 - População livre e escrava. Vilas do sul da Bahia, 1872


POP. LIVRE POP. ESCRAVA TOTAL Nº
MUNICÍPIOS
Nº % Nº % Nº % FOGOS
CAMAMÚ 8.065 89,4 964 10,6 9.029 100,0 1.850
BARCELOS 1.556 77,2 460 22,8 2.016 100,0 624
MARAÚ 2.399 86,9 362 13,1 2.761 100,0 180
BARRA DO RIO
3.102 85,9 510 14,1 3.612 100,0 736
DE CONTAS
ILHÉUS 4.631 81,5 1.051 18,5 5.682 100,0 1.620
UNA 2.689 93,5 188 6,5 2.877 100,0 505
CANAVIEIRAS 2.933 94,0 189 6,0 3.122 100,0 625
Fonte: Recenseamento Geral do Império do Brasil, 1872. Disponível em:
<http://www.biblioteca.ibge.gov.br> Acesso em 15 de fev. 2018.

A Tabela 1.2 demonstra a presença de escravos na população das vilas do sul da


Bahia, sendo Ilhéus uma delas. Dentre os 5.682 habitantes, 18,5% eram escravos, em outras
esse índice foi de 14,1% (Barra do Rio de Contas); 6,5% (Una); 6% (Canavieira). Assim, é
inegável que a escravidão foi parte integrante daquele contexto histórico. Todavia, precisamos
avaliar o impacto do trabalho escravo no desenvolvimento da economia cacaueira, sendo esse
um dos objetivos de nossa tese.
Na opinião de Mary Ann Mahony “os escravos foram essenciais para o
estabelecimento da economia cacaueira da Bahia e para a sociedade que se desenvolveu com
ela”89. Outros pesquisadores, no entanto, assinalam as dificuldades enfrentadas por esta
cultura em sua fase de implantação inicial, que se estendeu até a última década do século
XIX. Romulo Barreto de Almeida, por exemplo, destacou que:

Não faltaram tentativas de racionalização da cultura e do tratamento da


amêndoa do cacau, muitos fazendeiros procuraram inovar, adaptar processos

87
SPIX, Joham B. Von; MARTIUS, Karl F. P. Von. Viagem pelo Brasil 1817 – 1820. Tradução Lúcia Furquim
Lahmeyer. Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1981.
88
MAHONY, op. cit., p. 99.
89
Ibidem., p. 95
42

usados em outras circunstâncias, inventar melhores sistemas de barcaças,


taboleiros e até estufas90.

A despeito do crescimento do cultivo de cacaueiro em Ilhéus, como será demonstrada


em nossa análise dos inventários, a importância deste produto nas exportações da província
continua reduzida se comparada à de outros gêneros, sobretudo açúcar, como se ver na Tabela
1.3.

Tabela 1.3 – Porcentagem da receita total das exportações dos principais


produtos. Província da Bahia, 1873-1877
Produtos/Anos 1873 1874 1875 1876 1877 Média
Açúcar 37,2 25,1 38,1 20,4 37,0 31,6
Fumo e seus Preparos 31,0 33,0 31,0 40,7 29,5 33,0
Café 9,8 15,5 14,1 23,4 18,7 16,3
Couros em cabelo 5,4 6,7 4,9 2,8 2,3 4,4
Algodão 5,1 6,2 1,4 0,3 0,1 2,6
Madeira e taboado 3,5 3,1 2,4 1,6 1,4 2,4
Piaçava 2,4 2,6 2,9 2,2 2,2 2,5
Diamantes 2,3 3,2 0,7 2,8 3,0 2,4
Cacau 2,1 2,4 1,6 2,4 3,2 2,3
Aguardente 0,5 0,8 1,1 0,5 0,4 0,7
Pau Brasil 0,2 0,4 0,7 0,4 0,2 0,4
Ticum 0,1 0,1 0,1 0,1 0,1 0,1
Vários gêneros 0,4 0,9 1,0 2,4 1,9 1,3
TOTAL 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
a
Fonte: Fala com que abriu no dia 1º de maio de 1878 a 57 legislatura da Assembleia Legislativa
Provincial da Bahia o Sr. Barão Homem de Mello. Bahia, Typ. do Diario, 1878. Disponível em:
<http://www-apps.crl.edu/brazil/provincial> Acesso em 24 de março de 2018.

Os dados da Tabela 1.3 revelam que entre 1873 e 1877 o cacau ocupou uma posição
secundária no que diz respeito às receitas provenientes das exportações na Bahia. O açúcar e o
fumo permanecem como principais itens de exportações. Ao que parece esse quadro se
manteve até a abolição da escravidão no Brasil (1888). Segundo Bert J. Barickman “[...]
outros produtos entraram no rol das exportações baianas; mas, até as últimas décadas do
século XIX, nenhum jamais se equiparou ao açúcar”91. Vale advertir que este autor ressaltou
os problemas da economia açucareira e o declínio das exportações de açúcar a longo prazo,

90
ALMEIDA, Rômulo Barreto de. Traços da História econômica da Bahia no último século e meio. Revista
Planejamento. Salvador, n.5., v.4, p. 19-54, out./dez., 1977. p. 34-35.
91
BARICKMAN, Op. Cit., p. 71.
43

mas não fornece nenhuma pista indicando que o cacau se tornou importante para a economia
baiana nesse período.
O café foi um dos produtos que se destacou no rol das exportações da Bahia. Os dados
da Tabela 1.3 demonstram que as receitas provenientes das exportações deste produto
saltaram de 9,8% no ano de 1873 para 18,7% em 1877, sendo que grande parte desse artigo
vinha da comarca de Ilhéus92.
Talvez, a pouca relevância do cacau nas exportações da Bahia nessa época seja
resultado da baixa oferta do produto, que percorreu a sua trajetória mais promissora e de plena
afirmação econômica no período 1890-1930, como destacaram Angelina N. R. Garcez e
Antônio Fernando G. de Freitas93.
Consultamos 19 inventário post mortem de moradores de Ilhéus, abertos na década de
1850, entre eles apenas 7 declararam plantações de cacau, a maior delas possuía 2.877
cacaueiros, 60% com idade entre 6 e 12 anos, a outra parte entre 6 meses e 2 anos94. É certo
que esse quadro se modificou ao longo do período do nosso estudo (1850-1888), mas ao que
parece as exportações não cresceram no mesmo ritmo das plantações95.
De todo modo, os estudiosos são unânimes em ressaltar que o cacaueiro é uma planta
muito exigente, sendo que na fase de sua implantação no sul da Bahia os lavradores
enfrentaram sérias dificuldades para adaptá-la aos solos da região. Para Milton Santos,

O cacaueiro depende mais do céu do que da terra. É que, de fato, se as


condições de solo influem na sua produção, determinando maior ou menor
rendimento, são as condições de clima as preponderantes, pois, fora de
certos limites, observados em todas regiões cacauicultoras do mundo, a sua
produção torna-se economicamente impossível96.

Assim, a escolha do solo e do local para plantação interferia no desenvolvimento da


planta. Gregório Bondar expõe as diferentes espécies e variedades de cacaueiros que foram
introduzidos no sul da Bahia, aconselhando que os terrenos devessem ter profundidade do

92
Ibidem., p. 61.
93
GARCEZ, Angelina Nobre Rolim; FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro de. Bahia cacaueira: um estudo de
história recente. Salvador: Centro Editorial e Didático da Universidade Federal da Bahia, 1979. p. 21
94
APEB, Seção Judiciária. Inventários. Ilhéus. João Segismundo Cordier. Est. 08, Cx. 3424, Maço n/c, Doc. 06,
25 de maio 1849.
95
Como demonstra o Livro de imposto sobre exportação de cacau e café. APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro
de imposto sobre exportação de cacau e café. Maço 5459. Ilhéus, 1871-1885.
96
SANTOS, Milton. Zona do cacau: introdução ao estudo geográfico. 2ª ed. São Paulo: Companhia Editora
Nacional, 1957. p. 17.
44

solo e subsolo e que se deviam evitar aqueles que recebem luz solar direta depois de 10 e 11
horas, já que o cacaueiro é uma planta adaptada a locais úmidos e sombreados97.
O plantio das mudas necessitava de uma sombra provisória, fornecida por outras
espécies, como a bananeira, por exemplo, além de cuidados permanentes contra insetos e
plantas daninhas durante aproximadamente três anos, quando, em condições normais, o
cacaueiros começava a frutificar. Porém, nos primeiros anos a frutificação era pequena e a
safra completa era alcançada quando a planta atingia idade de sete a oito anos98. Outrossim,
após se tornarem frutíferas as árvores continuam necessitando de cuidados especiais,
imprescindíveis para obtenção de uma boa colheita.
Milton Santos salienta que o cacaueiro pode atingir dez metros de altura e seu fruto,
ligeiramente oval, tem entre 20 e 25 centímetros de comprimento e aproximadamente 30 de
diâmetro. No seu interior encontram-se as amêndoas, em número de 20 a 30, estimando-se
que, em condições normais, cada árvore fornecia cerca de 3 quilos, com duas fases de
colheita: uma era a safra propriamente dita, que começava em agosto e a outra era o chamado
temporão, iniciado em março. O “paradeiro” é a fase entre janeiro e março99.

O cacau é colhido em podões amarrados em varas. Em seguida é arrumado


em pequenos montes que os lavradores chamam de bandeira, as quais,
reunidas, formam as rumas. Depois de embandeirado e junto o cacau é
quebrado, sendo os caroços conduzidos pelos tropeiros em caixas e no
lombo de burros, para os cochos de fermentação, onde ficam de 6 a 7 dias
[...] Depois de fermentado o cacau é levado para as barcaças, onde vai ser
posto a secar [...] em seguida é ele encaminhado para o depósito [...]100

Em linhas gerais, o processo que envolve o cultivo de cacaueiro e a produção de cacau


era demorado. Precisava-se abrir a mata, preparar as mudas, esperar crescerem, em seguida
plantá-las em terrenos apropriados, cuidar durante mais ou menos três anos para a árvore
começar a frutificar. Depois disso podiam contar com algo em torno de duas ou três colheitas
por ano, dependendo das oscilações climáticas, das enchentes dos rios e dos cuidados com as
plantações, fatores que interferiam diretamente nos resultados das safras.
Isso implicou na fixação permanente do homem à terra cultivada com cacau. Os que
tomavam a posse pura e simples da terra precisavam defendê-la, numa época em que as
divisas das propriedades não eram definidas, e precisavam legitimar a posse pela força.

97
BONDAR, Gregório. A cultura de cacao na Bahia. Instituto de Cacau da Bahia (ICB) – Boletim Técnico n 1º.
Empresa Gráfica da “Revista dos Tribunaes”. São Paulo: 1938. p. 126-142.
98
Ibidem.
99
SANTOS, Op. cit., p. 29.
100
Ibidem., p. 29-30.
45

Vale ressaltar que a comarca de Ilhéus não era a única região que produzia cacau,
assim como o Brasil também não era o único produtor mundial do fruto. É oportuno lembrar
que o cacau é originário da América e já era conhecido pelos Maias e Astecas antes da
colonização, sendo que esses povos cultuavam a planta e utilizavam as sementes como
moeda, com as quais produziam a bebida dos deuses, conhecida como chocolate101.
No período colonial a bebida foi incorporada aos hábitos de consumo dos europeus,
agregando valor ao fruto, que aos poucos foi se destacando nas exportações do Brasil. O
cacau também era cultivado há tempos nas regiões dos atuais México, Guatemala, Nicarágua,
Equador, Venezuela e Colômbia.
Ao longo do Oitocentos o plantio se estendeu para outros continentes, africano e
asiático. Em 1895, por exemplo, se destacam entre os produtores mundiais a Costa do Ouro
(atual Gana), Nigéria, Costa do Marfim, Fernando Pó e São Tomé, que juntos com outros
países africanos exportaram 7.777 toneladas, enquanto no mesmo ano os países asiáticos
exportaram 2.561 e os americanos 66.505 toneladas102. Assim, durante o século XIX a maior
parcela da produção mundial era da América.
No Brasil, outras províncias, além da Bahia, também se dedicavam à produção de
cacau para exportação, com destaque para Amazônia e Grão-Pará, localizadas na região
Norte. Foram essas regiões, juntamente com a Bahia, que contribuíram para tornar o Brasil
um dos maiores fornecedores mundiais do produto. No caso da comarca de Ilhéus esse
processo começou a se desenvolver durante a segunda metade do século XIX, intensificando-
se na última década desta centúria e atingindo auge nos primeiros decênios do século XX.
Vale advertir que este produto dependia exclusivamente da demanda externa, pois o
processamento das amêndoas e a fabricação do chocolate realizavam-se fora do Brasil.103
Assim, as exportações estavam sujeitas às oscilações do mercado externo, inclusive da
concorrência com outros países. Contudo, o cultivo do cacaueiro se disseminou no sul da
Bahia e muitas pessoas se interessaram em comercializar o fruto em Ilhéus.
Nessa época várias mercadorias industrializadas, provenientes da Europa e Estados
Unidos, eram desembarcadas na capital da Bahia e em outras partes do Império, sendo
despachadas para diversas regiões do interior e do litoral. Por outro lado, matérias primas

101
Ver, entre outros, MCNEIL, Cameron L. Chocolate in Mesoamerica: a cultural history of cacao. University
Press of Florida, 2006.
102
BONDAR, Gregório. A cultura de cacao na Bahia. Instituto de Cacau da Bahia (ICB) – Boletim Técnico n
1º. Empresa Gráfica da “Revista dos Tribunaes”. São Paulo: 1938. p. 22.
103
Segundo Gregório Bondar a “foi ao principiar do século XVII que o cacao fez sua entrada definitiva na
Europa. O seu uso começou a se generalizar na Espanha primeiramente, e dahi atravessou para a França e se
espalhou por toda parte. BONDAR, Gregório. Op. Cit., p. 16-17.
46

baratas, muitas das quais produzidas com o uso do trabalho escravo, eram enviadas para
Salvador e outros portos do Brasil, de onde eram despachadas para os países estrangeiros.
Esse processo de trocas comerciais se desenvolveu em Ilhéus durante a segunda metade do
século XIX. Antônio Fernando Guerreiro de Freitas percebeu esse mecanismo, que ele
denominou de formação da burguesia cacaueira, no entanto, o autor se concentrou no período
da Primeira República (1889-1930)104, ficando de fora de suas análises uma fase importante
desse processo, que será uma das questões abordadas em nossa tese, começando com a
investigação do mercado interno.

1.3 - O mercado interno. Ilhéus, 1850-1888

O mercado interno de Ilhéus ainda é pouco investigado pela historiografia, que


concentrou atenção na produção e comercialização do cacau, deixando de fora outros
produtos importantes. Nos próximos parágrafos analisamos o mercado interno de Ilhéus a
partir dos Livros de cobrança de impostos, particularmente os que tratam das atividades
internas, quais sejam: Livro de imposto sobre Casas de Negócios (1874-1892); Livro de
imposto sobre Gado Vacum abatido (1862-1879) e (1879-1888); Livro de imposto sobre
Gado Suíno abatido (1872-1885) e Livro de imposto sobre os rendimentos dos direitos de
madeiras (1862-1876)105.
Esses livros fazem parte de um conjunto de documentos relativos à fiscalidade da
Câmara, eles demonstram a atuação do poder público municipal no controle das atividades
praticadas, sobretudo na vila e suas imediações. Vale ressaltar que esta documentação não dá
conta de explicar toda a dinâmica dos produtos que circulavam no território da comarca, visto
que muitos produtos escapavam da fiscalização ou eram isentos de tributos.
De modo geral esses livros seguem basicamente um padrão de preenchimento, ou seja,
são assinados e rubricados pelo Presidente da Câmara, com termo de abertura e encerramento,
contendo no interior listas mensais com os nomes dos fornecedores ou exportadores dos
produtos no decorrer dos meses e ao longo dos anos, as quantidades e os impostos pagos.

104
FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro. Os donos dos frutos de ouro. Dissertação (Mestrado em Ciências
Sociais). ICS-UFBA. Salvador, 1979.
105
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre casas de negócios. Maço 5455. Ilhéus, 1874-1892;
Livro de imposto sobre gado vacum abatido. Maço 5442. Ilhéus, 1862-1879; Livro de imposto sobre gado vacum
abatido. Maço 5451. Ilhéus, 1879 – 1888; Livro de imposto sobre gado suíno abatido. Maço 5447. Ilhéus, 1872-
1885; Livro de Lançamento dos rendimentos relativos a direitos de madeira. Maço 5438. Ilhéus, 1862-1870.
47

1.3.1 - As casas de negócios. Ilhéus, 1874-1888

O Livro de imposto sobre casas de negócios foi aberto e assinado em setembro de


1874 pelo presidente da Câmara, Joaquim Pereira Caldas, sendo procurador, Francisco
Antônio de Salles Silva. Ele fornece listas anuais com os nomes dos negociantes que atuavam
em Ilhéus, na vila e nos distritos ou povoações das adjacências, no período 1874-1892106.
Para manter em funcionamento suas casas de negócios esses homens pagavam o valor
de Rs. 2$000 (dois mil réis) anuais de imposto municipal, tarifa que se manteve até abolição
da escravidão (1888). A documentação permite conhecer apenas os nomes dos proprietários e
o valor do imposto pago, sem discriminar as atividades econômicas praticadas.
No entanto, algumas constatações podem ser feitas a partir dessa documentação e do
cruzamento com as outras fontes, especialmente os inventários post mortem. Inicialmente
percebemos que houve expansão do número de casas de negócios ao longo dos anos, pois a
quantidade de nomes que aparecem nas listas aumenta no decorrer do tempo. Na lista de 1875
aparecem 14 negociantes que pagaram imposto, já na lista de 1890 esse número subiu para 35,
o que indica, em certa medida, crescimento das atividades comerciais.
Outro dado relevante é a frequência de membros da mesma família, que se destacam
entre os proprietários das casas de negócio. Embora a documentação não informe nada sobre
parentescos, os sobrenomes indicam o pertencimento a determinadas famílias, o que em
alguns casos pôde se confirmar confrontando com as informações dos inventários. Vamos
analisar alguns casos para ilustrar essa situação e explicar uma parte da dinâmica do mercado
interno de Ilhéus.
Luiz Adami, por exemplo, era negociante em Ilhéus e pagou imposto diversas vezes
para manter em funcionamento sua casa de negócio, até falecer, em março de 1887107.
Investigando seu inventário verificamos que ele era pai de outro importante negociante, José
Carlos Adami, dono da Loja e Armazém Guarany, com venda de variado sortimento de
fazendas, roupas, calçados, perfumaria, miudezas, além de gêneros alimentícios, bebidas de
todas as qualidades e ferragens, conforme nota em papel timbrado que ele apresentou ao juiz
no inventário de José Furtado da Silva, devedor da quantia de Rs. 201$760, referente a
compras realizadas na loja108.

106
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre casas de negócios. Maço 5455. Ilhéus, 1874-1892.
107
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Luiz Adami. Est. 03, Cx. 1372, Maço 1841, Doc. 18, 28 de maio
1887.
108
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. José Furtado da Silva. Est. 03, Cx. 1298, Maço 1767, Doc. 05,
22 de nov. 1882.
48

Outros membros dessa família aparecem no livro de impostos indicando que eles eram
negociantes influentes em Ilhéus. Domingos Adami de Sá, era coletor da mesa de rendas
provinciais, responsável pela arrecadação dos impostos provinciais, ele não aparece entre os
negociantes que pagaram impostos, mas é filho de Luiz Adami. Outro membro dessa família
que localizamos como dono de casa de negócio foi João Batista Adami, que pagou imposto
para manter seu estabelecimento funcionando. Ao que parece, posteriormente eles montaram
uma firma, Luiz Adami & Filho, como consta no referido Livro de cobrança de impostos.
José Joaquim da Costa Seabra, aparece entre os donos de casas de negócio, além de
Emilio José Seabra. Um membro dessa família, Joaquim José da Costa Seabra, faleceu em
1856 e era negociante em Ilhéus, oferecendo crédito a diversas pessoas da vila e arredores,
além de possuir um barco109. Posteriormente eles também montaram uma firma, Seabra Filho
& Cia110.
Caetano Lafeme também atuou como negociante em Ilhéus na segunda metade do
século XIX. Quando Carlos Stephani Hohlenwegner faleceu, em 1886, Caetano apresentou ao
juiz a dívida que o finado tinha na Loja e Armazém Caetano Lafeme, situado na rua da matriz
nº 9, que vendia fazendas, miudezas, calçados, roupas, molhados, ferragens e drogas, além de
comprar cacau e outros gêneros dos lavradores locais, como consta na nota. Entre os artigos
consumidos encontramos garrafas de conhaque, caixas de charutos, côvados de chitas,
fechaduras, latas de manteiga, além de dinheiro que Carlos Stephani tomava emprestado ao
negociante111. Tudo indica que este negociante fornecia crédito à população e recebia como
pagamento gêneros da lavoura.
Adão Schaum foi outra pessoa que se destacou naquele contexto. Casado com dona
Helena Lavigne Schaum, eles eram donos de uma padaria em Ilhéus quando ele faleceu em
1886, além de possuírem casa de farinha, quatro escravos e outros bens112.
Domingos José de Lemos é outro negociante que aparece com frequência no Livro de
cobrança de impostos sobre casas de negócio. José Antônio Coutinho, produtor de cacau,
comprava diversos gêneros na loja dele antes de falecer em 1869, a exemplo de fumo, carne,

109
Sobre este negociante ver, SANTOS, Leandro Dias dos; SANTOS, Zildemar Alves; DIAS, Marcelo
Henrique. Mecanismo de acesso ao crédito na vila de Ilhéus na primeira metade do século XIX: o caso de
Joaquim José da Costa Seabra. Revista de História Econômica & Economia Regional Aplicada. Juiz de Fora,
v.7, n. 12, jan./jun. 2012.
110
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Joaquim José da Costa Seabra. Est. 08, Cx. 3424, Doc. 06, 17 de
set. 1856.
111
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Carlos Stephani Hohlenwegner. Est. 02, Cx. 762, Maço 1228,
Doc. 10, 20 de abr. 1886.
112
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Adão Schaum. Est. 02, Cx. 781, Maço 1248, Doc. 02, 05 de nov.
1877.
49

bolacha, garrafas de vinho, açúcar branco, farinha, sabão, sal, pólvora, dentre outros artigos,
que eram pagos com cacau e café113. Nessa conta, referente a compras realizadas entre
dezembro de 1866 e março de 1869, uma garrafa de vinho custou Rs. $640; de cachaça Rs.
$160; de aguardente de cana Rs. $200; (½ kg) de fumo Rs. $200; (1 kg) de açúcar branco Rs.
$200; um Alqueire (36,2 litros) de farinha Rs. 1$800; (½ Kg) de bolacha Rs.$200; uma arroba
de carne Rs. 6$600. Em contrapartida o negociante pagava Rs. 3$200 (três mil e duzentos
réis) por cada arroba de cacau do lavrador.
Pedro Gonçalves de Vasconcelos Gusmão vendia secos e molhados em sua casa de
negócio, além de aviamentos, ferramentas agrícolas, utensílios domésticos e materiais de
construção. Quando este negociante faleceu, em 1881, devia à Pharmacia Ilheense diversos
medicamentos que utilizou no tratamento de sua moléstia, como papeis diuréticos, óleo de
fígado de bacalhau, garrafas de magnésio lefort, pílulas anti-intermitentes do Dr. Devay,
tintura de iodo, vinho quinium de labarraque, entre outros.114
Infelizmente não conseguimos localizar o inventário de todos os negociantes, mas
pelos exemplo mencionamos notamos que a vila de Ilhéus era dotada de comércio interno
ativo, sendo possível contabilizar no Livro de cobrança de imposto sobre casas de negócio
pelo menos uma centena de negociantes espalhados na vila e na zona rural, indicando a
presença do capital comercial atuando em Ilhéus na segunda metade do século XIX115.
Ao que parece esses negociantes compravam mercadorias industrializadas: bebidas,
fumos, medicamentos, pólvora, chumbo, ferramentas, materiais de construção, utensílios
domésticos, vestuários, dentre outros artigos, revendendo-os no mercado interno de Ilhéus.
Constatamos que alguns tinham ligação com a praça de Salvador e uma parte deles recebia
cacau e outros produtos da lavoura como pagamento das dívidas contraídas em seus
estabelecimentos.
As relações entre os negociantes e a população eram diversificadas. No geral os
produtores de cacau podiam contar com apenas duas colheitas por ano, ficando desabastecidos
durante a entre safra, tendo que recorrer às casas de negócio para suprir suas demandas
básicas de sobrevivência. O preço das mercadorias que vinham da capital não devia ser baixo,
dado os custos com transporte e pagamento de impostos. Mesmo assim os negociantes
vendiam a prazo para muita gente, inclusive esravizados e indígenas, e recebiam como

113
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. José Antônio Coutinho. Est. 02, Cx. 741, Maço 1206, Doc. 02,
13 de abr. 1869.
114
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Pedro Gonçalves de Vasconcelos Gusmão. Est. 02, Cx. 757,
Maço 1223, Doc. 03, 05 de mar. 1881.
115
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre casas de negócios. Maço 5455. Ilhéus, 1874-1892.
50

pagamento aluguéis de escravos, aluguéis de bois para serviços, além dos produtos da
lavoura.
Essas relações se espalharam por diversos lugares da comarca. O Alferes Acrísio
Januário Cardoso, por exemplo, era negociante estabelecido na Cachoeira de Itabuna, distante
cerca de 30km de Ilhéus, tinha a posse de sete escravos e uma plantação de 4.155 pés de
cacau, entre outros bens declarados no inventário, aberto em 1877, por ocasião da sua
morte116. Encontramos outros casos semelhantes, indicando que os negociantes estavam
acompanhando o crescimento da lavoura cacaueira, oferecendo crédito aos lavradores.
É oportuno lembrar que encontramos no Livro de imposto sobre casas de negócio
nomes de pessoas “consagradas” como fundadoras do município de Itabuna, como José
Firmino Alves e Henrique Alves dos Reis117. Na segunda metade do século XIX esse distrito
se tornou um dos principais núcleos de atração populacional devido às condições naturais
favoráveis ao desenvolvimento da lavora cacaueira. Certamente muitos negociantes
perceberam isso e aumentaram suas riquezas com a venda de produtos em suas casas de
negócio.
Antônio Fernando Guerreiro de Freitas não aprofundou o estudo dessas relações no
período 1850-1888, mas talvez ele não estivesse equivocado quanto aos grupos que mais se
beneficiaram com a expansão da lavoura cacaueira.

Desde as primeiras roças e logicamente com a ampliação da área cultivada e


do volume da produção se fez presente de forma decisiva a classe agro-
comercial através de seus agentes, prontos a financiar os "fregueses", com
operações financeiras justificadas pela falta de crédito[...]118

116
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Alferes Acrisio Januário Cardoso. Est. 03, Cx. 1298, Maço 1767,
Doc. 08, 21 de abr. 1877.
117
APEB, SCP, Maço 5455. Livro de imposto sobre Casas de Negócio. Ilhéus, 1874-1892. Para uma discussão
da História de Itabuna ver, SILVA, Ayalla Oliveira. Camacãs, guerens, pataxós e o aldeamento São Pedro de
Alcântara: trabalho, relações interétnicas e ocupação do território de Cachoeira de Itabuna, Sul da Bahia (1814-
1877). Dissertação (Mestrado em História). ICHS-UFRRJ. Rio de Janeiro, 2015. (Cap. I – Nem tudo era
sergipano: a escrita do mito pioneiro e invizibilização indígena nas origens de Itabuna).
118
FREITAS, Op. cit., p. 14.
51

1.3.2 - O gado vacum abatido. Ilhéus, 1864-1888

Art. 66. § 9º Só nos matadouros públicos, ou particulares, com licença das


Camaras, se poderão matar, e esquartejar as rezes, e calculado o arrobamento
de cada uma rez, estando presente os exactores dos direitos impostos sobre a
carne; permitir-se-há aos donos dos gados conduzi-los depois de
esquartejados, e vende-los pelos preços que quiserem, e aonde bem lhe
convier, contanto que o façam em lugares patentes, em que a Camara possa
fiscalizar a limpeza, e salubridade dos talhos, e da carne, assim como a
fidelidade dos pesos119.

A carne bovina era um dos produtos que integrava a dieta da população da comarca de
Ilhéus. A Câmara Municipal registrou o tributo sobre o Gado Vacum abatido em dois livros.
O primeiro abrange o período 1862-1879, e o segundo 1879-1888. Como são
cronologicamente complementares, optamos por realizar uma análise conjunta dos mesmos, o
que facilita a apresentação dos dados e permite uma visão global do fenômeno no período
(1864-1888)120.
A análise desta documentação permite inferir que a pecuária extensiva não foi uma
atividade econômica que se destacou em Ilhéus durante a segunda metade do século XIX.
Entre os inventariados encontramos pequenas criações e no Livro de cobrança de impostos
constam poucos abatimentos de bois. No entanto, devemos considerar que uma parte devia
escapar da fiscalização municipal.
No geral cada pessoa abatia apenas um animal por mês e as listagens dos fornecedores
não são extensas. Assim, por exemplo, em fevereiro de 1864 houve registro de cobrança de
imposto de apenas dois abastimentos, um realizado no dia 14 e outro no dia 20.
De acordo com o Livro de impostos no ano de 1864 foram abatidos apenas 48 animais,
porém, no decurso do período a tendência foi de crescimento desse número, o que pode ser
reflexo do aumento da fiscalização. Como mostra o Gráfico 1.2.

119
Brasil, Lei de 1º de outubro de 1828. Da nova forma às Camaras Municipais, marca suas atribuições, e o
processo para a sua eleição e dos juízes de paz. Título II – Funções municipais. Art. 66. In: Coleção de Leis do
Império do Brasil, 1808-1889. Disponível em: <https://www2.camara.leg.br/atividade-
legislativa/legislacao/doimperio>. Acesso em: 25 maio 2016.
120
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre gado vacum abatido. Maço 5442. Ilhéus, 1862-1879;
Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre gado vacum abatido. Maço 5451. Ilhéus, 1879-1888.
52

Gráfico 1.1 – Gado vacum abatido. Ilhéus, 1864-1888


200
180
160
140
120
100
80
60
40
20
0

1876
1864
1865
1866
1867
1868
1869
1870
1871
1872
1873
1874
1875

1877
1878
1879
1880
1881
1882
1883
1884
1885
1886
1887
1888
Fonte: APEB, SCP. Maços 5442 e 5451. Câmara de Ilhéus. Imposto sobre Gado Vacum abatido.
Ilhéus, 1864-1888.

O Gráfico 1.1 permite identificar as variações nas quantidades de gado vacum abatido
em Ilhéus no período 1864-1888. No primeiro Livro (1864-1879) encontramos o total de 923
bois abatidos, no segundo (1879-1888) esse número subiu para 1.035. O ano em que houve
maior número de abatimentos foi 1880, com 175 bois abatidos; por outro lado, a menor cifra
foi registrada em 1886, quando apenas 3 animais foram abatidos. As médias mensais
oscilaram entre o mínimo de 4,2 e o máximo de 15 abatimentos.
A análise desta documentação permite afirmar que nesse período não houve
regularidade no fornecimento de carne bovina em Ilhéus, pois ocorreram muitas oscilações.
Poucos meses mantiveram a frequência, com lacuna notória em 1886, quando apenas 3
animais foram abatidos em janeiro, ficando os demais meses deste ano sem registros, não
sabemos por quais motivos. Além deste caso o Gráfico 1.1 demonstra variações significativas
ao longo do período.
Ao que parece a carne bovina era vendida nas diversas feiras e casas de negócios
espalhadas por Ilhéus na segunda metade do século XIX. Não encontramos nos Livros de
cobrança de impostos, nem nos inventários post mortem, referências a matadouro público,
mas é possível que existisse, já que a Câmara controlou a atividade.
Ademais, como já frisamos, muitos abatimentos podiam ser realizados no interior das
fazendas, sítios e roças espalhados pelo município, longe da fiscalização municipal, assim,
talvez a documentação esteja refletindo os abatimentos realizados no matadouro público
localizado nas proximidades da vila, mas a documentação não revela nada sobre o assunto.
53

Provavelmente o abatimento dos animais era realizado por trabalhadores escravizados,


homens libertos ou livres pobres, que extraiam o couro, separavam as partes e entregavam aos
negociantes compradores dos bois, que compravam o animal vivo e pagavam os impostos
para ter o direito de comercializar a carne em Ilhéus.
Os principais fornecedores de gado vacum abatido em Ilhéus eram negociantes, donos
de casas de negócio, membros da elite econômica. Contudo, pessoas menos abastadas também
deviam participar do negócio, desde que pagassem os impostos.
A Tabela 1.4 apresenta os principais fornecedores de gado vacum abatido em Ilhéus.

Tabela 1.4 - Principais fornecedores do gado vacum abatido. Ilhéus, 1864-1888


Animais
Fornecedores Registros Imposto Pago
abatidos
Nomes Nº % Nº % Nº % (em réis) %
Sebastião Egídio de Lemos 1 0,3 198 10,0 199 10,0 165.340 9,8
Plínio Cardoso do Nascimento 1 0,3 187 9,6 187 9,5 153.340 9,0
Egídio Geraldo de Lemos 1 0,3 185 9,5 185 9,4 179.060 10,5
Manoel Rodrigues de Moura 1 0,3 118 6,0 121 6,2 103.720 6,1
Antônio Victorio 1 0,3 91 4,7 91 4,7 79.120 4,7
Manoel Bernardino de Lemos 1 0,3 74 3,8 74 3,8 66.800 3,9
Demais fornecedores 329 98,2 1.102 56,4 1.108 56,4 952.260 56,0
Total 335 100,0 1.955 100,0 1.965 100,0 1.699,640 100,0
Fonte: APEB, SCP. Maços 5442 e 5451. Câmara de Ilhéus. Imposto sobre Gado Vacum abatido. Ilhéus, 1864-
1888.

Os membros da família Lemos se destacam no fornecimento do gado vacum abatido


em Ilhéus. Sebastião Egídio de Lemos, Egídio Geraldo de Lemos e Manoel Bernardino de
Lemos deviam ser parentes. Não encontramos referência direta sobre essas três pessoas, mas
um integrante da família, Domingos José de Lemos, aparece listando três escravos para
concorrerem à libertação pelo fundo de emancipação. Além de possuir escravos ele também
era negociante, seu nome aparece várias vezes entre os pagantes do imposto sobre casas de
negócios121.
Outro importante fornecedor do gado vacum abatido em Ilhéus, Plínio Cardoso do
Nascimento, também era negociante, e pagou impostos diversos anos para manter em
funcionamento sua casa de negócios122. Não encontramos seu inventário e o seu nome não
aparece no Livro de classificação dos escravos. Quanto aos demais fornecedores constantes na
Tabela 1.4 não encontramos pistas sobre eles.

121
APEB, SCP, Maço 5455. Livro de imposto sobre Casas de Negócio. Ilhéus, 1874-1892.
122
Ibidem.
54

Afora essas pessoas, que aparecem com maior frequência na documentação,


identificamos muita gente participando do negócio envolvendo abatimento de gado bovino em
Ilhéus, inclusive mulheres. Dona Ana Maria Velozo, Dona Helena Lavigne Shaum (esposa do
negociante Adão Schaum), Thomazia Maria dos Santos e Sebastiana dos Prazeres Dias, por
exemplo, fazem parte de uma minoria, mas que também participavam da atividade.
Certamente elas compravam bois para serem abatidos, vendendo a carne nas casas de
negócios ou colocando seus escravos para realizarem o serviço.
Algumas pessoas aparecem ao mesmo tempo realizando abatimentos de bois e
classificando escravo para concorrerem à libertação. José Carlos Adami, por exemplo,
apresentou o escravo Estevão para possível libertação, era dono de casa de negócio e forneceu
um boi para abatimento em Ilhéus no dia 10 de outro de 1885123.
Esses exemplos, entre outros casos, permitem inferir que homens e mulheres
escravizados em Ilhéus também trabalhavam nas casas de negócios, vendendo carne bovina.
Os homens podiam realizar o abatimento e a separação das partes do animal, as mulheres
salgamento e venda da carne nas feiras e casas de negócios.
De todo modo a carne bovina, especialmente as partes privilegiadas do boi, devia
custar caro e o acesso a este alimento devia ser restrito aos grupos abastados. Os custos com
abatimento, retirada do couro, separação das partes, salgamento, transporte e armazenamento
deviam gerar despesas aos fornecedores, o que possivelmente fazia aumentar o preço. Por
cada boi abatido pagava-se o imposto de Rs. $820, mas no último ano, 1888, essa cifra
aumentou para Rs.1$000124. Ademais a Lei estabelecia que o dono do gado podia vender a
carne pelo preço que quisesse125. Assim, a população livre pobre, escravizados e líberos
deviam consumir as partes menos privilegiadas do animal.

123
APEB, SCP. Livro de imposto sobre Gado Vacum abatido. Maço 5442 (1862-1879); Maço 5451 (1879-
1888); APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos pelo fundo de emancipação. Lv.
7008. Ilhéus, 1874-1886.
124
APEB, SCP. Livro de imposto sobre Gado Vacum abatido. Maço 5442 (1862-1879); Maço 5451 (1879-
1888)
125
Brasil, Lei de 1º de outubro de 1828. Da nova forma às Camaras Municipais, marca suas atribuições, e o
processo para a sua eleição e dos juízes de paz. Título II – Funções municipais. Art. 66. In: Coleção de Leis do
Império do Brasil, 1808-1889. Disponível em: <https://www2.camara.leg.br/atividade-
legislativa/legislacao/doimperio>. Acesso em: 25 maio 2016.
55

1.3.3 - O gado suíno abatido. Ilhéus, 1872-1885

A carne de porco foi outro produto que integrou a dieta da população de Ilhéus. O
livro que serviu para o registro do imposto relativo ao gado suíno abatido revela um
fornecimento muito pequeno deste tipo de carne126. Ao longo do período, que compreende
aproximadamente 14 anos, foram registrados o abatimento de apenas 156 animais, perfazendo
uma média de 13 suínos abatidos por ano, cifra muito baixa tendo em vista o tamanho da
população, 5.682 habitantes em 1872127. O Gráfico 1.2 mostra a variação do abatimento de
suínos em Ilhéus entre 1872 e 1885.

Gráfico 1.2 – Gado suíno abatido. Ilhéus, 1872-1885


30

25

20

15

10

Fonte: APEB, SCP. Maço 5447. Câmara de Ilhéus. Imposto sobre Gado Suíno abatido.
Ilhéus, 1872- 1885.

O Gráfico 1.2 demonstra as variações nas quantidades de gado suíno abatido. O ano
com maior número de registro foi 1874, com o total de 28 suínos abatidos. Nos anos seguintes
as quantidades declinaram de forma acentuada, chegando a não ocorrer registros em 1881 e
1882. A partir daí o número de abatimentos voltou a crescer, mas sem alcançar o nível de
antes, pelo menos até onde foi possível investigar.
Todavia, como salientamos anteriormente em relação ao gado bovino, esse número
certamente não revela o real consumo de carne suína no território da comarca,
correspondendo apenas ao que era controlado pela Câmara, o que provavelmente se refere aos

126
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre gado suíno abatido. Maço 5447. Ilhéus, 1872-1885.
127
Recenseamento Geral do Império do Brazil de 1872. Disponível em: <http://www.biblioteca.ibge.gov.br>.
Acesso em 15 de fev. 2018.
56

animais que eram abatidos e vendidos nas casas de negócios espalhadas na vila e seu termo.
Os moradores das diversas fazendas, roças e sítios distantes da vila poderiam ter pequenas
criações de suínos, abatendo-os em locais que escapavam do controle da Câmara e da
fiscalização.
Ademais, os fornecedores de carne suína de Ilhéus pagavam tributos que
provavelmente fazia aumentar o preço da carne. Também é importante ressaltar os custos que
incidiam no processo de abatimento, separação das partes do porco, salgamento, transporte e
armazenamento da carne. A Tabela 1.5 apresenta os principais fornecedores do gado suíno
abatido em Ilhéus.

Tabela 1.5 – Principais fornecedores do gado suíno abatido. Ilhéus, 1872-1885.


Animais
Fornecedores Registros Imposto Pago
abatidos
Nomes Nº % Nº % Nº % (em réis) %
José Carlos Leopoldo Valet 1 1,3 32 20,6 32 20,5 10,240 20,3
João Batista de Pena Matos 1 1,3 10 6,5 10 6,4 3,200 6,3
Manoel Rodrigues de Moura 1 1,3 10 6,5 11 7,0 3,520 7,0
Claudino José de Oliveira 1 1,3 5 3,2 5 3,2 1,600 3,2
Demais fornecedores 73 94,8 98 63,2 98 62,9 31,900 63,2
Total 77 100,0 155 100,0 156 100,0 50,460 100,0
Fonte: APEB, SCP. Maço 5447. Câmara de Ilhéus. Imposto sobre Gado Suíno abatido. Ilhéus, 1872- 1885.

José Carlos Leopoldo Vallet foi o mais importante fornecedor do gado suíno abatido
em Ilhéus no período, responsável por 20,5% de todos abatimentos. Não localizamos seu
inventário, mas ele consta no Livro de imposto sobre casa de negócio, assim, constatamos que
ele era negociante128, mas não apresentou escravos no Livro de classificação para libertação.
Ademais, ele aparece como um dos credores do Tenente Cândido Narciso Soares, que lhes
devia a quantia de Rs. 6$320 quando faleceu em 1869129, e de Lúcio Antônio Brandão, que
lhe devia o valor de Rs.32$000, proveniente de gêneros comprados em sua loja130.
Manoel Rodrigues de Moura aparece entre os principais fornecedores do gado suíno
abatido em Ilhéus e também se destacou entre os fornecedores de gado vacum131. Não
localizamos o seu inventário, ele também não consta no Livro de imposto sobre casa de

128
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre casas de negócios. Maço 5455. Ilhéus, 1874-1892.
129
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Tenente Cândido Narciso Soares. Est. 03, Cx. 1270, Maço 1739,
Doc. 1, 01 de jan. 1869.
130
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Lúcio Antônio Brandão. Est. 02, Cx. 740, Maço 1205, Doc. 6,
22 de fev. 1871.
131
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre gado suíno abatido. Maço 5447. Ilhéus, 1872-1885;
APEB, SCP. Livro de imposto sobre Gado Vacum abatido. Maço 5442 (1862-1879); Maço 5451 (1879- 1888).
57

negócio e nem no Livro de classificação dos escravos. Claudino José de Oliveira foi outro
importante fornecedor de gado suíno de Ilhéus. Faleceu em outubro de 1880, era dono
Fazenda Mapendi, com três escravos, um boi do serviço e uma plantação de mandioca, entre
outros bens132.
Embora algo em torno de 37% do fornecimento de gado vacum estivesse concentrado
não mãos de quatro pessoas, muita gente participava da atividade. Mais uma vez, destacamos
a presença de mulheres, ainda que minoria. Dona Maria Saraiva, Dona Alifan Dimas Lessa,
Perpétua Felicidade dos Santos, Ana Bernardes Gomes, Joana Maria da Conceição e Joana
Maria Dantas, foram mulheres que pagaram imposto pelo abatimento de gado suíno em
Ilhéus133.
Afora essa peculiaridade, diversas pessoas participavam dessa atividade e algumas
possuíam escravos. Adão Schaum, por exemplo, era comerciante, pagou imposto sobre sua
casa de negócio134, forneceu gado vacum e suíno para serem abatidos na vila e registrou
quatro escravos no Livro de classificação135. Existem outros exemplos semelhantes, indicando
que certamente os escravos e as escravas trabalhavam nas atividades relacionadas com a
venda de carne bovina e suína, dentre outros setores da economia de Ilhéus.

1.3.4 - A exploração de madeiras. Ilhéus, 1863

Poderemos plantar nossos arrozes onde quisermos, e em qualquer brejo, sem


que para isso peçamos licença, e poderemos cada um tirar jacarandás ou
qualquer pau sem darmos parte para isso136.

Quando os escravos do Engenho Santana reclamaram o direito de explorar madeiras,


certamente o fizeram sabendo que era uma atividade rentável, que poderia gerar boas
economias. Não por acaso, desde o período colonial a Coroa portuguesa tentou controlar a
exploração das matas da capitania de Ilhéus, como demonstram os estudiosos do assunto137.

132
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Claudino José de Oliveira. Est. 02, Cx. 740, Maço 1205, Doc. 6,
22 de fev. 1871.
133
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre gado suíno abatido. Maço 5447. Ilhéus, 1872-1885
134
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre casas de negócios. Maço 5455. Ilhéus, 1874-1892.
135
APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos pelo fundo de emancipação. Lv. 7008.
Ilhéus, 1874-1886.
136
Tratado de paz proposto pelos escravos do Engenho Santana de Ilhéus em 1789. In: SCHWARTZ, Stuart.
Escravos, roceiros e rebeldes. Tradução Jussara Simões. Bauru, SP: EDUSC, 2001. p. 119-121.
137
Ver, entre outros, DIAS, Marcelo Henrique. Farinha, madeiras e cabotagem: a capitania de Ilhéus no antigo
sistema colonial. Ilhéus: Editus, 2011. DEAN, Warren. A ferro e fogo. A história e a devastação da Mata
Atlântica. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.
58

Nessa seção analisaremos a exploração de madeiras em Ilhéus na década de 1860,


quando a Câmara de Ilhéus cobrou tributos pelo direito de praticar a atividade exploratória,
registrando em livro próprio os dados sobre as pessoas envolvidas, como nomes, quantidades,
tipos de madeira e o valor do imposto pago138.
O Livro abrange o período 1862-1876, mas somente os três primeiros anos foram
utilizados para registrar o imposto sobre exploração de madeiras, nos demais o procurador
registrou o tributo da décima urbana139. Desse modo, ficamos com a possibilidade de analisar
um período restrito, isto é, outubro de 1862 até março de 1864, sendo que 1863 é o único ano
completo, com dados relativos a todos os meses, por isso concentramos nossa atenção nele.
Os registros revelam a diversidade de madeiras exploradas na mata atlântica. Em
janeiro de 1863, por exemplo, cinco pessoas pagaram o tributo: Antônio Dias dos Santos
pagou Rs. 11$587 pela exploração de 71 paus de jacarandá; Domingos Cristaino Alves pagou
Rs. 1$000 pela exploração de 12 paus de cedro e Rs. $500 pela exploração de 6 paus de
jangada; João Florêncio Maceió pagou Rs. 2$004 pela exploração de 12 paus de jacarandá e
Manuel Eugênio dos Santos pagou Rs. 4$814 pela exploração de 58 paus de cedro140.
Outras madeiras, menos frequentes na documentação, foram louro e condurú, além das
caixarias e tabuados. Nesse mesmo ano (1863) Domingos Cristaino Alves pagou Rs. 4$585
pela exploração de 55 paus de condurú; Antônio G. Santiago pagou Rs. 8$000 pela
exploração de uma dúzia de louro; Jose Pereira de Andrade pagou Rs. 2$800 pela exploração
de 28 carradas de caixaria; e o capitão Ernesto de Sá pagou Rs. 40$000 pela exploração de 40
dúzias de tabuado141.
A quantidade de nomes que aparece nas listas mensais variou bastante. O maior
número de registros ocorreu em dezembro (20 registros), e em junho apenas um nome foi
lançado no livro. De todo modo, percebemos uma intensa exploração de madeiras, com
muitas pessoas envolvidas no negócio, inclusive escravistas. A Tabela 1.6 mostra uma parte
das madeiras exploradas em Ilhéus no ano de 1863.

138
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de Lançamento dos rendimentos relativos a direitos de madeira. Maço
5438. Ilhéus, 1862-1870.
139
No catálogo do APEB a data correspondente a este livro é 1862-1870, porém, ao consultar o documento
percebemos que ele se estende até 1876, por isso nas citações mantivemos a data do período correto, 1862-1876.
Ademais, constatamos que a partir de 1864 o procurador lançou o tributo relativo à décima urbana pois a palavra
décima passa a ser usada ao lado dos nomes das pessoas tributadas, com diferenças nominais notória entre os
dois grupos, isto é, exploradores de madeira e pagadores do imposto da décima urbana.
140
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de Lançamento dos rendimentos relativos a direitos de madeira. Maço
5438. Ilhéus, 1862-1870.
141
Ibidem.
59

Tabela 1.6 – Relação das madeiras exploradas. Ilhéus, 1863


Tipos de Madeiras Unidades Quantidade
Jacarandá Paus 1.226
Cedro Paus 1.061
Jangada Paus 228
Condurú Paus 55
Tabuados Dúzia 43
Louro Dúzia 1
Louro Tábuas 72
Caixaria Carradas 234
Fonte: APEB, SCP, Maço 5438, Câmara de Ilhéus: lançamento dos
rendimentos relativos a direito de madeira, 1862-1876.

A principal madeira explorada em 1863 foi o jacarandá (1.226 paus), seguida por
cedro (1.061 paus), como demonstra a Tabela 1.6. Se cada pau for uma árvore derrubada,
calculamos que neste ano houve desmatamento de pelo menos 2.570 plantas, incluindo, além
das mencionadas, os paus de jangada e condurú.
Ao que parece boa parte do jacarandá era proveniente da Cachoeira de Itabuna,
terceiro distrito de Ilhéus. Embora o livro não traga informação sobre a origem das madeiras,
muitos inventários post mortem de moradores deste distrito se referem ao lugar denominado
jacarandá, ou jacarandá de dentro, o que pode ser uma referência, ou pelo menos uma pista, a
respeito de uma das áreas de exploração. Ademais, o rio Cachoeira serviu como uma das
principais entradas para a expansão da lavoura cacaueira em Ilhéus, sendo que a exploração
das matas para abertura das roças de cacau acompanhou esse processo. Vale ressaltar que
esses dados se referem apenas ao que era controlado pela Câmara, outra parte devia escapar
da fiscalização.
Os principais exploradores de madeira encontram-se na Tabela 1.7. É importante
salientar que cada registro no livro continha quantidades e qualidades variadas de madeiras,
por isso optamos por apresentar apenas os nomes das pessoas com maior frequência no livro,
sem descrever todos os tipos de madeiras que elas exploraram.
60

Tabela 1.7 - Principais exploradores de madeiras. Ilhéus, 1863


Exploradores de madeira Registros Imposto Pago
Nomes Nº % Nº % (em réis) %
Antônio da Cruz R. Leitão 1 3,6 9 10,0 33.998 9,5
José Pereira de Andrade 1 3,6 9 10,0 9.383 2,6
Antônio Pedro dos Santos 1 3,6 8 9,0 67.419 18,8
Domingos [Critaino Alves] 1 3,6 8 9,0 41.580 11,6
José Ignácio da Silva 1 3,6 6 6,5 6.716 2,0
Demais exploradores 23 82,0 50 55,5 198.672 55,5
Total 28 100,0 90 100,0 357.768 100,0
Fonte: APEB, SCP, Maço 5438, Câmara de Ilhéus: lançamento dos rendimentos relativos a
direitos de madeira, 1862-1876.

A Tabela 1.7 demonstra que cinco pessoas se destacaram entre os exploradores de


madeira, que juntos foram responsáveis por 44,5% dos registros. Antônio da Cruz Rabelo
Leitão era negociante, seu nome consta no livro de imposto sobre casas de negócio, sendo que
ele foi um dos que mais explorou jacarandá e cedro. José Pereira de Andrade, também era
negociante, e explorou, principalmente, tábuas de louro, paus de jangadas e caixarias142.
Os valores dos tributos variavam de acordo com o tipo de madeira. Sobre cada pau de
jacarandá cobra-se, aproximadamente, Rs. $167; de cedro, jangada ou condurú Rs. $083; por
cada dúzia de tabuado Rs.1$000 e por cada tábua de louro Rs.$083.
De modo geral, os tributos que incidiam sobre essa atividade não eram baixos, mas
certamente os ganhos compensavam o pagamento. Não conseguimos investigar os Livros de
Notas do Cartório de Ilhéus, que podem fornecer os preços venais dessas madeiras. Todavia,
alguns inventários contêm informações sobre madeiras, com preços de avaliação delas, o que
pode ser útil para uma análise, ainda que superficial, da relação custo benefício.
Em 1874, por exemplo, foi aberto o inventário do produtor de cacau Thomas Dias dos
Inocentes, que morava na Cachoeira de Itabuna, onde tinha uma dúzia de madeira cedro,
ainda na mata, avaliada em Rs. 12$000143, sendo que em 1863 a Câmara cobrou Rs. 1$000
pela exploração desta mesma quantidade de cedro.
O Tenente Cândido Narciso Soares, dono da Fazenda Caldeiras, entre outras
propriedades, tinha sete escravos e 40 carradas de caixarias, entre outros bens, cada uma

142
Ver APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre casas de negócios. Maço 5455. Ilhéus, 1874-
1892.
143
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Thomas Dias dos Inocentes. Est. 02, Cx. 738, Maço 1203, Doc.
5, 18 de ago. 1874.
61

avaliada em Rs. 9$000 e todas por Rs. 360$000144. Em 1863 o imposto sobre cada carrada
era de Rs.$100. Na Fazenda Piratiquesse, em 1878, cada tábua de louro foi avaliada em Rs.
1$280145, e o tributo cobrado em 1863 era de Rs. $083 sobre cada tabua explorada146. Esses
exemplos indicam que a exploração de madeira era uma atividade rentável.

***

Nesse capítulo ressaltamos algumas mudanças que ocorreram no território da comarca


de Ilhéus no período 1850-1888. As nossas análises buscaram salientar a presença de
indígenas, quilombos e escravos na população, bem como o avanço do processo de ocupação
e exploração do território.
Para além dessas questões avançamos nas análises sobre a fiscalidade e o mercado
interno de Ilhéus. A nosso ver essa foi a principal contribuição do primeiro capítulo da tese.
Existe um debate sobre a presença da escravidão na economia cacaueira que ainda não está
encerrado. A historiadora Mary Ann Mahony foi pioneira nessa discussão e suas análises
buscam evidenciar que o cacau foi um produto economicamente muito importante para o sul
da Bahia na segunda metade do século XIX, atraindo para Ilhéus várias famílias interessadas
em cultivar o fruto e que para isso recorreram ao trabalho escravo.
As nossas análises mostraram que naquele contexto o cacau ainda não tinha se tornado
uma mercadoria importante na pauta das exportações da Bahia. Mesmo assim houve expansão
das atividades econômicas naquele território e acreditamos que os engenhos de açúcar foram
os empreendimentos mais atraentes. Embora até aqui não tenhamos fornecido dados sobre os
engenhos e a produção de açúcar, Bert J. Barickmam demonstrou que o açúcar continuou
sendo o principal produto da economia da província até a véspera da abolição147.
O referido autor salienta que os engenhos se expandiram para o sul da província
durante a primeira metade do Oitocentos e o café também se tornou produto de valor
econômico considerável148. Por outro lado, o cultivo do cacau ainda estava em posição

144
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Tenente Cândido Narciso Soares. Est. 03, Cx. 1270, Maço 1739,
Doc. 1, 01 de out. 1869.
145
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Capitão Pascoal Gonçalves de Paiva. Est. 02, Cx. 750, Maço
1216, Doc. 13, 17 de set. 1878.
146
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de Lançamento dos rendimentos relativos a direitos de madeira. Maço
5438. Ilhéus, 1862-1870.
147
BARICKMAN, Bert J. Até a véspera: o trabalho escravo e a produção de açúcar nos engenhos do Recôncavo
baiano (1850-1881). Afro-Ásia. Salvador, n. 21-22, p. 177-238, 1998-1999.
148
BARICKMAN, Bert J. Um contraponto baiano: açúcar, fumo, mandioca e escravidão no Recôncavo, 1780-
1860. Tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.
62

secundária se comprado ao açúcar e ao café. Nesse sentido parece que ele não foi o principal
atrativo econômico do sul da província, e sim a empresa açucareira, dada abundância de terras
virgens e disponibilidade de madeiras.
As madeiras inclusive eram produtos que geravam mais receitas de exportação que o
cacau. Neste capítulo mostramos que vários negociantes estavam envolvidos com exploração
de madeiras. Certamente eles lucravam com essa atividade, não por acaso pagavam os
impostos para terem o direito de exploração. Todavia, suas negociações não se restringiam ao
negócio madeireiro, eles forneciam crédito à população e recebiam gêneros da lavoura como
pagamento. Certamente perceberam que os cultivos de cacau e café estavam se
desenvolvendo em Ilhéus e se interessaram em lucrar como o comércio dessas mercadorias.
Essa observação vai de encontro às análises de Antônio Fernando Guerreiro de Freitas,
segundo o qual o crédito comercial acompanhou o desenvolvimento da lavoura cacaueira
desde o início da sua formação149. Ainda que o estudo deste autor tenha como foco o período
da Primeira República, nossas análises sugerem que desde meados do século XIX já existiam
grupos intermediários (negociantes) financiando o desenvolvimento da economia de Ilhéus
com oferta de crédito.
Ademais, verificamos que além dos Livros tratados neste capítulo existiam outros
tipos de tributação. Cobravam impostos sobre a décima urbana (1857-1858) e (1872-1888);
sobre foros de terrenos (1879-1892); sobre balança grande (1862-1878), sobre passagem
(1865-1878) e sobre a venda de pólvora (1862-1890)150.
Além destes, vários produtos destinados à exportação também eram tributados. No
próximo capítulo da tese dedicamos atenção à esses produtos, identificando os principais
exportadores, os artigos exportados e a posse de escravos.

149
FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro. Os donos dos frutos de ouro. Dissertação (Mestrado em Ciências
Sociais). ICS-UFBA. Salvador, 1979.
150
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto das décimas urbanas. Maço 5431. Ilhéus, 1857-1858; Livro
de imposto das décimas urbanas. Maço 5450. Ilhéus, 1872-1888; Livro de imposto dos foros de terrenos. Maço
5457. Ilhéus, 1879-1892; Livro de imposto sob direitos de balança grande. Maço 5452. Ilhéus, 1880-1888; Livro
de imposto sob direitos de passagens. Maço 5440. Ilhéus, 1865-1878; Livro de imposto sobre vendagem de
pólvora e fogos de artifício. Maço 5454. Ilhéus, 1862-1890.
63

CAPÍTULO II
EXPORTAÇÕES E POSSE DE ESCRAVOS. ILHÉUS, 1850-1888

2.1 - Introdução

A maioria dos estudos sobre a economia cacaueira do sul da Bahia privilegiou o século
XX como foco das análises, especialmente por ter sido nesta centúria que o cacau se destacou
nas exportações do Estado e contribuiu para tornar o Brasil um dos maiores fornecedores
mundiais do fruto151. De modo geral, parte da literatura negou a presença da escravidão no
século anterior, privilegiando os coronéis e o mandonismo como foco das análises, atribuindo
pouca ou nenhuma importância às relações escravistas e à economia de Ilhéus no século
XIX152.
Nas últimas décadas, o avanço das pesquisas em arquivos trouxe revisões importantes
desses paradigmas, criticando muitos de seus postulados. Mary Ann Mahony é a pesquisadora
que mais contribuiu para realçar a presença da escravidão na economia cacaueira. Suas
análises enfatizaram que a posse de escravos estava difundida em Ilhéus no século XIX e que
algumas famílias ligadas à elite açucareira do Recôncavo se transferiram para Ilhéus e fizeram
grandes investimentos no cacau, entre elas as famílias Sá, Cerqueira Lima e Gallo153.
As nossas análises seguem essa direção crítica, acreditamos que na segunda metade do
século XIX o processo de ocupação da comarca de Ilhéus se intensificou e várias atividades
econômicas se desenvolveram, sendo que muitos produtos eram exportados, inclusive o
cacau. Ademais, havia negociantes exportando diversos artigos, sendo que nessa época não
existia uma especialização na economia, visto que a cultura do cacau se afirmou somente nos

151
Sobre o assunto ver, entre outros. SANTOS, Milton. Zona do cacau: introdução ao estudo geográfico.
Companhia Editora Nacional, 2ed. São Paulo, 1957. BAIARDI, Amílcar. Subordinação do trabalho ao capital
na lavoura cacaueira da Bahia. São Paulo: Editora Hucitec, 1984.
152
Ver, por exemplo, BARROS, Francisco Borges. Memória sobre o município de Ilhéus. 3ª ed. Ilhéus: Editus;
Fundação cultural de Ilhéus, 2004; FALCÓN, Gustavo. Os coronéis do cacau: raízes do mandonismo político
em Ilhéus, 1890-1930. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais). UFBA, Salvador, 1983. ADONIAS FILHO.
Sul da Bahia, chão de cacau. 2ª ed. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1978.
153
MAHONY, Mary Ann. “Instrumentos Necessários” Escravidão e Posse de Escravos no Sul da Bahia no
século XIX, 1822-1889. Afro-Ásia, Salvador, n. 25-26, p. 95-139, 2001. p. 109.
64

primeiros decênios do século XX154. Outrossim, sustentamos que o trabalho escravo estava
presente naquele contexto, em várias atividades, inclusive nas exportações155.
Argumentamos que durante o período 1850-1888 o cacau não ocupou lugar de
destaque nas exportações da província, mas aos poucos adquiriu importância na economia de
Ilhéus.
Acreditamos que nesse contexto os negociantes se sobressaíram no comércio de
mercadorias, no setor de exportação e abastecimento interno. Como demonstramos no
primeiro capítulo, eles obtinham mercadorias industrializadas na capital da província para
revende-las em suas casas de negócios em Ilhéus, enquanto outros produtos eram exportados
de Ilhéus para Salvador e de lá para países estrangeiros. Todos esses produtos estavam
sujeitos às oscilações da demanda externa, à disponibilidade de transportes para exportação,
ao pagamento de fretes e impostos municipais.
Analisaremos a economia de exportação de Ilhéus tentando perceber a influência
desses fatores e dos negociantes. A nossa hipótese é que nesse contexto as atividades
econômicas se diversificaram e vários produtos, além do cacau, integravam a pauta de
exportações da comarca, sendo que a Câmara atuou no controle dessas atividades por meio da
cobrança de tributos.
As fontes que servem de suporte para as análises são os Livros de cobrança de
impostos sobre os produtos destinados para fora do município, quais sejam: cacau e café
(1871-1885); cachaça (1870-1878), jacarandá (1870-1879); piaçava (1879-1892) e couros
(1878-1892).156
Analisaremos de modo sistemático as exportações de cada um desses produtos,
destacando as principais pessoas envolvidas, o pagamento de impostos e a presença da posse
de escravos.
154
Segundo Angelina Nobre R. Garcez e Antônio Fernando G. de Freitas, no período entre 1890 e 1930 a
lavoura cacaueira percorre a sua trajetória mais promissora e de plena afirmação econômica. GARCEZ,
Angelina N. R.; FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro de. Bahia cacaueira: um estudo de história recente.
Centro Editorial e Didático da Universidade Federal da Bahia. Salvador, 1979.
155
Sobre o trabalho escravo em Ilhéus ver, entre outros, MAHONY, Mary Ann. “Instrumentos Necessários”
Escravidão e Posse de Escravos no Sul da Bahia no século XIX, 1822-1889. Afro-Ásia, Salvador, n. 25-26, p. 95-
139, 2001; ANDRADE, Marcelo Loyola de. Nos labirintos da liberdade. Das alforrias na lavoura cacaueira
(Ilhéus-BA, 1810-1850) à discussão historiográfica acerca das manumissões no Brasil do século XIX.
Dissertação (Mestrado em História) - FFLCH/USP, São Paulo, 2013; CRUZ, Ronaldo Lima da. Conflitos e
tensões: conquistas de escravizados e libertos no sul da Bahia (1880-1900). Dissertação (Mestrado em História) -
FCHS/UNESP, Franca, 2012; GONÇALVES, Victor Santos. Escravos e senhores na terra do cacau: alforrias e
família escrava (São Jorge dos Ilhéos, 1806-1888). Dissertação (Mestrado em História) – FFCH, UFBA,
Salvador, 2014.
156
Disponíveis no Arquivo Público do Estado da Bahia (APEB), Seção Colonial Provincial (SCP). Livros de
cobrança de imposto da Câmara de Ilhéus. Maço 5459 - Cacau e Café (1871-1885); Maço 5441 - Cachaça (1870-
1878); Maço 5443 - Jacarandá (1870-1879); Maço 5458 - Piaçava (1879-1892) e Maço 5456 - Couros (1878-
1892).
65

2.2 - Exportações de cacau, café e posse de escravos. Ilhéus, 1871-1885

O Livro que serviu para o registro do imposto sobre exportação de cacau e café foi
aberto pelo Presidente da Câmara Municipal, Joaquim Pereira Caldas, em 12 de janeiro de
1871157. O procurador responsável pela arrecadação dos impostos foi Francisco Antônio de
Salles Silva, que preencheu os livros com os nomes dos exportadores, registrando os dias e os
meses das exportações, as quantidades exportadas e os impostos pagos. No final de cada mês
ele somava a receita, descrevia o total por extenso, datava e assinava.
Em alguns meses não houve registro e a série apresenta lacunas. Ademais, não é
possível saber o destino das exportações, quem eram os compradores dos produtos e nem os
preços de venda das mercadorias exportadas, o mesmo ocorrendo com os demais livros158.
Essa documentação constitui fonte valiosa para as pesquisas sobre a economia do sul
da Bahia no século XIX, haja vista a carência de estudos sistemáticos a respeito das
exportações das vilas localizadas nessa parte da província.
A primeira folha do Livro fornece uma noção das exportações e das pessoas
envolvidas no comércio. Em janeiro de 1871 foram lançados treze nomes de exportadores,
quantidade que se mantém relativamente razoável ao longo da série, mas com alguns
declínios, especialmente nos meses de abril e maio.
O primeiro nome da lista é Fernando Steiger, uma das pessoas que aparece com
frequência ao longo dos anos. Em janeiro de 1871 ele exportou 1.068 arrobas de cacau e
pagou Rs. 21$360 (vinte e um mil trezentos e sessenta réis) de impostos. Dividindo este valor
pela quantidade de arrobas verificamos que por cada arroba exportada incidia a quantia de
Rs.$020 (vinte réis), mas ao longo do período a tarifa aumentou.
Outros importantes exportadores também aparecem nessa primeira lista, como Luiz
Adami, Jose Simeão Moreno dos Reis e Antônio da Cruz Rabelo Leitão, por exemplo159. O
total das exportações deste mês foi de 5.656 arrobas de cacau, sendo que não houve
exportação de café, e a Câmara Municipal arrecadou Rs. 113$120 de impostos.
As exportações de cacau superaram as exportações de café, num total de 242.635
arrobas contra 8.386, respectivamente. Inicialmente analisamos as exportações de cacau,

157
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de cacau e café. Maço 5459. Ilhéus, 1871-
1885.
158
Utilizamos o termo exportação para se referir aos produtos enviados para fora de Ilhéus.
159
Vale explicar que alguns nomes foram registrados com abreviações, ou com o acréscimo de outro sobrenome,
como existe fortes evidências acreditamos que se tratava da mesma pessoa. Assim, por exemplo, Joze Simeão,
teve seu nome registado desta forma, outras vezes como Joze Simeão Mor. e como Joze Simeão Moreno dos
Reis, de modo semelhante aconteceu com Antônio da Cruz Rabello e Joze Malaquias Barbosa, dentre outros.
66

lembrando que este produto dependia exclusivamente da demanda externa, visto que nessa
época a fabricação de chocolate se realizava principalmente na Europa e nos Estados Unidos.
O Gráfico 2.1 mostra o comportamento das exportações de cacau em Ilhéus no período
1871-1885.

Gráfico 2.1 - Exportações de cacau (em arrobas).


Ilhéus, 1871-1885
40.000
35.000
30.000
25.000
20.000
15.000
10.000
5.000
0

Fonte: APEB. SCP. Maço 5459. Câmara de Ilhéus: Imposto sobre exportação de cacau e café.
Ilhéus, 1871-1885.

O Gráfico 2.1 mostra as variações nas exportações de cacau, sendo a tendência de


declínio no período 1871-1885. O ano de maior exportação foi 1872, com 37.338 arrobas e o
oposto foi 1885, quando apenas 1.487 arrobas foram exportadas, mas neste último ano
ocorreram registros de exportações em somente cinco meses. Infelizmente não sabemos
explicar as razões dessa redução. Algumas hipóteses podem ser discutidas, mas não temos
respostas conclusivas.
A primeira é que a produção realmente pode ter diminuído neste período, outra é que
parte das exportações pode ter escapado da fiscalização, principalmente porque ao longo do
período a cobrança de imposto aumentou. Nos primeiros anos a Câmara cobrava Rs. $020
(vinte réis) por cada arroba de cacau ou de café exportada. Em outubro de 1873, no entanto, o
valor foi reajustado na mesma proporção para os dois produtos, ou seja, Rs. $040 (quarenta
réis) por arroba. A partir de 1877, no entanto, a tarifa sobre o café exportado passa a ser um
pouco menor que a do cacau, mas ambas aumentaram, alcançando Rs.$090 e Rs.$120,
respectivamente. No final do período ocorreu novo aumento, isto é, a partir de 1881 a Câmara
67

passou a cobrar Rs. $180 (cento e oitenta réis) por cada arroba de cacau ou de café
exportada160.
Esse aumento pode ter influenciado produtores e negociantes a buscarem rotas
alternativas de exportação, o que parece ser uma hipótese pouco provável, já que a economia
de Ilhéus devia funcionar no sistema de porto único.
Outra hipótese é que nessa época as lavouras se expandiram principalmente pelas
encostas dos rios, sobretudo o Cachoeira de Itabuna, que passava por enchentes periódicas,
alagando as lavouras e prejudicando a produção, como ressaltaram Angelina Nobre R. Garcez
e Antônio Fernando G. de Freitas,

A primeira variedade de cacau transplantada para a Bahia – extremamente


exigente quanto ao grau de umidade e solo – ocupou inicialmente as terras
ribeirinhas, tornando assim as rocas muito vulneráveis as enchentes
periódicas desses rios. [...] De 1860 em diante, porém, um dos fatores
negativos internos para a expansão da lavoura é superado com a introdução
de variedades mais resistentes de cacau – as variedades Pará e Maranhão do
grupo “forasteiro” permitindo que as roças se estendessem pelas encostas,
ocupando terras mais protegidas e conferindo assim maior estabilidade às
plantações161.

Com efeito, a disseminação da lavoura cacaueira estava condicionada a vários fatores,


sobretudo ao processo de ocupação e exploração das terras, que envolvia derrubada das matas,
preparação do solo e enfrentamento dos grupos indígenas. Ademais, independente da espécie,
o cacau é uma planta muito exigente, como ressaltamos no primeiro capítulo. Depois que as
mudas são plantadas eram necessários aproximadamente 3 anos para a realização da primeira
colheita. Dali para frente os cacaueiros adultos podiam render entre duas e três colheitas no
ano, mas as safras dependiam dos cuidados com a plantação, das oscilações climáticas, da
quantidade de chuva, do tipo de solo, dentre outros fatores162.
Por fim, devemos considerar as oscilações na demanda externa, que nessa época não
apresentava regularidade, o que também pode ter influenciado na redução das exportações.
Avaliando agora o café, notamos que as exportações deste produto também
declinaram, sendo que neste caso a cobrança de imposto também aumentou ao longo do

160
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de cacau e café. Maço 5459. Ilhéus, 1871-
1885.
161
GARCEZ, Angelina Nobre Rolim; FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro de. Bahia cacaueira: um estudo
de história recente. Salvador: Centro Editorial e Didático da Universidade Federal da Bahia, 1979. p. 20-21.
162
Ver, entre outros, BONDAR, Gregório. A cultura de cacao na Bahia. Instituto de Cacau da Bahia (ICB) –
Boletim Técnico n 1º. Empresa Gráfica da “Revista dos Tribunaes”. São Paulo: 1938. p. 126-164.
68

período. Desse modo, as hipóteses que levantamos podem servir para explicar não apenas o
caso do cacau, mas também do café, que também teve que se adaptar às condições naturais do
território da comarca de Ilhéus. O Gráfico 2.2 mostra as variações nas exportações de café.

Gráfico 2.2 - Exportações de café (em arrobas).


Ilhéus, 1871-1885
2.500

2.000

1.500

1.000

500

Fonte: APEB. SCP. Maço 5459. Câmara de Ilhéus: Imposto sobre exportação de cacau e café.
Ilhéus, 1871-1885.

O Gráfico 2.2 mostra as variações nas exportações de café, com acentuado declínio do
período 1871-1885. Em 1871 as exportações de café atingiram o pico com 2.243 arrobas. No
último triênio do período, precisamente em junho de 1884, somente 38 arrobas de café foram
exportadas.
Apesar da diferença no volume das exportações dos produtos ambos eram importantes
para a economia de Ilhéus. O café, além de exportado, podia circular no mercado interno, uma
parte da produção, ainda que pequena, devia servir ao consumo diário da população.
Ademais, algumas pessoas, mesmo grandes exportadores de cacau, em certas ocasiões,
exportaram mais café. Luiz Adami, por exemplo, no dia 5 de maio de 1871 exportou 56
arrobas de café e apenas 8 de cacau163. Uma possível explicação para tal ocorrência é que os
meses de março, abril e maio foram os que apresentaram as menores médias de exportação de
cacau, 245, 48 e 280 arrobas, respectivamente, ao passo que a média dos meses de dezembro
foi de 2.647 arrobas, e dos meses de janeiro 2.568, o que corresponde às maiores médias
mensais de exportação compulsadas.

163
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de cacau e café. Maço 5459. Ilhéus, 1871-
1885.
69

Com efeito, observando a série é possível notar que as maiores exportações de cacau
ocorriam no segundo semestre, começando em agosto e se estendendo até janeiro. O café, por
sua vez, era exportado em maiores quantidades nos meses de maio, junho e julho, cujas
médias mensais compulsadas chegaram a 334, 157 e 116 arrobas, respectivamente.
A diferença quantitativa entre os dois produtos, no entanto, deve-se às condições
naturais do território. O café se adaptou melhor ao clima e ao solo da região Sudeste e era o
principal produto de exportação do Império nesse período, mas no sul da Bahia o cacau se
desenvolveu melhor, mesmo assim, encontramos várias pessoas exportando os dois produtos,
o que significa que o café também tinha importância naquele contexto.
Começaremos analisando os principais exportadores de cacau.

Tabela 2.1 - Principais exportadores de cacau. Ilhéus, 1871-1885


Cacau
Exportadores Registros Imposto Pago
exportado
Nomes Nº % Nº % (em @) % (em réis) %
Luiz Adami 1 0,5 90 8,8 68.092 28,1 2.322,900 13,5
José Simeão
1 0,5 103 10,0 33.895 14,0 1.416,600 8,2
Moreno dos Reis
Antônio da Cruz
1 0,5 65 6,3 17.572 7,2 1.167,720 7,0
Rabelo Leitão
José Carlos Adami 1 0,5 34 3,3 11.365 4,7 1.811,760 10,6
Manoel Esteves
1 0,5 27 2,6 11.063 4,6 586,800 3,4
Moreno
Fernando Steiger 1 0,5 17 1,6 8.340 3,4 193,880 1,1
José Malaquias
1 0,5 15 1,4 6.641 2,7 187,380 1,0
Barbosa
Demais
208 96,5 676 66,0 85.667 35,3 9.458,650 55,2
exportadores
Total 215 100,0 1.027 100,0 242.635 100,0 17.145,690 100,0
Fonte: APEB. SCP. Câmara de Ilhéus: Maço 5459. Imposto sobre exportação de cacau e café.
Ilhéus, 1871-1885.

A Tabela 2.1 demonstra alta concentração das exportações de cacau nas mãos de
poucas pessoas. Praticamente sete indivíduos foram responsáveis por algo em torno de 70%
das exportações de cacau no período.
Luiz Adami, por exemplo, foi responsável por 28,1% das exportações de cacau e por
17% das exportações de café. No primeiro capítulo comentamos sobre ele, destacamos que
era negociante e o seu filho, José Carlos Adami, dono da loja e armazém Guarany, também
aparece entre os principais exportadores de cacau, responsável por 4,7% de todas exportações.
Outro filho de Luiz Adami era coletor da mesa de rendas provinciais, Domingos Adami de Sá,
70

que também exportou cacau, embora seu nome não esteja na Tabela 2.1. Somando as
exportações dos três podemos afirmar que eles concentraram pelo menos um terço das
exportações de cacau e todos apresentaram escravos para concorrerem à libertação, mas a
quantidade de cativos indica que eles não eram grandes escravistas164. O inventário de Luiz
Adami foi aberto em 1877, por ocasião da sua morte, sendo que nesta data ela não tinha
plantação alguma de cacau e era dono de cinco escravos, dentre outros bens165.
Outra pessoa que se destacou nas exportações foi José Simeão Moreno dos Reis,
responsável por 14% de todo o cacau exportado e por 31,4% das exportações de café. Seu
inventário foi aberto em 1881, ano em que ele faleceu, quando possuía apenas uma escrava,
uma plantação de cacau avaliada em Rs. 500$000, dentre outros bens. Analisando seu
inventário constatamos que ele não era grande produtor de cacau, atuava como negociante,
junto com alguns filhos, que também aparecem no Livro de impostos sobre casas de negócio,
como João Simeão Moreno e Antônio Simeão Moreno166. Entre os bens desta família
constava uma lancha, que o falecido tinha em sociedade com Bernardo Sellemam, outro
negociante, que não tinha produção de cacau quando faleceu em 1881 e era dono de três
escravos, entre outros bens, além de ter atuado como presidente da Câmara Municipal de
Ilhéus167.
Nos autos do processo alguns parentes e o sócio reclamaram ao juiz dos prejuízos da
lancha estar parada no porto da vila, solicitando licença para navegar até o porto da Bahia
(Salvador)168. Entre os reclamantes encontramos Manoel Esteves Moreno, que também se
destacou nas exportações de vários produtos. Assim, pelo sobrenome comum, identificamos
que eram membros da mesma família. Manoel Esteves Moreno foi responsável por 4,6% de
todas exportações de cacau, além dele, outros membros desta família exportaram várias
mercadorias, como veremos nas próximas páginas. Assim, é possível afirmar que pelo menos
um quarto das exportações de cacau foi realizada por esses negociantes169.

164
APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos pelo fundo de emancipação. Lv. 7008.
Ilhéus, 1874-1886.
165
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Luiz Adami. Est. 03, Cx. 1372, Maço 1841, Doc. 18, 28 de maio
1887.
166
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. José Simeão Moreno dos Reis. Est. 02, Cx. 781, Maço 1248,
Doc. 10, 09 de jul. 1881; APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre casas de negócios. Maço 5455.
Ilhéus, 1874-1892.
167
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Major Bernardo Sellman. Est. 02, Cx. 755, Maço 1221, Doc. 01,
11 de nov. 1881.
168
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. José Simeão Moreno dos Reis. Est. 02, Cx. 781, Maço 1248,
Doc. 10, 09 de jul. 1881.
169
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre casas de negócios. Maço 5455. Ilhéus, 1874-1892.
71

Outro nome que se destacou na Tabela 2.1 foi Fernando Steiger, que exportou 8.340
arrobas de cacau (3,4% do total) e 921 arrobas de café (11%)170. Ele foi um dos que mais
apresentou escravos para concorrem à libertação (146 cativos)171. Neste caso identificamos
que ele integrava uma família de produtores de cacau e café. Sua falecida esposa, Dona
Amélia de Sá Steiger, era filha do Tenente Coronel Egídio Luiz de Sá Bitencourt Câmara e
Dona Rita Constança de Melo Sá. Este ramo da família Sá Bitencourt Câmara, uma das mais
tradicionais de Ilhéus, tinha fazendas com produção de cacau e café no distrito da Cachoeira
de Itabuna, além de imóveis na vila, dentre outros bens constantes no inventário de sua sogra,
aberto em 1880172. Outros membros desta família também aparecem exportando cacau, como
Capitão Egídio Luiz de Sá, cunhado de Fernando Steiger, que também classificou escravos
para concorrerem à libertação e era dono de fazendas com produção de cacau no distrito da
Cachoeira de Itabuna, entre outros bens173.
Antônio da Cruz Rabelo Leitão foi outro nome que se destacou nas exportações,
responsável por 7,2% das exportações de cacau e 12% das exportações de café. Não
encontramos seu inventário, mas seu nome consta no Livro de impostos sobre casas de
negócios, o que permite afirmar que ele era negociante174.
Agora vamos analisar a relação dos principais exportadores de café, constantes na
Tabela 2.2.

170
Ibidem.
171
APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos pelo fundo de emancipação. Lv. 7008.
Ilhéus, 1874-1886.
172
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Rita Constança de Melo Sá. Est. 02, Cx. 759, Maço 1225, Doc.
04, 28 de ago. 1880.
173
APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos pelo fundo de emancipação. Lv. 7008.
Ilhéus, 1874-1886.APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Capitão Egídio Luiz de Sá Bitencourt Camara.
Est. 02, Cx. 754, Maço 1220, Doc. 11, 16 de nov. 1880.
174
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre casas de negócios. Maço 5455. Ilhéus, 1874-1892
72

Tabela 2.2 - Principais exportadores de café. Ilhéus, 1871-1885


Exportadores Registros Café exportado Imposto Pago
Nomes Nº % Nº % (em @) % (em réis) %
José Simeão
1 3,6 32 24,6 2.633 31,4 69,390 23,2
Moreno dos Reis
Luiz Adami 1 3,6 22 17,0 1.456 17,4 37,630 12,6
Antônio da Cruz
1 3,6 14 10,7 1.011 12,0 36,030 12,0
Rabelo Leitão
Fernando Steiger 1 3,6 12 9,2 921 11,0 51,020 17,0
Antônio Jorge Moreno 1 3,6 3 2,3 525 6,2 10,500 3,5
Joaquim André Mattos 1 3,6 2 1,5 390 4,6 7,800 2,6
Henrique [Torres] C. 1 3,6 1 0,8 328 4,0 6,560 2,2
Demais exportadores 21 74,8 44 33,9 1.122 13,4 80,300 26,9
Total 28 100,0 130 100,0 8.386 100,0 299,230 100,0
Fonte: APEB. SCP. Câmara de Ilhéus: Maço 5459. Imposto sobre exportação de cacau e café.
Ilhéus, 1871-1885.

De modo semelhante ao que aconteceu com o cacau, percebemos alta concentração


nas exportações de café. No computo geral apenas sete pessoas concentraram a maior parte
das exportações, com destaque para José Simeão Moreno dos Reis, que sozinho concentrou
31,4% das exportações. Grande parte dos nomes da Tabela 2.2 também se destacou nas
exportações de cacau e já comentamos que muitos eram negociantes, a exceção de Fernando
Steiger.
Apesar da concentração nas exportações desses produtos (cacau e café) outras pessoas
participavam do negócio, e na década de 1880 apareceram firmas e companhias de navegação
que atuaram nas exportações: Lavigne & Irmão, Seabra S. e Cia, Henrique Berbet, Vapor S.
Feliz, Vapor Marinho, Vapor Sergipe, Vapor Caravelas e Vapor Rio Vermelho.
Ao que parece, nessa época, algumas firmas e companhias de navegação começaram a
se especializar nas exportações de cacau e café, certamente comprando o produto dos
lavradores para revenderem a preços mais elevados, processo que Antônio Fernando
Guerreiro de Freitas denominou de formação da burguesia cacaueira175.
Algumas linhas da Companhia de Navegação Baiana apareceram nas exportações de
cacau e café em Ilhéus nesse período. O vapor Rio Vermelho, por exemplo, em outubro de
1884 exportou 1.582 arrobas de cacau176. Essas embarcações percorreriam todo o litoral,
como ressaltou Kátia M. de Queirós Mattoso “A Linha Sul conduz os vapores da Companhia

175
FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro de. Os donos dos frutos de ouro. Dissertação (Mestrado em Ciências
Sociais). ICS-UFBA, 1979.
176
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de cacau e café. Maço 5459. Ilhéus, 1871-
1885.
73

aos portos de Camamu, Ilhéus, Canavieiras, Porto Seguro, São José, Colônia Leopoldina,
numa viagem redonda mensal”177.
Ilhéus não era o único município dedicado ao cultivo e exportação de cacau e café,
então é possível supor que essas companhias compravam produtos da lavoura para exportação
em outras partes da Bahia. Quando comparamos o volume das exportações desta localidade
com as quantidades apresentadas no quadro de exportação da província, apresentado pelo
Conselheiro Barão Homem de Mello na Assembleia Legislativa de 1878, conseguimos
dimensionar a questão.
O referido quadro contempla cinco (5) anos financeiros, começando em 1872-1873,
quando a província exportou, entre outros produtos, 79.171 arrobas de cacau e terminando em
1876-1877, quando essa cifra atingiu 97.910 arrobas. O Gráfico 2.3 apresenta o resultado da
comparação.

Gráfico 2.3 - Exportações de cacau (em arrobas). Bahia. I872-1876


120.000

100.000

80.000

60.000

40.000

20.000

0
1872 1873 1874 1875 1876

Província Ilhéus
Fontes: Fala com que abriu no dia 1° de maio de 1878 a 57 a legislatura da Assembleia Legislativa Provincial
da Bahia o Exm. Sr. Conselheiro Barão Homem de Mello, presidente da Província da Bahia. Disponível em:
<http://www-apps.crl.edu/brazil/provincial> Acesso em 24 de março de 2018. APEB. SCP. Câmara de Ilhéus.
Livro de imposto sobre exportação de cacau e café. Maço 5459. Ilhéus, 1871-1885.

O Gráfico 2.3 revela que a participação de Ilhéus no quadro geral das exportações de
cacau da província não foi muito expressiva. Em 1872 o município chegou a exportar 47% do

177
MATTOSO, Kátia M. de Queirós. Bahia: a cidade do Salvador e seu mercado no século XIX. São Paulo:
Hucitec; Salvador: Secretaria Municipal de Educação e Cultura, 1978. p. 73-74.
74

total despachado pela Bahia para países estrangeiros, mas esse percentual diminuiu nos anos
seguintes.
Desse modo, outras comarcas também participavam das exportações. Como se ver no
Gráfico 2.3 existe diferenças significativas entre o volume das exportações de Ilhéus e o total
realizado pela província da Bahia entre os anos de 1872 e 1876. De onde vinha a outra parcela
da produção de cacau? Talvez, as outras comarcas despachassem cacau para Salvador em
proporção maior que Ilhéus, que certamente estava adaptando a cultura ao território nessa
época.
Como afirmaram Angelina N. R. Garcez e Antônio Fernando G. de Freitas, o cacau
percorreu a sua trajetória mais promissora e de plena afirmação econômica no período 1890-
1930178.

2.3 - Exportações de cachaça e posse de escravos. Ilhéus, 1870-1878

No dia 1º de outubro de 1870 o presidente da Câmara Municipal de Ilhéus, Joaquim


Pereira Caldas, assinou a folha de abertura do Livro de registro do imposto sobre a aguardente
exportada pelo município, onde constam as seguintes informações: o mês, o dia, o nome do
produtor/exportador, a quantidade exportada e o valor do imposto cobrado179. O procurador
da Câmara, Francisco Antônio de Salles Santos, anotava os dados e no final de cada folha
descrevia por extenso o total da receita do mês, datava e assinava. O documento dispõe de
uma série praticamente completa com essas informações distribuídas ao longo do período
1870-1878180.
Para se ter uma ideia, no mês de outubro de 1870, quando iniciou o registro do
imposto no referido livro, Ilhéus exportou 1.565 canadas de cachaça (10.720 litros), o que
rendeu a quantia de Rs. 15$650 (quinze mil seiscentos e cinquenta réis) de impostos. Se
levarmos em conta a população de Ilhéus em 1872, que era de 5.682 habitantes181 notamos
que a quantidade de cachaça exportada não era pequena.
Os responsáveis pela exportação do produto no primeiro mês foram: José Simeão
(2.021); o Tenente José Seabra (480); outra vez José Simeão (7.671) e por último Antônio da

178
GARCEZ, Angelina Nobre Rolim; FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro de. Bahia cacaueira: um estudo
de história recente. Salvador: Centro Editorial e Didático da Universidade Federal da Bahia, 1979. p. 21
179
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de aguardente de cana (cachaça). Maço
5441. Ilhéus, 1870-1878.
180
Os únicos meses que não ocorreram registros de impostos foram outubro de 1874 e junho de 1878.
181
Recenseamento Geral do Império do Brazil de 1872. Disponível em: <http://www.biblioteca.ibge.gov.br>.
Acesso em 15 de fev. 2018.
75

Cruz, que no dia 28 de outubro pagou Rs.$800 pela exportação de 80 canadas (548 litros) de
aguardente de cana182.
A pequena quantidade de nomes que aparece em cada mês, no máximo chegava-se a
listar sete, normalmente era em torno de quatro, e o volume da cachaça exportada por cada
um deles, permitem duas inferências relevantes: primeiro isso leva a crer que as exportações
estavam concentradas, devido à presença constante de determinados nomes durante os meses
e anos analisados, com registros de quantidades expressivas de cachaça exportada; segundo
que, apesar disso, era possível realizar exportações de pequenas quantidades, embora essas
ocorrências não tenham sido frequentes. Raras vezes encontramos exportações de apenas 2
barris no mês. A Tabela 2.3 apresenta os principais exportadores de cachaça de Ilhéus na
década de 1870.

Tabela 2.3 - Principais exportadores de cachaça. Ilhéus, 1870-1878


Exportadores Registros Cachaça exportada Imposto Pago
Nomes Nº % Nº % (em litros) % (em réis) %
José Simeão Moreno 1 1,8 100 32,0 189.343 35,0 344,370 34,0
Antônio da Cruz
1 1,8 42 13,4 83.736 15,0 135,300 13,3
Rabelo
Luiz Adami 1 1,8 15 4,8 42.202 8,0 62,050 6,1
José Malaquias
1 1,8 18 5,7 31.383 6,0 41,790 4,1
Barboza
Manoel Esteves
1 1,8 19 6,1 49.910 9,0 81,650 8,1
Moreno
Demais exportadores 50 91,0 119 38,0 147.175 27,0 348,210 34,4
Total 55 100,0 313 100,0 543.749 100,0 1.013,370 100,0
Fonte: APEB. SCP. Maço 5441. Câmara de Ilhéus. Imposto sobre exportação de cachaça, 1870-1878.

Os dados da Tabela 2.3 revelam forte concentração das exportações de cachaça, ou


seja, cinco pessoas foram responsáveis por 73% de toda a cachaça exportada por Ilhéus no
período. Os exportadores de cachaça também tiveram presença marcante entre os
exportadores de cacau e café, como Luiz Adami e José Simeão Moreno, por exemplo.
A análise do documento permite inferir que a produção de cachaça era uma importante
atividade econômica de Ilhéus, mas determinado grupo controlava as exportações.
Encontramos alguns donos de engenho que exportaram o produto, porém, o mais comum era
a cachaça ser exportada por negociantes, sem vínculo direto com a fabricação da bebida.

182
Uma canada de aguardente da Bahia correspondia a 6,85 litros. Ver BARICKMAN, Bert J. Um contraponto
baiano: açúcar, fumo, mandioca e escravidão no Recôncavo, 1780-1860. Tradução de Maria Luiza X. de A.
Borges. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. p. 23.
76

Mariana Caldas, era dona do Engenho São João, entre outros bens, e antes de falecer,
em 1878, exportou 548 litros de cachaça em janeiro de 1874, mais 840 em novembro do
mesmo ano, e por último160 litros em agosto de 1875183. Lourenço Dias Ribeiro tinha uma
Fazenda com engenho de moer cana e alambique no Iguape, dentre outros bens, e antes de
falecer, em 1879, exportou cachaça184.
Agora vamos analisar o volume da bebida exportada por Ilhéus entre outubro de 1870
e setembro de 1878, como mostra o Gráfico 2.4.

Gráfico 2.4 - Exportações de cachaça (em litros).


Ilhéus, 1870-1878
120.000

100.000

80.000

60.000

40.000

20.000

0
1870 1871 1872 1873 1874 1875 1876 1877 1878
Fonte: APEB. SCP. Maço 5441. Câmara de Ilhéus. Imposto sobre exportação de aguar-
dente de cana (cachaça). Ilhéus, 1870-1878.

O Gráfico 2.4 mostra as variações nas exportações de cachaça em Ilhéus entre 1870 e 1878,
sendo possível notar que as oscilações foram significativas. A menor média mensal foi de 2.629
litros em 1875, e a maior de 9.455 litros em 1876, ano que Ilhéus mais exportou cachaça
(113.470 litros). Se considerarmos a possibilidade de parte da produção ser desviada do
controle da Câmara, mais o que era consumido nos armazéns e botequins da vila, é possível
inferir que a produção fosse maior do que a apresentada no Gráfico 2.4. Ademais, na listagem
dos exportadores consta apenas um registro, realizado em setembro de 1876, no qual José

183
Ver, APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Mariana Joaquina de Queirós Caldas. Est. 02, Cx. 750,
Maço 1216, Doc. 07, 16 de set. 1878.; APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de
aguardente de cana (cachaça). Maço 5441. Ilhéus, 1870-1878.
184
Ver, APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Lourenço Dias Ribeiro. Est. 02, Cx. 754, Maço 1220, Doc.
01, 30 de jun. 1879; APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de aguardente de cana
(cachaça). Maço 5441. Ilhéus, 1870-1878
77

Malaquias Barboza exportou 600 litros de cachaça, explicitamente declarada como sendo de
fora do município.
Desse modo, a grande maioria dos registros foi de cachaça proveniente do próprio
município. Com base no quadro de exportação dos artigos da província da Bahia, em que
consta a aguardente e outros produtos, conseguimos calcular a participação da cachaça de
Ilhéus no total das exportações da província. O referido quadro contempla cinco (5) anos
financeiros, começando em 1872-1873, quando a província exportou, entre outros produtos,
602.844 litros de aguardente e terminando em 1876-1877, quando essa cifra despencou para
363.187 litros185. O Gráfico 2.5 apresenta o resultado da comparação.

Gráfico 2.5 - Exportações de cachaça (em litros). Bahia, 1872-1876


1.600.000
1.400.000
1.200.000
1.000.000
800.000
600.000
400.000
200.000
0
1872 1873 1874 1875 1876

Província Ilhéus
Fontes: Falla com que abriu no dia 1.o de maio de 1878 a 57 a legislatura da Assembleia
Legislativa Provincial da Bahia o exm. sr. conselheiro barão Homem de Mello, presidente
da província da Bahia. Disponível em: <http://www-apps.crl.edu/brazil/provincial>, acesso
em março de 2018; APEB. Seção Colonial Provincial. Maço 5441. Câmara de Ilhéus.
Imposto sobre a aguardente, 1870-1878.

O Gráfico 2.5 permite dimensionar o volume da exportação de cachaça de Ilhéus no


contexto da província da Bahia. Analisando os dados percebemos que as exportações desta
localidade, quando comparadas com as da província, não eram muito significativas. O que já

185
Falla com que abriu no dia 1.o de maio de 1878 a 57 a legislatura da Assembléa Legislativa Provincial da
Bahia o exm. sr. conselheiro barão Homem de Mello, presidente da provincia da Bahia. Disponível em:
<http://www-apps.crl.edu/brazil/provincial> APEB. Seção Colonial Provincial. Maço 5441. Câmara de Ilhéus.
Imposto sobre a aguardente exportada, 1870-1878.
78

era de se esperar, visto que a Bahia possuía um território grande, composto por 17 comarcas,
além da capital, todas, provavelmente, também dedicadas à produção do destilado186.
Ainda com relação ao Gráfico 2.5, notamos que o menor percentual de participação no
total das exportações foi de 4,5% em 1874, todavia a aguardente de Ilhéus chegou a
corresponder a 31% de toda a cachaça exportada pela província da Bahia em 1876, indicando
que a fabricação da bebida era uma importante atividade econômica do município.
Alguns exportadores de cachaça também constam no Livro de classificação dos
escravos para serem libertos pelo fundo de emancipação (1874-1886)187. Os membros da
família Sá Bithencourt Camara, por exemplo, aparecem nos dois documentos. Eduardo de Sá
Bithencourt Camara listou três escravos e em abril de 1877 exportou 3.900 litros de cachaça.
Luiz Adami também listou três escravos, no entanto, exportou mais de 42.000 litros de
cachaça entre 1871 e 1877188. Mariana Caldas, dona do engenho São João, possuía, dentre
outros bens, 22 escravos antes de falecer em 1878189, sendo que seu nome aparece entre os
exportadores de cachaça. Lourenço Dias Ribeiro tinha Engenho no Iguape e possuía, dentre
outros bens, 20 escravos, antes de falecer em 1879190, seu nome também aparece nas
exportações de cachaça. Outros exemplos semelhantes poderiam ser mencionados para
demonstrar a relação de alguns exportadores da bebida com a posse de escravos.

186
Além da comarca de Ilhéus, cuja sede era a vila de mesmo nome, em 1853 a província da Bahia era composta
pelas seguintes comarcas, afora a capital: Abrantes, Cachoeira, Santo Amaro, Nazareth, Inhambupe, Itapicuru,
Monte Santo, Sento Sé, Jacobina, Rio de Contas, Urubu, Rio de São Francisco, Valença, Camamu, Porto Seguro
e Caravelas. In: Fala que recitou o Exm. Presidente da província da Bahia, dr. João Maurício Wanderley, na
abertura da Assembleia Legislativa da mesma província no dia 1º de março de 1853. Typ. Const. De Vicente
Ribeiro Moreira, 1853. Disponível em: <http://www-apps.crl.edu/brazil/provincial> Acesso em 24 de março de
2018.
187
APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos pelo fundo de emancipação. Lv. 7008.
Ilhéus, 1874-1886.
188
Ibidem.
189
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Mariana Joaquina de Queirós Caldas. Est. 02, Cx. 750, Maço
1216, Doc. 07, 16 de set. 1878
190
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Lourenço Dias Ribeiro. Est. 02, Cx. 754, Maço 1220, Doc. 01,
30 de jun. 1879.
79

2.4 - Exportações de jacarandá e posse de escravos. Ilhéus, 1870-1879

A extração de madeiras é uma atividade que existe em Ilhéus desde os tempos


coloniais. As pesquisas voltadas para o assunto ressaltaram a importância histórica da mata
atlântica para o funcionamento do antigo sistema colonial, sendo que a Coroa portuguesa
procurou controlar o corte de madeira de diversas formas191.
Durante o Império essa atividade continua sendo praticada na comarca de Ilhéus, mas
sob o controle da Câmara Municipal, como demonstra a documentação produzida pelos
agentes da fiscalização.
Encontramos dois Livros de cobrança de impostos que tratam do assunto. O primeiro
diz respeito aos direitos cobrados pela exploração de madeira na localidade, tratado no
primeiro capítulo, o segundo se refere ao imposto que incidia sobre as exportações192.
Nesta seção analisamos apenas as exportações, ainda assim de um tipo específico de
madeira, ou seja, o jacarandá193. O livro de imposto sobre exportação deste artigo foi aberto
em primeiro de outubro de 1870, pelo presidente da Câmara, Joaquim Pereira Caldas, sendo o
procurador Francisco Antônio de Sales Silva. O registro foi feito em paus, e manteve-se assim
até o final do período, junho de 1879. Não sabemos qual era o peso e tamanho desses paus, a
documentação não faz especificações alguma, a cobrança de imposto também não permite
identificar distinção.
No geral registrava-se o nome de uma ou duas pessoas em cada mês, o máximo que
ocorreu foram cinco registros em dezembro de 1875. O Gráfico 2.6 apresenta as exportações
de jacarandá em Ilhéus na década de 1870.

191
Ver, entre outros, DIAS, Marcelo Henrique. Farinha, Madeiras e Cabotagem: a Capitania de Ilhéus no antigo
sistema colonial. Ilhéus: Editus, 2011; PEREIRA, Rodrigo Osório. O império Botânico: as políticas portuguesas
para a flora da Bahia atlântica colonial, 1768-1808. Tese (Doutorado em História) – FAFICH-UFMG. Belo
Horizonte, 2013.
192
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de Lançamento dos rendimentos relativos a direitos de madeira. Maço
5438. Ilhéus, 1862-1870.
193
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de Jacarandá. Maço 5443. Ilhéus, 1870-
1879.
80

Gráfico 2.6 – Exportações de madeira Jacarandá (em paus).


Ilhéus, 1870-1879
800
700
600
500
400
300
200
100
0
1870 1871 1872 1873 1874 1875 1876 1877 1878 1879
Fonte: APEB. SCP. Maço 5443. Câmara de Ilhéus: Imposto sobre jacarandá exportado.
Ilhéus, 1870-1879.

O Gráfico 2.6 mostra oscilações significativas nas exportações, aumento e declínio


constantes marcaram o período. No total foram exportados 3.952 paus de jacarandá,
ocorrendo exportações todos os anos, porém com vazios em vários meses, sendo que no geral
as exportações se concentraram no segundo semestre.
O ano de maior exportação foi 1872, quando Ilhéus exportou 748 paus de jacarandá, o
oposto ocorreu em 1876, com apenas 56 exportações. A Tabela 2.4 apresenta os principais
exportadores.

Tabela 2.4 – Principais exportadores de madeira jacarandá.


Ilhéus, 1870-1879
Jacarandá
Exportadores Registros Imposto Pago
exportada
Nomes Nº % Nº % (em paus) % (em réis) %
Antônio da Cruz Rabelo 1 5,3 20 31,2 1.302 32,9 240,804 34,5
José Simeão Moreno 1 5,3 11 17,2 711 18,0 118,490 17,0
Manoel Esteves Moreno 1 5,3 6 9,4 429 11,0 76,492 10,9
Cristhiano Sellman 1 5,3 5 7,8 320 8,0 53,318 7,6
Demais exportadores 15 78,8 22 34,4 1.190 30,1 209,458 30,0
Total 19 100,0 64 100,0 3.952 100,0 698,562 100,0
Fonte: APEB. SCP. Maço 5443. Câmara de Ilhéus: Imposto sobre exportação de Jacarandá, 1870-1879.

A Tabela 2.4 mostra que em torno de 70% das exportações de Jacarandá foram
realizadas por apenas quatro pessoas, evidenciando a forte concentração dessa atividade,
como também ocorreu com as exportações dos produtos anteriormente analisados.
81

Alguns nomes se destacaram nas exportações de jacarandá, como os negociantes


Antônio da Cruz Rabelo e Jose Simeão Moreno194. O primeiro foi responsável por 32,9% das
exportações e classificou duas cativas para concorrerem à libertação195, o segundo exportou
18% das madeiras e quando faleceu, em 1881, era dono da escrava Maria196.
Como já ressaltamos, os negociantes prevaleceram nas atividades de exportação,
certamente eles obtinham lucros com o comércio de madeiras e a cobrança de fretes, mas eles
arcavam com os impostos.
Na maior parte do período o imposto que incidia sobre cada pau de Jacarandá
exportado era de Rs. $167 (cento e sessenta e sete réis). No entanto, a partir de janeiro de
1879 o tributo sofreu um reajuste vertiginoso, passando para Rs.$333, não sabemos por quais
motivos.
Ao que parece, essa atividade gerava bons rendimentos para os exportadores e para os
cofres municipais. Para se ter uma ideia o imposto por cada arroba de cacau exportada
alcançou o pico de Rs.$180197, bem abaixo do que incidia sobre exportação de jacarandá
(Rs.$333).
Talvez, na segunda metade do século XIX, a exploração de madeiras tenha se tornado
uma atividade econômica tão importante quanto a produção de cacau em Ilhéus.

2.5 - Exportações de piaçava e posse de escravos. Ilhéus, 1879-1888

A piaçava é uma fibra vegetal extraída de palmeiras nativas da mata atlântica.


Gregório Bondar, referindo-se ao tipo de solo dessa planta destacou o seguinte:

[...] são solos profundos, permeáveis, leves, formados de areia solta. Como
vegetação espontânea possuem a piassaveira (Attalea funifera), bury, catulé,
ticum, e outras palmeiras, cyperaceas e fetos de solos ácidos [...] Estes
terrenos são de uma pobreza extrema e não acumulam húmus. Nenhuma
cultura racional de plantas alimentícias é praticável. A piassaveira é a única
espécie botânica que dá a estes solos um certo valor, estendendo-se do
município do Prado até a Bahia198.

194
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre casas de negócios. Maço 5455. Ilhéus, 1874-1892
195
APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos pelo fundo de emancipação. Lv. 7008.
Ilhéus, 1874-1886
196
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. José Simeão Moreno dos Reis. Est. 02, Cx. 781, Maço 1248,
Doc. 10, 09 de jul. 1881
197
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de cacau e café. Maço 5459. Ilhéus, 1871-
1885.
198
BONDAR, Gregório. A cultura de cacao na Bahia. Instituto de Cacau da Bahia (ICB) – Boletim Técnico n
1º. Empresa Gráfica da “Revista dos Tribunaes”. São Paulo: 1938. p. 100.
82

A extração de piaçava é uma atividade econômica que existe em Ilhéus desde os


tempos coloniais. Marcelo Henrique Dias, por exemplo, menciona a existência dessa
atividade entre os habitantes da capitania no período 1757-1768199. Os viajantes estrangeiros
Spix e Martius, quando passaram por Ilhéus em 1819, afirmaram que na vila de Olivença,
duas léguas ao sul da vila de Ilhéus,

habitam uns 800 índios [...], que ocupam-se com a fabricação de rosários de
cocos de piaçaba [...] outros em fazer cordas, escovas, esteiras, com as fibras
da piaçaba, e chapéus de palha do coqueiro, sabendo também tingir, com
pau-brasil ou pau-amarelo, esses chapéus e panos de algodão200.

O litoral sul da Bahia é uma área própria ao desenvolvimento das palmeiras de


piaçava, com forte presença dos indígenas nessa atividade. O Livro de imposto sobre
exportação do produto atesta a importância dessa fibra para a economia de Ilhéus, mas nada
informava sobre os produtores. O livro abrange o período compreendido entre janeiro de
1879 até março de 1891. Nesta época o presidente da Câmara era Bernardo Sellman, que
assinou a folha de abertura do Livro201.
As exportações foram registradas sempre em molhos. Não sabemos o volume e nem o
peso desses molhos, provavelmente significava uma certa quantidade de piaçava enrolada e
amarrada como um feixe, mas a documentação nada informa a esse respeito.
Nem todos os meses ocorriam exportações de piaçava, no total do período elas
chegaram a 120.389 molhos. No único ano em que Ilhéus exportou piaçava todos os meses
(1879) a cifra chegou a 54.709 molhos. O ano de menor exportação foi 1886, quando apenas
1.250 molhos foram despachados entre janeiro e fevereiro.
No computo geral a média anual de exportações de piaçava foi calculada em 12.039
molhos, mas com oscilações significativas. No que se refere às médias mensais, a máxima
observada foi no mês de março (2.011 molhos) e a mínima em novembro (710). O mês em
que Ilhéus mais exportou piaçava foi janeiro de 1879 (13.652 molhos) e o contrário foi
novembro de 1882, com apenas 72 molhos de piaçava exportados. O Gráfico 2.7 mostra o
movimento das exportações de piaçava no decorrer do período 1879-1888.

199
DIAS, Marcelo Henrique. Economia, sociedade e paisagens da capitania e comarca de Ilhéus no período
colonial. Tese (Doutorado em História) – IFCH/UFF, Niterói, 2007. p. 364 (Tabela 17)
200
SPIX; MARTIUS, op. cit. p. 177.
201
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de piaçava. Maço 5458. Ilhéus, 1879-
1892.
83

Gráfico 2.7 – Exportações de piaçava (em molhos). Ilhéus, 1879-1888

60.000

50.000

40.000

30.000

20.000

10.000

0
1879 1880 1881 1882 1883 1884 1885 1886 1887 1888
Fonte: APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Maço 5458. Imposto sobre exportação de
piaçava. Ilhéus, 1879-1892.

Entre 1879 e 1888 as exportações de piaçava de Ilhéus declinaram muito, como se ver
no Gráfico 2.7. Diversos fatores podem estar associados a esse declínio, mas a documentação
não informa nada sobre isso. Talvez seja devido ao avanço da ocupação do território e
expulsão dos indígenas para o interior, que sofriam baixas constantes nas “guerras justas”, ou
devido à redução da demanda externa. Como a Bahia exportava piaçava para países
estrangeiros a demanda estava sujeita às oscilações do mercado externo.
Ao que parece a piaçava era extraída pelos diversos grupos indígenas que habitavam o
sul da Bahia. Isso fica evidente quando analisamos os inventários, onde quase não aparece
referência à cultura de piaçava. Quem seriam os exploradores desta fibra? Sabemos que o
município exportava o artigo, mas não sabemos quem extraía a piaçava da floresta, montava
os molhos e transportava o produto até o porto ou até as casas de negócio da vila. Esse
silêncio nas fontes pode indicar muita coisa, nossa interpretação é que era uma atividade
própria dos índios202.
Nesse sentido é importante conhecer os exportadores de piaçava de Ilhéus. A Tabela
2.5 apresenta os principais.

202
Sobre a cultura de piaçava na Bahia ver, por exemplo, GUIMARÃES, Carlos Alex Lima; SILVA, Luiz
Alberto Mattos. Piaçava da Bahia (Attalea funifera Martius): do extrativismo à cultura agrícola. Ilhéus, BA:
Editus, 2012.
84

Tabela 2.5 – Principais exportadores de piaçava. Ilhéus, 1879-1888


Piaçava
Exportadores Registros Imposto Pago
exportada
Nomes Nº % Nº % (molhos) % (em réis) %
Antônio Simeão M. dos Reis 1 4,0 54 32,0 27.475 22,8 408,530 20,0
Manoel Esteves Moreno 1 4,0 19 11,2 15.381 13,0 243,490 12,0
Antônio da Cruz R. Leitão 1 4,0 14 8,3 14.429 12,0 269,235 13,2
Jose Simeão M. dos Reis 1 4,0 16 9,4 12.802 10,5 200,715 9,8
José Jorge Moreno 1 4,0 8 4,7 10.792 9,0 200,970 9,8
Antônio Moreno de Jesus 1 4,0 9 5,3 6.919 5,7 130,905 6,4
Outros exportadores 19 76,0 49 29,0 32.591 27,0 587,470 28,8
Total 25 100,0 169 100,0 120.389 100,0 2.041,315 100,0
Fonte: APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Maço 5458. Imposto sobre exportação de piaçava, 1878-1892.

Os nomes dos principais exportadores de piaçava já são bem conhecidos, pois eles
também atuaram de modo incisivo nas exportações dos produtos anteriormente analisados. A
família de José Simeão Moreno é um dos exemplos. Como salientamos eles possuíam alguns
escravos, mas não tinham ligação com a produção das mercadorias. A especialidade deles era
a exportação, comercializavam produtos e cobravam fretes pelo transporte de mercadorias.
Vale lembrar que ele tinha uma lancha em sociedade com Bernardo Sellman, que foi
presidente da Câmara municipal de Ilhéus203.
O imposto que incidia sobre cada molho de piaçava exportada era de Rs.$020 (vinte
réis), reduzindo-se para Rs.$015 a partir de outubro de 1879, mantendo-se assim até 1888.
Certamente os exportadores negociavam a piaçava com os indígenas, pagam o imposto à
Câmara Municipal e obtinham lucros com a venda do produto a preços mais elevados em
Salvador, onde a mercadoria era exportada para países estrangeiros, certamente por preços
ainda mais elevados.

2.6 - Exportações de couros e posse de escravos. Ilhéus, 1878-1888

A pecuária não foi uma atividade econômica que se destacou em Ilhéus no século
XIX. Ao que parece a criação extensiva não teve lugar na estrutura agrária do município,
sendo mais comum a utilização de gado como força de tração animal, como eram chamados
os “bois de brocha” ou “bois do serviço”, como evidenciam os inventários post mortem.
Não obstante, encontramos algumas propriedades com pequenas criações de bovinos,
incluindo vacas, novilhas, bezerros e garrotes. Ademais, o crescimento populacional

203
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. José Simeão Moreno dos Reis. Est. 02, Cx. 781, Maço 1248,
Doc. 10, 09 de jul. 1881.
85

certamente provocou aumento na demanda por alimentos, o que pode ter estimulado essa
atividade. Outro ponto a considerar é a abertura de estradas ligando Ilhéus ao interior da
Bahia e a outras províncias, especialmente do norte de Minas Gerias, o que pode ter
estimulado a vinda de gado de fora do município.
O Livro de imposto sobre exportação de couros secos ou salgados não informa nada a
respeito da origem do produto204, podendo ser proveniente de bois abatidos no interior das
fazendas ou nas proximidades da vila (matadouro), retirando-se o couro do animal para salgar,
secar e exportar. O Gráfico 2.8 permite analisar a movimentação das exportações de couros
em Ilhéus.

Gráfico 2.8 – Exportações de couros secos ou salgados (em unidades).


Ilhéus, 1878-1888

450
400
350
300
250
200
150
100
50
0
1878 1879 1880 1881 1882 1883 1884 1885 1886 1887 1888
Fonte: APEB, SCP. Maço 5456. Câmara de Ilhéus. Imposto sobre exportação de
Couros. Ilhéus, 1878-1892.

O Gráfico 2.8 demonstra oscilações nas exportações de couros, atingindo o pico em


1885, quando 406 couros foram exportados, e reduzindo-se ao mínimo de 57 unidades
exportadas em 1886. No computo geral calculamos o total de 2.722 couros, provavelmente
despachados para Salvador e de lá para o exterior, onde certamente eram utilizados como
matéria prima na indústria de calçados, bolsas, cintos e outros acessórios.
Essa deve ter sido a lógica de funcionamento do comércio de couros. Produzidos em
Ilhéus eram transportados para o exterior e processados nas indústrias, onde eram
transformados em diversos artigos e vendidos no mundo inteiro.

204
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de couros secos ou salgados. Maço 5456.
Ilhéus, 1879-1888.
86

O couro de Ilhéus também podia ser destinado ao mercado interno da capital e para
outras regiões da Bahia e ou do Império do Brasil. Ao que parece os exportadores preferiam a
praça mercantil de Salvador, mas não podemos descartar a possibilidade de o artigo ser levado
para o Rio de Janeiro e outras províncias. A Tabela 2.6 apresenta os principais exportadores
de couros de Ilhéus.

Tabela 2.6 – Principais exportadores de couros. Ilhéus, 1878-1888


Couros
Exportadores Registros Imposto Pago
exportados
Nomes Nº % Nº % Nº % (em réis) %
Antônio Simeão Moreno 1 3,3 26 24,5 571 21,0 136,220 25,3
Manoel Esteves Moreno 1 3,3 20 18,9 343 12,6 96,780 18,0
Maximiano & Irmão 1 3,3 11 10,4 301 11,0 96,320 17,9
Antônio da Cruz R. Leitão 1 3,3 9 8,5 230 8,5 46,540 8,6
Demais exportadores 26 86,8 40 37,7 1.277 46,9 163,120 30,2
Total 30 100,0 106 100,0 2.722 100,0 538,980 100,0
Fonte: APEB, SCP. Livro de imposto sobre exportação de couros secos ou salgados. Maço 5456. Ilhéus,1878-
1892.

As exportações de couros também se mostraram bem concentradas, quatro pessoas


foram responsáveis por aproximadamente 53% do total das exportações, enquanto os demais
exportadores (86,8%) exportaram 46,9% dos couros. Alguns nomes são bem conhecidos,
como é o caso de Antônio Simeão Moreno e Manoel Esteves Moreno, familiares de José
Simeão Moreno, que juntos detinham grandes parcelas das exportações.
O imposto que incidia sobre cada couro exportado era, inicialmente, de Rs.$100 (cem
réis), mas foi reajustado para Rs.$320 em janeiro de 1884, mantendo-se nesse valor até 1888.
Infelizmente, a documentação nada informa sobre os motivos do reajuste.
No geral os principais exportadores estavam ligados ao comércio local, seus nomes
aparecem com frequência no Livro de imposto sobre casas de negócios205. Alguns tinham
embarcações próprias e cobravam fretes para realizar o transporte dos produtos. De todo
modo, eles exerciam influência significativa na economia de Ilhéus, tanto nas exportações
quanto no abastecimento interno.

205
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre casas de negócios. Maço 5455. Ilhéus, 1874-1892
87

***

Nesse capítulo procuramos evidenciar três questões que consideramos relevantes para
entendermos a economia de exportação de Ilhéus. A primeira é que nessa época não havia
uma especialização, já que diversos produtos integravam a pauta de exportação; a segunda é
que os negociantes concentraram parte significativa do comércio exportador; a terceira é que a
maioria das exportações declinou.
Essa foi a nossa primeira intenção, de caráter geral, provar a existência de uma
diversificação econômica, que extrapolava o âmbito do comércio de cacau. Além deste
produto foram despachados café, cachaça, madeiras, piaçava e couros, todos exportados nas
décadas de 1870 e 1880, com acentuados declínio em muitos casos. O Quadro 2.1 apresenta
uma síntese dessas exportações.

Quadro 2.1 – Exportações do município de Ilhéus, 1870-1888


Média Anual Imposto Média Anual
Produtos Unidades Quantidades
Quantidade Arrecadado Imp. Arrecad.
Cacau
Arrobas 242.635 16.175 17.145,690 1.143,046
(1871-1885)
Café
Arrobas 8.386 559 299,230 23,018
(1871-1885)
Aguardente
Litros 543.949 60.147 1.013,390 112,599
(1870-1878)
Jacarandá
Paus 3.952 395 698,562 69,856
(1870-1879)
Piaçava
Molhos 120.389 12.039 2.041,320 170,109
(1879-1888)
Couros
Quantid. 2.722 247 538,980 48,998
(1878-1888)
Fonte: APEB, SCP. Livros de cobrança de imposto da Câmara de Ilhéus. Maço 5459 - Cacau e Café (1871-
1885); Maço 5441 - Cachaça (1870-1878); Maço 5443 - Jacarandá (1870-1879); Maço 5458 - Piaçava (1879-
1892) e Maço 5456 - Couros (1878-1892).

O Quadro 2.1 comprova que o cacau, apesar de ser o produto que gerou mais receitas
de impostos para a Câmara de Ilhéus não era o único item das exportações. Ademais, mesmo
considerando que os pesos e medidas desses artigos eram diferentes, em termos globais
podemos comprovar que a economia era diversificada.
Desse modo, olhar Ilhéus apenas pelo prisma da produção e exportação de cacau não
ajuda entender toda a dinâmica da economia. Muitos produtos não eram exportados, mas
serviam ao mercado interno. O café, por exemplo, se comparado ao cacau não teve
88

participação expressivo nas exportações, mas uma parte devia servir ao abastecimento interno,
para consumo diário da população. A exploração de madeira era outro componente com
utilidade no mercado interno e na economia de exportação, servindo para fabricação de
canoas, jangadas, móveis da lavoura, dentre outras funções. A piaçava também tinha utilidade
para a população local e era exportada, o mesmo acontecendo com o couro.
Desse modo, os dados indicam que a produção de cacau não dominava a economia.
Talvez por isso muitos negociantes se interessaram em praticar negócios na praça de Ilhéus,
sendo que muitos deles controlavam as exportações, como procuramos demonstrar neste
capítulo. Alguns tinham transportes marítimos, como era o caso de Jose Simeão Moreno dos
Reis e seus familiares, cobrando fretes, pagando impostos e certamente obtendo lucros com a
venda das mercadorias na capital. Ao que parece esse comércio se tornou rentável e algumas
firmas e companhias de navegação ingressaram na atividade.
Os dados compulsados indicam que as exportações de Ilhéus não estavam
atravessando uma fase de crescimento, contudo, devemos considerar que essa documentação
não dá conta de explicar toda a dinâmica da economia. Certamente a fiscalização era limitada
por diversos fatores.
Ademais, alguns produtos como açúcar e farinha de mandioca, por exemplo, não
estavam submetidos à tributação municipal. A existência de engenhos em Ilhéus nessa época
suscita este tipo de questionamento. Qual o lugar do açúcar nas exportações de Ilhéus? Os
engenhos produziam somente cachaça? A economia realmente estava em declínio ou essa
evidência é uma questão da fonte, ou seja, dos Livros de cobrança de impostos?
Acreditamos que existia uma dinâmica em determinados setores da exportação que as
fontes utilizadas não permitem captar. O estudo sistemático dos inventários post mortem pode
ajudar a elucidar algumas dessas questões. Os próximos capítulos baseiam-se principalmente
nessa fonte. Entre os objetivos propostos estão analisar a composição da riqueza inventariada,
o peso dos escravos e cacaueiros no conjunto dos bens, as diferenças das fortunas dos grupos
sociais, as atividades econômicas, dentre outras questões relacionadas com a escravidão e
economia em Ilhéus no período 1850-1888.
89

CAPÍTULO III
A COMPOSIÇÃO DA RIQUEZA NOS INVENTÁRIOS POST MORTEM.
ILHÉUS, 1850-1888

3.1 - Introdução

Os estudos sobre a composição da riqueza a partir de inventários post mortem é uma


linha de investigação da História econômica brasileira praticamente consolidada, com
pesquisas abrangendo diferentes espaços e temporalidades.206 Nesse capítulo analisaremos a
composição da riqueza de Ilhéus com base na investigação desses processos judiciais, abertos
entre 1850 e 1888, e preservados no Arquivo Público do Estado da Bahia (APEB).
O objetivo geral é avaliar a importância do cacau e dos escravos no conjunto dos bens.
Queremos saber se a produção de cacau era a principal atividade econômica da população
inventariada e qual o lugar dos escravos nessa atividade. Estamos interessados em conhecer as
características dos produtores de cacau e das plantações, o uso da terra e a concentração da
riqueza.
Os inventários post mortem oferecem grandes possibilidades para a realização desses
estudos. Constituem um verdadeiro convite ao historiador interessado em conhecer diversos
aspectos da vida dos indivíduos e das famílias no espaço e no tempo, contendo informações
detalhadas sobre os bens que compõe o patrimônio.
Para alcançarmos os objetivos propostos foi necessário o auxílio de um banco de
dados, no qual registramos as informações sobre os bens arrolados nos inventários de Ilhéus.
O banco é composto por diferentes grupos, cada um correspondendo a determinado tipo de
bem e ocupando uma planilha no programa computacional, com informações quantitativas e
qualitativas próprias, específicas daquele bem207.
Os grupos tentam seguir as etapas que, no geral, os processos de inventários
obedecem, desde a abertura até a partilha. Assim, organizamos cada planilha com
informações específicas sobre os seguintes itens: Inventários, Herdeiros, Móveis, Animais,

206
Para uma discussão historiográfico sobre o uso dos inventários ver, entre outros, COSTA, Fernando Antônio
Alves da. Em distantes paragens: demografia, riqueza, escravidão e mercado em Santa Rita do Turvo na
segunda metade do Oitocentos. Tese (Doutorado em História). FFLCH - USP, São Paulo, 2014. (Cap. I – O
estudo da riqueza como instrumento para a análise das formações sociais e econômicas do passado brasileiro).
Sobre os limites e potencialidades dos inventários como fonte histórica ver, entre outros, MORENO, Breno
Aparecido Servidone. Demografia e trabalho escravo nas propriedades rurais cafeeiras de Bananal, 1830-1860.
Dissertação. (Mestrado em História). FFLCH-USP, São Paulo, 2013; ARAÚJO, Maria Lucília Viveiros de. Os
caminhos da riqueza dos paulistanos na Primeira metade do Oitocentos. São Paulo: Hucitec: Fapesp, 2006.
207
Agradeço ao Breno Aparecido Servidone Moreno, que forneceu o Banco de Dados e me auxiliou nas
instruções de uso, além de ajudar nas dúvidas que surgiram durante a transcrição dos inventários de Ilhéus.
90

Escravos, Culturas, Imóveis, Terras, Dívidas ativas, Dívidas passivas e Partilhas, cada um
contento descrições próprias do grupo, com os respectivos valores alocados, sendo que na
planilha de Partilhas encontra-se a distribuição da riqueza por item, o cálculo da soma da
fortuna (Monte-mor) e a divisão dela entre os herdeiros.
Essa fragmentação do patrimônio permite uma compreensão global da composição da
riqueza e possibilita averiguar cada grupo separadamente, assim como a representatividade
deles dentro da fortuna.
Inicialmente investigamos o peso relativo dos escravos e dos pés de cacau no conjunto
dos bens inventariados ao longo das décadas. Em seguida tratamos das hierarquias sociais,
aprofundando as análises sobre os produtores de cacau e suas singularidades. Depois
investigamos as culturas, principalmente as plantações de cacau, e o uso terra.
A proposta do capítulo é compreender a dinâmica entre a composição da riqueza, o
desenvolvimento da economia e a utilização do trabalho escravo.
A nossa hipótese é que os escravos foram importantes ativos do desenvolvimento da
economia de Ilhéus, e estavam presentes em diversas atividades relacionadas com a
subsistência, mercado interno e exportações, sendo parte considerável do patrimônio de
muitos inventariados.
91

3.2 - Escravos e cacaueiros no conjunto dos bens inventariados

A maioria dos inventários post mortem abertos no Cartório de Ilhéus são processos
judiciais movidos pelos herdeiros das pessoas falecidas, que tinham interesse na divisão e/ou
preservação do patrimônio. No entanto, em alguns casos a própria justiça intimou os
familiares a realizarem a abertura do inventário, para resguardar a herança dos órfãos, ou para
atender pedidos de credores, geralmente negociantes, que recorriam à justiça para tentar
receber as dívidas contraídas pelo falecido.
De todo modo, por intimação ou livre vontade do inventariante, o juiz nomeava dois
avaliadores para realizarem a avaliação do patrimônio. Após o juramento de fidelidade esses
louvados, como eram chamados na época, se dirigiam para a propriedade do falecido e
realizavam a avaliação dos bens, junto com o escrivão, que descrevia de forma detalhada os
itens da riqueza e seus valores.
Essa documentação permite conhecer a realidade da vida material dos moradores de
Ilhéus, particularmente os que deixaram riquezas inventariadas entre 1850 e 1888, e cujos
processos sobreviveram ao nosso tempo. Outros pesquisadores já utilizaram essa
documentação em seus estudos sobre a escravidão na localidade, mas não exploraram toda
potencialidade da fonte208. Em nossa pesquisa analisamos 345 inventários, entre eles
encontram-se partilha amigável, arrolamento e arrecadação de bens. O foco das análises são
os aspectos econômicos relacionados com a composição da riqueza, a escravidão e
desenvolvimento da economia cacaueira.
Normalmente, nas primeiras páginas do inventário descreve-se a data de abertura do
processo, a localização do cartório e da residência da pessoa falecida, nome do inventariado,
inventariante, dos louvados, do juiz, dentre outras informações. Isso permitiu verificar a
distribuição espacial das pessoas inventariadas, como mostra o Gráfico 3.1, lembrando que
algumas tinham mais de uma residência.

208
Ver, entre outros, MAHONY, Mary Ann. The world cacao made: society, politics ann history in Sourthern
Bahia, Brazil, 1822-1889. Ph. D. dissertation, Yale University. Parte desse estudo foi publicado no Brasil com o
título – “Instrumentos necessários:” Escravidão e posse de escravos no sul da Bahia no século XIX, 1822-1889.
Afro-Ásia, Salvador, n. 25-26, p. 95-139, 2001; GONÇALVES, Victor Santos. Escravos e senhores na terra do
cacau: alforrias e família escrava (São Jorge dos Ilhéos, 1806-1888). Dissertação (Mestrado em História).
FFCH-UFBA, Salvador, 2014.
92

Gráfico 3.1 – Distribuição espacial dos inventariados. Ilhéus, 1850-1888

Fonte: APEB, Seção Judiciária (SJ). Ilhéus, 345 processos de inventários, 1850-1888.

A maioria dos processos refere-se aos moradores de Ilhéus (39%), sem mencionar
nomes de lugares ou distritos específicos, mas às vezes mencionando o nome de ruas.
Certamente essa parcela era formada por pessoas que residiam na vila ou no seu termo.
Em segundo lugar destaca-se, em ordem de importância numérica, o distrito de
Cachoeira de Itabuna, abrangendo esta localidade 29% dos inventariados. O rio Cachoeira era
a principal via de acesso a esse distrito, localizado aproximadamente 30 Km da costa
litorânea, como explicamos no primeiro capítulo. Ao longo das décadas o número de
processos de moradores deste lugar cresceu, indicando que o povoamento daquela área estava
se intensificando.
Outros rios próximos de Ilhéus também foram importantes para ocupação do território
e disseminação da lavoura cacaueira. Os rios Almada e Itaípe, por exemplo, aparecem com
frequência entre as localidades dos inventariados. Na freguesia de Una, situada ao sul de
Ilhéus, o rio Maruim também foi uma via importante de ocupação e exploração do território.
Outras pessoas inventariadas estavam espalhadas na costa litorânea ou nas margens
dos vários rios existentes naquele espaço, encontramos moradores de Olivença, Sambaituba,
Iguape, Cururupe, Mamoam, Ponta do Ramo, Banco do Pedro, entre outras.
93

Essas localidades foram fundadas e cresceram em território já ocupado por diversos


povos indígenas, que compunham a maioria da população, além de outra parcela expressiva
de crioulos e africanos, alguns vivendo e trabalhando como escravos209.
Entre os 345 inventários analisados doze estão muito incompletos e/ou sem descrição
alguma dos bens, extremamente deteriorados, ou os trâmites não foram levados adiante por
diversos motivos.
Em 1885, por exemplo, foi aberto o inventário do índio João Caboclo, que possuía
algum dinheiro recolhido na tesouraria da Fazenda Provincial e deixou como únicos herdeiros
dois sobrinhos menores e uma dívida que segundo o credor, José Carlos Adami, era da
quantia de Rs. 60$500. O curador geral dos órfãos nomeou Adão Schaum como tutor dos
menores e ao que parece os trâmites encerraram-se aí, apesar das queixas do credor sobre a
demora no andamento do processo210.
Nesse caso, como em outros semelhantes, não é possível saber detalhes sobre os bens,
nem mesmo o valor que João Caboclo possuía foi declarado. Talvez o processo tenha sido
retomado posteriormente, mas não conseguimos saber. Desse modo, eliminamos doze
processos e ficamos com um conjunto de 333 inventários post mortem com algum potencial
de investigação sobre a composição da riqueza.
No geral, as pessoas inventariadas eram de diversas condições sociais, com grandes
contrastes em suas fortunas. Todavia, não estão contempladas nos inventários as camadas
sociais sem patrimônio, abrangendo boa parte da população.
Entre os processos investigados encontramos desde pequenos produtores de cacau,
café, farinha de mandioca, coco, e outras culturas, até grandes negociantes, alguns com
fazendas, engenho, escravos e imóveis na vila e na área rural. A diferença entre eles pode ser
percebida, por exemplo, pelo valor do monte-mor, ou seja, a riqueza bruta, resultado da soma
de todos os bens mais as dívidas ativas. Essas diferenças refletem as condições de vida da
população e as hierarquias sociais constantes na localidade.
A posse de escravos, por exemplo, não estava presente em todos os inventários. Ainda
que a escravidão estivesse disseminada na sociedade e economia Ilhéus muitos não tinham

209
Ver, entre outros, FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro de; PARAÍSO, Maria Hilda Baqueiro. Caminhos
ao encontro do mundo: a capitania, os frutos de ouro e a princesa do Sul: Ilhéus, 1534-1940. Ilhéus: Editus,
2001; NÓS, Tupinambá. Índios na visão dos índios. Textos e fotos da comunidade indígena Tupinambá de
Olivença. Edição Sebastian Gerlic. Maceió, 2008. HÂ-HÂ-HÃE, Pataxó. Índios na visão dos índios. Textos e
fotos da comunidade indígena Pataxó hâ-hâ-hâe. Edição Sebastian Gerlic. Maceió, 2008. Disponível em
www.indiosonline.org.br acesso em dez. 2018.
210
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. João Caboclo. Est. 02, Cx. 761, Maço 1227, Doc. 14, 14 nov.
1885.
94

condições de comprar e manter escravos. Entre os 333 processos investigados encontramos


escravos em 121 casos (36%).
A primeira década (1850-1859) apresenta o problema da baixa representatividade do
número de processos, apenas 19 inventários foram localizados, o que impõe limites para uma
análise razoavelmente segura deste período. Nas demais alcançamos médias anuais
relativamente confiáveis, ou seja, na década de 1860 computamos 63 inventários e média
anual de 6,3 processos, na seguinte (1870-1879) 121 inventários e na última, que na verdade
compreende nove anos (1880-1888), encontramos 130 inventários, com média anual de 14,4
processos.
O Gráfico 3.2 mostra a distribuição dos inventários por décadas segundo a presença de
escravos.

Gráfico 3.2 – Distribuição dos inventários por décadas segundo a presença de


escravos. Ilhéus, 1850-1888
140
120
Nº DE INVENTÁRIOS

100
80
60
40
20
0
1850-1859 1860-1869 1870-1879 1880-1888

Com escravos Sem escravos


Fonte: APEB, Sessão Judiciária (SJ), 333 processos de inventários. Ilhéus, 1850-1888.

Observando os dados do Gráfico 3.2 percebemos que o número de inventários com


presença de escravos manteve-se concentrado ao longo do período 1850-1888, visto que a
maior proporção foi de processos sem cativos. Assim, acreditamos que a escravidão não se
expandiu junto com o processo de crescimento da lavoura cacaueira.
Para aprofundar essa questão vamos analisar a composição da riqueza a partir da
distribuição global dos diferentes tipos de bens, somando os valores líquidos alocados em
cada um deles, apresentando as somas e os percentuais correspondentes. Isso permite conferir
quais eram os principais componentes da riqueza dos inventariados de Ilhéus, verificar o peso
95

relativo dos escravos e cacaueiros, bem como as mudanças na forma de acumulação da


riqueza ao longo do tempo.
Para realizar os cálculos computamos somente os valores considerados na partilha
final do inventário. É importante ressaltar essa questão porque às vezes alguns bens eram
contestados, outros tinham seus valores depreciados, outros simplesmente desapareciam.
Houve caso de escravos que morreram ou fugiram durante os trâmites do processo, algumas
dívidas não foram acatadas pelo juiz por falta de provas, entre outros casos semelhantes.
Outro agravante deste método, que impõe limites nas análises longitudinais, diz
respeito à questão da inflação. Os historiadores, de modo geral, enfrentaram essa questão
desconsiderando as oscilações da moeda durante o Império, sendo que o peso dos bens é
sempre tomado em termos relativos, especialmente quando realizam-se comparações sobre a
distribuição da riqueza ao longo do tempo, sempre que necessário vamos advertir o leitor para
esta questão.
A Tabela 3.1 mostra a distribuição dos bens declarados nos inventários de Ilhéus por
décadas. A fragmentação em colunas segue ordem cronológica, da esquerda para a direita, e
na última coluna apresentamos o resultado da soma global de todos os bens inventariados no
período 1850-1888. Ao lado de cada década, entre parêntese, encontra-se o número de
inventários utilizados.
96

Tabela 3.1 – Distribuição dos bens inventariados por décadas (valores em réis). Ilhéus, 1850-1888
PERÍODOS/TIPOS DE BENS 1850-1859 - (19) 1860-1869 - (63) 1870-1879 - (121) 1880-1888 - (130) 1850-1888 - (333)
BENS DE RAIZ VALORES (%) VALORES (%) VALORES (%) VALORES (%) VALORES (%)
Cacaueiros 12.532,000 10,6 51.444,400 15,0 153.019,880 21,4 252.454,000 28,2 469.450,280 22,6
Imóveis 23.612,380 20,0 61.781,967 18,0 108.931,100 15,2 153.805,000 17,2 348.130,447 16,8
Terras 8.726,545 7,3 26.967,111 7,8 79.569,771 11,1 63.066,285 7,1 178.329,712 8,6
Outras Culturas 2.087,800 1,7 5.726,480 1,7 18.863,400 2,6 14.267,720 1,6 40.945,400 2,0
Subtotal 46.958,725 39,6 145.919,958 42,5 360.384,151 50,3 483.593,005 54,1 1.036.855,839 50,0

ESCRAVOS E SEMOVENTES VALORES (%) VALORES (%) VALORES (%) VALORES (%) VALORES (%)
Escravos 34.889,110 29,4 139.970,000 40,7 166.308,980 23,2 100.190,320 11,2 441.358,410 21,3
Animais 1.118,000 1,0 6.338,000 1,9 10.581,000 1,5 14.999,000 1,7 33.036,000 1,6
Subtotal 36.007,110 30,4 146.308,000 42,6 176.889,980 24,7 115.189,320 12,9 474.394,410 22,9

BENS MOVEIS VALORES (%) VALORES (%) VALORES (%) VALORES (%) VALORES (%)
Móveis 8.990,245 7,6 14.324,845 4,2 86.620,727 12,1 63.460,730 7,0 173.396,547 8,4
Outros (1) 2.047,366 1,7 540,964 0,1 1.620,449 0,2 7.624,723 1,0 11.833,502 0,6
Subtotal 11.037,611 9,3 14.865,809 4,3 88.241,176 12,3 71.085,453 8,0 185.230,049 9,0

DÍVIDAS VALORES (%) VALORES (%) VALORES (%) VALORES (%) VALORES (%)
Dívidas Ativas 24.485,610 20,7 36.384,245 10,6 90.752,079 12,7 224.007,497 25,0 375.629,431 18,1
Dívidas Passivas 45.587,622 - 41.094,278 - 121.253,433 - 262.047,593 - 468.415,860 -
TOTAL (2) 118.489,056 100,0 343.478,012 100,0 716.267,386 100,0 893.875,275 100,0 2.072.109,729 100,0
Fonte: APEB. Seção Judiciária (SJ). 333 Processos de inventários. Ilhéus, 1850-1888.
(Nº) Número de inventários por década.
(1) Inclui bens não identificados e/ou ilegíveis devido ao estado de conservação do documento.
(2) Não inclui dívidas passivas.
97

Os dados da Tabela 3.1 evidenciam a importância dos cacaueiros (pés de cacau) e dos
escravos na composição da riqueza de Ilhéus. De modo global (1850-1888), os bens estavam
distribuídos da seguinte forma, em ordem de importância econômica: cacaueiros (22,6%),
escravos (21,3%), dívidas ativas (18,1%) e imóveis (16,8%). Somando os percentuais
relativos às plantações de cacau e aos escravos notamos que 43,9% de todas as fortunas
declaradas nos inventários de Ilhéus estavam alocadas nesses bens, mas nem todos detinham a
posse de escravos.
Não obstante, observando os valores relativos às outras culturas percebemos que
foram sempre inferiores às quantias alocadas nos cacaueiros, sugerindo que ao longo da
segunda metade do Oitocentos os moradores de Ilhéus investiram, principalmente, no cultivo
de cacaueiros. Na década de 1860 as plantações deste fruto representavam 15% do total da
riqueza inventariada e no último período (1880-1888), esse índice foi para 28,2%. Ao que
parece na década de 1880 a produção de cacau se tornou uma atividade com importância
econômica significativa para a população de Ilhéus.
Sobre o peso relativo dos escravos verificamos que declinaram de 40,6% na década de
1860 para 11,2% no período 1880-1888, mas ao longo do período eles continuaram como um
dos principais componentes do patrimônio de determinado grupo de inventariados. Em março
de 1888 ainda existiam nove escravos no Engenho São João do Pasto, que correspondiam a
27% da fortuna inventariada211.
Esse declínio do peso dos escravos na riqueza não é específico de Ilhéus, quiçá de todo
o Brasil, visto que desde a década de 1830 a instituição escravista vinha sofrendo os efeitos da
interferência do Estado, que se agravou, sobretudo após a lei do Ventre Livre (1871), que
declarou os filhos das escravas nascidos a partir daquela data como sendo de condição livre
(ingênuos), e os mesmos deixaram de ser avaliados212. Outrossim, em 1885 a lei do
sexagenário “libertou” os escravos acima de 60 anos, e eles também deixaram de ser
avaliados nos inventários213.

211
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Firmino Pires Caldas. Est. 03, Cx. 1372, Maço 1841, Doc. 14, 10
mar. 1888.
212
BRASIL. Lei nº 2.040, de 28 de setembro de 1871. Art. 1º Os filhos de mulheres escravas que nascerem no
Império desde a data desta lei, serão considerados de condição livre. In: Coleção das Leis do Império do Brazil.
Disponível em: <https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao/doimperio>. Acesso em 24 de mar.
2016.
213
BRASIL. Lei nº 3.270, de 28 de setembro de 1885. Art. 1º § 5º Não serão dados á matricula os escravos de 60
annos de idade em diante; serão, porém, inscriptos em arrolamento especial para os fins dos §§ 10 a 12 do art. 3º. In:
Coleção das Leis do Império do Brazil. Disponível em: <https://www2.camara.leg.br/atividade-
legislativa/legislacao/doimperio>. Acesso em: 24 mar. de 2018.
98

Os demais bens mantiveram a importância relativa no grupo de modo mais ou menos


estável, com exceção das dívidas, que aumentaram no período, tanto as ativas (a receber),
quanto as passivas (a pagar), o que pode ser reflexo da atuação dos negociantes. Como
ressaltamos no primeiro capítulo o número de casas de negócios aumentou em Ilhéus no
período 1874-1892214, assim, esses dados sugerem que, em certa medida, houve
desenvolvimento do sistema de crédito ao longo dos anos. Ademais, alguns negociantes
recebiam gêneros da lavoura como pagamento das contas realizadas em seus
estabelecimentos215.
Sobre os animais os dados da Tabela 3.1 mostram que o peso relativo desse grupo
nunca ultrapassou 2% do total da riqueza inventariada, indicando que no período 1850-1888
não houve crescimento da pecuária na comarca de Ilhéus, ao contrário de certas áreas do
sertão da Bahia216. Dentre os grupos de animais predominaram os bovinos, com destaque para
os bois do serviço de lavoura. Todavia, a partir de 1885 começou a aparecer muares nos
inventários, indicando mudanças no transporte terrestre de pessoas e mercadorias.
Os imóveis declarados nos inventários de Ilhéus concentraram parcela significativa da
riqueza, mas os índices mantiveram-se relativamente estáveis no período, entre 15% e 20%,
aproximadamente. Contudo, percebemos que a partir do ano de 1868 começou a surgir nos
inventários casas com balcões para secar cacau, indicando que a lavoura estava se
expandindo.
As análises globais, no entanto, encobrem as particularidades, muito importantes para
o entendimento das mudanças na economia de Ilhéus. Afinal, quantos inventários tinham a
presença de cacaueiros? Quais os outros tipos de culturas inventariadas? Já demonstramos que
ao longo das décadas o número de inventários sem posse de cativos aumentou, mas ainda não
sabemos quem concentrava a propriedade escrava.
Para responder essas questões analisaremos as atividades econômicas dos
inventariados para percebermos as diferenciações entre eles, em seguida vamos verificar o
tamanho do patrimônio (em réis) e estabelecer comparações, com o objetivo de entender as
nuances relacionada com a economia e escravidão.

214
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre casas de negócios. Maço 5455. Ilhéus, 1874-1892.
215
Sobre o assunto ver capítulo 7: Credores e devedores na economia de Ilhéus, 1850-1888, p. 229.
216
Em Caitité, por exemplo, os investimentos em gado vacum chegaram a 12,98% no quinquênio 1870-1874.
PIRES, Maria de Fátima Novaes. Fios da vida: tráfico interprovincial e alforrias nos Sertoins de Sima-BA
(1860-1920). São Paulo: Annablume, 2009. p. 132 (Tabela 12)
99

3.3 - Os produtores de cacau e as hierarquias sociais nos inventários

Antes de analisarmos quantos inventariados de Ilhéus estavam envolvidos com o


cultivo de cacau vamos investigar a distribuição das fortunas nos processos de inventários,
para entendermos a distribuição das fortunas em diferentes faixas de riqueza e se havia
concentração.
Para realização desta tarefa utilizamos critério de classificação das fortunas
semelhante ao estabelecido por Kátia M. de Queiróz Mattoso em seu estudo sobre Salvador
no século XIX, cuja fonte também foi inventários post mortem217. Esta opção foi motivada
pelo interesse em comparar a riqueza nas duas localidades e dimensionar a importância
econômica dos inventariados de Ilhéus durante o processo de formação da economia
cacaueira.
A Tabela 3.2 apesenta o resultado dessa distribuição.

Tabela 3.2 – Classificação das fortunas inventariadas. Ilhéus, 1850-1888


CLASSIFICAÇÃO DAS FAIXAS DE RIQUEZAS INVENTÁRIOS SOMA DAS FORTUNAS
FORTUNAS (em réis) Nº % (contos de réis) %
1. Muito pequenas até :200 12 3,6 1.519,100 0,1
2. Pequenas :201 a 1:000 99 29,7 59.885,073 2,9
3. Médias baixas 1:100 a 2:000 58 17,4 87.613,857 4,2
4. Médias 2:100 a 10:000 112 33,6 518.835,987 25,0
5. Grandes baixas 10:100 a 50:000 45 13,5 955.467,432 46,1
6. Grandes 50:100 a 200:000 7 2,1 448.788,280 21,7
SOMA 333 100,0 2. 072,109,729 100,0
Fonte: APEB. Seção Judiciária (SJ). 333 Processos de inventários. Ilhéus, 1850-1888.

A Tabela 3.2 demonstra que no computo geral a riqueza declarada nos inventários de
Ilhéus não se concentrava na faixa das fortunas muito pequenas. Kátia Mattoso considerou
nesta condição as pessoas com até Rs. 200$000 (duzentos mil réis (:200)), sendo que entre os
720 inventários analisados para Salvador no período 1851-1889, apenas cinco (0,7%) tinham
fortunas nesta faixa, enquanto em Ilhéus esta cifra foi de 3,6%218.
Comparando a riqueza nas duas localidades percebemos contrastes e semelhanças.
Entre os inventariados de Ilhéus 29,7% detinha riqueza classificada como pequena, enquanto
em Salvador somente 10% estava nesta categoria, este é um contraste entre as duas

217
MATTOSO, Kátia Maria de Queirós. Bahia, século XIX: uma província no Império. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 1992. p. 608 e 611 (Tabelas 105 e 107)
218
Ibidem
100

localidades. Por outro lado, em Ilhéus, aproximadamente um terço (33,6%) dos inventariados
tinha fortunas classificadas como médias (entre dois contos e cem mil réis até dez contos de
réis( 2:100 a 10:000), enquanto em Salvador no mesmo período 37% dos inventariados estava
nesta condição, sendo que neste caso notamos semelhança.
Contudo, as maiores fortunas declaradas nos inventários de Ilhéus chegaram no
máximo à categoria das fortunas classificadas como Grandes baixas na capital baiana
(200:000 a 500:000), que possuía pessoas com fortunas superiores a Ilhéus, isto é, Grandes
médias (200:100 a 500:000), representando 2,9% dos inventariados e concentravam 29,5%
das fortunas, e Grandes (500:100 a 1.000:000), representando 0,4% dos inventariados e
concentrando 10,9% de toda riqueza219.
Isso significa que no computo geral os inventariados de Salvador tinham riquezas
maiores que os inventariados de Ilhéus, apesar de aproximadamente um terço possuírem
fortunas semelhantes, ou seja, dentro da faixa de riqueza considera como média.
Porém, nas duas localidades encontramos altos níveis de concentração da riqueza. Em
Salvador 14,5% dos inventariados entre 1851-1889 detinha 72% de toda fortuna e em Ilhéus
15,6% concentrou 68% de toda riqueza inventariada no período 1850-1888. Ao que parece as
atividades econômicas que se desenvolveram em Ilhéus na segunda metade do século XIX
contribuíram para aumentar a fortuna de uma parcela da população220. Desse modo, cabe
investigar quais as atividades econômicas dos inventariados que detinham as maiores e
menores fortunas em Ilhéus nessa época, para tentarmos entender o lugar dos produtores de
cacau no contexto.
Os inventários post mortem oferecem a possibilidade de investigar as hierarquias
sociais. No final de cada processo os avaliadores somam o montante bruto da riqueza da
pessoa falecida (monte-mor), descontam as dívidas passivas, os gastos com a abertura e
realização do processo, e depois repartiam o monte líquido entre os herdeiros.
Analisaremos as hierarquias sociais em Ilhéus a partir desta documentação,
comparando o valor da riqueza dos inventariados. Estamos interessados em identificar os
grupos que tinham as maiores e as menores fortunas, o lugar dos produtores de cacau, a
concentração da riqueza e a posse de escravos.
Inicialmente procuramos identificar a ocupação principal dos indivíduos a partir da
análise da composição de suas riquezas. Para isso realizamos uma investigação minuciosa dos

219
MATTOSO, Kátia Maria de Queirós. Bahia, século XIX: uma província no Império. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 1992. p. 608 e 611 (Tabelas 105 e 107)
220
Ibidem.
101

bens inventariados e a importância econômica deles no conjunto do patrimônio. A partir daí


definimos diferentes categorias ocupacionais, que não devem ser entendidas como categorias
fixas (congeladas), já que muitas pessoas estavam envolvidas em várias atividades.
Os inventários dos donos de engenho, por exemplo, normalmente descrevem o nome
da propriedade, as plantações de cana, as moendas, os cilindros, os tachos de cobre, os
tanques, roda d’água, formas de açúcar, entre outros móveis. Na maioria das vezes a riqueza
se concentrava no mobiliário do engenho, em escravos, terras e imóveis, mas isso não foi
regra. Alguns donos de engenho, a minoria, tinham balcões, armazéns e realizavam negócio, a
maior parte deles produzia, além de açúcar, cachaça e farinha de mandioca, e uma pequena
parcela tinha plantação de cacau, sendo que entre eles os proprietários do Engenho Castelo
Novo foram os que localizamos com a maior plantação (2 mil cacaueiros), que representava
apenas 4,4% da fortuna inventariada221. Assim, apesar de praticarem outras atividades, grande
parte da riqueza estava alocada no mobiliário do engenho e todos possuíam terras e escravos.
Os negociantes compunham outra categoria que encontramos certos riscos na hora de
identificar. Em muitos casos os avaliadores descreveram listas com os gêneros da casa de
negócio, os balcões, a relação dos devedores e outros bens. Contudo, alguns possuíam outras
ocupações, eram membros da Guarda Nacional, tinham sítios ou fazendas na zona rural, eram
donos de terras, a maioria tinha posse de alguns escravos, porém a minoria possuía plantações
de cacau. Desse modo, constatamos que a atividade econômica principal deles se relacionava
com os negócios, apesar de terem outras ocupações.
Na categoria dos produtores de cacau incluímos as pessoas com fortuna alocada,
principalmente, nas plantações de cacaueiros, porém, alguns tinham acessórios para produção
de farinha, cachaça, tinham plantações de café, e outros móveis. Entre eles encontramos casos
em que os imóveis e ou escravos representavam parcela maior do patrimônio, mas notamos
que a atividade econômica principal se relacionava com o cultivo de cacaueiros, assim, a
partir desta verificação optamos por defini-los como produtores de cacau. Esse critério
também foi utilizado para definição dos inventariados inseridos na categoria dos produtores
de farinha, café e coco. Incluímos nesta categoria aqueles que tinham parcela significativa dos
bens relacionada com estas atividades, como casas de farinha, rodas de ralar mandioca,
moinhos de café, tachos de cobre, plantações de coco, café e mandioca, porém, alguns
praticavam mais de uma atividade econômica e às vezes os imóveis e/ou escravos

221
APEB, Seção Judiciária. Inventários. Ilhéus. Maria José Leola Del Rey e Carolina Leola Del Rey. Esta. 02.
Cx. 786, Maço 1253. Doc. 06, 28 de fev. 1861.
102

sobressaíram no montante da riqueza, mas a composição do patrimônio indica que


praticavam, principalmente, atividades relacionadas com produção de farinha, café e coco.
Afora esses casos, encontramos inventariados ligados às profissões liberais e
funcionários eclesiásticos, bem como pessoas envolvidas com a exploração de madeiras ou
com lavouras de mandioca. Ademais não foi possível identificar qual era a atividade
econômica de parte dos inventariados, que foram inseridos na categoria ocupacional como
“não identificada”.
Consideramos que essa metodologia de classificação das ocupações dos inventariados
envolve sérios riscos, muitas vezes inerentes ao ofício do historiador. Assim, optamos por
assumi-los considerando ser esta a melhor saída para abordarmos o contexto histórico
investigado. Outrossim, para não reduzirmos as atividades econômicas dos inventariados a
apenas uma ocupação oferecemos um quadro contendo as ocupações que consideramos como
principais e outra, que normalmente combinava-se a esta, que classificamos como ocupações
secundárias. O Quadro 3.1 mostra essas categorias ocupacionais.

Quadro 3.1 – Quadro de ocupações dos inventariados. Ilhéus, 1850-1888.


OCUPAÇÃO PRINCIPAL Nº % OCUPAÇÃO SECUNDÁRIA Nº %
Produtores de cacau 215 64,5 Não possui outra ocupação 132 39,6
Negociantes 39 11,8 Produz farinha 53 16,0
Produz Farinha +
Donos de engenho 12 3,6 45 13,5
(café e/ou coco, outros)
Produz Farinha +
Produtores de coco 11 3,3 14 4,2
(cachaça e/ou cacau, dendê, outros)
Produtores de farinha 8 2,4 Produz ou café e/ou coco e/ou cacau 33 9,9
Produtores de café 5 1,5 Possui pequenas criações 10 3,0
Pequenos criadores 4 1,2 Possui Lavoura de mandioca 5 1,5
Profissionais liberais 4 1,2 Outras produções 11 3,3
Func. Eclesiástico 2 0,6 Não identificada 30 9,0
Madeireiro 1 0,3
Produtor de inhame 1 0,3
Dono de engenhoca 1 0,3
Não identificada 30 9,0
TOTAL 333 100,0 TOTAL 333 100,0
Fonte: APEB, SJ. 333 processos de inventários. Ilhéus, 1850-1888.

O Quadro 3.1 mostra que 64,5% dos inventariados tinha nas plantações de cacaueiros
a ocupação principal, em seguida aprece os negociantes, representando 11,8 dos inventariados
e os donos de engenho 3,6%. Os demais estavam envolvidos com produção de farinha, café,
103

coco e outras ocupações menos representativa no conjunto dos inventários, como mostra o
Quadro 3.1.
Entre as ocupações secundárias uma parte significativa (39,6%) não possuía outra
ocupação, além da principal, quando falecera. A maioria, no entanto, combinava a ocupação
principal com a produção de farinha de mandioca. Somando os percentuais de todos
envolvidos com a produção de farinha constatamos que 33,7% dos inventariados praticava
essa atividade, muitas vezes combinando-a com outras, produção de farinha com café, coco,
cachaça, dendê e outras.
Assim, notamos que a produção de farinha de mandioca combinava-se com a
ocupação principal da maioria dos inventariados, sendo esta atividade importante não somente
para subsistência e abastecimento interno da população de Ilhéus como também nas
exportações destinadas à capital da província. Bert J. Barickman realizou uma estimativa da
produção de farinha da comarca de Ilhéus entre 1785 e 1865, destacando que em 1864 Ilhéus
enviou 2.656 alqueires de farinha para Salvador e no ano seguinte foram despachados 4.466
alqueires do produto para a capital222, demonstrando assim a importância deste produto para a
economia de Ilhéus.
De modo geral as combinações foram diversificadas por todo período, incluindo
frequentemente produção de cacau, farinha, café e coco. Todavia, é oportuno lembrar que
muitas atividades de subsistência não aparecem nos inventários, como a caça, a pesca, a
mariscagem, por exemplo, invisíveis na documentação, mas que integravam o cotidiano da
população de Ilhéus.
Como salientamos anteriormente, essa diversidade impõe limites ao historiador na
hora de definir a ocupação principal dos inventariados, sendo que do ponto de vista
metodológico não é viável classificar e analisar separadamente cada um dos 333
inventariados, assim, para nos aproximarmos da realidade socioeconômica deles, realizamos o
cruzamento das duas categorias ocupacionais, apresentadas no Quadro 3.1, o que a nosso ver
permite conhecermos melhor as combinações das atividades econômicas dos inventariados. A
Tabela 3.3 mostra o resultado dessas combinações.

222
BARICKMAN, Bert J. Um contraponto baiano: açúcar, fumo, mandioca e escravidão no Recôncavo, 1780-
1860. Tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. p. 155 (Tabela 9)
104

Tabela 3.3 – Distribuição das ocupações principais e secundárias dos inventariados. Ilhéus, 1850-1888
OCUPAÇÕES SECUNDÁRIAS

Não possui outra ocupação

e/ou cacau, dendê, outros)


Produz Farinha + (cachaça,

Produz ou café e/ou coco

Possui pequenas criações

Lavradores de mandioca
(café e/ou coco, outros)

(bovinos ou muares)
e/ou cacau, outros)

Outras produções
Produz Farinha +

Não identificada
Produz Farinha
OCUPAÇÕES
PRINCIPAIS

TOTAL
Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %
Produtores de cacau 98 45,6 46 21,4 31 14,4 9 4,2 14 6,5 4 1,9 5 2,3 8 3,7 0 0,0 215 100,0
Negociantes 17 43,6 0 0,0 7 17,9 2 5,1 9 23,1 2 5,1 0 0,0 2 5,1 0 0,0 39 100,0
Donos de engenho 1 8,3 1 8,3 4 33,3 4 33,3 1 8,3 1 8,3 0 0,0 0 0,0 0 0,0 12 100,0
Produtores de coco 3 27,3 3 27,3 0 0,0 1 9,1 2 18,2 1 9,1 0 0,0 1 9,1 0 0,0 11 100,0
Produtores de farinha 3 37,5 0 0,0 0 0,0 0 0,0 3 37,5 1 12,5 0 0,0 1 12,5 0 0,0 8 100,0
Produtores de café 1 20,0 0 0,0 1 20,0 0 0,0 3 60,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 5 100,0
Pequenos criadores 1 25,0 2 50,0 0 0,0 0 0,0 1 25,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 4 100,0
Profissionais liberais 4 100,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 4 100,0
Func. Eclesiásticos 2 100,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 2 100,0
Madeireiro 1 100,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 1 100,0
Produtor de inhame 1 100,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 1 100,0
Dono de engenhoca 0 0,0 0 0,0 1 100,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 1 100,0
Não identificada 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 30 100,0 30 100,0
TOTAL 132 39,6 52 15,6 44 13,2 16 4,8 33 9,9 9 2,7 5 1,5 12 3,6 30 9,0 333 100,0
Fonte: APEB, SJ. 333 inventários. Ilhéus, 1850-1888.
105

A Tabela 3.3 revela o universo das atividades econômicas existente entre os


inventariados de Ilhéus, com as respectivas combinações. Entre os produtores de cacau quase
a metade (45,6%) não possuía outra ocupação, dedicava-se principalmente ao cultivo de
cacaueiros. Outra parte (21,4%) consorciava plantação de cacau com produção de farinha,
outros incrementavam essas duas atividades com produção de cachaça, cultivo de café, coco,
dendê e pequenas criações.
Entre os negociantes o mais comum foi a dedicação principal aos negócios, 43,6% não
possuía outra atividade. Não obstante 23,1% tinha, além dos negócios, produção de café e/ou
coco e/ou cacau e 17,9% consorciava a ocupação principal com a produção de farinha de
mandioca, incrementada ou não com outras culturas.
Os donos de engenho, além de produzirem açúcar, se dedicavam à produção de farinha
de mandioca mais café e/ou coco (33,3%), outros consorciavam as atividades do engenho com
a produção de farinha, cachaça, dendê (33,3%), além de uma parte deles possuir pequenas
criações de bovinos e/ou muares (8,3%).
Os demais inventariados faziam parte do grupo de pequenos lavradores, com riquezas
apoiadas principalmente na produção de farinha, café e coco. Além destes, encontramos
pessoas ligadas às profissões liberais e funcionários eclesiásticos, bem como pessoas
envolvidas com a exploração de madeiras.
Isso demonstra uma diversidade significativa de atividades econômicas praticadas
pelos moradores de Ilhéus da segunda metade do século XIX, sendo que muitas vezes a
produção de cacau estava associada com a produção de farinha de mandioca.
Agora é importante identificar quais dessas categorias ocupacionais detinham as
maiores fortunas. Os produtores de cacau eram mais ricos entre os inventariados? Como
estava distribuída a riqueza de acordo com a ocupação principal?
Para responder essas perguntas agrupamos os inventários em seis categorias que a
nosso ver, permitem uma aproximação com o tema, quais sejam: produtores de cacau,
negociantes, donos de engenho, produtores de farinha/café/coco, “outros” e “não
identificado”. Na categoria “outros” incluímos funcionários eclesiásticos, profissionais
106

liberais, madeireiros, pequenos criadores e outros lavradores. Na categoria “não identificada”


incluímos os inventários que não conseguimos identificar a ocupação223.

Tabela 3.4 – Distribuição dos inventários segundo ocupação principal e montante


da riqueza. Ilhéus, 1850-1888
OCUPAÇÕES PRINCIPAIS Inventários Monte-mor Monte-mor
DOS INVENTARIADOS Nº % Soma (em réis) % Média (em réis)
Produtores de cacau 215 64,5 826.087,702 40,0 3.842,268
Negociantes 39 11,7 707.941,329 34,1 18.152,342
Produtores de farinha/café/coco 24 7,2 70.887,350 3,4 2.941,947
Donos de Engenho 12 3,6 365.744,351 17,6 30.232,863
Outros * 13 4,0 29.226,089 1,4 2.248,161
Não Identificada 30 9,0 72.222,908 3,5 2.407,430
TOTAL 333 100,0 2.072.109,729 100,0 6.212,850
Fonte: APEB, SJ, 333 processos de inventários. Ilhéus, 1850-1888.
(*) Prof. liberais, func. eclesiástico; peq. criadores; madeireiro etc.

A Tabela 3.4 demonstra que, no computo global do período (1850-1888) os produtores


de cacau não concentraram a maior parte da riqueza inventariada em Ilhéus. Embora eles
representassem a maioria dos inventariados (64,5%), a soma de suas riquezas correspondeu a
somente 40% de todas as fortunas declaradas nos processos de inventários, ao passo que os
negociantes, 11,7% dos inventariados e donos de engenho, 3,6% destes, concentraram,
respectivamente, 34,1% e 17,6% das fortunas. Ao que parece nessa época os produtores de
cacau não estavam entre os mais abastados economicamente.
Em média os donos de engenho eram aproximadamente dez vezes mais ricos que os
produtores de cacau e quase duas vezes mais ricos que os negociantes. Somando os
percentuais relativos aos negociantes e aos donos de engenho constatamos que juntos eles
representavam tão somente 15,3% da população inventariada e concentraram 51,7% de toda a
fortuna declarada nos inventários.
Isso não significa que todos produtores de cacau eram pobres, encontramos exceções
dentro do conjunto dos processos. No entanto, ao longo do período a tendência foi de maior

223
A partir daqui vamos utilizar essas seis categorias de análises para entendermos as mutações da riqueza, bem
como a relação desses grupos com outras variáveis relacionadas com a escravidão e economia.
107

concentração da riqueza entre negociantes e donos de engenho. Segmentar as análises em


décadas pode confirmar essa hipótese.
Inicialmente vamos verificar a distribuição dos inventariados segundo suas ocupações
principais por décadas.

Tabela 3.5 – Distribuição dos inventariados por décadas segundo ocupação


principal. Ilhéus, 1850-1888
DÉCADAS 1850-1859 1860-1869 1870-1879 1880-1888
OCUPAÇÕES PRINCIPAIS Nº % Nº % Nº % Nº %
Produtores de cacau 5 26,3 35 55,5 79 65,3 96 73,8
Negociantes 3 15,8 9 14,3 9 7,5 18 13,8
Prod. de farinha/café/coco 1 5,3 14 22,2 4 3,3 5 3,9
Donos de Engenho 2 10,5 2 3,2 5 4,1 3 2,3
Outros * 3 15,8 2 3,2 5 4,1 3 2,3
Não Identificada 5 26,3 1 1,6 19 15,7 5 3,9
TOTAL 19 100,0 63 100,0 121 100,0 130 100,0
Fonte: APEB, SJ. 333 processos de inventários. Ilhéus, 1850-1888
(*) Prof. liberais; func. eclesiástico; peq. criadores; madeireiros; etc.

A Tabela 3.5 permite constatar que no decorrer das décadas houve acentuado
crescimento do número de produtores de cacau. Entre 1850 e 1859 eles eram cinco e
representavam 26,3% dos inventariados, na década de 1860 este percentual alcançou 55,5%,
na década de 1870 chegou a 65,3% e no último período do nosso estudo (1880-1888) atingiu
73,8% do total de inventariados.
Isso comprova que ao longo do período 1850-1888 houve expansão dos produtores de
cacau no conjunto da população inventariada. Nenhuma outra categoria cresceu tanto quanto a
destes lavradores. O número de negociantes manteve-se relativamente estável no período,
saindo de 15,2% na primeira década (1850-1859) para 13,8% no período 1880-1888. Os
donos de engenho também se mantiveram razoavelmente estáveis, nunca ultrapassando 4,1%
dos inventariados. De modo semelhante ocorreu com os produtores de farinha, café e coco,
que não cresceram de modo expressivo como os produtores de cacau. A exceção da década de
1860, que eles chegaram a representar 22,2% dos inventariados, nas demais décadas nunca
ultrapassaram 5,3% destes.
108

Agora que constatamos o expressivo aumento dos produtores de cacau no decorrer das
décadas podemos comparar as fortunadas dos inventariados a partir da soma da riqueza bruta
(monte-mor). A Tabela 3.6 mostra os percentuais destas somas de acordo com as categorias
ocupacionais.

Tabela 3.6 – Distribuição dos inventariados por décadas segundo a porcentagem da


soma das riquezas(monte-mor). Ilhéus, 1850-1888
DÉCADAS 1850-1859 1860-1869 1870-1879 1880-1888
OCUPAÇÕES PRINCIPAIS % % % %
Produtores de cacau 15,6 29,6 48,4 40,1
Negociantes 54,1 23,6 20,0 47,0
Prod.de farinha/café/coco 0,6 15,7 1,1 1,0
Donos de Engenho 19,0 27,5 23,0 9,3
Outros * 3,6 3,5 0,5 1,1
Não Identificada 7,1 0,1 7,0 1,5
TOTAL 100,0 100,0 100,0 100,0
Fonte: APEB, SJ. 333 processos de inventários. Ilhéus, 1850-1888
(*) Prof. liberais; func. eclesiástico; peq. criadores; madeireiros; etc.

Observando a porcentagem da soma das riquezas dos produtores de cacau e


comparando com os percentuais das outras categorias percebemos que no decorrer das
décadas eles não conseguiram acumular grandes fortunas, como ocorreu com os negociantes e
donos de engenho. Mesmo na década de 1880, quando eles chegaram a representar quase três
quartos dos inventariados (Tabela 3.5) a soma de suas riquezas representou 40% de toda a
fortuna inventariada.
Em média a fortuna dos negociantes e donos de engenho foram sempre superiores às
dos produtores de cacau e à dos produtores de farinha/café/coco, com diferenças
significativas.
Na década de 1860-1869, por exemplo, a média de riqueza dos negociantes era
aproximadamente três vezes maior que a dos produtores de cacau, Rs. 9.002$921 contra Rs.
2.909$502; a diferença com relação à riqueza dos donos de engenho era muito maior, Rs.
2:909$582 contra Rs. 47:281$015, respectivamente. Nesta década, em média os donos de
engenho eram dezesseis vezes mais ricos que os produtores de cacau.
109

Em certa medida, esse quadro permanece ao longo do período, sendo que na década de
1880 a média do monte-mor dos produtores de cacau foi de Rs. 3.734$597, dos negociantes
Rs. 23.328$923 e dos donos de engenho Rs. 26.794$483.
Esse é um aspecto importante do processo de formação da economia cacaueira de
Ilhéus, que perpassou todo o período do nosso estudo. Na maioria das vezes os homens que
tinha como ocupação principal o cultivo de cacaueiros possuíam riquezas, em média, bem
inferiores à dos negociantes e donos de engenho.
Essas diferenças refletem, em alguma medida, as hierarquias sociais existentes na
localidade. A maioria dos produtores de cacau era formada por pequenos lavradores (pessoas
com poucos recursos econômicos), assim como os produtores de farinha/café/coco.
Contudo, essas diferenças não explicam todas as nuances da formação da economia
cacaueira. Ainda podemos avançar no assunto investigando a presença de escravos na
composição da riqueza dos inventariados. A maioria dos escravistas era formada por
produtores de cacau, negociantes ou donos de engenho? Para avançar no assunto distribuímos
os inventariados de acordo com as ocupações principais e a presença de escravos no
patrimônio.

Tabela 3.7 – Distribuição dos inventariados por ocupação principal e posse de escravos.
Ilhéus, 1850-1888
Total de
TIPOS DE INVENTÁRIOS Com escravos Sem escravos
inventários
OCUPAÇÕES PRINCIPAIS Nº % Nº % Nº %
Produtores de cacau 51 23,7 164 76,3 215 100,0
Negociantes 31 79,5 8 20,5 39 100,0
Produtores de farinha/café/coco 11 45,8 13 54,2 24 100,0
Donos de Engenho 12 100,0 0 0,0 12 100,0
Outros * 3 23,0 10 77,0 13 100,0
Não Identificada 13 43,3 17 56,7 30 100,0
TOTAL 121 35,7 214 64,3 333 100,0
Fonte: APEB, SJ. 333 processos de inventários. Ilhéus, 1850-1888
(*) Prof. liberais; func. eclesiástico; peq. criadores; madeireiros; etc.

Os dados da Tabela 3.7 mostram que em relação à presença de escravos no patrimônio


existiam diferenças significativas entre os inventariados de Ilhéus. A primeira constatação de
110

caráter geral é que entre os produtores de cacau predominou os “sem escravos”. No computo
global de todo o período (1850-1888) constatamos que apenas 23,7% deles detinha a posse de
algum escravo. Por outro lado, entre os negociantes e donos de engenho a presença de
escravos foi expressiva se comparada com a realidade dos produtores de cacau. Todos os
donos de engenho estavam comprometidos com a exploração do trabalho escravo (100%) e
entre os negociantes verificamos que 79,5% detinha a posse de a menos um cativo. Até a
categoria dos produtores de farinha, café e coco tinha percentual de escravos no patrimônio
superior ao dos produtores de cacau, 45,8% contra 23,7%, como mostram os dados da Tabela
3.7.
Essa constatação permite contrapor, ainda que de modo parcial, a premissa de Mary
Ann Mahony, segundo a qual “[...] os escravos foram essenciais para estabelecimento da
economia cacaueira da Bahia e para a sociedade que se desenvolveu com ela [...]”224 Como
vimos até agora no conjunto de 333 inventários analisados os produtores de cacau não
estavam entre os mais envolvidos com a posse de escravos, pelo contrário, apenas um quarto
deles, aproximadamente, detinha a posse de cativos. Ainda podemos averiguar se ao longo
das décadas esse quadro se modificou.

Tabela 3.8 – Distribuição dos inventariados por décadas segundo a ocupação


principal e posse de escravos em porcentagem. Ilhéus, 1850-1888
DÉCADAS 1850-1859 1860-1869 1870-1879 1880-1888
OCUPAÇÕES PRINCIPAIS (1) (2) (1) (2) (1) (2) (1) (2)
Produtores de cacau 40,0 60,0 34,3 65,7 20,2 79,8 21,9 78,1
Negociantes 100,0 0,0 88,9 11,1 66,7 33,3 77,8 22,2
Prod.de farinha/café/coco 100,0 0,0 50,0 50,0 25,0 75,0 40,0 60,0
Donos de Engenho 100,0 0,0 100,0 0,0 100,0 0,0 100,0 0,0
Outros * 33,3 66,7 50,0 50,0 0,0 100,0 33,3 66,7
Não Identificada 80,0 20,0 0,0 100,0 42,1 57,9 0,0 100,0
TOTAL 68,4 31,6 47,6 52,3 29,8 70,2 31,5 68,5
Fonte: APEB, SJ. 333 processos de inventários. Ilhéus, 1850-1888
(*) Prof. liberais; func. eclesiástico; peq. criadores; madeireiros; etc.
OBS: (1) Inventários com escravos; (2) Inventários sem escravos.

MAHONY, Mary Ann. “Instrumentos necessários”: escravidão e posse de escravos no sul da Bahia no século
224

XIX, 1822-1889. Afro-Ásia. Salvador, n. 25-25, p. 95-139, 2001. p. 95.


111

Observando os dados da Tabela 3.8 percebemos que ao longo das décadas o


percentual de produtores de cacau com posse de escravos diminuiu. Isso demonstra que a
lavoura cacaueira não dependeu, essencialmente, do trabalho escravo para o seu
desenvolvimento. Na década de 1850 notamos que 60% deles não tinha sequer um escravo
entre os bens inventariados, na seguinte esse índice chegou a 65,7% e nas últimas décadas
chegou a 79,8% e 78,1%, respectivamente. Assim, é notório que a maioria dos produtores de
cacau não era constituída por escravistas.
Desse modo, cabe indagar qual o tipo de trabalho que predominou na lavoura
cacaueira entre os anos de 1850-1888. Quem fornece a resposta é a própria Mary Ann
Mahony, apoiada na Memória sobre a cultura de cacau, de Miguel Calmon du Pin e Almeida,
a autora ressaltou que “seis homens adultos eram suficientes para manter e colher uma
plantação com 6.400 cacaueiros”225. Em outra passagem a Mahony observou que,

O grande atrativo da lavoura cacaueira residia no fato de não se precisar de


muito capital nem de braços para cultivá-la, especialmente quando
comparada com as lavouras de cana e fumo, os dois grandes produtos de
exportação da Bahia na época. Era, portanto, uma cultura aberta a todo
mundo, desde os mais pobres até os senhores de engenho com seu capital e
já empregado em engenhos, escravos e plantações de cana226.

Em suas análises Mary Ann Mahony reconhece que não há necessidade de muitos
trabalhadores para o cultivo de cacaueiros, porém em muitas passagens insiste que a
escravidão determinou os rumos da lavoura cacaueira. Concordamos em muitos pontos com
as análises de Mahony, sobretudo em suas críticas aos postulados de Adonias Filho, segundo
o qual o coronel desbravador não se serviu do trabalho escravo para exploração da terra e
quando o fez foi em escala mínima227. É inegável a contribuição da referida autora para
descortinar os mitos que foram construídos na história de Ilhéus. Todavia, nossos dados
apontam uma direção um pouco diferentes da visão de Mahony. Constatamos, por exemplo,

225
MAHONY, Op. Cit., p. 106-107.
226
MAHONY, Mary Ann. Um passado para justificar o presente: memória coletiva, representação histórica e
dominação política na região cacaueira da Bahia. Tradução de Marcelo Henrique Dias. In: Especiaria - Cadernos
de Ciências Humanas. Dossiê: Sociedade Escravista e Pós-Abolição. Ilhéus, v. 10, n. 18, p. 732-793, jul-dez.,
2007. p. 740.
227
FILHO, Adonias. Sul da Bahia: chão de cacau. 2 ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978. p. 51-52.
112

que o maior percentual de escravistas estava presente entre os donos de engenho e


negociantes e que entre eles não havia investimentos significativos em plantações de cacau.
É oportuno lembrar que as categorias ocupacionais definidas em nosso estudo não
expressam, exatamente, os espaços de atuação dos escravos na economia e sociedade de
Ilhéus. Já ressaltamos que muitos inventariados tinham mais de uma ocupação, alguns
possuíam propriedades na zona rural e urbana e seus escravos deviam circular,
desempenhando várias funções.
Não faz parte dos objetivos de nossa pesquisa negar a presença da escravidão
formação da economia cacaueira, tampouco fazer terra arrasada das análises de Mary Ann
Mahony. O que fica nítido a partir da análise da documentação é que dentro da sociedade
escravista de Ilhéus os produtores de cacau ocupavam uma posição econômica que não era
das mais privilegiadas se comparada com a dos negociantes e donos de engenho. Eles tinham
menores níveis de riqueza e, portanto, menos condições de comprar e manter escravos.
Assim, constatamos que uma parcela restrita da população inventariada de Ilhéus
estava investindo de modo sistemático em escravos e plantações de cacau. Alguns eram
membros de famílias ricas, tinham recursos suficientes para comprar escravos e fazê-los
trabalhar na lavoura cacaueira, que se tornou economicamente muito importante na década de
1880. Isso permitiu a este grupo aumentar suas riquezas. Computando-se a média das fortunas
dos produtores de cacau escravistas (23,7%) notamos que alcançou a quantia de Rs.
9.943$441, ao passo que aqueles que não tinham escravos (76,3%) chegou a Rs. 1.993$428.
Esse quadro se repete de modo mais ou menos semelhante ao longo das décadas,
revelando que a posse de escravos foi um elemento definidor de riqueza em Ilhéus e no Brasil
de uma maneira geral. Os mais afortunados eram aqueles que possuíam com mais frequência
escravos na composição do patrimônio. Se a maior parte dos escravistas não era formado por
produtores de cacau isso significa que o cacau não se tornou um produto de grande
importância econômica na maior parte do período do nosso estudo (1850-1888), ao contrário
do açúcar228. Podemos avaliar melhor a questão investigando as culturas declaradas nos
inventários.

228
Sobre o assunto ver, entre outros, BARICKMAN, Bert J. Até a véspera: o trabalho escravo e a produção de
açúcar nos engenhos do Recôncavo baiano (1850-1881). Afro-Ásia. Salvador, n. 21-22, p. 177-238, 1998-1999.
113

3.4 - As plantações de cacau e outras culturas nos inventários

Os inventários post mortem de Ilhéus contém descrições de diversos tipos de culturas,


destacando-se as plantações de cacau. Antes de apresentar os dados dessas culturas e iniciar
as análises é importante explicar algumas peculiaridades dos procedimentos adotados na
pesquisa.
Primeiro aspecto importante é saber a distribuição dos inventários com cultura ao
longo das décadas, para avaliarmos se houve expansão das lavouras no período. O Gráfico 3.3
apresenta essa distribuição.

Gráfico 3.3 – Distribuição dos inventários segundo a presença de culturas.


Ilhéus, 1850-1888
140
120
Nº DE INVENTÁRIOS

100
80
60
40
20
0
1850-1859 1860-1869 1870-1879 1880-1888

Com culturas Sem culturas

Fonte: APEB, Sessão Judiciária (SJ), 333 processos de inventários. Ilhéus, 1850-1888.

Os dados do Gráfico 3.3 mostram crescimento do número de inventários com


declaração de algum tipo de cultura. Do total de 333 processos analisados encontramos
cultura em 263 casos, 79% dos inventários. A distribuição destes processos nas décadas
indica que houve expansão das lavouras no decorrer do período, agora precisamos saber qual
foi a cultura que mais se expandiu.
Inicialmente é importante ressaltar que no momento da abertura dos inventários essas
culturas encontravam-se em condições e situações diversas, o que impõe limites na hora de
avaliar e estabelecer comparações.
114

Já constatamos que os cacaueiros concentravam a maior parte dos investimentos entre


as culturas inventariadas (Tabela 3.1), mas ainda não conhecemos nada sobre as outras
plantações, nem se o cacau foi a cultura mais disseminada ou simplesmente era o produto
mais valorizado. Investigar essa questão pode ajudar a entender o processo de formação da
economia cacaueira.
Para realizarmos essa tarefa somamos o número de pés de cacau declarados nos
inventários ao longo das décadas, em seguida comparamos com as quantidades das outras
culturas. Isso implica, necessariamente, enfrentar sérios problemas e riscos, pois, entre outras
questões, alguns registros não declararam as quantidades. No inventário de Antônio Manoel
da Coroa de Cristo, por exemplo, os avaliadores declararam “uma plantação de cacaueiros no
lugar putumujú, avaliada em vinte e cinco mil réis”229. Em casos como este, ainda que
minoria, não é possível saber a quantidade de plantas cultivadas.
Outra questão pertinente é que existem culturas com rotatividades no plantio e colheita
bem diferenciados. As plantações de cana e mandioca, por exemplo, após o plantio das
primeiras mudas não ultrapassam 16 meses sem que sejam colhidas, e praticamente todas as
plantas são extraídas do solo, enquanto as plantações de cacau, café e coco, entre outras,
podem perdurar por décadas, colhendo-se apenas os frutos e mantendo-se as plantações230.
Desse modo, podemos esperar encontrar com maior frequência as plantas que se mantêm
fixas no solo por muito tempo, frutificando periodicamente.
Outra questão importante que devemos considerar refere-se às diferentes formas de
descrição das plantações. Afora os casos como o de Antônio Manoel da Coroa de Cristo,
mencionado acima, normalmente as plantações de cacau, coco e café são descritas em número
de pés cultivados, já as canas de açúcar são descritas em tarefas e as plantações de mandiocas
em covas, com variações nas idades, nas condições e nos tipos de terrenos (próprios ou
foreiros), mas nem sempre essas informações aparecem nos inventários.

229
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Antônio Manoel da Coroa de Cristo. Est. 03, Cx. 1270, Maço
1739, Doc. 13, 13 mar. 1865.
230
Sobre o cultivo de cana na Bahia ver, entre outros, SCHWARTZ, op. cit., (1988), p. 95-122 (Safra: as
técnicas do fabrico do açúcar); para o cultivo da mandioca ver, entre outros, AGUIAR, Pinto de. Mandioca: pão
do Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1982; sobre o cultivo do cacau ver, entre outros, BONDAR,
Gregório. A cultura de cacau na Bahia. Instituto de cacau da Bahia. Salvador: Editora Revista dos Tribunaes,
1938; SOUZA, Carlos Alberto Spaggiari [et al.]. Cacau: do plantio à colheita. Viçosa, MG: Ed. UFV, 2016.
115

Mesmo com a diversidade de condições e situações das lavouras cultivadas em Ilhéus


optamos por estruturar uma tabela com o objetivo de mostrar as principais culturas arroladas
nos inventários ao longo das décadas, revelando as quantidades de plantas e os preços que
foram avaliadas no momento da abertura do processo.
Essa foi a noção intenção ao construir a Tabela 3.9. Na primeira coluna, da esquerda
para a direita, lançamos os tipos de culturas, em seguida mostramos o número e o percentual
dos registros referentes a cada uma delas, na próxima coluna destacamos as plantações de
acordo com as quantidades descritas pelos avaliadores, ou seja, em número de plantas
cultivadas (Nº Pés), em número de tarefas (Nº TRF) ou em número de plantações (Nº PLT).
Na última coluna informamos a soma dos preços alocados em cada cultura com os
respectivos percentuais. Vale destacar que priorizamos as culturas mais frequentes nos
inventários, agrupando as demais na categoria “outras culturas”, inclusive as situações em que
as culturas foram descritas e avaliadas em conjunto como ocorreu na Fazenda Massaquara,
por exemplo, localizada na Cachoeira de Itabuna, com 4.400 cacaueiros, onde os avaliadores
descreveram em 1884 “um roçado de mandioca e cacau pequeno, avaliado em duzentos mil
réis”231. Outro exemplo semelhante ocorreu no inventário de Maria Izabel de Souza, falecida
em 1887, onde consta “um roçado novo plantado de cacaueiro e mandioca, tudo avaliado em
cem mil réis”232.
Esses exemplos demonstram os cuidados com as plantações de cacaueiros novos, que
necessitavam de sombras produzidas por outras culturas, nesse caso mandioca, mas também
eram utilizadas bananeiras nesta função. Como ressaltamos no primeiro capítulo o cacaueiro é
uma planta muito exigente e precisa de cuidados especiais, sobretudo, nos primeiros três anos
de vida233.

231
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Jorge Mathias Scher. Est. 02, Cx. 761, Maço 1227, Doc. 01, 28
de out. 1884.
232
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Maria Izabel de Souza. Est. 03, Cx. 1372, Maço 1841, Doc. 16,
02 de ago. 1887.
233
Sobre o assunto ver, por exemplo, BONDAR, Gregório. A cultura de cacao na Bahia. Instituto de Cacau da
Bahia (ICB) – Boletim Técnico n 1º. Empresa Gráfica da “Revista dos Tribunaes”. São Paulo: 1938.
116

Tabela 3.9 - Distribuição das culturas nos inventários por décadas.


Ilhéus, 1850-1888
1850-1859 - (10) Registros Plantações Soma dos Preços
CULTURAS Nº % Nº Pés Nº TRF Nº PLT (em réis) %
Cacaual 16 47,0 7.004 - - 12.532,000 85,7
Coqueiral 9 26,5 807 - - 1.908,400 13,1
Cafezal 1 2,9 100 - - 13,000 0,09
Canavial 5 14,7 - 5,5 - 158,000 1,08
Mandiocal - - - - - - -
Outras culturas * 3 8,9 26 - - 8,400 0,06
TOTAL 34 100,0 7.937 5,5 - 14.619,800 100,0
1860-1869 - (51) Registros Plantações Soma dos Preços
CULTURAS Nº % Nº Pés Nº TRF Nº PLT (em réis) %
Cacaual 64 44,7 41.066 - 2 51.864,400 89,2
Coqueiral 25 17,5 1.992 - - 2.812,100 4,9
Cafezal 17 12,0 2.495 - 1 892,360 1,5
Canavial 5 3,5 - 41,5 2 1.105,000 1,9
Mandiocal 14 9,8 47.500 2 5 1.035,000 1,8
Outras culturas * 18 12,5 191 - 6 427,920 0,7
TOTAL 143 100,0 93.244 43,5 16 58.136,780 100,0
1870-1879 - (91) Registros Plantações Soma dos Preços
CULTURAS Nº % Nº Pés Nº TRF Nº PLT (em réis) %
Cacaual 156 62,6 179.406 - 7 153.125,180 89,0
Coqueiral 39 15,7 6.066 - 7.785,000 4,6
Cafezal 15 6,0 12.111 - 1 3.583,900 2,1
Canavial 7 2,8 - 32,75 1 2.760,000 1,6
Mandiocal 19 7,7 58.752 - 6 1.391,000 0,8
Outras culturas * 13 5,2 585 - 1 3.239,100 1,9
TOTAL 249 100,0 256.920 32,75 16 171.884,180 100,0
1880-1888 - (111) Registros Plantações Soma dos Preços
CULTURAS Nº % Nº Pés Nº TRF Nº PLT (em réis) %
Cacaual 229 76,6 282.373 13 253.249,000 94,7
Coqueiral 40 13,4 7.703 3 10.916,720 4,1
Cafezal 13 4,3 8.050 1 1.950,000 0,7
Canavial 3 1,0 - 15 - 360,000 0,13
Mandiocal 9 3,0 6.000 - 7 1.005,000 0,36
Outras culturas * 5 1,7 20 - - 41,000 0,01
TOTAL 299 100,0 304.146 15 24 267.521,720 100,0
Fonte: APEB, SJ. Ilhéus, 263 processos de inventários, 1850-1888.
(*) Pés de jaca, dendê, laranja, inhame, fruta pão etc.; (Nº) Número de inventários com culturas por décadas.
117

Observando os dados da Tabela 3.9 percebemos que tanto em termos quantitativos


quanto em termos de avaliação, as plantações de cacau se destacaram entre as culturas
inventariadas. Os dados demonstram que a maior parte dos registros se referia à lavoura
cacaueira (cacaual), que nunca concentrou menos que 85% do total dos investimentos em
culturas.
Essas plantações estavam espalhadas, principalmente, pelas margens dos rios, riachos
e ribeirões existentes na região, expandindo-se especialmente para Cachoeira de Itabuna,
terceiro distrito de Ilhéus. Os inventários contêm descrições de plantações, roças, sítios e
fazendas com números variados de cacaueiros plantados por pessoas de diferentes condições,
revelando que essa cultura estava disseminada na sociedade. Entre os 263 inventários com
declaração de algum tipo de cultura, a maior parte, 232 (88%), possuía alguma plantação de
cacau, porém as plantações eram de tamanhos diferenciados. Computando-se todos os casos
com declaração da quantidade de plantas cultivadas chegamos ao total de 507.510 cacaueiros,
com idades e situações diversas, como mostra o Gráfico 3.4.

Gráfico 3.4 – Distribuição dos cacaueiros segundo o estado da planta.


Ilhéus, 1850-1888
1%
1% 2% 0% 0%
Sem informação
41% Frutífero
Infrutífero
55% Esgalhando
Mau estado
Pequeno
Velho

Fonte: APEB, Sessão Judiciária (SJ), 221 processos de inventários. Ilhéus, 1850-1888

A maior parte dos cacaueiros inventariados encontrava-se na condição de frutíferos


(55%), ou seja, estavam produzindo cacau, embora em muitos casos não apareça essa
118

informação, pois os avaliadores não informaram. Os cacaueiros descritos como velhos, em


mau estado e infrutífero compunham uma parcela pequena das plantações e ao longo das
décadas surgiram cacaueiros descritos como esgalhando, cultivados a pouco tempo, que ainda
não frutificavam234.
Agora que conhecemos um pouco das características dos cacaueiros podemos avançar
para analisarmos o tamanho das plantações. A Tabela 3.10 permite visualizar a estrutura das
plantações de cacau em Ilhéus entre 1850-1888.

Tabela 3.10 – Distribuição dos cacaueiros por faixas de tamanho das plantações.
Ilhéus, 1850-1888
Classificação das Faixas de Tamanho das Inventários Soma dos cacaueiros
Plantações Plantações (FTP) Nº % Nº %
Muito Pequena até 250 cacaueiros 24 10,8 3.260 0,6
Pequena 251 a 1.000 cacaueiros 70 31,7 39.791 7,8
Média 1.001 a 3.000 cacaueiros 75 34,0 141.768 28,0
Média Alta 3.001 a 5.000 cacaueiros 30 13,5 114.272 22,5
Grande 5.001 a 10.000 cacaueiros 15 6,8 103.455 20,4
Muito Grande acima de 10.000 cacaueiros 7 3,2 104.964 20,7
TOTAL 221 100,0 507.510 100,0
Fonte: APEB, SJ, 221 inventários. Ilhéus, 1850-1888.

Observando os dados da Tabela 3.10 percebemos que as plantações grandes e muito


grandes pertenciam a poucos inventariados, 6,8% e 3,2%, respectivamente. Entretanto, uma
parcela expressiva dos cacaueiros estava com esses proprietários, 20,4% nas grandes
plantações e 20,7% nas classificadas como muito grandes.
Por outro lado, os donos das plantações classificadas como muito pequenas, 10,8%
dos inventariados, detinham somente 0,6% de todos cacaueiros e os donos das plantações
pequenas, 31,7% dos inventariados, detinham 7,8% dos cacaueiros, já as plantações médias,
34% dos inventariados, concentraram 28% dos cacaueiros.
Isso significa que a maioria dos produtores de cacau tinha plantações de no máximo 3
mil cacaueiros, enquanto uma parcela diminuta concentrou em suas propriedades a maior

234
BONDAR, Gregório. A cultura de cacao na Bahia. Instituto de Cacau da Bahia (ICB) – Boletim Técnico n
1º. Empresa Gráfica da “Revista dos Tribunaes”. São Paulo: 1938. p. 131-138.
119

parte das plantações. Juntos, os donos das plantações grandes e muito grande representavam
10% dos proprietários de cacau e concentraram 41,1% de todos os cacaueiros.
No entanto, esses dados estão agregados e representam o período como um todo.
Fragmentar as análises por décadas pode revelar outra característica importante do processo
de formação da economia cacaueiro de Ilhéus no período 1850-1888. A Tabela 3.11 apresenta
essa distribuição.

Tabela 3.11 – Distribuição dos cacaueiros por décadas segundo faixas de tamanho das
plantações (FTP). Ilhéus, 1850-1888
Classificação das FTP 1850-1859 1860-1869 1870-1879 1880-1888
Plantações Cacaueiros Nº % Nº % Nº % Nº %
Muito Pequena até 250 3 42,8 11 29,7 8 10,1 2 2,0
Pequena 251 a 1.000 1 14,4 13 35,1 34 43,0 22 22,5
Média 1.001 a 3.000 3 42,8 10 27,1 23 29,1 39 39,8
Média Alta 3.001 a 5.000 0 0,0 2 5,4 6 7,6 22 22,5
Grande 5.001 a 10.000 0 0,0 1 2,7 4 5,1 10 10,2
Muito Grande 10.001 ou + 0 0,0 0 0,0 4 5,1 3 3,0
TOTAL 7 100,0 37 100,0 79 100,0 98 100,0
Fonte: APEB, SJ, 221 inventários. Ilhéus, 1850-1888.
(FTP) Faixas de Tamanho das Plantações

Observando os dados da Tabela 3.11 notamos que nas duas primeira décadas as
plantações grandes e muito grandes foram quase inexistentes, encontramos apenas um caso de
grande plantação em 1868, cujo proprietário era membro de família rica de Ilhéus235, o
Alferes Augusto de Sá Bitencourt Câmara, dono da Fazenda Bom Sucesso, com 5.500
cacaueiros e onze escravos, entre ouros bens236.
Nas outras décadas as plantações de cacau muito pequenas diminuíram, ao passo que
as grandes e muito grandes começaram a aparecer nos inventários, mesmo assim, durante todo
o período as plantações com até 3 mil cacaueiro sobressaíram-se, sendo que as propriedade
com mais de 10 mil cacaueiros continuam representando uma fração pequena no conjunto das
plantações, 5,1% na década de 1870 e 3% no período 1880-1888, mas eles concentraram a
maior parte dos pés de cacau, como vimos na Tabela 3.10.
235
Sobre família em Ilhéus ver, por exemplo, RIBEIRO, André Luiz Rosa. Família, poder e mito: o município
de S. Jorge de Ilhéus (1880-1912). Ilhéus: Editus, 2001.
236
APEB, Seção Judiciária. Inventários. Ilhéus. Alferes Augusto de Sá Bitencourt Câmara. Est. 02, Cx. 785,
Maço 1252, Doc. 13, 05 de nov. 1868.
120

Isso indica que ao longo do período as pequenas plantações estavam disseminadas e


com o passar dos anos surgiram pessoas interessadas em expandir a cultura e para isso
recorreram ao trabalho escravo.
Na década de 1850 a maior plantação pertencia a Guilherme Mor, proprietário da
Fazenda Boa Vista, dono de 1.950 cacaueiros e um escravo, entre outros bens. A sua riqueza
bruta foi calculada Rs. 4.004$000, os cacaueiros representavam 85% do patrimônio, cada pé
frutífero e bem tradado foi avaliado em Rs. 2$000 e outros 300, ainda principiando a dar
frutos, porém mal tratados, em Rs.$500, o único escravo que ele possuía era Manoel, africano,
já idoso e doente, avaliado em Rs. 250$000237. Antes de falecer, em 1856, Guilherme Mor
possuía seis filhos, dois do sexo feminino e quatro masculinos, o inventariante não informou a
idade, mas certamente os adultos e jovens ajudavam a cuidar das plantações de cacau e
realizavam outros serviços238.
O Alferes Augusto de Sá Bitencourt Camara, casado com Maria Bárbara Melo e Sá,
dono da Fazenda Bom Sucesso, proprietário de onze escravos e 5.500 pés de cacau, entre
outros bens, teve fortuna avaliada em Rs. 20.697$800 ante de falecer em 1868, sendo dono da
maior plantação de cacau da década de 1860, como já ressaltamos. Os escravos representavam
32% de sua fortuna e os cacaueiros 38%, cada pé de cacau foi avaliado em Rs. 1$500 e os
pequenos em Rs. $800, entre seus imóveis consta uma serra d’água com tanque, avaliada em
Rs. 2.000$000, casa de morada e casa de farinha239.
Na década de 1870 a maior plantação de cacau pertencia ao Major Joaquim José de
Oliveira, casado com Adelaide Melo Sá de Oliveira, proprietário de 19.404 cacaueiros em sua
fazenda localizada na Cachoeira de Itabuna, além de 28 escravos, dentre outros bens. Sua
riqueza bruta foi avaliada em Rs. 62.180$824, os escravos representavam 18% dessa fortuna,
os cacaueiros 31%, os imóveis 17% e as terras 14%, cada pé de cacau foi avaliado em Rs.
1$000. Ademais, o referido Major possuía plantações de café, engenhoca de fabricar açúcar,

237
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Guilherme Mor. Est. 02, Cx. 783, Maço 1250, Doc. 14, 06 de
fev. 1856.
238
Ibidem.
239
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Alferes Augusto de Sá Bitencourt Câmara. Est. 02, Cx. 785,
Maço 1252, Doc. 13, 05 de nov. 1868.
121

casa de farinha, casa com balcão para venda e outros bens240. No computo geral ele foi o dono
da maior plantação de cacau que localizamos entre os inventariados e era membro da família
Sá Bitencourt Câmara, assim como o Alferes Augusto de Sá Bitencourt Câmara, dono da
maior plantação de cacau da década de 1860241.
Ao que parece esta família foi o principal grupo que estava investindo em escravos e
plantações de cacau. Na década de 1880 outro membro desta família, o Capitão Egídio Luiz
de Sá Bitencourt Câmara aparece como proprietário da segunda maior plantação de cacau,
com 11.622 cacaueiros espalhados em várias propriedades, muitos na Cachoeira de Itabuna, e
29 escravos, dentre outros bens. Seu inventário foi aberto em 1880, por ocasião da sua morte,
e a riqueza bruta avaliada em Rs. 25.575$000, os cativos representavam 42% desta fortuna e
os cacaueiros 38%242.
O dono da maior plantação de cacau da década de 1880 foi Augusto Ferreira Scher,
proprietário da Fazenda Rio Comprido, localizada na Cachoeira de Itabuna, com 13.890
cacaueiros e 12 escravos, dentre outros bens. Seu inventário foi aberto em 1882, ano de seu
falecimento, sendo a riqueza bruta avaliada em Rs. 23.006$000, os cacaueiros representavam
55% desta fortuna e os escravos 27%243.
Esses exemplos deixam de fora muitos inventariados envolvidos com plantações de
cacau. No entanto eles dão a dimensão do desenvolvimento da lavora cacaueira em Ilhéus no
período do nosso estudo (1850-1888). Notamos que as plantações cresceram a partir da
década de 1870, mas chegou ao máximo de 19.404 cacaueiros244, a maioria das plantações
estava bem abaixo desse número. Destarte, o preço de cada cacaueiro variou muito entre as
propriedades e percebemos que eles não aumentaram no decorrer das décadas, mesmo
considerando as diferentes condições da planta, o maior valor de um cacaueiro frutífero, por

240
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Major Joaquim José de Oliveira. Est. 02, Cx. 749, Maço 1215,
Doc. 07, 30 de out. 1875.
241
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Alferes Augusto de Sá Bitencourt Câmara. Est. 02, Cx. 785,
Maço 1252, Doc. 13, 05 de nov. 1868.
242
APEB, Seção Judiciária. Inventários. Ilhéus. Capitão Egídio Luiz de Sá Bitencourt Câmara. Est. 02, Cx. 754,
Maço 1220, Doc. 11, 16 de nov. 1880.
243
APEB, Seção Judiciária. Inventários. Ilhéus. Augusto Ferreira Scher. Est. 02, Cx. 757, Maço 1223, Doc. 09,
18 de ago. 1882.
244
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Major Joaquim José de Oliveira. Est. 02, Cx. 749, Maço 1215,
Doc. 07, 30 de out. 1875.
122

exemplo, foi encontrado em 1862, custando Rs. 3$000 no inventário de Domingos Alves da
Silva245.
Além dessas observações, notamos que nessa época a economia de Ilhéus não era
completamente dominada pela cultura do cacau, outras plantações eram importantes para a
dinâmica das exportações e do abastecimento interno. Voltando atenção para os dados da
Tabela 3.9 verificamos que as plantações de coco e café, por exemplo, também aumentaram
ao longo das décadas.
Manoel Conrado de Gusmão, morador da povoação de Una, detinha a posse de dois
escravos e da maior plantação de coco entre os inventariados, 1.660 pés (10% do total),
avaliados em mil réis cada um (Rs. 1$000) e todos na quantia de um conto e seiscentos e
sessenta mil réis (Rs. 1.660$000)246.
A maior plantação de café, por sua vez, pertencia a ao Major Joaquim José de
Oliveira, dono de 6.000 pés em sua propriedade na Cachoeira de Itabuna, que corresponde a
26% do total computado, cada um dos frutíferos foi avaliado em quatrocentos réis (Rs. $400),
e os infrutíferos por cem réis, Rs.$100247.
As plantações de mandioca também aparecem com certa frequência nos inventários.
Na década de 1860 calculamos o total de 47.500 covas de mandiocas cultivadas, contra
41.066 pés de cacau. A Fazenda Jetimana-Acu, concentrou a maior plantação, com 30.000
covas de mandioca em 1866, correspondendo a 27% do total. Ao que parece tratava-se de
uma propriedade especializada na produção de farinha, não possuía plantação de cacau nem
de café, tinha casa de farinha coberta de telha, roda de ralar mandioca, prensa e utensílios,
alguidar de barro e de ferro, bois de brocha e contava com o trabalho escravo de 14 pessoas,
entre outros bens248.
As plantações de cana de açúcar concentravam-se, a maioria, entre os donos de
engenho. Do total de 94,75 tarefas declaradas nos inventários, parte significativa estava no

245
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Domingos Alves da Silva. Est. 02, Cx. 784, Maço 1251, Doc.
12, 09 de set. 1862.
246
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Ana Maria Afonso de Gusmão. Est. 02, Cx. 740, Maço 1205,
Doc. 01, 10 de jun. 1871.
247
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Major Joaquim José de Oliveira. Est. 02, Cx. 749, Maço 1215,
Doc. 07, 30 de out. 1875.
248
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Felipa de Melo Sá Bandeira. Est. 02, Cx. 785, Maço 1252, Doc.
07, 16 de mar. 1866.
123

Engenho Castelo Novo, ou seja, quarenta tarefas de canas (42%), que juntas foram avaliadas
em Rs.800$000249.
As outras culturas, menos frequentes nos inventários, também tinham importância para
a população. Os dendezeiros, as jaqueiras, os pés de fruta pão, entre outros, serviam ao
abastecimento interno e circulavam como mercadorias. Embora pouco frequentes na
documentação essas culturas tinham importância na alimentação da população, sobretudo na
subsistência dos grupos menos favorecidos economicamente.

3.5 - As terras nos inventários

Segundo Bert J. Barickmam no final do século XVIII e na primeira metade do século


XIX a Bahia possuía uma oferta abundante de terras para aumentar a produção agrícola, sendo
o litoral ao sul do Recôncavo, nas antigas comarcas de Ilhéus e Porto Seguro, o povoamento
mal começara a abrir brechas nas matas, de onde eram retiradas as madeiras de lei e abrigava
escravos fugidos e índios não subjugados250.
Esse era o cenário do território da comarca de Ilhéus em meados do século XIX,
quando o governo provincial passou a estimular a ocupação do espaço e promover a
desapropriação das terras indígenas, como ressaltaram Marcelo Henrique Dias e Girleane
Santos Araújo251.
Entre os anos de 1850 e 1888 esse território foi ocupado de modo mais intenso por
particulares, que estabeleceram fazendas com engenhos e outras propriedades nas margens
dos rios e na costa litorânea, explorando madeiras e cultivando cacau, café, coco, produzindo
açúcar, cachaça, farinha de mandioca e outros gêneros. Os inventários post mortem contém
descrições de vários tipos de terras. Normalmente os terrenos na área urbana eram descritos
em “palmos de chãos”, os localizados na zona rural em “quinhão de terras” ou “sorte de

249
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Maria José Leola Del Rey e Carolina Leola Del Rey. Est. 02, Cx.
786, Maço 1253, Doc. 06, 28 de fev. 1861.
250
BARICKMAN, Bert J. Um contraponto baiano: açúcar, fumo, mandioca e escravidão no recôncavo, 1780-
1860. Tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. p. 167-169.
251
DIAS, Marcelo Henrique; ARAÚJO, Girleane Santos. Ocupação territorial em uma fronteira indígena do sul
da Bahia: Una e Olivença em meados do século XIX. Revista Territórios e Fronteiras. Cuiabá, vol. 9, n. 1,
jan./jun. 2016. Ver também, entre outros, DIAS, Marcelo Henrique. Sesmarias, posses e terras indígenas na vila
de Ilhéus (Bahia, 1758-1822). Especiaria – Caderno de Ciências Humanas, v.14, n.25, p. 53-65, jul./dez. 2013.
124

terras”. Além destes encontramos descrições em “braças de terras”, em “tarefas de pastos” e


raros casos em “léguas”. Todas essas descrições apresentam problemas comuns aos
estudiosos do assunto, sendo que a falta de precisão nos limites das propriedades é a questão
mais evidente252.
No caso de Ilhéus mais da metade dos registros referia-se a “quinhão de terra” ou
“sorte de terra”, sem mencionar o tamanho dos terrenos. Em outras situações os avaliadores
descreviam apenas a medida da frente, por vezes apenas a medida dos fundos, o que dificulta
muito o trabalho do historiador interessado em conhecer a estrutura fundiária da localidade.
Por esses motivos nossos esforços de análise das terras têm sérios limites e não
pretendemos apresentar resultados conclusivos.
Para iniciar a investigação delimitamos os inventários com presença de terras para
sabermos a proporção deles no conjunto dos processos. O Gráfico 3.5 mostra essa
distribuição.
Gráfico 3.5 – Distribuição dos inventários com presença de terras.
Ilhéus, 1850-1888
140
120
Nº DE INVENTÁRIOS

100
80
60
40
20
0
1850-1859 1860-1869 1870-1879 1880-1888

Com Terras Sem Terras


Fonte: APEB, SJ. 223 processos de inventários. Ilhéus, 1850-1888.

252
Sobre o assunto ver, entre muitos, FERLINI, Vera Lúcia Amaral. Terra, trabalho e poder: o mundo dos
engenhos no Nordeste colonial. São Paulo: Brasiliense, 1988; MOTTA, Márcia Maria Menendes. Nas fronteiras
do poder: conflitos de terras e direito agrário no Brasil de meados do século XIX. Tese (Doutorado em História)
– IFCH-UNICAMP, Campinas, 1996.
125

De acordo com o Gráfico 3.5 ao longo das décadas a tendência foi de crescimento do
número de inventários com terras, o que pode estar refletindo o aumento da ocupação do
território com a policultura, especialmente cacau, principal cultura declarada nos inventários
post mortem da localidade.
No computo geral de todo o período (1850-1888) identificamos que 66,7% dos
inventários possuíam algum tipo de terra, sendo que na primeira década (1850-1859) do total
de 19 inventários analisados 63% possuía este bem e no último período 1880-1888 este
percentual alcançou a cifra de 75% dos processos.
Agora precisamos saber quais categorias ocupacionais possuíam terras com mais
frequência, para isso cruzamos os informes relativos à ocupação principal com a presença de
terras nos inventários. A Tabela 3.12 apresenta o resultado desse cruzamento.

Tabela 3.12 – Distribuição dos inventariados segundo a


presença de terras e ocupação principal. Ilhéus, 1850-1888
Total de
TIPOS DE INVENTÁRIOS Com Terras Sem Terras
Inventários
OCUPAÇÕES PRINCIPAIS Nº % Nº % Nº %
Produtores de cacau 147 68,4 68 31,6 215 100,0
Negociantes 25 64,0 14 36,0 39 100,0
Produtores de farinha/café/coco 20 83,4 4 16,6 24 100,0
Donos de Engenho 12 100,0 0 0,0 12 100,0
Outros * 6 46,0 7 54,0 13 100,0
Não Identificada 12 40,0 18 60,0 30 100,0
TOTAL 222 66,7 111 33,3 333 100,0
Fonte: APEB, SJ, 333 processos de inventários. Ilhéus, 1850-1888
(*) Prof. liberais; func. eclesiástico; peq. criadores; madeireiros etc.

Os dados da Tabela 3.12 mostram que 68,4% dos produtores de cacau eram
proprietários de algum tipo de terra. A outra parte deles, quase um terço (31,6%), não possuía
terras declaradas nos inventários, certamente cultivavam cacau em terrenos foreiros, em terras
de familiares ou eram agregados, cultivando lavouras em terras de outrem. Francisca de Jesus,
por exemplo, possuía 247 cacaueiros plantados na fazenda do pai253. José Dias Ribeiro tinha

253
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Francisca de Jesus. Est. 02, Cx. 783, Maço 1250, Doc. 09, 26 de
ago. 1856.
126

500 cacaueiros, no lugar denominado Bazílio, em terrenos de Lourenço Dias Ribeiro254.


Herculano Quintino dos Santos tinha 620 cacaueiros frutíferos, no lugar Almada, em terrenos
foreiros a Roberto Lavigne255. Encontramos vários casos com este entre os produtores de
cacau sem terras.
Com relação aos produtores de farinha/café/coco percebemos que 83,4% possuía
algum tipo de terra e entre os negociantes a maior parte também detinha este bem (64%).
Contudo, os dados da Tabela 3.9 confirmam que o grupo de proprietários de terra que mais se
destacou em Ilhéus foi o dos donos de engenho, todos possuíam terras.
Esses dados mostram como alguns grupos sociais de Ilhéus acumularam riquezas no
período de crescimento da economia cacaueira. Os mais ricos entre os inventariados (donos
de engenho), eram os que tinham maior número de escravos e possuíam terras com mais
frequência que os demais inventariados.
Agora é importante saber se ao longo do período a presença de terras entre os
produtores de cacau aumentou ou diminuiu. Isso pode ajudar a entender se houve crescimento
da ocupação do território com plantações de cacaueiros no período 1850-1888.

Tabela 3.13 – Distribuição dos inventários com terras por décadas segundo a
ocupação principal dos inventariados. Ilhéus, 1850-1888
Total de
DÉCADAS 1850-1859 1860-1869 1870-1879 1880-1888
inventários
OCUPAÇÕES PRINCIPAIS Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %
Produtores de cacau 2 16,7 25 55,5 42 62,7 78 79,6 147 66,2
Negociantes 3 25,0 4 8,9 7 10,4 11 11,2 25 11,3
Prod. farinha/café/coco 1 8,2 11 24,4 3 4,5 5 5,1 20 9,0
Donos de Engenho 2 16,7 2 4,5 5 7,5 3 3,1 12 5,4
Outros * 2 16,7 2 4,5 1 1,5 1 1,0 6 2,7
Não Identificada 2 16,7 1 2,2 9 13,4 0 0,0 12 5,4
TOTAL 12 100,0 45 100,0 67 100,0 98 100,0 222 100,0
Fonte: APEB, SJ. 222 processos de inventários. Ilhéus, 1850-1888.
(*) Prof. liberais; func. eclesiástico; peq. criadores; madeireiros etc.

254
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. José Dias Ribeiro. Est. 02, Cx. 738, Maço 1203, Doc. 13, 10 de
abr. 1875.
255
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Herculano Quintino dos Santos. Est. 02, Cx. 750, Maço 1216,
Doc. 03, 02 de jun. 1875.
127

Os dados da Tabela 3.13 mostram que no decorrer das décadas houve progressivo
crescimento do número de produtores de cacau com terras. Na década de 1850-1859 eles
representavam 16,7% dos inventariados e no período (1880-1888) este percentual alcançou
79,6%, demonstrando que ao longo da segunda metade do século XIX as terras da comarca de
Ilhéus foram ocupadas, principalmente, com plantações de cacau.
Todavia, ainda não sabemos como essas terras foram adquiridas nem os tamanhos das
propriedades, infelizmente, os inventários não revelam muita coisa sobre esses aspectos.
Podemos avaliar parcialmente as formas de aquisição contabilizando os registros de terras
com declaração do modo de aquisição, como mostra a Tabela 3.14.

Tabela 3.14 – Distribuição dos registros de terras segundo o modo


de aquisição. Ilhéus, 1850-1888
Total de
DÉCADAS 1850-1859 1860-1869 1870-1879 1880-1888
registros
MODO DE AQUISIÇÃO Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %
Posse 1 3,6 9 10,5 16 8,9 21 9,9 47 9,3
Compra 0 0,0 1 1,1 5 2,8 1 0,5 7 1,4
Herança 1 3,6 3 3,5 4 2,2 2 1,0 10 2,0
Compra e herança 1 3,6 0 0,0 0 0,0 1 0,5 2 0,4
Sem informação 25 89,2 73 84,9 155 86,1 187 88,1 440 86,9
TOTAL 28 100,0 86 100,0 180 100,0 212 100,0 506 100,0
Fonte: APEB, SJ. 222 processos de inventários. Ilhéus, 1850-1888.

Observando os dados da Tabela 3.11 percebemos que a grande parte dos registros de
terras não contém informação sobre o modo de aquisição. Entre os casos em que esta
informação aparece constatamos que a posse prevaleceu em relação à compra e herança.
Talvez, a “posse pacífica” tenha sido o meio mais comum de apropriação da terra pelos
pequenos produtores de cacau. Do total de 47 registro com declaração de posse de terras
notamos que 41 (87%) era de pessoas que cultivavam cacaueiros. Isso pode ser um indício de
que a lavoura cacaueira se formou a partir da expansão das pequenas propriedades.
Na década de 1850 encontramos dois produtores de cacau com terras declaradas nos
inventários. Guilherme Mor e Jacob Mor eram donos da Fazenda Boa Vista, o primeiro
possuía “vinte e cinco braças de terras onde se acha situada a fazenda do casal com seus
128

fundos respectivos avaliadas na quantia de cem mil”256 e o segundo “trinta e três braças de
terreno a margem do rio cachoeira com seus competentes fundos, cada uma avaliada na
quantia de quatro mil réis e todas por cento e trinta e dois mil réis”257
Na década de 1860 encontramos produtores de cacau com 25, 60, 80 e 690 braças de
terras, isso para os casos com dimensões das propriedades declaradas nos inventários. Entre
os bens de Pedro Bonin, dono da Fazenda Rio Comprido consta:

seiscentas e noventa braças de terreno na sesmaria comprada a


Joaquim Pereira Caldas e seu irmão Firmino Pereira Caldas, do lado
sul do rio Cachoeira de Itabuna, principiando onde acaba a sesmaria
que hoje é do Tenente Coronel Paulino Lopes de Carvalho, senhor do
Engenho Jacarecica, a findar no mesmo terreno de Henrique Berbet258.

Nesta década de 1870, entre os produtores de cacau com as dimensões da propriedade


declarada, encontramos os donos da Fazenda Ermo Nobre, com 713 braças de terra e uma
légua de fundo, cada braça avaliada em três mil réis e todas por Rs. 2.139$000259. Esta foi a
propriedade da terra que alcançou a maior avaliação nesta década, as demais, em sua grande
maioria, tiveram preços de avaliação bem abaixo deste, indicando que, talvez, as dimensões
das propriedades fossem menores.
Entre os anos de 1880 e 1888 o dono da Fazenda Almada, Roberto Gaston Lavigne,
foi o produtor de cacau que localizamos entre os que tiveram as dimensões das terras
definidas e que a propriedade alcançou a mais alta avaliação, ou seja, “quinhentas braças de
terras no mesmo rio com uma légua de fundo, avaliadas na quantia de dois contos de réis”260.

256
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Guilherme Mor. Est. 02, Cx. 783, Maço 1250, Doc. 14, 06 de
fev. 1856.
257
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Jacob Mor. Est. 02, Cx. 783, Maço 1250, Doc. 14, 06 de fev.
1856.
258
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. João Pedro Bonin. Est. 02, Cx. 742, Maço 1207, Doc. 02, 03 de
jul. 1868.
259
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Luiza Amélia Vaill Benevides. Est. 02, Cx. 740, Maço 1205,
Doc. 07, 17 de jul. 1871.
260
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Roberto Gaston Lavigne. Est. 02, Cx. 758, Maço 1224, Doc. 13,
19 de jun. 1882.
129

É certo que esses exemplos deixam de fora muitos proprietários de terras que não
sabemos a dimensão das propriedades e isso prejudica qualquer conclusão antecipada sobre o
as formas de ocupação e uso da terra em Ilhéus entre os anos de 1850-1888. Nossas análises
procuraram apenas apontar tendências sobre a questão.

***

Este capítulo mostrou alguns aspectos da composição da riqueza nos inventários post
mortem de Ilhéus entre os anos de 1850 e 1888. No bojo das discussões sobre a importância
do trabalho escravo para o desenvolvimento da lavoura cacaueira constatamos que as
plantações de cacau estavam disseminadas no patrimônio da maior parte dos inventariados,
porém, a posse de escravo abrangeu somente um terço dos processos investigados.
Ao segmentarmos os inventariados em categorias ocupacionais verificamos que a
maioria dos produtores de cacau não estava entre os mais privilegiados economicamente se
comparados aos negociantes e donos de engenhos. Ademais, apenas uma fração deles (23,7%)
detinha escravos e, em média, as fortunas destes eram superiores às dos seus pares que não
tinha cativos. Assim, as diferenças de riquezas estavam pautadas, sobretudo, nas chances de
adquirir escravos e não necessariamente na produção de cacau. Como a maioria dos
negociantes e donos de engenho tinha acesso a estes trabalhadores e poucos estavam
envolvidos com plantações de cacau acreditamos que a produção de açúcar e as atividades
comerciais eram as principais atividades geradoras de riqueza. Isso não significa que todos os
produtores de cacau eram pobres, mas é certo que grande parte deles não conseguia ampliar
suas fortunas pela fala de acesso ao trabalho escravo e igualmente pelas dificuldades que
tinham de exportar seus produtos.
Como afirmamos no segundo capítulo da tese os negociantes eram os principais
exportadores de mercadorias, isso indica que eles eram os mais beneficiados com as vendas
dos produtos, restando aos lavradores a alternativa de entregar os gêneros da lavoura como
pagamento pelas compras realizadas nas casas de negócio.
Essa é a premissa de Antônio Fernando Guerreiro de Freitas, que enfatizou que os
donos dos frutos de ouro eram aqueles qualificados pelo autor como burguesia cacaueira. Em
130

parte, concordamos com sua hipótese sobre o processo de endividamento o qual eram
submetidos os produtores de cacau. Ao que parece a origem da riqueza dos negociantes vinha
dessas relações, pautadas na comercialização não apenas do cacau mais em diversos tipos de
mercadorias, incluindo café, madeiras, cachaça, farinha e outros gêneros.
Por outro lado, não podemos deixar de salientar que os donos de engenho eram
possuidores das maiores fortunas inventariadas e ao que parece a riqueza deles provinha do
comércio de açúcar. A nossa hipótese, pouco discutida na historiografia, é que no século XIX
a comarca de Ilhéus atraiu pessoas interessadas em montar engenho e não necessariamente em
investir em cacau, como afirmou Mary Ann Mhony. A nosso ver, as famílias ricas do
recôncavo se estabeleceram em Ilhéus com o intuito de montar engenhos, principalmente,
dada a disponibilidade de terras virgens e madeiras, essenciais para fazer funcionar a empresa
açucareira. Nesse processo também se empenharam no cultivo de cacau e café, mas não
parece que este foi o objetivo principal.
131

CAPÍTULO IV
ESCRAVIDÃO NA ECONOMIA DE ILHÉUS, 1850-1888

4.1 - Introdução

Os estudos históricos sobre a escravidão no Brasil avançaram de modo significativo


nas últimas décadas e parte dos pesquisadores se concentrou no campo da Demografia
Histórica, trazendo contribuições importantes para a revisão de alguns paradigmas da
historiografia brasileira261. Nesse capítulo vamos estudar a escravidão na economia de Ilhéus
na época da disseminação da lavoura cacaueira, utilizando as ferramentas deste campo de
estudo. Estamos interessados em conhecer a estrutura da posse de escravos, a origem, o sexo e
os preços dos cativos, bem como a relação dessas variáveis com o contexto socioeconômico.
A intensificação das pesquisas nesta área do conhecimento permitiu identificar a
existência de estruturas de produção variadas, relativizando a suposta predominância das
plantations na escravidão brasileira. Além disso destacou a presença marcante dos pequenos
plantéis e a expressiva quantidade de produtores não escravistas262.
A quantificação e catalogação dos dados permitiu compreender ainda as diferenças
entre os papeis desempenhados pelos escravos e escravas dentro da escravidão. As análises
sobre os preços, sexo, idade e origem revelaram, entre outras questões, os meios utilizados
pelos escravistas para prolongar o cativeiro no Brasil, sobretudo após a proibição do tráfico
atlântico de africanos (1850)263.

261
Sobre este alentado potencial revisionista ver, entre outros, MOTTA, José Flávio. Demografia Histórica no
Brasil. In: ARRUDA, José Jobson & FONSECA, Luís Adão da (Org.). Brasil – Portugal: história, agenda para o
milênio. Bauru, SP: EDUSC; São Paulo: FAPESP; Portugal, PT: ICCTI, 2001, p. 473-507; LUNA, Francisco
Vidal; COSTA, Iraci del Nero da; KLEIN: Herbert S. Escravismo em São Paulo e Minas Gerais. São Paulo:
EDUSP: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2009; SLENES, Robert W. The demography and economics
of brasilian slavery: 1850-1888. Tese (Doutorado em História). Stanford University, Stanford, 1976.
262
Ver, entre outros, COSTA, Iraci del Nero da. Arraia-miúda: um estudo sobre os não proprietários de escravos
no Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1984.
263
BRASIL. Lei nº 581, de 4 de setembro de 1850. Estabelece medidas para a repressão do tráfico de africanos
neste império. In: Coleção das Leis do Império do Brazil. Disponível em:
<https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao/doimperio>. Acesso em: 24 mar. de 2018.
132

Esses avanços refinaram nosso entendimento sobre o passado escravista brasileiro. No


caso de Ilhéus, bem como na Bahia de maneira geral, as pesquisas nas áreas de história
econômica e demográfica histórica ainda são escassas. Nosso objetivo é avançar no tema e
contribuir com os estudos recentes.
Inicialmente analisaremos a estrutura da posse de escravos para entender a distribuição
da propriedade escrava em Ilhéus no período 1850-1888. Queremos saber se havia
concentração e/ou disseminação de cativos, quem eram os maiores escravistas e qual o lugar
dos produtores de cacau nesse contexto.
Em seguida dedicamos atenção aos aspectos relacionados com a origem e o sexo dos
cativos para avaliarmos a participação de crioulos e africanos na época de formação da
economia cacaueira. Ademais, cruzaremos essas informações com a ocupação principal dos
inventariados com o objetivo de identificar os grupos que tinham mais africanos, isto é, se
havia concentração destes cativos em alguma atividade econômica específica.
Na última seção analisamos de modo sistemático os preços dos escravos por décadas,
relacionando-os com as variáveis sexo e idade. Estamos interessados em saber se ao longo do
período houve oscilações dos preços e qual a relação disso com a economia de Ilhéus. Outra
questão que pretendemos discutir é sobre os meios utilizados pelos escravistas para
adquirirem escravos, por isso segmentamos os cativos em faixas etárias e de acordo com o
sexo, o que permite verificar a proporção de mulheres e crianças na população escrava.
A nossa hipótese é que a reprodução natural foi um dos fatores que contribuiu para
manutenção do escravismo na localidade, pois na segunda metade do século XIX os preços
dos escravos sofreram elevação, sendo que poucas famílias de Ilhéus tinham recursos
suficientes para comprar escravos264.

264
Para uma discussão historiográfica do tráfico interno de escravo no Brasil ver, por exemplo, MOTTA, José
Flávio. Escravos daqui, dali e de mais além: o tráfico interno de cativos na expansão cafeeira paulista (Areias,
Guaratinguetá, Constituição/Piracicaba e Casa Branca, 1861-1887). São Paulo: Alameda, 2012. (Capítulo 2 –
Historiografia e tráfico interno de escravos no Brasil, p. 61-101). Sobre o tráfico interno na Bahia ver, entre
outros, PIRES, Maria de Fátima Novaes. Fios da vida: tráfico interprovincial e alforrias nos Sertoins de Sima –
BA (1860-1920). São Paulo: Annablume, 2009.
133

4.2 - A estrutura da posse de escravos

Durante a segunda metade do século XIX diversas famílias exploraram o trabalho


escravo em Ilhéus. Nesta seção investigaremos a estrutura da posse de cativos com o objetivo
de avaliar a proporção de escravos entre os inventariados. Vale ressaltar que nessa conjuntura
a Bahia, assim como outras províncias do Nordeste, atravessou uma fase marcada pela
diminuição da mão de obra escrava, pois muitos escravistas, aproveitando a elevação dos
preços dos cativos, optaram por vende-los via tráfico interno.
A documentação que serve de suporte para nossas análises são, essencialmente: 333
inventários post mortem (1850-1888)265, o Livro de classificação dos escravos para libertação
pelo Fundo de Emancipação (1874-1886)266 e o Recenseamento Geral do Império do Brasil de
1872267.
No censo de 1872 duas paróquias conformavam a comarca de Ilhéus. A paróquia de
São Jorge dos Ilhéus, com 5.682 habitantes, dos quais 1.051 eram escravos (18,5%) e a
paróquia de Santo Antônio da Barra do rio de Una, com 2.877 habitantes, sendo 188 (6,5%)
escravos.
Os 333 inventários compulsados são de pessoas que viviam nas diversas localidades
da comarca e identificamos a presença de escravos em 121 processos (36%). No computo
geral foram arrolados 829 cativos, dentre eles 75 ingênuos268. Já no Livro de classificação
encontramos 802 escravos, além de 345 filhos menores e 65 ingênuos, perfazendo, nesta
fonte, o total de 1.212 cativos.
Inicialmente analisaremos a distribuição da população escravizada descrita nos
inventários de acordo com a faixa de tamanho da posse, identificada pela sigla (FTP).

265
APEB, SJ. Inventários post mortem (333 processos). Ilhéus, 1850-1888. (Ver listagem em anexo).
266
APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos pelo fundo de emancipação. Lv. nº
7008. Ilhéus, 1874-1886.
267
Recenseamento Geral do Império do Brasil, 1872. Disponível em: <http://www.biblioteca.ibge.gov.br>.
Acesso em 15 de fev. 2018.
268
Ingênuos eram os filhos das escravas nascidos após a Lei 2.040 de 28 de setembro de 1871, que passaram a
ser considerados de condição livre. BRASIL. Lei nº 2.040, de 28 de setembro de 1871. Art. 1º Os filhos de
mulheres escravas que nascerem no Império desde a data desta lei, serão considerados de condição livre In:
Coleção de Leis do Império do Brasil, 1808-1889. Disponível em: <https://www2.camara.leg.br/atividade-
legislativa/legislacao/doimperio>. Acesso em 24 mar. de 2018.
134

Queremos saber quem eram os maiores e menores escravistas, as suas atividades econômicas
e se havia a concentração e/ou disseminação da posse de escravos.
Para tanto optamos por segmentar a posse de cativos em quatro faixas principais, que a
nosso ver correspondem à realidade socioeconômica de Ilhéus, uma localidade distante dos
principais pontos terminais do tráfico atlântico de africanos e com uma economia em
desenvolvimento, assim definimos as seguintes faixas escravista (1 a 3 escravos); pequeno
escravista (4 a 9); médio escravista (10 a 19), e por fim aqueles que tinham 20 ou mais
escravos, classificados como grandes escravistas, sendo que nesta fonte o maior de todos
chegou a possuir 73 escravos269.

Tabela 4.1 - Distribuição dos escravistas inventariados por faixas de tamanho


da posse de escravos (FTP). Ilhéus, 1850-1888
Classificação dos FTP Escravistas Total de escravos
escravistas Nº % Nº %
Mini 1a3 66 54,5 109 13,1
Pequeno 4a9 31 25,6 181 21,8
Médio 10 a 19 15 12,4 221 26,7
Grande 20 ou + 9 7,5 318 38,4
Total 121 100,0 829 100,0
Fonte: APEB, SJ. 121 processos de inventários. Ilhéus, 1850-1888

De acordo com os dados da tabela 4.1 a maioria dos escravistas de Ilhéus detinha entre
1 e 3 cativos, eles representavam 54,5% de todos inventariados com posse de escravos,
porém, a soma de seus cativos correspondeu apenas a 13,1% dos escravos arrolados nos
inventários. Por outro lado, os grandes escravistas, que representavam tão somente 7,5% dos
donos de escravos, acumularam 38,4% do total de cativos, demonstrando alta concentração na
estrutura da posse.
Os grupos intermediários também eram importantes. Os médios escravistas, 12,4% do
total, detinham 26,7% de toda escravaria, e os pequenos (4 a 9 escravos), que representavam
25,6 % dos escravistas, concentraram 21,8% dos escravos.

269
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Rita Constança de Melo Sá, Est. 02 Cx. 759, Maço 1225, Doc.
04, 28 ago. 1880.
135

Esse quadro demográfico mostra que poucas famílias de Ilhéus eram detentoras de
grandes escravarias. Não obstante, ele permite afirmar que não era privilégio dos mais ricos
ter escravos, muitas pessoas tinham entre 1 e 3 cativos. Destarte, encontramos pessoas que
tinham metade de um escravo. Em Ilhéus, e no Brasil de maneira geral, os escravos eram bens
de valor considerável, frequentemente disputado na justiça, doados, vendidos, comprados ou
arrematados em praça pública para pagamento de dívidas, como deixam transparecer alguns
inventários post mortem270.
Ademais, após a proibição do tráfico atlântico de africanos, em 1850271, o preço desse
bem subiu muito e para maioria dos lavradores de Ilhéus, ficou mais difícil comprar escravos.
Esse foi um dos aspectos que limitou a posse de cativos pelos produtores de cacau da
localidade, assim muitos recorrerem ao trabalho familiar para cultivar as plantações e garantir
a sobrevivência.
Segundo Mary Ann Mahony “os registros de batismo, inventários e documentos
notariais mostram que a posse de escravos era muito difundida no século XIX”272. Ao que
parece algumas famílias, que já eram ricas, concentraram a maior parte dos escravos em suas
propriedades, sendo que grande parte dos cacaueiros foram cultivados por pequenos
lavradores, sem recursos suficientes para adquirir escravos, e outros com pequenas posses de
cativos.
Podemos avaliar melhor essa questão cruzando as diferentes ocupações dos
inventariados com a estrutura da posse de escravos, isso permitirá saber quem eram os
maiores escravistas de Ilhéus nessa época. Antes de mostrarmos os resultados deste
cruzamento é oportuno lembrar que no conjunto dos inventários compulsados nesta pesquisa

270
Maria, uma criança escrava de 6 anos de idade, foi avaliada em 1865 no inventário do seu proprietário (João
Adão Schaum), pelo preço de Rs. 600$000, sendo que a inventariante declarou que metade daquela escrava
pertencia a herdeira Maria Juliana Schaum; Francisca, uma escrava preta de 54 anos, cega do olho esquerdo, foi
avaliada em Rs. 400$000 em 1880, sendo que cabia a Hipolito Gastão Lavigne, um dos proprietários, a quantia
de Rs. 294$320, porque a outra parte foi liberta. Durante os trâmites do processo Francisca apresentou o restante
do seu valor e solicitou a liberdade. APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. João Adão Schaum, Est. 02 Cx.
784, Maço 1251, Doc. 09, 12 jul. 1865; Hipólito Gastão Lavigne, Est. 02 Cx. 755, Maço 1221, Doc. 06, 19 ago.
1880.
271
BRASIL. Lei nº 581, de 4 de setembro de 1850. Estabelece medidas para a repressão do tráfico de africanos
neste império. In: Coleção das Leis do Império do Brazil. Disponível em:
<https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao/doimperio>. Acesso em: 24 mar. de 2018.
272
MAHONY, Mary Ann. “Instrumentos necessários”; escravidão e posse de escravos no sul da Bahia no século
XIX, 1822-1889. Afro-Ásia. Salvador, n. 25-26, p. 95-139, 2001. p. 108.
136

(333) o maior índice de escravistas foi entre os donos de engenho (100% dos casos); depois
entre os negociantes (79,5%); em seguida entre os produtores de farinha/café ou coco (45,8%)
e por último entre os produtores de cacau (23,3%). É certo que alguns donos de engenho,
negociantes e outros inventariados tinham plantações de cacau, mas estas não eram a principal
fonte de alocação de suas riquezas.
Inicialmente vamos analisar a distribuição global dos escravos de acordo com a
ocupação principal dos escravistas.

Tabela 4.2 – Distribuição dos escravos segundo a ocupação principal


dos escravistas. Ilhéus, 1850-1888
Total de
Ocupação principal Soma dos escravos
escravistas
Nº % Nº %
Produtores de cacau 51 42,1 254 30,6
Negociantes 31 25,6 122 14,7
Donos de Engenho 12 9,9 304 36,7
Produtores de farinha 5 4,1 52 6,3
Produtores de coco 4 3,3 7 0,8
Produtores de café 2 1,7 4 0,5
Outros 3 2,5 12 1,4
Não Identificada 13 10,7 74 8,9
TOTAL 121 100,0 829 100,0
Fonte: APEB, SJ, 121 processos de inventários. Ilhéus, 1850-1888

Observando a Tabela 4.2 notamos que 42,1% dos escravistas tinha como ocupação
principal a produção de cacau, porém a soma de seus escravos correspondeu apenas a 30,6%
do total de cativos, demonstrando que a participação do trabalho escravo no cultivo de cacau
não era desprezível.
No entanto, entre os donos de engenho, que representaram tão somente 9,9% dos
escravistas inventariados, a posse de escravos era mais concentrada, visto que 36,7% dos
cativos estavam em suas propriedades.
Esse é o ponto de partida importante para entendermos a estrutura da posse de
escravos em Ilhéus. Donos de engenho e negociantes detinham as maiores fortunas e a
maioria deles era composta por escravistas, ao contrário dos demais inventariados. Embora
137

42,1% dos escravistas fossem produtores de cacau, ainda não sabemos se eles concentraram a
maior parte das plantações de cacaueiros.
Vamos avançar nessa investigação analisando, num primeiro momento, o tamanho das
escravarias dos inventariados de Ilhéus de acordo com as ocupações principais.

Tabela 4.3 – Distribuição dos escravistas inventariados por faixas de tamanho da


posse de escravos (FTP) e ocupação principal. Ilhéus, 1850-1888
1a3 4a9 10 a 19 20 ou + Total de
(FTP)
escravos escravos escravos escravos escravistas
OCUPAÇÃO PRINCIPAL Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %
Produtores de cacau 31 60,8 12 23,5 5 9,8 3 5,9 51 100,0
Negociantes 17 54,8 13 41,9 1 3,9 0 0,0 31 100,0
Donos de Engenho 1 8,3 1 8,3 4 33,3 6 50,0 12 100,0
Produtores de farinha 2 40,0 0 0,0 3 60,0 0 0,0 5 100,0
Produtores de coco 3 75,0 1 25,0 0 0,0 0 0,0 4 100,0
Produtores de café 2 100,0 0 0,0 0 0,0 0 0,0 2 100,0
Outros 2 75,0 1 25,0 0 0,0 0 0,0 3 100,0
Não identificada 8 61,5 3 23,1 2 15,4 0 0,0 13 100,0
TOTAL 66 54,5 31 25,6 15 12,4 9 7,4 121 100,0
Fonte: APEB, SJ, 121 processos de inventários. Ilhéus, 1850-1888

Os dados da Tabela 4.3 mostram que 60,8% dos produtores de cacau escravistas
detinha entre 1 e 3 cativos, comprovando que entre eles uma parcela restrita tinha 20 ou mais
escravos, apenas 5,9%, ao contrário dos donos de engenho, em que a maior parte era formada
por grandes e médios escravistas, 50% e 33,3%, respectivamente.
Não devemos desprezar o fato de que entre 1850 e 1888 diversos negociantes, muitos
deles pertencentes a famílias ricas, estavam envolvidos com a comercialização de cacau e
outros gêneros da lavoura. No entanto, entre eles também predominou pequenas posses de
escravos, 54,8% tinha entre 1 e 3 cativos e a outra parcela (41,9%) entre 4 e 9. Certamente
eles utilizavam seus escravos nos serviços domésticos, no embarque e desembarque de
mercadorias, nas vendas de produtos nas casas de negócios, nas feiras e com menor
frequência no cultivo de cacau.
Desse modo, para a maioria dos pequenos lavradores as chances de comercializar seus
produtos diretamente em Salvador eram remotas dadas a dificuldade de obter transportes de
138

longa distância a preços baixos, além da cobrança de fretes e impostos e as complicações do


acesso ao mercado da capital, que certamente oferecia preços mais altos pelos produtos. É
oportuno lembrar que essa questão foi colocada no tratado de paz proposto pelos escravos do
Engenho Santana, “[...] Faça uma barca grande para quando for para a Bahia nós metermos a
nossas cargas para não pagarmos fretes”273.
Ao que parece, para os pequenos lavradores de Ilhéus da segunda metade do século
XIX a alternativa mais viável era entregar a produção aos negociantes, que recebiam o cacau
e outros gêneros da lavoura como pagamento, revendendo os produtos na capital a preço mais
elevados, e lá mesmo se abastecendo com mercadorias vindas de outros lugares da província,
do Império ou do exterior, retornando para abastecer o mercado interno de Ilhéus274.
Agora vamos avaliar a distribuição dos cacaueiros de acordo com a estrutura da posse
de escravos, para entendermos qual foi a importância do trabalho escravo no processo de
disseminação do cultivo do cacau em Ilhéus. Devido à baixa amostragem de inventários na
década de 1850 optamos por realizar uma análise conjunta do período 1850-1869.

Tabela 4.4 - Produtores de cacau segundo a posse de escravos.


Ilhéus, 1850-1869
Nº Nº Nº %
FTP
Produtores Escravos Cacaueiros * Cacaueiros
0 26 0 16.636 36,4
1 5 5 7.560 16,5
2 2 4 4.134 9,0
3 0 0 0 0,0
4a9 6 31 11.922 26,0
10 a 19 1 11 5.500 12,0
Total 40 51 45.752 100,0
Fonte: APEB, SJ. 40 Inventários. Ilhéus, 1850-1869
(FTP) Faixas de tamanho da posse de escravos.
(*) Excluímos 2.318 cacaueiros pertencentes a 6 inventariados
que não tinham a produção de cacau como ocupação principal.

273
Tratado de paz proposto pelos escravos do Engenho Santana de Ilhéus. In: SCHWARTZ, Stuart. Escravos,
roceiros e rebeldes. Tradução Jussara Simões. Bauru, SP: EDUSC, 2001. Apêndices: Documentos relativos aos
fugitivos do Engenho Santana. Documento II, p. 119-121.
274
Essa discussão pode ser vista em FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro. Os donos dos frutos de ouro.
Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais). ICS-UFBA. Salvador, 1979.
139

Os dados da Tabela 4.4 mostram que entre 1850-1869 aproximadamente um terço dos
cacaueiros (36,4%) eram cultivados por pessoas que não detinham escravos. A outra parte das
plantações, a maioria, contava com a participação de pelo menos um cativo. Sendo que apenas
um inventariado, dono de 11 escravos, concentrou 12% dos cacaueiros. Aproximadamente um
quarto tinha entre 1 e 2 escravos e 26% entre 4 e 9 cativos. Assim, neste período, o trabalho
escravo estava presente na maioria das plantações, ainda que indiretamente.
Não obstante, a fase de arranque da lavoura cacaueira em Ilhéus ocorreu entre as
décadas de 1870 e 1880, sendo imprescindível avaliar a distribuição dos cacaueiros e a
presença de escravos nesses decênios.

Tabela 4.5 - Produtores de cacau segundo a posse de escravos.


Ilhéus, 1870-1879
Nº Nº Nº %
FTP
Produtores Escravos Cacaueiros* Cacaueiros
0 63 0 81.691 47,0
1 4 4 5.965 3,4
2 1 2 4.154 2,4
3 4 12 7.381 4,3
4a9 4 15 8.791 5,1
10 a 19 2 29 25.159 14,5
20 ou + 2 49 40.293 23,2
Total 80 111 173.434 100,0
Fonte: APEB, SJ. 80 Inventários. Ilhéus, 1870-1879.
(FTP) Faixas de tamanho da posse de escravos.
(*) Excluímos 5.972 cacaueiros pertencentes a 4 inventariados
que não tinham a produção de cacau como ocupação principal.

Observando os dados da Tabela 4.5 percebemos que quase a metade dos cacaueiros
(47%) eram cultivados por produtores sem escravos. Isso significa que a participação relativa
deste grupo aumentou em relação ao período anterior. Por outro lado, notamos que ocorreu
aumento da concentração de cacaueiros nas propriedades com grandes escravarias. Apenas
dois produtores, donos de 20 ou mais cativos, detinham 23,2% de todos os cacaueiros
arrolados nos inventários da década de 1870. Isso permite constatar que as poucas famílias
140

com muitos escravos conseguiram ampliar a produção. Todavia, o trabalho familiar


desempenhou papel importante na expansão da lavoura de cacau.
Ainda podemos avançar nessa investigação analisando a década de 1880, que
concentrou a maior parte dos cacaueiros.

Tabela 4.6 - Produtores de cacau segundo a posse de escravos.


Ilhéus, 1880-1888
Nº Nº Nº %
FTP
Produtores Escravos Cacaueiros* Cacaueiros
0 76 0 159.780 63,2
1 13 13 51.686 20,4
2 1 2 8.561 3,4
3 0 0 0 0,0
4a9 2 12 3.576 1,4
10 a 19 2 29 17.577 7,0
20 ou + 1 29 11.622 4,6
Total 95 85 252.802 100,0
Fonte: APEB, SJ. 95 Inventários. Ilhéus, 1880-1888
(FTP) Faixas de tamanho da posse de escravos.
(*): Excluímos 29.571 cacaueiros pertencentes a 6 inventariados
que não tinham a produção de cacau como ocupação principal.

Os dados da Tabela 4.6 mostram que entre 1880 e 1888 a maioria (63,2%) dos
cacaueiros era cultivada por produtores sem escravos. Assim, notamos que a fase de arranque
e expansão da lavoura cacaueira se caracterizou por ampla participação do trabalho familiar,
sendo que poucas famílias utilizaram o trabalho escravo em larga escala no cultivo do cacau.
Todavia, é importante ressaltar que essas análises deixam de fora uma parte dos
inventariados que tinham escravos e cacaueiros, mas que não foi possível saber a quantidade
de plantas cultivadas, pois os avaliadores descreveram as culturas em conjunto com outros
bens. Esses casos constituem a minoria dos processos investigados e acreditamos que eles não
distorcem os resultados apresentados, até porque a maior parte desses processos era de
pessoas que não tinham cativos, outros que tinham pequenas posses e somente um era grande
escravistas, membro da família Sá Bitencourt Câmara 275.

275
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Rita Constança de Melo Sá, Est. 02 Cx. 759, Maço 1225, Doc.
04, 28 ago. 1880.
141

É importante ressaltar que, apesar da posse de escravos estar restrita a 36% dos
inventariados identificamos que os cativos trabalhavam em vários setores da economia.
Comprar escravos e fazê-los trabalhar significava a possibilidades de aumentar a fortuna em
quaisquer que fosse a atividade. Todavia, no caso de Ilhéus notamos que a maior parte dos
grandes escravistas era constituída por donos de engenho, isso significa que a maioria dos
escravos trabalhava, principalmente, na produção de açúcar e em menor proporção nas
lavouras de cacau. Assim como no Recôncavo baiano276, em Ilhéus a empresa açucareira
continuo sendo uma atividade lucrativa até a véspera da abolição da escravidão.
No entanto, devemos reconhecer que nesse contexto a expansão do cultivo de cacau
conviveu com várias outras atividades importantes. Encontramos produtores de farinha que
tinham entre 10 e 19 escravos, muito acima da posse do típico lavrador de mandioca analisado
por Bert J. Barickman, que no geral detinha entre dois e oito escravos277. No litoral havia
fazendas com escravos e plantações de coco; também encontramos produtores de café com
escravos.
Assim, a exploração do trabalho escravo em larga escala realizava-se, sobretudo, entre
os donos de engenho, que concentraram a maior parte dos cativos e entre algumas famílias
ricas que viram no cacau uma alternativa de investimento, mesmo assim eles tinham ligação
com os negociantes, donos de engenho e se articulavam para obter vantagens não apenas com
a produção mas também na comercialização dos produtos. A maioria dos produtores de cacau
não tinha esses recursos, utilizaram as sementes do fruto como moeda de pagamento, ficando
impossibilitado, na maioria das vezes, de enriquecer com o cultivo de cacaueiros.
Analisar a relação dos maiores proprietários de escravos presentes nos inventários post
mortem, bem como a composição de suas riquezas, pode contribuir para entendermos melhor
a questão.

276
Ver, BARICKMAN, Bert J. Até a véspera: o trabalho escravo e a produção de açúcar nos engenhos do
Recôncavo baiano (1850-1881). Afro-Ásia. Salvador, n. 21-22, p. 177-238, 1998-1999.
277
BARICKMAN, Bert J. Um contraponto baiano: açúcar, fumo, mandioca e escravidão no Recôncavo, 1780-
1860. Tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. p. 248.
142

Tabela 4.7 – Relação dos grandes escravistas (20 ou + cativos) inventariados.


Ilhéus, 1850-1888
Total de Escravos *
Nomes Nº % Nº %
Rita Constança de Melo Sá e esposo 1 0,8 73 9,0
Maria José Leola Del Rey e irmã 1 0,8 54 6,5
Maria da Piedade Melo e Sá 1 0,8 48 5,7
Cap. Egídio Luiz de Sá Bitencourt Câmara 1 0,8 29 3,5
Major Joaquim José de Oliveira 1 0,8 28 3,4
Cristiano Manoel de Sá Bitencourt Câmara 1 0,8 23 2,7
Mariana Joaquina de Queirós Caldas 1 0,8 22 2,6
Capitão Pascoal Gonçalves de Paiva 1 0,8 21 2,5
Lourenço Dias Ribeiro 1 0,8 20 2,4
Demais escravistas 112 92,5 511 61,7
TOTAL 121 100,0 829 100,0
Fonte: APEB, SJ. 121 processos de inventários. Ilhéus, 1850-1888
(*) Inclui 75 ingênuos.

A Tabela 4.7 apresenta os nove maiores escravistas encontrados nos inventários post
mortem de Ilhéus, isto é, aqueles que tinham 20 ou mais escravos. Eles representavam a
minoria dos escravistas, mas concentraram 38,3% dos cativos inventariados.
A primeira pessoa da lista é Dona Rita Constança de Melo Sá, viúva do Tenente
Coronel Egídio Luiz de Sá Bitencourt Câmara, dona do maior número de escravos entre os
inventariados, 73 cativos (9%). O inventário foi aberto em 28 de agosto de 1880, após a morte
de Dona Rita, que tinha várias propriedades em Ilhéus e no distrito de Cachoeira de Itabuna,
com riqueza bruta calculada no valor de Rs.57.889$448, a maior parte comprometida com
escravos (53%), dívidas ativas (35%) e terras (8%)278.
A primeira avaliação foi realizada na Fazenda Morro, na Cachoeira de Itabuna, um dos
locais de residência da inventariada, onde trabalhavam doze escravos no serviço de lavoura. A
fazenda possuía três bois do serviço, todos por Rs. 150$000; uma casa de morada coberta de
telha por Rs. 500$000; uma plantação com 4.500 cafezais por Rs. 900$000; outra com 4.000
covas de mandioca por Rs. 100$000. Ao que parece tratava-se de uma fazenda escravista
voltada para produção de café e mandioca para fabricação de farinha.

278
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Rita Constança de Melo Sá, Est. 02 Cx. 759, Maço 1225, Doc.
04, 28 ago. 1880.
143

Outra importante propriedade de Dona Rita era “uma fazenda de cacaueiros


denominada Santa Maria, situada no mesmo rio Cachoeira, com um quarto de légua de frente,
três léguas de fundo, casa velha de fazer farinha coberta de telha, tudo avaliado em Rs.
2.500,000”279. Pelas dimensões da fazenda e o preço de avaliação parece que era uma grande
propriedade escravista dedicada à produção de cacau. Embora os avaliadores não mencionem
o número de cacaueiros cultivados, nem quantos escravos trabalhavam nesta fazenda,
acreditamos que durante o século XIX este foi o principal ramo da família Sá Bitencourt
Câmara, uma das mais tradicionais de Ilhéus280, que investiu muito em escravos e plantações
de cacau e café no distrito da Cachoeira de Itabuna, além da produção de farinha de
mandioca. A inventariada tinha imóveis na vila de Ilhéus e uma parte dos seus escravos (29)
estava neste espaço, outra parte (32) na Fazenda Vitória, também localizada na Cachoeira de
Itabuna, propriedade de Fernando Steiger, genro da falecida, outro importante escravista
produtor de cacau e café desta família, como mostraremos nos próximos parágrafos.
Um dos filhos de Dona Rita Constança, o Capitão Egídio Luiz de Sá Bitencourt
Câmara, batizado com mesmo nome do pai, faleceu em 1880, poucos meses depois da morte
de sua mãe e seu nome aparece em quarto lugar em nossa lista dos maiores escravistas
inventariados, possuindo 29 escravos. Na época, além dos cativos ele possuía 11.622
cacaueiros espalhados em diversas propriedades, inclusive na Cachoeira de Itabuna: na
Fazenda Santa Maria, propriedade de seus falecidos pais (2.100); na Fazenda Boa Vista Sá
(3.140); na Fazenda Boa Vista Kahene Sá (4.647); na Fazenda Hico, continuação da Boa
Vista Sá (1.070) e na Fazenda Pupe (665). Ademais, ele possuía casa de residência na vila de
Ilhéus, na rua direita do Porto, casas de morada nas fazendas, casa de farinha, senzalas, casas
de beneficiar cacau, entre outros bens. No computo geral a riqueza bruta foi calculada no
valor de Rs. 25.575$000, a maior parte alocada em escravos (42%) e cacaueiros (38%)281.
Outro segmento desta família tinha riqueza apoiada nas atividades do engenho. Maria
da Piedade Melo e Sá faleceu em 12 de abril de 1876 e era casada com Christiano Manoel de
Sá Bitencourt Câmara. Na época eles eram donos do Engenho Itaípe e de 48 escravos, entre

279
Ibidem.
280
Sobre as tradicionais famílias de Ilhéus ver, entre outros, Ribeiro, André Luiz Rosa. Família, poder e mito: o
município de São Jorge de Ilhéus (1880-1912). Ilhéus: Editus, 2001.
281
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Capitão Egídio Luiz de Sá Bitencourt Câmara. Est. 02 Cx. 754,
Maço 1220, Doc. 11, 16 de nov. 1880.
144

outros bens. A fortuna da família foi calculada em Rs. 53.097$000, a maior parte
comprometida com escravos (61%), imóveis (14,4%) e terras (14%)282. O nome dela aprece
em terceiro lugar em nossa lista dos maiores escravistas. Todavia, o viúvo se casou em
segundas núpcias com Cândida Fausta de Sá e faleceu em 14 de abril de 1879, sem deixar
testamento. Nesta ocasião Christiano Manoel de Sá ainda era dono do Engenho Itaípe e dos
escravos, mas neste inventário só foram considerados 23 escravos, pois a outra parte pertencia
ao espólio do primeiro casamento283, assim, ele aparece em sexto lugar em nossa lista dos
maiores escravistas inventariados.
Outro representante desta família ocupa o quinto lugar na alista dos maiores
escravistas inventariados. Major Joaquim José de Oliveira era casado com dona Adelaide de
Melo Sá Oliveira e o inventário da família foi aberto em 1875, por ocasião da morte do Major.
O casal possuía, entre outros bens, uma fazenda na Cachoeira de Itabuna com 19.406
cacaueiros, 6 mil pés de café e 28 escravos. A riqueza bruta foi avaliada em Rs. 62.180$824, e
estava comprometida, principalmente, com os seguintes bens: plantações de cacau (31%);
284
escravos (18%); imóveis (17%), dívidas ativas (14%) e terras (14%) . Além de dono da
maior plantação de cacau entre os inventariados o Major Joaquim José de Oliveira era dono
de “uma engenhoca de fabricar açúcar e casa de farinha com todos os seus utensílios, tudo no
valor de duzentos e sessenta mil réis”285, também possuía “uma casa situada na rua do porto
com seus chãos próprios e armação para venda”286. Assim, percebemos que sua riqueza era
diversificada, além de grande produtor de cacau ele devia vender gêneros da lavoura na vila
de Ilhéus.
Voltando atenção para a Tabela 4.7 notamos que Maria José Leola Del Rey e sua irmã
ocuparam o segundo lugar em nossa lista dos maiores escravistas. Elas eram herdeiras do
Engenho Castelo Novo, grande complexo econômico e escravista de Ilhéus na segunda
metade do século XIX, com 54 escravos. O inventário foi aberto em 1861 devido a morte

282
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Maria da Piedade Melo e Sá. Est. 02, Cx. 781, Maço 1248, Doc.
03, 12 de jul. 1876.
283
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Cristiano Manole de Sá Bitencourt Câmara. Est. 02, Cx. 753,
Maço 1219, Doc. 02, 24 de abr. 1879.
284
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Major Joaquim José de Oliveira. Est. 02, Cx. 749, Maço 1215,
Doc. 07, 30 de out. 1875.
285
Ibidem.
286
Ibidem.
145

destas herdeiras e essa família foi a mais ricas entre os inventariados, com fortuna calculada
no valor de Rs. 89.797$030, grande parte alocada em escravos (60%); imóveis (18%) e terras
(9%)287.
Os escravos do Engenho Castelo Novo trabalhavam em diversas atividades
relacionadas com a produção de açúcar, aguardente, farinha de mandioca, serviços
domésticos, exploração e beneficiamento de madeiras, além de cuidarem dos animais, do
canavial e da plantação de cacau (2.000 pés). O engenho também tinha balcão com armação
para negócio e o nome de Manoel Assêncio Homem Del Rey, um dos proprietários, consta no
Livro de imposto sobre casas de negócio288. Ademais, ele recebia cacau como pagamento das
dívidas contraídas em seu estabelecimento pelos lavradores.
A viúva de José Pedro Mendes, por exemplo, produtor de cacau em Banco do Pedro,
declarou que entregou mais de 200 arrobas ao Tenente Manoel Assencio Homem Del Rey,
por conta de sua dívida, mas segundo ela “o referido credor não costuma passar recibo da
quantidade de cacau que seus fregueses lhe entregam e que à própria inventariante recusou
dar conta corrente, perguntando-lhe na ocasião em que solicitava-a: Para que conta? A
senhora vai pagar?”289 A viúva mostrou-se claramente inconformada com o valor da dívida
apresentada pelo negociante (Rs. 2.537$521), que arrancou 40% da fortuna do casal (Rs.
6.297$500)290.
Outro nome que aparece na lista dos maiores escravistas inventariados é o de Dona
Mariana Joaquina de Queirós Caldas, proprietária do Engenho São João, localizado na
Cachoeira de Itabuna, com 22 escravos e outros bens em 1878, ano que ela faleceu291. A
riqueza bruta da família foi avaliada em Rs. 22.186$960, a maior parte comprometida com
escravos (54%), imóveis (26%) e terras (12,5%)292.

287
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Maria José Leola Del Rey e Carolina Leola Del Rey. Est. 02, Cx.
786, Maço 1253, Doc. 06, 28 de fev. 1861.
288
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Maço 5455. Livro de imposto sobre casas de negócio. Ilhéus, 1874-1892.
289
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. José Pedro Mendes. Est. 02, Cx. 762, Maço 1228, Doc. 14, 16 de
nov. 1886.
290
Ibidem.
291
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Mariana Joaquina de Queirós Caldas. Est. 02, Cx. 750 Maço
1216, Doc. 07, 16 de set. 1878.
292
Ibidem.
146

Outro grande escravista de Ilhéus era o Capitão Pascoal Gonçalves de Paiva, casado
com Florinda Francisca de Paiva, donos da Fazenda Pirataquisse, além de 20 escravos e
plantações que totalizaram 20.889 cacaueiros, espalhados em vários lugares, entre outros bens
declarados no inventário, aberto em 1878 por ocasião da morte do referido capitão. A fortuna
do casal foi calculada em Rs. 49.742$100, comprometida, principalmente, com os seguintes
bens: cacaueiros (41,7%); escravos (25%); terras (17%) e imóveis (9%)293.
O último nome da lista dos maiores escravistas era proprietário de engenho. Antes de
falecer, em 1879, Lourenço Dias Ribeiro era dono de Fazenda com engenho no Iguape, dono
de 20 escravos e de uma fortuna avaliada em Rs. 17.457$800, a maior parte comprometida
com escravos (58%); imóveis (21,5%) e terras (15%)294.
A análise do patrimônio desses grandes escravistas mostra que na segunda metade do
século XIX a economia de Ilhéus estava em transição, sendo que os mais ricos estavam
investindo em engenhos e outros e plantações de cacau, ambos recorreram ao trabalho escravo
como meio de aumentar as suas riquezas. Alguns engenhos se expandiram além do litoral e
foram estabelecido no distrito de Cachoeira de Itabuna, para onde se deslocaram membros da
família Sá Bitencourt Câmara junto com seus escravos, eles foram os grandes escravistas que
investiram no cultivo de cacau e outros produtos, a maioria dos lavradores que também se
dirigiram para Itabuna para expandir a fronteira agrícola com plantações de cacau era formada
por pessoas com poucos recursos financeiros e portanto sem condições de comprar escravos.
A família Sá Bitencourt Câmara já era rica antes mesmo do cacau se tornar produto de
alto valor econômico. Eles compraram o Engenho Santana na primeira metade do século XIX
e alguns continuaram investindo em engenhos enquanto outros se estabeleceram em Itabuna,
mas mantiveram propriedades na vila de Ilhéus e em outras partes da comarca295.
Mary Ann Mahony argumenta que no final do século XIX e início do XX surgiram
novos ricos em Itabuna em contraposição às antigas famílias tradicionais de Ilhéus·. Os
nossos dados indicam que essa questão merece aprofundamentos, visto que encontramos
293
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Capitão Pascoal Gonçalves de Paiva. Est. 02, Cx. 750, Maço
1216, Doc. 13, 17 de set. 1878.
294
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Lourenço Dias Ribeiro. Est. 02, Cx. 754, Maço 1220, Doc. 01,
30 de jun. 1879.
295
Sobre a cadeia sucessória dos proprietários do Engenho Santana ver, entre outros, MARCIS, Teresinha. O
Engenho Santana: uma reconstrução histórica. In: PÓVOAS, Ruy do Carmo. Mejigã e o contexto da escravidão.
Ilhéus: Editus, 2012. p. 281-326.
147

diversos integrantes desta tradicional família rica de Ilhéus (Sá Bitencourt Câmara)
estabelecidos no distrito de Cachoeira de Itabuna, isso desde a segunda metade do século
XIX296.
Ainda podemos analisar a estrutura da posse de escravos investigando outra fonte, o
Livro de classificação dos escravos para libertação pelo fundo de emancipação, onde constam
grandes escravistas, parte deles não capturados nos inventários post mortem297.
Entre 1874 e 1886, os donos de escravos de Ilhéus tiveram que apresentar seus cativos
à Junta de classificação para concorrerem à libertação pelo Fundo de emancipação298,
declarando as características principais como nome, cor, idade, ocupação, estado conjugal e a
quantidade de filhos menores, escravos e ingênuos. O resultado é uma listagem com o nome
de 183 escravistas, que classificaram 802 escravos, além de 345 filhos menores e outros 65
ingênuos299. A distribuição desses escravistas e dos 1.212 escravizados por faixas de tamanho
da posse poder ser vista na Tabela 4.8.

Tabela 4.8 - Distribuição dos escravistas do Livro de classificação dos escravos por
faixas de tamanho da posse de cativos (FTP). Ilhéus, 1874-1886
Classificação dos FTP Escravistas Total de escravos*
escravistas Nº % Nº %
Mini 1a3 117 64,0 176 14,5
Pequeno 4a9 35 19,0 199 16,4
Médio 10 a 19 14 7,7 203 16,8
Grande 20 ou + 17 9,3 634 52,3
Total 183 100,0 1.212 100,0
Fonte: APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para libertação pelo fundo
de emancipação. Livro nº 7008. Ilhéus, 1874-1886.
(*) Inclui 345 filhos menores escravos e 65 ingênuos

296
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Rita Constança de Melo Sá, Est. 02 Cx. 759, Maço 1225, Doc.
04, 28 ago. 1880.
297
APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos pelo fundo de emancipação. Fundo:
Tesouraria Provincial. Lv. 7008. Ilhéus, 1874-1886.
298
BRASIL. Lei nº 2.040, de 28 de setembro de 1871. Art. 3º Serão anualmente libertados em cada Província do
império tantos escravos quantos corresponderem à quota anualmente disponível do fundo destinado à
emancipação. In: Coleção das Leis do Império do Brazil. Disponível em:
<https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao/doimperio>. Acesso em: 24 mar. de 2018.
299
Ibidem.
148

A Tabela 4.8 evidencia um padrão de estrutura da posse de escravos semelhante ao


encontrado no estudo com os inventários post mortem, ou seja, a maioria (64%) dos donos de
escravos também possuía de 1 a 3 cativos. No entanto, a soma de seus escravos representou
somente 14,5% dos cativos classificados.
Já o grupo dos grandes escravistas, com 20 ou mais escravos, era composto por apenas
17 pessoas (9,3%) e concentrou 52,3% dos escravos. Juntos, médios e grandes escravistas
detinham 69,1% de todos os escravos, e representavam tão somente 17% dos escravistas.
Desse modo, assim como nos inventários post mortem, no Livro de classificação encontramos
altos níveis de concentração na estrutura da posse de escravos.
Muitos escravistas presentes nos inventários também aparecem no Livro de
classificação dos escravos e vamos analisar alguns. Contudo, para evitar repetição das
análises vamos contemplar aqueles que não estavam entre os inventariados anteriormente
discutidos. Vale advertir que não encontramos informações sobre todos escravistas do Livro
de classificação dos escravos, certamente alguns faleceram num período posterior aos limites
temporais do nosso estudo. Mesmo assim, ao confrontar a duas fontes, percebemos que o
número de escravistas de Ilhéus era maior do que os 121 inventariados.

Tabela 4.9 – Relação dos maiores escravistas (20 ou + cativos) do Livro de classificação
dos escravos. Ilhéus, 1874-1886
Total de escravos*
Nomes Nº % Nº %
Fernando Steiger 1 0,55 146 12,0
Fortunato Pereira Gallo 1 0,55 63 5,2
Ernesto de Sá Bitencourt Câmara 1 0,55 47 4,0
Paulino Lopes de Carvalho 1 0,55 46 3,9
Dr. Pedro de Cerqueira Lima 1 0,55 37 3,0
José de Melo Sá 1 0,55 30 2,5
Joaquim José de Calazans Bitencourt 1 0,55 23 1,9
Leôncio Armando de Lima 1 0,55 23 1,9
Luiz Gaston Lavigne 1 0,55 23 1,9
João Baptista Homem Del Rey 1 0,55 21 1,7
Demais escravistas 173 94,5 753 62,0
TOTAL 183 100,0 1.212 100,0
Fonte: APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para libertação pelo fundo de emancipação.
Livro nº 7008. Ilhéus, 1874-1886.
(*) Inclui 345 filhos menores escravos e 65 ingênuos.
149

A Tabela 4.9 mostra que apenas dez escravistas concentraram 38% dos escravos
classificados. Fernando Steiger foi o que apresentou maior quantidade, 146 cativos (12%). Ele
foi um dos maiores exportadores de cacau e café de Ilhéus entre 1871 e 1885300 e era casado
com a filha do Tenente Coronel Egídio Luiz de Sá Bithencourt Câmara e de Dona Rita
Constança de Sá, que na época da abertura do inventário já era falecida. Assim, percebemos
que Fernando Steiger era viúvo e disputou na justiça vários escravos com Paulina Kaene de
Sá, também viúva, nora de Dona Rita301. Outro grande escravista membro desta família foi
Ernesto de Sá Bitencourt Câmara, que apresentou 47 escravos para concorrerem à libertação,
mas não encontramos seu inventário.
Fortunato Pereira Galo, classificou 49 escravos, mas também não tivemos acesso ao
seu inventário. Quem fornece informações sobre ele é Mary Ann Mahony, segundo a autora,

Fortunato Pereira Gallo era o filho de um proeminente senhor de engenho do


Recôncavo, que comprou vários cativos na praça de Salvador quando
recebeu sua herança e se mudou para Ilhéus, onde reconstituiu uma parte
significante de uma antiga sesmaria para criar uma propriedade agrícola
chamada Santo Antônio da Ribeira das Pedras, que produzia madeiras,
açúcar, café e cacau302.

Mais uma vez identificamos o caso de um grande escravista em Ilhéus, dono de 49


escravos, que era dono de engenho, envolvido com a produção de açúcar, cacau e café, com a
exploração de madeiras e outras atividades.
Pedro de Cerqueira Lima é outro importante escravista de Ilhéus que Mary Ann
Mahony identificou como ligado às famílias da elite açucareira do Recôncavo. Ao todo ele
apresentou 30 escravos para libertação pelo fundo de emancipação. Não localizamos seu
inventário, contudo seu nome é citado nos autos do inventário de Roberto Gaston Lavine

300
Ver APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos pelo fundo de emancipação. Fundo:
Tesouraria Provincial. Lv. 7008. Ilhéus, 1874-1886; APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Maço 5459. Livro de
imposto sobre exportação de cacau e café. Ilhéus, 1871-1885.
301
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Rita Constança de Melo Sá, Est. 02 Cx. 759, Maço 1225, Doc.
04, 28 ago. 1880.
302
MAHONY, Mary Ann. A vida e os tempos de João Gomes: escravidão, negociação e resistência no Atlântico
negro. Revista Crítica Histórica. Ano VII, nº 13, jun. 2016.
150

como sendo o proprietário do Engenho Almada, onde o falecido inventariado residia, na


qualidade de caixeiro da casa de negócio303.
Paulino Lopes de Carvalho apresentou 49 escravos para concorrerem à libertação pelo
fundo de emancipação. No inventário de João Pedro Bonin, aberto em 1868, consta a seguinte
informação sobre ele,

[...] 690 braças de terreno na sesmaria comprada a Joaquim Pereira Caldas e


seu irmão Firmino Pereira Caldas, do lado sul do rio Cachoeira de Itabuna,
principiando onde acaba a sesmaria que hoje é do Tenente Coronel Paulino
Lopes de Carvalho, senhor do Engenho Jacarecica, a findar no mesmo terreno
de Henrique Berbet304. (Grifo nosso)

Essa descrição revela que Paulino Lopes de Carvalho era dono de Engenho Jacarecica,
localizado na Cachoeira de Itabuna, além de possuir a patente de Tenente Coronel da Guarda
Nacional, constituindo mais um exemplo de grande escravista dono de engenho.
Joaquim José de Calazans Bitencourt é outro exemplo, no inventário de Rita
Constança de Melo Sá consta uma dívida ativa no valor de Rs. 4.445$000, “referente à venda
do Engenho Esperança, localizado nas proximidades do rio Fundão, vendido ao Coronel
Joaquim José de Calazans Bitencourt por Rs. 12.000$000”305.
João Baptista Homem Del Rey era proprietário do Engenho Santana e apresentou 21
escravos para concorrerem à libertação. Seu inventário foi aberto em 1884, por ocasião da sua
morte, e sua fortuna foi avaliada em Rs. 11.219$000, nessa época ele possuía dez escravos
que representaram 29% da riqueza, as terras 44% e os imóveis 17%, não encontramos
plantações de cacau entre os seus bens inventariados306.
Desse modo, na listagem dos dez grandes escravistas da Tabela 4.9 percebemos que
pelo menos 50% deles eram donos de engenho. É certo que não localizamos os inventários de
todos, mas percebemos que a quantidade de engenhos não era desprezível. Destarte, muitos

303
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Roberto Gaston Lavigne. Est. 02 Cx. 758, Maço 1224, Doc. 08,
19 de jun. 1882.
304
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. João Pedro Bonin. Est. 02 Cx. 742, Maço 1207, Doc. 02, 03 de
jul. 1868.
305
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Rita Constança de Melo Sá, Est. 02 Cx. 759, Maço 1225, Doc.
04, 28 ago. 1880.
306
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Capitão João Batista Homem Del Rey. Est. 02, Cx. 760, Maço
1226, doc. 11, 09 de jun. 1884.
151

membros da família Sá Bitencourt Câmara aparecem entre os grandes proprietários de


escravos, parte deles envolvida com cultivo de cacau e outra parte continuou com engenhos
praticamente até a véspera da abolição. Assim, podemos considerar que naquele contexto
Ilhéus estava vivenciando uma transição econômica dos engenhos de açúcar para a lavoura
cacaueira. Nesse processo as famílias ricas conseguiram ampliar suas fortunas, pois tinham
recursos para comprar escravos e assim conseguiam aumentar a produção, ao contrário da
maioria dos inventariados que investigamos.
Entre os pequenos escravistas encontramos produtores de cacau, negociantes,
produtores de farinha e pessoas envolvidas com outras atividades econômicas. Santos Antônio
Teixeira, por exemplo, morava no sítio Jacarandá, na Cachoeira de Itabuna, tinha um escravo
e uma plantação com 125 pés de cacau, entre outros bens. Sua riqueza bruta foi calculada em
Rs. 940$000 e o seu escravo João, cabra de 18 anos de idade, representava 85% do valor de
seu patrimônio. Nos autos do processo, cujo inventário foi aberto em 1862, a viúva
inventariante declarou que ele estava foragido e o juiz mandou capturá-lo307.
Antônio da Cunha Marelim era negociante na vila de Ilhéus e possuía apenas uma
escrava, a crioula Paulina, solteira, avaliada em Rs. 1.000$000, entre outros bens descritos no
inventário, aberto em 1866 por ocasião da morte de Antônio. O monte-mor foi avaliado em
Rs. 11.700$473 e neste caso a escrava equivalia a 8,5% de toda fortuna308.
Esses exemplos demonstram as disparidades entre os pequenos escravistas de Ilhéus.
Se a viúva de Santos Antônio Teixeira não conseguisse que as autoridades capturassem seu
escravo foragido a riqueza da família seria drasticamente reduzida. No caso do negociante
uma situação como esta não causaria grande impacto. De todo modo, muitos escravistas
tinham apenas um escravo. Dentre os 121 inventários com posse de cativos constatamos que
31% era dono de apenas um escravo, a maioria deles era formada por produtores de cacau.
No Livro de classificação dos escravos computamos a presença de 183 escravistas, dos
quais 74 (40%) eram donos de apenas um escravo, demonstrando que a posse de muitos
cativos estava restrita a algumas famílias ricas da localidade e outras que vieram do

307
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Santos Antônio Teixeira. Est. 02 Cx. 784, Maço 1251, Doc. 15,
04 de ago. 1862.
308
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Antônio da Cunha Marelim. Est. 02 Cx. 785, Maço 1252, Doc.
02, 06 de ago. 1866.
152

Recôncavo e se estabeleceram em Ilhéus para montar engenhos de açúcar, empreendimento


que exige grande quantidade de trabalhadores, como ressaltou Stuart Schwartz, “Embora
existissem alguns engenhos que operassem com menos de quarenta escravos, na Bahia a
maioria deles possuía entre sessenta e oitenta, número esse que podemos supor como sendo o
mínimo necessário para o funcionamento eficaz”309.

4.2 - Crioulos e africanos no trabalho escravo

Muitos crioulos e africanos trabalharam como escravos em Ilhéus durante a segunda


metade do século XIX. Nessa seção analisaremos a proporção deles no conjunto da população
escrava da localidade, levando em consideração a divisão por sexo e idade. O objetivo é
investigar a dispersão ou concentração de africanos nas atividades econômicas e discutir o
acesso dos escravistas de Ilhéus ao mercado de escravo, bem como analisar as origens dos
cativos pertencentes aos produtores de cacau, negociantes, donos de engenho e demais
inventariados.
Nosso ponto de partida é a proibição do tráfico atlântico de africanos pela Lei nº 581
de 4 de setembro de 1850310, que causou elevação dos preços dos cativos. A partir desta lei a
compra de escravos passou a exigir maiores somas de dinheiro, o que ensejou um opulento
comércio interno de pessoas escravizadas, cuja direção principal foi da região Norte para o
Centro Sul do Império, onde a cafeicultura se expandia. Os estudiosos do assunto já
demonstraram que esse comércio se desenvolveu tanto pelos caminhos do interior quanto pelo
litoral, com quantidades expressivas de pessoas comercializadas311. Bert J. Barickman, por

309
SCHWARTZ, Stuart. Segredos internos: engenhos e colonial. Traduçaõ de Laura Teixeira Motta. São Paulo:
Companhia das Letras, 1998. p. 136.
310
BRASIL. Lei nº 581, de 4 de setembro de 1850. Estabelece medidas para a repressão do tráfico de africanos
neste império. In: Coleção das Leis do Império do Brazil. Disponível em:
<https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao/doimperio>. Acesso em: 24 mar. de 2018.
311
Para discussão historiográfica ver, por exemplo, MOTTA, José Flávio. Escravos daqui, dali e de mais além:
o tráfico interno de cativos na expansão cafeeira paulista (Areias, Guaratinguetá, Constituição/Piracicaba e Casa
Branca, 1861-1887). São Paulo. Alameda, 2012. (Capítulo II – Historiografia e tráfico interno de escravos no
Brasil). Sobre o tráfico interno na Bahia ver, entre outros, PIRES, Maria de Fátima Novaes. Fios da vida: tráfico
interprovincial e alforrias nos Sertoins de Sima-BA (1860-1920). São Paulo: Annablume, 2009.
153

exemplo, constatou que entre 1853 e 1871 as autoridades portuárias da Bahia registraram a
saída de quase 18.000 escravos despachados para fora da província.312
Entre os inventariados de Ilhéus encontramos casos de pessoas envolvidas com o
tráfico interno de cativos. Joaquim José da Costa Seabra, por exemplo, um dos grandes
negociantes de Ilhéus, realizou a venda de dois escravos para o Rio de Janeiro, conforme a
conta de venda e líquido que aparece em seu inventário, aberto em 1856. Sebastião, de nação
Angola, foi vendido por Rs. 550$500 e Maria, crioula, por Rs. 550$000. Entre as despesas
com a venda constam: frete ao Brigue (Rs. 24$100); apresentação na Polícia e matrícula no
Tesouro (Rs. 5$000); comedorias por seis dias cada um, a Rs.$200 o dia (Rs. 2$400) e
Comissão de 5% sobre as vendas (Rs. 55$000)313.
Por outro lado, alguns estudiosos apontam que desde 1831, com o aumento da
repressão britânica ao tráfico de africanos, o sul da Bahia se tornou uma alternativa para os
traficantes que fugiam da fiscalização. O cronista João da Silva Campos informa que
moradores de Ilhéus noticiaram desembarque ilegal de africanos na costa do mamoam314.
Mary Ann Mahony discute vários exemplos de desembarques de escravos no litoral de Ilhéus
após a Lei de 1850315. Ronaldo Lima da Cruz também se debruçou sobre a questão analisando
as correspondências dos juízes de Ilhéus, constatando, entre outras questões, a preocupação
das autoridades com os desembarques clandestinos316.
Analisar as características da população escrava descrita nos inventários post mortem
pode ajudar a entender como os escravistas de Ilhéus conseguiram escravos. A nossa hipótese
é que a reprodução natural foi o principal aspecto a garantir a manutenção do sistema
escravista na localidade. Todavia, não descartamos a possibilidade de algumas compras via
tráfico interno. A Tabela 4.10 fornece algumas pistas sobre a questão.

312
BARICKMAN, Bert. J. Até a véspera: o trabalho escravo e a produção de açúcar nos engenhos do recôncavo
baiano (1850-1888). Afro-Ásia, Salvador, n. 21-22, p. 177-238, 1998-1999. p. 194 e 204.
313
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Joaquim José da Costa Seabra. Est. 08 Cx. 3424, Doc. 06, 17 de
set. 1856.
314
CAMPOS, João da Silva. Crônica da capitania de São Jorge dos Ilhéus. 3 ed. Ilhéus: Editus, 2006. p. 356.
315
MAHONY, 2001, Op. Cit. p. 103-104; BRASIL. Lei nº 581, de 4 de setembro de 1850. Estabelece medidas
para a repressão do tráfico de africanos neste império. In: Coleção das Leis do Império do Brazil. Disponível em:
<https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao/doimperio>. Acesso em: 24 mar. de 2018.
316
CRUZ, Ronaldo Lima. No lado de cá: o tráfico clandestino de africanos na vila de São Jorge dos Ilhéus, 1851.
Crítica & Debates, Caetité, UNEB, v.1, n.1, p. 1-18, jul./dez., 2010.
154

Tabela 4.10 – Distribuição dos escravos por décadas, segundo origem e sexo.
Ilhéus, 1850-1888
Total de
Décadas 1850-1859 1860-1869 1870-1879 1880-1888
escravos
Origem e Sexo Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %
Crioulos 23 29,1 69 36,1 109 34,5 69 29,4 270 32,9
Crioulas 26 32,9 69 36,1 121 38,3 86 36,6 302 36,7
Subtotal 49 62,0 138 72,2 230 72,8 155 66,0 572 69,6

Africanos 15 19,0 14 7,3 22 7,0 7 3,0 58 7,1


Africanas 6 7,6 14 7,3 14 4,4 10 4,2 44 5,3
Subtotal 21 26,6 28 14,6 36 11,4 17 7,2 102 12,4

Sem inform. 9 11,4 25 13,2 50 15,8 63 26,8 147 18,0


Total * 79 100,0 191 100,0 316 100,0 235 100,0 821 100,0
Fonte: APEB, SJ, 121 inventários. Ilhéus, 1850-1888.
(*) Excluímos 8 casos sem informação de sexo.

A Tabela 4.10 mostra que o número de crioulos predominou sobre o de africanos em


todas as décadas, sendo que no computo do total de escravos eles perfizeram 69,6% dos
cativos e os africanos 12,4%. Ademais, é possível constatar que ao longo do período o
percentual de africanos declinou, saltando de 26,6% na década de 1850 para 7,2% no período
1880-1888.
Não obstante, devemos considerar que o percentual relativo de casos sem informação
da origem aumentou de forma vertiginosa, 11,4% na década de 1850 para 26,8% nos últimos
anos (1880-1888). A historiografia já ressaltou que desde 1831 os escravistas evitaram, até
quando puderam, revelar a origem de seus escravos, visto que os africanos desembarcados no
Brasil a partir desta data eram considerados pela lei como de condição “livres”317. Isso
também pode ter acontecido em Ilhéus, visto que o aumento dos casos sem informação sobre
a origem é surpreendente, o que não deve ser mera coincidência.
A procedência dos africanos, por exemplo, aparece poucas vezes nos inventários,
encontramos apenas dez casos: cinco nagôs e os outros gege, congo, cassange, fula e Angola.

317
Sobre o assunto ver, entre outros, MAMIGONIAN, Beatriz Galloti. Revisitando a “transição para o trabalho
livre” a experiência dos africanos livres. In: FLORENTINO, Manolo (Org.). Tráfico, cativeiro e liberdade (Rio
de Janeiro, séculos XVII-XIX). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005; BERTIN, Enidelce. Os meia-cara:
africanos livres em São Paulo no século XIX. Tese (Doutorado em História) – FFLCH-USP, São Paulo, 2006.
155

Não sabemos se eles foram comprados antes ou depois de 1850. Avaliar a origem por faixas
etárias pode revelar algumas pistas sobre o assunto. Antes de aprofundar a questão vamos
explicar a metodologia que adotamos na definição das idades dos escravos.
Incluímos no grupo das crianças os cativos com até 10 anos de idade e os casos
descritos como “cria”, “crioulinho”, “mulatinho”, “cabrinha” e “pardinho”. No grupo dos
jovens incluímos escravos entre 11 e 16 anos, bem como os casos declarados como “moço”,
ou “ainda moço”. No grupo dos adultos novos incluímos cativos com idades entre 17 e 30
anos; os considerados adultos maduros com idades entre 31 e 55 anos e no grupo dos idosos
incluímos aqueles com idade a partir de 56 anos, bem como os casos descritos como “velhos”,
“idosos”, “bastante velho”. Os cativos sem menção da idade foram agrupados na categoria
“sem informação”.

Tabela 4.11 - Distribuição da população escrava


por faixas etárias. Ilhéus, 1850-1888
TOTAL DE ESCRAVOS
CLASSIFICAÇÃO FAIXAS ETÁRIAS
Nº %
Crianças até 10 anos 194 23,4
Jovens 11 até 16 anos 85 10,3
Adultos Novos 17 até 30 anos 179 21,6
Adultos Maduros 31 até 55 anos 160 19,3
Idosos 56 ou + anos 58 7,0
Sem informação 153 18,4
TOTAL 829 100,0
Fonte: APEB, SJ. 121 processos de inventários. Ilhéus, 1850-1888

Os dados da Tabela 4.11 revelam a presença significativa de crianças na população


escrava, 23,4% deles tinha entre 0 e 10 anos de idade. Do ponto de vista senhorial o elevando
percentual de crianças significava a possibilidade de prolongar o cativeiro, para os
156

escravizados significava a chance de formar família, contudo, não pretendemos investigar


esse assunto no momento, nosso foco é analisar a origem dos cativos318.

Tabela 4.12 – Distribuição da população escrava por origem


e faixas etárias. Ilhéus, 1850-1888
Sem Total de
Origem Crioulos Africanos
Informação escravos
Faixas Etárias Nº % Nº % Nº % Nº %
Crianças (0-10) 171 29,8 0 0,0 23 15,0 194 23,4
Jovens (11-16) 78 13,6 2 2,0 5 3,3 85 10,2
Adultos N. (17-30) 143 25,0 13 12,7 23 15,0 179 21,6
Adultos M. (31-55) 109 19,0 35 34,3 16 10,4 160 19,3
Idosos (56 ou +) 21 3,6 32 31,4 5 3,3 58 7,0
Sem Informação 52 9,0 20 19,6 81 53,0 153 18,5
TOTAL 574 100,0 102 100,0 153 100,0 829 100,0
Fonte: APEB, SJ, 121 processos de inventários. Ilhéus, 1850-1888

Os dados da Tabela 4.12 demonstram que havia diferenças significativas quanto à


origem e faixas etárias da população escrava de Ilhéus. A maioria dos crioulos era formada
por pessoas com até 30 anos de idade, enquanto entre os africanos predominou adultos
maduros (34,3%) e idosos (31,4%). Esse quadro sugere que houve incentivo à reprodução
natural entre os crioulos e também houve compra de africanos, talvez antes de 1850, dada a
quantidade de idosos entre eles.
Avaliar essa hipótese por meio dos inventários post mortem é uma tarefa muito
arriscada, pois não sabemos como os escravistas de Ilhéus adquiriram esses escravos. O
máximo que podemos fazer é levantar hipóteses sobre a questão. Um dos caminhos que
permitem se aproximar do assunto é distribuir a origem desses escravos nas diferentes
categorias ocupacionais dos inventariados.

318
Sobre a família escrava no Brasil ver, entre outros, MOTA, José Flávio. Corpos escravos, vontades livres:
posse de cativos e família escrava em Bananal (1801-1829). São Paulo: FAPESP: Annablume, 1999; SLENES,
Robert W. Na senzala uma flor: esperanças e recordações na formação da família escrava – Brasil, Sudeste,
século XIX. Campinas: Editora da UNICAMP, 2004; FLORENTINO, Manolo; GÓES, José Roberto. A paz das
senzalas: famílias escravas e tráfico atlântico, Rio de Janeiro, c. 1790- c. 1850. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1997. Sobre família escrava em Ilhéus ver SANTOS, Victor Gonçalves dos. Escravos e senhores nas
terras do cacau: alforrias e família escrava (São Jorge dos Ilhéos, 1806-1888). Dissertação (Mestrado em
História). FFCH-UFBA, 2014.
157

Tabela 4.13 – Distribuição da população escrava por origem e


ocupação principal dos escravistas. Ilhéus, 1850-1888
Origem dos escravos Crioulos Africanos Sem Inf. Total de escravos
OCUPAÇÃO PRINCIPAL Nº % Nº % Nº % Nº %
Produtores de cacau 196 34,1 31 30,4 27 17,6 254 30,6
Negociantes 77 13,4 17 16,7 28 18,3 122 14,7
Donos de Engenho 199 34,7 44 43,1 61 40,0 304 36,7
Produtores de farinha 38 6,6 3 2,9 11 7,2 52 6,3
Produtores de coco 5 0,9 2 2,0 0 0,0 7 0,8
Produtores de café 4 0,7 0 0,0 0 0,0 4 0,5
Outros * 6 1,0 2 2,0 4 2,6 12 1,4
Não identificada 49 8,6 3 2,9 22 14,3 74 9,0
TOTAL 574 100,0 102 100,0 153 100,0 829 100,0
Fonte: APEB, SJ, 121 inventários. Ilhéus, 1850-1888
(*) Prof. liberais; func. eclesiástico; peq. criadores; madeireiros etc.

Os dados da Tabela 4.13 comprovam que a posse de africanos estava distribuída em


todas ocupações principais dos inventariados. No entanto, os donos de engenho concentraram
a maior proporção deles em suas escravarias (43,1%). Os produtores de cacau aparecem em
segundo lugar neste quesito, acumulando 30,4% dos africanos.
Considerando que os investimentos em escravos dependiam, sobretudo, da
rentabilidade das atividades econômicas e da necessidade de mão de obra que cada uma
exigia, podemos inferir que os donos de engenho foram os que mais recorreram ao mercado
de escravos. A média de africanos por produtor de cacau era de 1,6 escravo, entre os donos de
engenho chegou a 4,4. A produção de açúcar dependia de muito mais trabalhadores que a
lavoura cacaueira.
Entre os 54 escravos do Engenho Castelo Novo pelo menos 14 (26%) eram africanos,
com idades entre 18 e 74 anos, isso em 1861, quando foi aberto o inventário da família319.
Entre os 23 cativos que aparecem na matrícula de escravos do Engenho União e da Fazenda
Caldeiras nove (39%) eram africanos, com idades entre 46 e 70 anos. Amancio e Adolpho,

319
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Maria José Leola Del Rey e Carolina Leola Del Rey. Est. 02, Cx.
786, Maço 1253, Doc. 06, 28 de fev. 1861.
158

natural da África, foram descritos como fugidos, além de Frederico, natural de Ilhéus, filho de
Rachel, também descrito como fugido320.
Ademais, encontramos nos inventários de Ilhéus escravos provenientes de outras
regiões da Bahia, que podem ter sido adquiridos via tráfico interno.
Em 1872 foi aberto o inventário de Manoel Cardoso da Silva, dono da Fazenda Retiro,
sendo que na matrícula dos escravos consta Delmira, com 27 anos, natural de Santo Amaro321.
Antônio, cabra de 45 anos, era natural da vila de Nazareth, e trabalhava como escravo na
Fazenda Tabocas em 1873, propriedade de Manoel Francisco Dunda, com 6.020 cacaueiros
cultivados322. Maximiano era um escravo natural da vila de Maraú e trabalhava como padeiro
na casa de negócio de Adão Schaum em 1877323. O crioulo Mamedis era natural do Pilão
Arcado e em 1885 trabalhava como escravo na fazenda de cacau de João Francisco da Mata,
localizada na Cachoeira de Itabuna324. Entre os escravos do Engenho São João do Pasto,
constam a preta Domingas, natural de São Francisco, a parda Cecilia, natural da Bahia e o
preto Francisco, de 40 anos, natural da vila de Nazareth325.
Esses exemplos apenas ilustram as diversas origens dos escravos que trabalhavam em
Ilhéus na segunda metade do século XIX, uma pesquisa aprofundada nos registros de compra
e venda pode revelar outros aspectos dessa realidade, que não conseguimos captar com o uso
dos inventários.

320
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Alferes José Antônio de Guimarães Bastos. Est. 02 Cx. 738,
Maço 1203, Doc. 12, 10 de fev. 1875.
321
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Manoel Cardoso da Silva. Est. 02, Cx. 737, Maço 1205, Doc. 04,
19 de nov. 1872.
322
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Manoel Francisco Dunda. Est. 02, Cx. 737, Maço 1202, Doc. 18,
18 de fev. 1873.
323
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Adão Schaum. Est. 02, Cx. 781, Maço 1248, Doc. 02, 05 de nov.
1877.
324
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. João Francisco da Mata. Est. 02, Cx. 762, Maço 1228, Doc. 01,
11 de dez. 1885.
325
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Firmino Pires Caldas. Est. 03 Cx. 1372, Maço 1841, Doc. 14, 10
de mar. 1888.
159

4.3 - Os preços dos escravos

Os preços dos escravos possuem relação direta com outras variáveis demográficas,
especialmente idade e sexo, além das condições de saúde e especialização. Outrossim, as
pressões contra o tráfico, as conjunturas econômicas e as leis antiescravistas também
interferiam no mercado de escravos326. Vamos analisar os preços dos cativos de Ilhéus
tentando considerar a influência desses fatores, dentro dos limites e potencialidades de nossas
fontes.
Nos inventários post mortem de Ilhéus os escravos foram descritos por diversos
avaliadores, cada um com estilo próprio de descrição, o que impõe sérios limites à pesquisa.
Entre as especializações, por exemplo, muitas vezes aparece a descrição “do serviço de
lavoura”, que é uma categoria ampla, incluindo várias atividades, que dependendo do caso
influenciava no preço. Quanto às condições de saúde alguns escravos foram declarados como
“doentes”, porém, nem sempre consta o tipo de doença. Ademais, nem todos eram
efetivamente avaliados: alguns doentes foram declarados como “sem valor algum” o que
também ocorreu entre os idosos; certos escravos pertenciam a vários donos e o valor
declarado corresponde apenas a parte do inventariado; alguns filhos de escravas foram
avaliados junto com a mãe e os ingênuos, nascidos após a Lei do Ventre Livre, deixaram de
ser avaliados.
Essa complexidade da documentação exige cuidados minuciosos na hora de calcular e
apresentar os dados relativos aos preços dos escravos. Para efeito de cálculo consideramos as
variáveis idades e sexo. Inicialmente apresentamos os preços (mínimo, médio e máximo) por
faixas etárias, englobando todos cativos. Num segundo momento fornecemos os preços
médios por sexos e faixas etárias, excluindo dos cálculos os doentes e, posteriormente, os
ingênuos. Outrossim, optamos por segmentar o estudo em décadas pois ao longo do século

326
Sobre o assunto ver, entre muitos, ANDRADE, Maria José de Souza. A mão de obra escrava em Salvador,
1811-1860. São Paulo: Corrupio, 1988; BARICKMAN, Bert J. Um contraponto baiano: açúcar, fumo, mandioca
e escravidão no Recôncavo, 1780-1860. Tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 2003; NOGUERÓL, Luiz Paulo Ferreira. Mercado Regional de escravos: padrões de preços em Porto
Alegre e Sabará, no século XIX – elementos da nossa formação econômica e social. Ensaios FEE, Porto Alegre,
v. 23, número especial, p. 539-564, 2002; VERSIANI, F. R.; VERGOLINO, J. R. O. “Preços de escravos em
Pernambuco no século XIX”. Texto para Discussão nº 252. Brasília, DF: Universidade de Brasília, outubro de
2002. Disponível em: <www.unb.br/face/eco/cpe/TD/252Oct02FVersiani.pdf.> Acesso em: 16 de fev. 2019.
160

XIX ocorreram mudanças na legislação que influenciaram no mercado de escravos. A


proibição do tráfico atlântico de africanos (1850), por exemplo, foi um dos acontecimentos
que causou impacto nos preços dos cativos. Vejamos a situação dos preços dos escravos de
Ilhéus nessa época.

Tabela 4.14 – Preços dos escravos por faixas etárias. Ilhéus, 1850-1859
Faixas Etárias Escravos Preços (em réis) Soma dos Preços
Grupos Nº % Mínimo Médio Máximo (em réis) %
Crianças (0-10) 22 26,8 40,000 182,482 504,620 4.114,620 11,8
Jovens (11-16) 9 11,0 400,000 872,222 1.100,000 7.850,000 22,5
Adultos N. (17-30) 17 20,7 300,000 555,294 1.000,000 9.440,000 27,0
Adultos M. (31-55) 12 14,7 100,000 425,167 1.200,000 5.102,000 14,7
Idosos (56 ou +) 6 7,3 30,000 293,333 900,000 1.760,000 5,0
Sem Informação 16 19,5 100,000 413,906 800,000 6.622,490 19,0
TOTAL 82 100,0 30,000 425,477 1.200,000 34.889,110 100,0
Fonte: APEB, SJ. 13 inventários. Ilhéus, 1850-1888.
OBS: Excluímos um escravo (criança) sem preço, avaliado junto com a mãe.

A Tabela 4.14 apresenta a proporção de escravos por faixas etárias com os respectivos
preços mínimo, médio e máximo de cada grupo. Na década de 1850 os escravos classificados
como jovens, entre 11 e 16 anos, alcançaram os maiores preços médios (Rs. 872$222) e o
valor máximo de um escravo chegou a Rs. 1.200$000, que foi o crioulo Pedro, marinheiro,
com 35 anos de idade em 1856, quando foi avaliado no inventário de Joaquim José da Costa
Seabra, negociante de Ilhéus.327 O menor valor foi atribuído ao africano Antônio, escravo de
60 anos, doente, que trabalhava no Engenho União em 1851, quando foi avaliado em Rs.
30$000.328
As crianças escravas, em geral custavam menos que os adultos, mas aparecem em
quantidade expressiva na década de 1850, representando 26,8% de todos escravos.
Computando-se os percentuais delas com o dos jovens concluímos que nesta década ao menos
um terço dos escravos inventariados tinham até 16 anos de idade.

327
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Joaquim José da Costa Seabra. Est. 08, Cx. 3424, Maço n/c,
Doc. 06, 17 de set. 1856.
328
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Narcisa da Rosa Dorea. Est. 02, Cx. 783, Maço 1250, Doc. 15,
23 de ago. 1851.
161

O filho da escrava Clara, de nome Moysés, com menos de um ano de idade, foi o que
teve o preço mais baixo. Ele foi doado em 1851 e seu preço (Rs. 40$000) descontado nas
terças do inventário329.
Miguel, cabrinha, pertencente à Joaquim José da Costa Seabra alcançou a mais alta
avaliação, ele foi vendido no Rio Janeiro pela quantia de Rs. 504$620, conforme declaração
do inventariante330.
Ao que parece na década de 1850 os preços dos cativos de Ilhéus estavam dentro da
média de preços dos escravos inventariado em outras partes do Brasil. No geral os jovens e
adultos eram os mais valorizados. Agora vamos conferir a proporção dos sexos entre os
cativos para saber as diferenças de preços. Optamos por excluir os doentes dos cálculos, a fim
de obter resultados mais apurados dos preços.

Tabela 4.15 – Preços médios dos escravos por faixas etárias e sexos.
Ilhéus, 1850-1859
Sexos Masculino Preços Feminino Preços Total
Faixas Etárias Nº % Médios Nº % Médios Nº %
Crianças (0-10) 13 59,0 197,278 9 41,0 172,222 22 100,0
Jovens (11-16) 5 55,5 830,000 4 44,5 925,000 9 100,0
Adultos N. (17-30) 9 53,0 612,222 8 47,0 491,250 17 100,0
Adultos M. (31-55) 3 33,3 666,667 6 66,7 375,167 9 100,0
Idosos (56 ou +) 2 66,7 40,000 1 33,3 900,000 3 100,0
Sem Informação 5 50,0 396,600 5 50,0 635,100 10 100,0
TOTAL 37 53,0 427,434 33 47,0 460,014 70 100,0
Fonte: APEB, SJ. 13 inventários. Ilhéus, 1850-1888.
OBS: Excluímos 12 escravos: 8 doentes e 4 sem informação de sexo

Na década de 1850 a população escrava mostrou-se bem equilibrada com relação aos
sexos: 53% masculino e 47% feminino, sendo que os preços médios dos cativos superaram os
das escravas na maioria das faixas etárias, porém, no computo geral elas alcançaram níveis de
preços médios mais elevados que os deles, Rs. 460$014 contra Rs. 427$434.

329
Ibidem.
330
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Joaquim José da Costa Seabra. Est. 08, Cx. 3424, Maço n/c,
Doc. 06, 17 de set. 1856.
162

Observando a Tabela 4.15 percebemos que os preços médios das escravas não estavam
muito reduzidos se comparados aos dos escravos. Entre os jovens elas alcançaram preço
médio mais elevado que o deles. A escrava Helena, com 13 anos de idade, foi a de maior
valor, Rs. 1.100$000. Ela pertencia a Joaquim José da Costa Seabra, mas foi doada para
Manoel José Spinola Bithencourt, conforme declaração do inventariante331.
Nesse contexto econômico algumas famílias de Ilhéus podem ter sido motivadas a
comprar escravos, principalmente mulheres, devido a possibilidade que elas tinham de gerar
novos rebentos, fato que ganhou maior importância após a proibição do tráfico atlântico de
africanos (1850). Talvez, essa tenha sido a principal estratégia dos escravistas da localidade,
uma vez que elas podiam trabalhar em vários serviços, tanto no eito quanto nos espaços
urbanos e nos serviços domésticos.
Para os donos de engenho adquirir escravos era essencial para manter a capacidade de
produção de açúcar nos níveis desejados, sendo que o maior percentual de africanos estava
entre eles. Bert J. Barickman ao analisar os custos de produção do açúcar e a relação com o
preço dos escravos no recôncavo entre 1780 e 1860 destacou que “A duplicação e talvez
triplicação da produção de açúcar por escravo entre a década de 1780 e meados do século
XIX teria compensado em grande parte a elevação do preço do escravo”332.
Ao que parece investir em escravos e na produção de açúcar se tornou um bom
negócio viável em Ilhéus durante o século XIX, dada a disponibilidade de terras virgens e
abundância de madeiras, elementos essenciais na atividade. Nesse processo eles também
fizeram investimentos em cacau, café, produção de farinha e cachaça, mas para os donos de
engenho o açúcar permaneceu como principal produto até a década de 1880, quando o cacau
começou a adquirir maior importância econômica.
Podemos continuar testando essa hipótese analisando os períodos subsequentes. Na
década de 1860 os preços dos escravos se elevaram de modo acentuado no Brasil e muitos
escravistas de Ilhéus optaram por manter a posse de seus escravos ao invés de vende-los,
indicando que, talvez, naquela conjuntura essa manutenção fosse favorável economicamente.

331
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Joaquim José da Costa Seabra. Est. 08, Cx. 3424, Maço n/c,
Doc. 06, 17 de set. 1856.
332
BARICKMAN, Bert J. Op. cit. p. 235.
163

Tabela 4.16 – Preços dos escravos por faixas etárias. Ilhéus, 1860-1869
Faixas Etárias Escravos Preços (em réis) Soma dos Preços
Grupos Nº % Mínimo Médio Máximo (em réis) %
Crianças (0-10) 54 28,7 20,000 403,333 1.000,000 21.780,000 15,6
Jovens (11-16) 17 9,0 300,000 952,941 1.500,000 16.200,000 11,6
Adultos N. (17-30) 44 23,4 500,000 1.130,682 1.500,000 49.750,000 35,7
Adultos M. (31-55) 30 15,9 400,000 935,000 1.500,000 28.050,000 20,0
Idosos (56 ou +) 15 8,0 50,000 318,000 1.000,000 4.770,000 3,4
Sem Informação 28 15,0 80,000 679,643 1.200,000 19.030,000 13,7
TOTAL 188 100,0 20,000 742,447 1.500,000 139.580,000 100,0
Fonte: APEB, SJ. 30 inventários. Ilhéus, 1860-1869.
OBS: Excluímos 3 escravos sem preços.

Observando a Tabela 4.16 percebemos que na década de 1860 todos preços máximos
se encontravam na casa dos Rs.1.000$000 e o maior preço médio chegou a Rs. 1.130$682.
Assim, notamos que os preços sofreram elevação com relação ao decênio anterior. Na
década de 1850 em média um escravo chegou a custar no máximo de Rs. 872$222 e o valor
máximo de um cativo chegou Rs. 1.200$000. Na década de 1860 essas cifras foram de Rs.
1.130$682 e Rs. 1.500$000, respectivamente.
Outros estudiosos do assunto também constataram semelhante elevação nos preços
médios dos escravos nesse período. Para Salvador, por exemplo, utilizando inventários post
mortem a historiadora Maria Jose de Souza Andrade destacou que “Quanto à elevação dos
preços médios de escravos, observamos que, considerando-se os períodos de 1831 a 1860 e de
1861 a 1888, o preço médio dos escravos homens cresce 24% e o das mulheres, 20%”333 Bert
J. Barickman destacou que “Um escravo de enxada e foice que podia ser comprado por menos
de Rs. 480$000 no início da década de 1850 era vendido por Rs. 1:075$000 em 1858.”334
Se os preços dos escravos aumentaram e ainda assim os escravistas de Ilhéus optaram
por manter a posse de cativos, sobretudo jovens e adultos, significa que para alguns

333
ANDRADE, Maria José de Souza. A mão de obra escrava em Salvador, 1811-1888. São Paulo: Corrupio,
1988. p. 170
334
BARICKMAN, op. cit. p. 231.
164

compensava mantê-los, do contrário teriam vendido para o Centro-Sul do Império, onde a


demanda por escravos era grande, sobretudo em função da expansão cafeeira.335
Nossa premissa é que a exploração do trabalho escravo nos engenhos, nas lavouras de
cacau, café e em outras atividades proporcionavam lucros suficientes que justificavam a
manutenção da posse de cativos em Ilhéus naquela conjuntura. Vamos avançar nas análises
para averiguarmos a situação de acordo com a divisão por sexos.

Tabela 4.17 – Preços médios dos escravos por faixas etárias e sexos.
Ilhéus, 1860-1869
Sexo Masculino Preços Feminino Preços Total
Faixas Etárias Nº % Médios Nº % Médios Nº %
Crianças (0-10) 31 58,5 379,355 22 41,5 441,818 53 100,0
Jovens (11-16) 9 56,3 866,667 7 43,7 1.157,143 16 100,0
Adultos N. (17-30) 19 45,2 1.118,421 23 54,8 1.172,154 42 100,0
Adultos M. (31-55) 15 57,7 1.063,333 11 42,3 890,909 26 100,0
Idosos (56 ou +) 5 38,4 660,000 8 61,6 152,500 13 100,0
Sem Informação 7 30,4 921,429 16 69,6 601,875 23 100,0
TOTAL 86 49,7 780,930 87 50,3 746,782 173 100,0
Fonte: APEB, SJ. 30 inventários. Ilhéus, 1860-1869.
OBS: Excluímos 15 escravos: 12 doentes e 3 sem preços.

Os dados da Tabela 4.17 mostram que em Ilhéus, na década de 1860, os escravos


adultos foram aqueles que alcançaram maiores preços médios, seguindo a tendência geral do
mercado, de valorizar os que estavam em melhor idade produtiva. Contudo, em relação aos
sexos os preços médios delas foram ligeiramente superiores ao deles nas três primeiras faixas
etárias, indicando que, talvez, naquele contexto as mulheres alcançaram importância singular.
Todavia, após a Lei 2.040 de 28 de setembro de 1871 (Ventre Livre), os filhos das
escravas foram considerados ingênuos e deixaram de ser avaliados. Isso pode ter provocado
diminuição nos preços delas. Para analisarmos essa questão foi preciso excluir os ingênuos
dos cálculos.

335
Sobre o assunto ver, entre muitos, MUAZE, Mariana; SALLES, Ricardo (Org.). O Vale do Paraíba e o
Império do Brasil nos quadros da Segunda Escravidão. 1ª Ed. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2015. MORENO, Breno
Aparecido Servidone. Demografia e trabalho escravo nas propriedades rurais cafeeiras de Bananal, 1830-1860.
Dissertação (Mestrado em História). FFLCH-USP, 2013.
165

Tabela 4.18 – Preços dos escravos por faixas etárias. Ilhéus, 1870-1879
Faixas Etárias Escravos Preços (em réis) Soma dos Preços
Grupos Nº % Mínimo Médio Máximo (em réis) %
Crianças (0-10) 38 13,4 100,000 356,579 700,000 13.550,000 7,7
Jovens (11-16) 38 13,4 100,000 734,211 1.200,000 27.900,000 16,0
Adultos N. (17-30) 65 23,0 150,000 801,231 1.300,000 52.080,000 29,7
Adultos M. (31-55) 65 23,0 50,000 545,846 1.000,000 35.480,000 20,3
Idosos (56 ou +) 21 7,4 50,000 328,571 900,000 6.900,000 3,9
Sem Informação 56 19,8 300,000 702,303 1.300,000 39.328,980 22,4
TOTAL 283 100,0 50,000 619,219 1.300,000 175.238,980 100,0
Fonte: APEB, SJ. 36 inventários. Ilhéus, 1850-1888.
OBS: Excluímos 36 escravos: 29 ingênuos e 7 sem preços.

Os dados da Tabela 4.18 mostram que no computo de todos os escravos o preço médio
chegou a Rs. 619$219. Desse modo, se comparado ao decênio anterior notamos que houve
declínio, visto que na década de 1860 o referido preço médio alcançou a quantia de
Rs.742$447 (Tabela 4.17).
No entanto, essa redução não parece ser típica de Ilhéus quiçá de todo Brasil, visto que
as mudanças na legislação interferiram no mercado de escravos, não só em relação aos filhos
das escravas nascidos a partir da Lei do Ventre Livre, que deixaram de ser avaliados, como
também em relação aos tributos que passaram a incidir sobre a compra e venda de cativos, o
que interferiu nos preços336. Vejamos as diferenças em relação aos sexos.

336
Sobre as tarifas do tráfico de escravos ver, entre outros, MOTA, José Flávio. A Lei, Ora a Lei! driblando a
legislação no tráfico interno de escravos no Brasil (1861-1887). História e Economia – revista interdisciplinar.
BBS Business School, São Paulo, v. 10, n.1, p. 15-28, 2012; PIRES, Maria de Fátima Novaes. Fios da Vida:
tráfico interprovincial e alforrias nos sertoins de Sima-BA (1860-1920). São Paulo: Annablume, 2009. p. 58-60.
166

Tabela 4.19 – Preços médios dos escravos por faixas etárias e sexos.
Ilhéus, 1870-1879
Sexo Masculino Preços Feminino Preços Total
Faixas Etárias Nº % Médios Nº % Médios Nº %
Crianças (0-10) 22 58,0 356,818 16 42,0 356,250 38 100,0
Jovens (11-16) 16 42,0 887,500 22 58,0 622,727 38 100,0
Adultos N. (17-30) 24 40,0 1.031,250 36 60,0 680,000 60 100,0
Adultos M. (31-55) 26 51,0 728,846 25 49,0 540,000 51 100,0
Idosos (56 ou +) 5 50,0 525,000 5 50,0 300,000 10 100,0
Sem Informação 34 65,4 783,205 18 34,6 633,333 52 100,0
TOTAL 127 51,0 742,023 122 49,0 580,000 249 100,0
Fonte: APEB, SJ. 36 inventários. Ilhéus, 1850-1888.
OBS: Excluímos 70 escravos: 35 doentes, 26 ingênuos e 9 sem preços.

Os dados da Tabela 4.19 revelam que na década de 1870 os preços médios das
escravas estavam abaixo dos preços dos cativos em todas as faixas etárias. No computo geral
eles alcançaram Rs. 742$023 e elas Rs. 580$000, demonstrando que a lei do Ventre Livre
impactou no preço das escravas de Ilhéus, assim como no Brasil de maneira geral.
Entre 1880 e 1888 os preços dos escravos de Ilhéus continuam declinando, mas ainda
era possível encontrar escravos custando Rs. 1.500$000 nos inventários post mortem.

Tabela 4.20 – Preços dos escravos por faixas etárias. Ilhéus, 1880-1888
Faixas Etárias Escravos Preços (em réis) Soma dos Preços
Grupos Nº % Mínimo Médio Máximo (em réis) %
Crianças (0-10) 3 1,7 400,000 633,333 1.000,000 1.900,000 1,8
Jovens (11-16) 20 11,0 300,000 700,500 1.200,000 14.010,000 13,4
Adultos N. (17-30) 51 28,2 50,000 743,157 1.200,000 37.901,000 36,3
Adultos M. (31-55) 51 28,2 50,000 503,908 1.000,000 25.699,320 24,7
Idosos (56 ou +) 13 7,2 100,000 311,538 500,000 4.050,000 3,8
Sem Informação 43 23,7 30,000 483,256 1.500,000 20.780,000 20,0
TOTAL 181 100,0 50,000 576,466 1.500,000 104.340,320 100,0
Fonte: APEB, SJ. 40 inventários. Ilhéus, 1850-1888.
OBS: Excluímos 55 escravos: 52 ingênuos e 3 sem preços.

Na década de 1880 os preços médios dos escravos de Ilhéus permaneceram baixos,


porém notamos que ainda era possível encontrar vários cativos com valores acima de Rs.
167

1.000$000. Ademais, nesta década encontramos muitas famílias com riquezas apoiadas na
exploração do trabalho escravo, indicando que naquele contexto ainda era viável, do ponto de
vista econômico, manter tais investimentos. Ao que parece o retorno financeiro compensava
os riscos da abolição. Destarte, o preço do cacau aumentou em relação ao decênio anterior. Se
em 1873 uma arroba foi avaliada no inventário post mortem pelo valor de Rs. 3$500337, dez
anos depois esse preço dobrou, chegando a custar Rs. 7$000 no inventário do Tenente
Coronel Domingos Lopes da Silva, aberto em 1883338.
Essa tendência pode ter influenciado os escravistas de Ilhéus na decisão de manter a
posse de seus cativos até a véspera da abolição (1888). Vários negociantes, a maioria
composta por escravistas, estavam envolvidos nos negócios do cacau.
Em janeiro de 1884, por exemplo, o negociante José Carlos Adami exportou 850
arrobas. Se tomarmos como referência o valor de Rs. 7$000 por cada arrobas calculamos que
ele podia obter até Rs. 5.950$000 com estas exportações. Talvez isso justifique a decisão de
manter a posse de cativos.
Em 1887 o alferes Acrísio Januário Cardoso, negociante estabelecido na Cachoeira de
Itabuna, era dono de sete escravos e uma plantação com 4.155 cacaueiros. Sua riqueza bruta
foi calculada no valor de Rs. 46.864$778, sendo que os escravos concentravam 11,5% desta
fortuna: o preto Antônio, de 30 anos, foi avaliado em Rs. 800$000; a escrava Julia, de cor
preta, com 25 anos, em Rs. 675$000; o jovem Antônio, 16 anos, em Rs. 900$000; a escrava
Domingas, 21 anos, em Rs. 675$000; a preta Vitória, 27 anos, em Rs. 675$000; o escravo
Luiz, de 23 anos, foi avaliado em Rs. 900$000 e o escravo Jacinto, de 30 anos, foi avaliado
em Rs. 800$000.339
Em 1886 o alferes João Carlos Hohlenweger, proprietário da Fazenda Óculos, no
Almada, possuía dois escravos e uma plantação de 8.561 cacaueiros, entre outros bens. Sua
fortuna foi calculada no valor de Rs. 11.622$944, a maior parte alocada em cacau (53%),

337
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Ignez Maria do Espírito Santo. Est. 02 Cx. 737, Maço 1202 Doc.
13, 27 de fev. 1873.
338
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Tenente Coronel Domingos Lopes da Silva. Est. 02 Cx. 759,
Maço 1225, Doc. 03, 10 de out. 1883.
339
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Alferes Acrísio Januário Cardoso. Est. 03 Cx. 1298, Maço 1767,
Doc. 08, 21 de abr. 1887.
168

escravos (8,6%) e terras (10%). A escrava Romana, crioula de 34 anos, foi avaliada em Rs.
500$000; a escrava Paula, crioula de 32 anos, também foi avaliada em Rs. 500$000340.
Outras pessoas, principalmente negociantes, continuaram exportando cacau nesse
período. As evidências indicam que o crescimento da economia cacaueira, aliado à elevação
dos preços do cacau na década de 1880, influenciou na decisão dos escravistas de manter a
exploração do trabalho escravo, mesmo com o risco da abolição.
A exploração dos cativos não se restringiu ao trabalho na lavoura, eles
desempenharam diversas funções na sociedade. Os serviços domésticos das escravas, por
exemplo, deviam ser imprescindíveis para as famílias ricas.
Vejamos as diferenças entre seus preços médios de escravos e escravas na década de
1880.

Tabela 4.21 – Preços médios dos escravos por faixas etárias e sexos.
Ilhéus, 1880-1888
Sexo Masculino Preços Feminino Preços Total
Faixas Etárias Nº % Médios Nº % Médios Nº %
Crianças (0-10) 1 33,4 1.000,000 2 66,6 450,000 3 100,0
Jovens (11-16) 12 63,2 785,417 7 36,8 612,143 19 100,0
Adultos N. (17-30) 20 50,0 880,000 20 50,0 670,000 40 100,0
Adultos M. (31-55) 20 45,5 577,750 24 54,5 514,583 44 100,0
Idosos (56 ou +) 6 66,6 441,667 3 33,4 166,667 9 100,0
Sem Informação 13 31,7 600,000 28 68,3 424,286 41 100,0
TOTAL 72 46,0 694,861 84 54,0 537,247 156 100,0
Fonte: APEB, SJ. 40 inventários. Ilhéus, 1850-1888.
OBS: Excluímos 80 escravos: 52 ingênuos, 25 doentes e 3 sem preços.

Os preços dos escravos do sexo masculino continuaram ligeiramente superiores aos


das escravas, em todas faixas etárias. Os classificados como jovens e adultos novos foram os
que alcançaram preços médios mais elevados, Rs. 785$417 e Rs. 880$000, respectivamente.
Essas diferenças podem estar relacionadas com as diversas habilidades dos cativos de
ambos os sexos. Eles deviam ter mais habilidade que elas no uso do facão, deviam cuidar da

340
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Alferes João Carlos Hohlenwegner. Est. 02, Cx. 762, Maço
1228, Doc. 12, 20 de abr. 1886.
169

poda das árvores, colher e quebrar os frutos para extração das sementes, transportando a
matéria prima para os cochos de fermentação, secagem e posteriormente para o porto de
embarque.
Já as crianças e mulheres escravas deviam atuar com mais frequência no cuidado com
as primeiras mudas de cacau, que demoravam pelo menos três anos para começarem a
frutificar. Ademais, elas eram empregadas com mais frequência que eles nos serviços
domésticos, na raspagem da mandioca, na fabricação de farinha, na colheita do café e quebra
dos grãos, e em outras lavouras de subsistência.

***

Esse capítulo analisou algumas características da escravidão na economia de Ilhéus.


Um dos traços marcantes que constatamos naquela sociedade foi a alta concentração na
estrutura da posse de escravos. Com destaque para os donos de engenhos e os membros da
família Sá Bitencourt Câmara, normalmente detentores de mais de 20 cativos.
Outras pessoas, não diretamente ligados à esta família, também eram donos de
quantidades expressivas de cativos. No computo geral a maior parte delas tinha ligação com
engenho de açúcar e outros estavam investindo em plantações de cacau. Ao que parece a
economia estava atravessando uma fase de transição da produção de açúcar para lavoura
cacaueira, processo que se consolidou no século XX e contou com a participação expressiva
de pequenos produtores que utilizaram o trabalho familiar para desenvolver suas lavouras.
Outros grandes escravistas conseguiram ampliar suas plantações explorando o trabalho
escravos, sendo que alguns donos de engenho começaram a investir no plantio de cacau,
como foi o caso dos proprietários do Engenho Castelo341. Em outros casos percebemos
ramificações entre os donos de engenho e negociantes.
As análises realizadas neste capítulo, bem como os exemplos discutidos, evidenciaram
que na segunda metade do século XIX a escravidão em Ilhéus estava bem desenvolvida, com
concentração de escravos em várias propriedades, como também ocorria em outras áreas da

341
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Maria José Leola Del Rey e Carolina Leola Del Rey. Est. 02, Cx.
786, Maço 1253, Doc. 06, 28 de fev. 1861.
170

província, onde os cativos eram explorados em diversas atividades econômicas. Bert J.


Barickman, por exemplo, ao investigar a distribuição da posse de escravos no Recôncavo
baiano entre 1779 e 1835, destacou:

Em Nazaré, nenhum fogo empregava mais de 34 escravos, e em São


Gonçalo dos Campos só 1,7% de todos os fogos com escravos tinham
plantéis de quarenta ou mais cativos. Mas no Iguape, 11,2% dos plantéis
compreendiam pelo menos quarenta escravos. Onze fogos na freguesia
açucareira possuíam cem ou mais escravos342

Assim como no Recôncavo baiano, em Ilhéus os maiores plantéis de escravos se


concentraram nas mãos dos donos de engenho. O crescimento da economia cacaueira
provocou dinamização de várias atividades econômicas e muitos negociantes, apesar de não
produzirem cacau recebiam as sementes deste fruto e outros gêneros da lavoura como
pagamento pelas compras realizadas em suas casas de negócio, muito deles também eram
escravistas, a maior parte 54,8% detinha entre 1 e 3 cativos. Os produtores de farinha, café e
coco também tinham escravos, mas normalmente suas posses não eram tão elevadas quanto a
dos donos de engenho.
Quando aprofundamos a análise a respeito da composição da população cativa
percebemos traços típicos das zonas de abastecimento. Como ressaltou Stuart Schwartz, entre
outros historiadores, “Em áreas menos fortemente ligadas à economia exportadora ou com
menos acesso ao tráfico atlântico de escravos, poderíamos esperar encontrar razões de
masculinidade menores, menos africanos, mais crioulos e pardos e mais mulheres e crianças
[...]”343.
Essas foram as características que encontramos na população escrava declarada nos
inventários post mortem de Ilhéus. A presença marcante de mulheres e crianças indica que a
família escrava exerceu papel importante no tipo de escravidão que se desenvolveu na

342
BARICMAN, Bet J. Um contraponto baiano: açúcar, fumo, mandioca e escravidão no Recôncavo, 1780-
1860. Tradução de Maria Luiz X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003. p. 239.
343
SCHWARTZ, Stuart B. Segredo internos: engenhos e escravos na sociedade colonial, 1550-1835. Tradução
Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia da Letras, 1998. p. 290. Ver também, entre outros, GUTIÉRREZ,
Horacio. Demografia Escrava numa Economia Não-exportadora: Paraná, 1800-1830. Estudos Econômicos: São
Paulo, 17 (2), p. 297-314, maio/ago. 1987.
171

localidade. Todavia, percebemos indícios de que os escravistas também recorreram ao


mercado interno de escravos, dada a presença de africanos e de cativos natural de outras vilas
da Bahia, como Maraú, Santo Amaro, Nazaré e outras.
A manutenção ou busca por escravo pode estar relacionada com a dinamização da
economia, que fomentou investimento em escravos, elemento importante para obtenção de
lucros e aumento da riqueza no Brasil colonial e Imperial. Os preços dos cativos de Ilhéus
indicam que eles eram bens de valor considerável, nem todos podiam adquirir escravos e
talvez por isso poucas famílias ricas tinham acesso a grandes escravarias. A maioria dos
escravistas detinha entre 1 e 3 escravos.
A rentabilidade da economia cacaueira parece que ganhou maior importância somente
na década de 1880, quando os preços do produto se elevaram. Todavia, as demais atividades
econômicas também geravam rendas suficientes para justificar a manutenção da posse de
cativos. A opção de manter número considerável de escravos mesmo na década de 1880
indica que, talvez, naquela conjuntura, os lucros compensassem os riscos da abolição.
A presença marcante de mulheres e crianças escravas naquele contexto indica que um
dos meios que garantiu a manutenção do escravismo na localidade foi a reprodução natural
dos escravos. Conhecer as características das famílias que se formaram no cativeiro de Ilhéus,
pode ajudar a entender outros aspectos da escravidão na localidade. Nesse sentido, o próximo
capítulo investiga as mulheres e crianças escravizadas.
172

CAPÍTULO V
AS ESCRAVAS E SEUS FILHOS NA ECONOMIA DE ILHÉUS, 1850-1888

5.1 - Introdução

Muitas mulheres negras viveram como escravas em Ilhéus na segunda metade do


século XIX, contribuindo de diversas formas para o desenvolvimento da economia. Uma parte
delas era formada por mães solteiras, outras casadas e viúvas, que trabalharam como escravas
e compartilharam com os filhos a experiência do cativeiro. Nesse capítulo dedicamos atenção
especial ao estudo dessas mulheres. Os objetivos principais são analisar os aspectos
demográficos, como a quantidade de filhos e estado conjugal, bem como os espaços de
trabalho, tentando explicar a importância delas no contexto socioeconômico.
Essas escravas, na maior parte das vezes, encontravam-se nos espaços rurais de Ilhéus,
viviam próximas do litoral e das margens dos rios. Eram as mulheres dos serviços de lavoura,
que trabalhavam nas plantações de cacau, café, mandioca, coco, dendê, trabalhavam nas casas
de farinha, nos engenhos de açúcar e alambiques. Outras se ocupavam do serviço doméstico,
achavam-se no território da vila, trabalhavam nas casas de negócios e circulavam pelos
diferentes espaços, compartilhando a criação dos filhos com suas famílias, com os parceiros
de cativeiro, tendo que trabalhar como escrava, ser mãe e mulher negra numa sociedade
escravista e patriarcal.
A historiografia sobre as mulheres no Brasil alcançou avanços consideráveis nas
últimas décadas e parte dos pesquisadores se dedicou ao estudo das escravas e forras, trazendo
contribuições importantes para o entendimento dos papéis sociais, econômicos e culturais que
elas desempenharam na sociedade escravista brasileira. Muitas obras se tornaram referências
no assunto e gostaríamos de comentar alguns de seus argumentos344.

344
Um painel denso e atualizado, com 20 artigos de especialistas, pode ser visto em: XAVIER, Giovana;
FARIAS, Juliana Barreto e GOMES, Flávio (Org.). Mulheres negras no Brasil escravista e do pós-emancipação.
São Paulo: Selo Negro, 2012. Sobre a história das mulheres no Brasil ver, entre muitos, SAMARA, Eni de
Mesquita; GUTIÉRREZ, Horácio. Mujeres esclavas em el Brasil del Siglo XIX. In: PERROT, Michele; DUBY,
Georges. História de las mujeres em Occidente. Traducción de Marco Aurelio Galmarini. Taurus Ediciones, p.
640-641. Spain, 1993; SAMARA, Eni de Mesquita. As mulheres, o poder e a família. São Paulo, século XIX.
São Paulo: Marco Zero; Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo, 1989; PRIORE, Mary Del. A mulher na
história do Brasil. São Paulo: Contexto, 1988.
173

Cecília Conceição Moreira Soares, por exemplo, pesquisou as mulheres negras em


Salvador no século XIX, e fez um esboço das principais ocupações femininas, entre outras
análises. Destacou que a maioria das escravas de Salvador ocupava-se do serviço doméstico
(27,2%), mas ressaltou que no geral elas estavam envolvidas em diversas atividades como
amas-de-leite, lavadeiras, cozinheiras, ganhadeiras, dentre outras.345 Sandra Lauderdale
Graham, estudando as criadas e seus patrões no Rio de Janeiro, destacou que “uma escrava
podia inclusive viver fora da jurisdição de seu amo, empregar-se como mão de obra e pagar
uma soma fixa a seu proprietário, guardando para si o que sobrasse, a fim de comprar comida
ou pagar um cômodo”346. Maria Odila Leite da Silva Dias, ao destacar as mulheres pobres de
São Paulo no século XIX, percebeu a presença importante destas no pequeno comércio,
disputando pontos estratégicos da cidade, vendendo produtos diversos (quitutes, cará, milho,
garapa, aluá, saúva fêmea, peixes, dentre outros) evidenciando as habilidades delas na luta
pela sobrevivência.347
Esses estudos mostraram a diversidade de ocupações das escravas e libertas, para além
do serviço no eito e o trabalho doméstico. Ademais, revelaram aspectos importantes do
cotidiano, das lutas travadas frente às imposições das autoridades e suas formas de resistência
no Brasil escravista do século XIX348.
Outros estudos se dedicaram à investigação do papel das escravas dentro da família,
discutindo o acesso ao casamento, a escolha dos parceiros e a condição social dos cônjuges,
bem como a quantidade de filhos e o crescimento vegetativo da população349.

345
SOARES, Cecília Conceição Moreira. Mulher Negra na Bahia no século XIX. Dissertação (Mestrado em
História). FFCH/ UFBA. Salvador, 1994. p. 23 (Tabela 1).
346
GRAHAM, Sandra Lauderdale. Proteção e Obediência: criadas e seus patrões no Rio de Janeiro, 1860-1910.
Tradução Viviana Bosi – São Paulo: Companhia das Letras, 1992. p. 19
347
DIAS, Maria Odila Leite da Silva. Quotidiano e poder em São Paulo no século XIX. 2 ed. São Paulo:
Brasiliense, 1995, p. 156.
348
Ver, entre muitos, MOTT, Maria Lúcia de Barros. Submissão e resistência: a mulher na luta conta a
escravidão. São Paulo. Contexto, 1988; DIAS, Maria Odila Leite da Silva. “Nas fímbrias da escravidão urbana:
negras de tabuleiro e de ganho”. Estudos Econômicos, São Paulo: IPE-USP, v. 15, n. esp. p. 167-80, 1985;
FARIA, Sheila de Castro. Mulheres forras: riqueza e estigma social. Tempo, Niterói, v.5, n. 9, p. 65-92, jul.2000.
349
Ver, entre outros, ALVES, Adriana Dantas Reis. As mulheres negras por cima. O caso de Luzia jeje.
Escravidão, família e mobilidade social, Bahia 1780 – 1830. Tese (Doutorado em História) - ICHF/ UFF, Rio de
Janeiro, 2010; REIS, Isabel Cristina Ferreira dos. A família negra no tempo da escravidão, Bahia 1850-1888.
Tese (Doutorado em História) - IFCH-UNICAMP, Campinas, 2007.
174

Analisaremos o estado conjugal e a presença de filhos entre as escravas de Ilhéus para


entender o acesso ao casamento, os tipos de uniões, a maternidade e a importância da
reprodução natural para o crescimento da população cativa. Para tanto recorremos ao Livro de
classificação dos escravos para libertação pelo fundo de emancipação (1874-1886), que
oferece informações sistemáticas a respeito desses aspectos350.
No segundo momento tratamos da participação das escravas na economia, tentando
explicar os seus espaços de trabalho, o envolvimento nas atividades econômicas e o
desempenho de diversas funções ligadas à subsistência, exportações e mercado interno. Neste
caso recorremos aos inventários post-mortem, que se mostraram fontes privilegiadas para as
análises, haja visto a riqueza de informações sobre os bens que compunham o patrimônio dos
escravistas. Como fonte complementar utilizaremos o Recenseamento Geral do Império do
Brasil de 1872351.

5.2 - A população escrava classificada para libertação. Ilhéus, 1874-1886

Em 1873 foi rubricado o Livro destinado à classificação dos escravos que pudessem
ser libertos pelo fundo de emancipação no Município de Ilhéus. Esse livro, fornecido pelo
Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, contém as seguintes informações sobre
os escravos: número da matrícula, nome, cor, idade, estado conjugal, profissão, aptidão para o
trabalho, pessoas de família, moralidade, valor, nome do senhor e observações. Infelizmente,
no caso de Ilhéus, os campos valor e moralidade não foram preenchidos, não sabemos por
quais motivos352.

350
APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos pelo fundo de emancipação. Lv. 7008.
Ilhéus, 1874-1886.
351
Recenseamento Geral do Império do Brazil de 1872. Disponível em: <http://www.biblioteca.ibge.gov.br>.
Acesso em 15 de fev. 2018.
352
O fundo de emancipação de escravos foi um instrumento jurídico criado pela lei n.° 2.040 de 28 de setembro
de 1871 (conhecida como Lei do Ventre Livre ou Lei Rio Branco), que previa a destinação de recursos
pecuniários a cada província do país e ao Município Neutro (o Rio de Janeiro) para a libertação de tantos
escravos quantos possíveis. Decreto n.° 5.135, de 13 de novembro de 1872. “Aprova o regulamento geral para a
execução da lei n.° 2.040 de 28 de setembro de 1871. In: Coleção de Leis do Império do Brasil, 1808-1889.
Disponível em:
<https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao/doimperio>. Acesso em: 24 mar. de 2014.
175

Essa documentação provém do contexto mais amplo de projeto do governo imperial


brasileiro para controlar a emancipação dos escravos, cuja lei 2.040 de 28 de setembro de
1871 (Ventre Livre) é um dos principais referenciais353. Em linhas gerais, o objetivo do
governo era promover a emancipação por meio da indenização aos senhores, respeitando a
propriedade particular e tentando conduzir de forma lenta e gradual, o processo de abolição da
escravidão.
Assim, as Câmaras Municipais atenderam às prerrogativas da lei e montaram as juntas
responsáveis pela classificação dos escravos, composta pelo Presidente da Câmara, o
Promotor Público e o Coletor da Fazenda Pública, além de um escrivão do Juízo de Paz, cuja
função seria registrar as atividades da junta em livros próprios354.
No caso de Ilhéus, a composição da junta variou ao longo dos anos. O nome de
Domingos Adami de Sá é o único que permanece em todas as assinaturas, na condição de
coletor da Fazenda Pública, responsável pela arrecadação dos impostos destinados à
província. Entre os que assinaram como presidente da Câmara Municipal destaca-se Joaquim
Pereira Caldas, mas a composição variou ao longo dos anos.
A folha de abertura do Livro data de 22 de março de 1873, e foi entre esta data e a
primeira assinatura coletiva da junta (1874), que a maioria dos escravos foram classificados.
A partir dali outros foram apresentados, porém em quantidades bem menores, até 12 de
outubro de 1886, última assinatura definitiva da junta355. O Gráfico 5.1 mostra a distribuição
das classificações ao longo do período.

353
BRASIL. Lei nº 2.040, de 28 de setembro de 1871. Art. 1º Os filhos de mulheres escravas que nascerem no
Império desde a data desta lei, serão considerados de condição livre. In: Coleção das Leis do Império do Brazil.
Disponível em: <https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao/doimperio>. Acesso em 24 de mar.
2016.
354
Sobre o assunto ver, entre outros, DAUWE, Fabiano. “A libertação gradual e a saída viável: os múltiplos
sentidos da liberdade pelo fundo de emancipação de escravos. Dissertação (Mestrado em História). ICHF-UFF,
Rio de Janeiro, 2004; SANTANA NETO, José Pereira de. “A Alforria nos termos e limites da lei: o Fundo de
emancipação na Bahia (1871-1888). Dissertação (Mestrado em História). FFCH-UFBA, 2012.
355
Excluímos de nossas análises oito classificações explicitamente declaradas pelos membros da junto como
“sem efeito”.
176

Gráfico 5.1 - Distribuição das classificações dos escravos por anos.


Ilhéus, 1874-1886.
800
700
715
600
500
400
300
200
100 28 20 16 5 5 3 6 4
0

Fonte: APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos
pelo fundo de emancipação. Lv. nº 7008. Ilhéus, 1874-1886.

Ao todo foram classificados 802 escravos, a serem libertos de acordo com as reservas
do fundo, provenientes dos impostos sobre transações envolvendo escravos, loterias, doações
e depósitos realizados pelos próprios cativos. Além destes foram mencionados indiretamente
filhos menores, nascidos antes ou depois da Lei 2.040 de 28 de setembro de 1871356.
Nas observações do primeiro casal de escravos classificado para libertação, por
exemplo, consta a seguinte frase “cônjuges com uma filha livre, tida da lei, e um menor
escravo”357. Essas descrições de “filhos menores livres” e “filhos menores escravos” foram
frequentes, o que permite calcular a quantidade de filho das escravas, todavia não é possível
saber o sexo, a cor e a idade delas, por isso optamos em excluí-las dos cálculos de algumas
tabelas que mostram dados sobre os escravos classificados para libertação.
Antes de analisarmos as mulheres escravas e seus filhos vamos explicar os traços
gerais da população descrita nesta fonte, começando pela distribuição por faixas etárias.

356
BRASIL. Lei nº 2.040, de 28 de setembro de 1871. Art. 1º Os filhos de mulheres escravas que nascerem no
Império desde a data desta lei, serão considerados de condição livre. In: Coleção das Leis do Império do Brazil.
Disponível em: <https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao/doimperio>. Acesso em 24 de mar.
2016.
357
APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos pelo fundo de emancipação. Lv. 7008.
Ilhéus, 1874-1886.
177

Tabela 5.1 - População escrava por faixas etárias.


Ilhéus, 1874-1886
FAIXAS ETÁRIAS TOTAL DE ESCRAVOS
(anos) Nº %
Crianças * 436 36,0
Jovens (11-16) 65 5,4
Adultos N. (17-30) 275 22,7
Adultos M. (31-55) 381 31,4
Idosos (56 ou +) 55 4,5
TOTAL 1.212 100,0
Fonte: APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos
para libertação pelo fundo de emancipação. Lv. nº 7008.
Ilhéus, 1874-1886.
(*) Inclui 65 ingênuos, 345 filhos menores e 26 crianças
diretamente classificadas com idades entre 0 e 10 anos.
OBS: Adultos N. (Adultos Novos)
Adultos M. (Adultos Maduros)

Os dados da Tabela 5.1 mostram elevado percentual de crianças na população escrava


de Ilhéus, 36% dos cativos. Entre os adultos notamos que 22,7% tinha idade entre 17 e 30
anos, a outra grande parte (31,4%) era composta por Adultos Maduros, entre 31 e 55 anos e a
minoria era jovem (5,4%) e idosos (4,5%). Esse elevado número de crianças sugere que a
família escrava e a reprodução natural podem ter sido elementos importantes para o tipo de
escravismo que se desenvolveu em Ilhéus na segunda metade do século XIX. Analisar a
distribuição por sexo ajuda a elucidar a questão. Para este cálculo excluímos os ingênuos e os
filhos menores nascidos antes da Lei do Ventre Livre, pois o documento não informa a cor
nem o sexo deles.
Tabela 5.2 - População escrava por sexo e cor.
Ilhéus, 1874-1886
SEXO MASCULINO FEMININO TOTAL
COR Nº % Nº % Nº %
PRETA 295 44,2 373 55,8 668 100,0
PARDA 63 47,7 69 52,3 132 100,0
CABRA 1 50,0 1 50,0 2 100,0
TOTAL 359 44,8 443 55,2 802 100,0
Fonte: APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem
Libertos pelo fundo de emancipação. Lv. nº 7008. Ilhéus, 1874-1886.
OBS: Excluímos dos cálculos 345 menores escravos e 65 ingênuos, por não
sabermos a cor nem o sexo deles.
178

A primeira constatação de caráter geral é a predominância de cativos da cor preta e


com relativo equilíbrio de sexo na população cativa, sendo que a proporção de escravas foi
ligeiramente superior à de escravos em todas as situações. A maioria dos classificados como
de cor preta era do sexo feminino (55,8%), e entre os pardos elas também predominaram
(52,3%), o que atesta a importância dessas mulheres no contexto histórico investigado.
Outra variável que nos interessa analisar é a condição de saúde desta população. O
Livro de classificação também apresenta um campo com informações sobre a aptidão para o
trabalho, o que permite verificar essa questão358. Quais eram as condições físicas desses
cativos? O que é possível saber a respeito do assunto? Os dados da Tabela 5.3 mostram que a
maioria dos homens e das mulheres estava em boas condições de trabalho.

Tabela 5.3 – População escrava por sexo e aptidão para o trabalho.


Ilhéus, 1874-1886
SEXO ESCRCAVAS ESCRAVOS TOTAL
TIPOS DE APTIDÃO Nº % Nº % Nº %
Boa 371 83,7 302 84,1 673 83,9
Pouca 35 7,9 21 5,8 56 7,0
Muita 4 0,9 13 3,6 17 2,1
Nenhuma 8 1,8 7 2,0 15 1,8
Regular 8 1,8 5 1,4 13 1,6
Apto 5 1,1 6 1,7 11 1,4
Ótima 8 1,8 2 0,6 10 1,2
Alguma 3 0,7 1 0,3 4 0,5
Bastante 1 0,2 2 0,6 3 0,4
TOTAL 443 100,0 359 100,0 802 100,0
Fonte: APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos
pelo fundo de emancipação. Lv. nº 7008. Ilhéus, 1874-1886.
OBS: Excluímos dos cálculos 345 menores escravos e 65 ingênuos, por não
sabermos o sexo e o estado de saúde deles.

Os dados da Tabela 5.3 mostram que no que diz respeito à aptidão para o trabalho
predominou aqueles descritos em boas condições, 673 (83,9%), sem grandes diferenças em

358
APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos pelo fundo de emancipação. Lv. 7008.
Ilhéus, 1874-1886.
179

relação aos sexos. Vale ressaltar que muitas crianças foram mencionadas indiretamente nesta
fonte, muitas delas certamente ainda não estavam aptas ao trabalho.
Outra característica que a documentação permite identificar é a profissão dos escravos.
A Tabela 5.4 mostra a distribuição dos cativos de acordo com essa variável.

Tabela 5.4 – Profissão dos escravos de acordo com o sexo.


Ilhéus, 1874-1886
SEXO ESCRAVAS ESCRAVOS TOTAL
TIPOS DE PROFISSÃO Nº % Nº % Nº %
Serviço de Lavoura 366 82,6 311 86,6 677 84,4
Serviço Doméstico 55 12,4 11 3,1 66 8,2
Carapina 0 0,0 13 3,6 13 1,7
Cozinheira(o) 7 1,6 3 0,8 10 1,3
Padeiro 0 0,0 7 1,9 7 0,9
Ferreiro 1 0,2 5 1,4 6 0,8
Costureira 5 1,1 0 0,0 5 0,7
Carregador 0 0,0 2 0,6 2 0,2
Lavadeira 2 0,5 0 0,0 2 0,2
Serrador 0 0,0 1 0,3 1 0,1
Arrumadeira 1 0,2 0 0,0 1 0,1
De canoa 0 0,0 1 0,3 1 0,1
Marinheiro 0 0,0 1 0,3 1 0,1
Marítimo 0 0,0 1 0,3 1 0,1
Gomadeira 1 0,2 0 0,0 1 0,1
Outras 5 1,2 3 0,8 8 1,0
TOTAL 443 100,0 359 100,0 802 100,0
Fonte: APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos
pelo fundo de emancipação. Lv. nº 7008. Ilhéus, 1874-1886.
OBS: Excluímos dos cálculos 345 menores escravos e 65 ingênuos, por não
sabermos o sexo nem a profissão deles.

Com relação à profissão predominou os escravos do serviço de lavoura. A maioria das


escravas estavam nesta categoria (82,6%) e nos serviços domésticos (12,4%). Contudo, elas
deviam exercer mais de uma atividade, trabalhando durante o dia na lavoura e a noite nos
serviços domésticos. Algumas foram descritas como cozinheiras (1,6%), outras como
costureiras (1,1%), arrumadeira e engomadeira.
180

A maioria dos escravos também era do serviço de lavoura (86,6%) e assim como as
cativas eles certamente desempenhavam diversas funções durante o dia e a noite, em proveito
próprio ou do senhor. Entre eles poucos foram vinculados aos serviços domésticos (3,1%), o
que está bem abaixo do índice delas (12,4%).
Conjugar o trabalho de lavoura com serviço doméstico parece mais próximo da
realidade das escravas. Entre eles o mais comum, depois da profissão dos serviços de lavoura,
era trabalhar na profissão de carapina (3,6%), padeiro (1,9%), ferreiro (1,4%) e nas
navegações, como marinheiro, marítimo e de canoa.
Agora vamos analisar o estado conjugal desses cativos, para sabermos as
possibilidades de acesso ao casamento legítimo, contraído na Igreja Católica, e qual a
frequência que isso ocorria entre homens e mulheres que viviam no cativeiro em Ilhéus. A
Tabela 5.5 mostra a distribuição da população escrava de acordo com o sexo e estado
conjugal.
Tabela 5.5 – População escrava por sexo e estado conjugal.
Ilhéus, 1874-1886
SEXO ESCRAVAS ESCRAVOS TOTAL
ESTADO CONJUGAL Nº % Nº % Nº %
SOLTEIROS 393 88,7 319 88,8 712 88,8
CASADOS 38 8,6 38 10,6 76 9,5
VIÚVOS 12 2,7 2 0,6 14 1,7
TOTAL 443 100,0 359 100,0 802 100,0
Fonte: APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos
pelo fundo de emancipação. Lv. nº 7008. Ilhéus, 1874-1886
OBS: Excluímos dos cálculos 345 menores escravos e 65 ingênuos, por não
sabermos o sexo deles.

Em Ilhéus notamos que predominou aquilo que a historiografia, de maneira geral,


também identificou para outras localidades, ou seja, poucos escravos tinham acesso ao
casamento legítimo, apenas 9,5% deles foram classificados como casados, a maioria era
composta por solteiros (88,8%)359.

359
Ver, entre outros, COSTA, Iraci del Nero da.; GUTIÉRREZ, Horacio. Nota sobre casamentos de escravos em
São Paulo e no Paraná (1830). In: LUNA, Francisco Vidal; COSTA, Iraci del Nero da.; KLEIN, Herbert S.
Escravismo em São Paulo e Minas Gerais. São Paulo: EDUSP. Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2009.
p. 511-518; LUNA, Francisco Vidal. Casamento de Escravos em São Paulo: 1776, 1804, 1829. In: LUNA;
COSTA; KLEIN, Op. cit., p. 571-594.
181

Vamos analisar agora a quantidade de filhos de acordo com o estado conjugal das
escravas.
Tabela 5.6 – Distribuição das escravas por estado conjugal
e quantidade de filhos. Ilhéus, 1874-1886.
ESTADO CONJUGAL E ESCRAVAS TOTAL DE FILHOS *
PRESENÇA DE FILHOS Nº % Nº %
Solteiras sem filhos 211 47,6 0 0,0
Solteiras com filhos 182 41,1 370 90,3
Casadas sem filhos 24 5,4 0 0,0
Casadas com filhos 14 3,2 40 9,7
Viúvas sem filhos 12 2,7 0 0,0
Viúvas com filhos 0 0,0 0 0,0
TOTAL 443 100,0 410 100,0
Fonte: APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos
pelo fundo de emancipação. Lv. nº 7008. Ilhéus, 1874-1886.
(*) Inclui filhos menores escravos (345) e ingênuos (65).

A Tabela 5.6 demonstra alta concentração de filhos entre as escravas solteiras


(90,3%), enquanto 9,7% eram filhos de escravas casadas, ou seja, com uniões legitimadas na
Igreja católica. Não encontramos nenhuma escrava viúva com filhos menores (escravos ou
ingênuos).
Vale ressaltar que a documentação não permite capturar o universo de afetividade e
habilidade dessas pessoas, muito menos os laços de parentesco e solidariedade que eles
desenvolveram ao longo de suas vidas. Nesse sentido é oportuno lembrar do estudo de Luiz
R. B. Mott sobre desvios da moral sexual dos habitantes da Comarca de Ilhéus, baseado no
ato da devassa ocorrida na região em 1813, em que constatou que 60,5% das acusações se
referiam aos desvios da vida familiar, sendo o concubinato o desvio mais frequente360.

360
MOTT, Luiz R. B. Os pecados da família na Bahia de todos os Santos (1813). Centro de Estudos Baianos.
Gráfica Universitária. Salvador, 1982. p. 10-13.
182

5.3 - As escravas casadas e seus filhos. Ilhéus, 1874-1886

Investigaremos agora as mulheres negras que viveram como escravas em Ilhéus e


consagraram matrimônio perante a Igreja Católica, ou seja, eram casadas. Parte delas
conviveu com os filhos a experiência do cativeiro, outra parte não tinha filhos menores na
época da implantação da lei do Ventre Livre (1871)361.
Como já explicamos, no Livro de classificação dos escravos de Ilhéus foram listadas
802 pessoas, entre elas 443 (55%) eram mulheres e 359 (45%) homens, além destes foram
mencionados a existência de 345 filhos menores escravos e outros 65 ingênuos362.
Dentre os 802 escravos somente 76 eram casados (9,5%), destes 32 eram casais
formados por cônjuges do mesmo proprietário, compunham 16 famílias em que
provavelmente os membros viviam juntos no cativeiro. Rachel e Firmino, por exemplo, foi o
primeiro casal de escravos da lista. Ela uma mulher escrava, classificada como parda, casada,
com 21 anos de idade. Ele classificado como preto, casado, 23 anos, ambos do serviço de
lavoura, com ótima aptidão para o trabalho e com quatro pessoas de família, pois os cônjuges
possuíam um filho menor escravo, e um filho livre em virtude da lei, todos propriedades de
Ernesto de Sá Bithencourt Câmara, um dos maiores escravistas de Ilhéus na época.
Entre as escravas casadas a maior parte formou união com pessoa da mesma condição
social e proprietário comum, como Rachel e Firmino. Entre as 16 famílias nestas condições
encontramos Rita, a mãe com maior número de filhos, classificada como parda, 49 anos, mãe
de cinco filhos que teve com o escravo Felippi, classificado como preto, com a mesma idade
dela, ambos do serviço de lavoura e com boa aptidão para o trabalho. Esta família, composta
por sete pessoas, também pertencia a Ernesto de Sá Bitencourt Câmara, ao que parece, um dos
incentivadores da reprodução natural de seus escravos.
361
BRASIL. Lei nº 2.040, de 28 de setembro de 1871. Art. 1º Os filhos de mulheres escravas que nascerem no
Império desde a data desta lei, serão considerados de condição livre. § 1º Os ditos filhos menores ficarão em
poder ou sob autoridade dos senhores de suas mães, os quais terão obrigação de cria-los e tratá-los até a idade de
oito anos completos. Chegando o filho da escrava a esta idade, o senhor da mãe terá opção, ou de receber do
Estado a indenização de 600$000, ou de utilizar-se dos serviços do menor até a idade de 21 anos completos. In:
Coleção das Leis do Império do Brazil. Disponível em: <https://www2.camara.leg.br/atividade-
legislativa/legislacao/doimperio>. Acesso em: 24 mar. de 2018.
362
APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos pelo fundo de emancipação. Lv. nº 7008.
Ilhéus, 1874-1886.
183

Além dessas famílias, com uniões entre escravos do mesmo cativeiro, encontramos
casamentos de escravas com pessoas libertas e livres, e casos em que os cônjuges não são
mencionados. Victória, por exemplo, foi classificada como escrava do serviço de lavoura,
com 43 anos de idade, casada, na época com seis filhos menores escravos. Nesse caso, o
documento não diz nada sobre seu marido, podia ser um escravo de outro proprietário, um
homem liberto ou livre, mas nem sempre é possível identificar, às vezes aparece informações
específicas na documentação, mas isso não foi uma regra.
Percebemos que havia possibilidade das cativas se casarem com escravos de outros
proprietários ou com pessoas de condições sociais diferentes. Umbelina, por exemplo, escrava
de Maria Custódia Lessa Soares, foi classificada como parda, casada, 28 anos, do serviço de
lavoura, boa aptidão para o trabalho. No campo observações consta a descrição “casada com
Joaquim, escravo de José Antônio Foneto Bastos”363. Assim, notamos que os membros deste
casal pertenciam a proprietários diferentes, e provavelmente residiam em lugares distintos.
Essa deve ter sido a realidade de muitas famílias negras sujeitas à escravidão em
Ilhéus. Os membros deviam enfrentar as complicações de ter que servir diferentes senhores,
de viverem separados ou ter seus entes queridos vendidos, doados ou trocados. Maria Felicia,
por exemplo, mulher negra, escrava, classificada como preta, 36 anos, solteira, do serviço de
lavoura, com muita aptidão para o trabalho e com três pessoas de família foi descrita como
“mãe com dois filhos menores escravos pertencentes a diversos senhores”364. Não sabemos se
os filhos foram separados da mãe, a necessidade do senhor, no entanto, devia prevalecer, e até
antes da Lei do Ventre Livre as crianças escravas podiam ser separadas de suas famílias sem
impedimentos legais365.
Em outros casos a condição social dos cônjuges das escravas era diferente. Felipa, por
exemplo, mulher escrava, classificada como preta, 47 anos, era casada com o liberto João, o
casal não tinha filho menor escravo nem ingênuo. Júlia, mulher escrava, classificada como
parda, 17 anos, era casada com o livre José Cardoso de Jesus, na época eles também não
tinham filhos menores. Nesses casos a condição dos cônjuges aparece no campo observações.

363
APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos pelo fundo de emancipação. Lv. nº
7008. Ilhéus, 1874-1886.
364
Ibidem.
365
Sobre o assunto ver, entre outros, REIS, Isabel Cristina Ferreira dos. História de vida familiar e afetiva de
escravos na Bahia do século XIX. Salvador: Centro de Estudos Baianos, 2001.
184

Esses exemplos demonstram que as mulheres escravas de Ilhéus consagraram


matrimônio com pessoas de diversas condições sociais e isso também ocorria com os
escravos. Vicente, por exemplo, foi classificado como preto, 49 anos, carapina, boa aptidão
para o trabalho, casado com a índia Carolina; Domingos, pardo, 34 anos, do serviço de
lavoura, casado com Maria, livre; Pedro Lourdes, preto, 60 anos, do serviço de lavoura, boa
aptidão para o trabalho, casado com a liberta Delfina.366
Esses exemplos mostram que os escravos fizeram suas escolhas, atuaram como
protagonistas de suas vidas, estabelecendo uniões com diversas pessoas da sociedade em que
estavam inseridos.
Agora vamos analisar a situação das outras escravas, que também foram classificadas
como casadas, mas que estabeleceram outros tipos de uniões. Já salientamos que do total de
76 cativos casados 32 (42%) formavam famílias com parceiros da mesma condição social e
proprietário comum, resta saber da realidade conjugal das outras 44 pessoas (58%).
Incialmente constatamos exato equilíbrio de sexo dentro do grupo, sendo metade (22)
formada por mulheres e a outra parte por homens. Entre elas encontramos sete casadas com
libertos; quatro com pessoas livres; três com escravos de outros donos e o restante eram
mulheres escravas casadas, mas os maridos não foram mencionados no documento, não sendo
possível identificar a condição social deles.
No geral esses dados demonstram que entre as escravas casadas o mais comum foi o
consórcio delas com escravos, em seguida com libertos e depois com livres. O número de
filhos que tiveram também variou e tal variação encontra correspondência na condição social
do cônjuge.
Para dar conta da diversidade de situações montamos uma tabela com a distribuição
das mulheres escravas casadas de acordo com a condição social do cônjuge e a presença de
filhos.

366
APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos pelo fundo de emancipação. Lv. nº
7008. Ilhéus, 1874-1886.
185

Tabela 5.7 – Escravas casadas segundo a condição social


dos cônjuges e presença de filhos. Ilhéus, 1874-1886
TOTAL DE
ESCRAVAS CASADAS COM FILHOS 1 SEM FILHOS
ESCRAVAS
Tipos de Uniões Nº % Nº % Nº %
Casada c/ escravo 9 47,4 10 52,6 19 100,0
Casada c/ liberto 2 28,6 5 71,4 7 100,0
Casada c/ livre 0 0,0 4 100,0 4 100,0
Casada c/outros 2 3 37,5 5 62,5 8 100,0
TOTAL 14 37,0 24 63,0 38 100,0
Fonte: APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para libertação pelo fundo de
emancipação. Lv. 7008. Ilhéus, 1874-1886.
OBS: (1) Inclui filhos menores escravos e ingênuos.
(2) Condição do cônjuge não mencionada no documento.

A Tabela 5.7 mostra que a maioria das escravas era casada com escravos e quase
metade delas tinha filhos menores (47,4%). Não obstante, a ocorrência de filhos variou
conforme a condição social do cônjuge. Entre as casadas com libertos este percentual foi de
28,6% e entre as casadas com homens livres não localizamos nenhum casal com filhos
menores.
Embora a amostragem seja pequena, os dados da Tabela 5.7 evidenciam que em Ilhéus
a reprodução natural dos escravos ocorria, principalmente, entre as pessoas que
compartilhavam a experiência do cativeiro, o que pode refletir a opção dos escravistas em
aumentar suas escravarias estimulando o casamento e o nascimento de novos rebentos, mas
pode significar também que havia certo grau de autonomia das escravas na escolha pelos seus
parceiros. A historiografia debateu o papel da família escrava no contexto da escravidão,
oferecendo diferentes interpretações sobre essa questão367.
A nossa interpretação é que na segunda metade do século XIX, com o
desenvolvimento econômico de Ilhéus, a reprodução natural foi um dos aspectos que permitiu
aos escravistas aumentar ou pelo menos manter a posse de escravos, como prova o elevado

367
Sobre a família escrava no Brasil ver, entre outros, MOTTA, José Flávio. Corpos escravos, vontades livres:
posse de cativos e família escrava em Bananal, 1801 – 1829. São Paulo, FAPESP: Annablume, 1999; SLENES,
Robert. Na senzala uma flor: esperanças e recordações na formação da família escrava – Brasil, Sudeste, século
XIX. Campinas: Editora da UNICAMP, 2004; FLORENTINO, Manolo; GÓES, José Roberto. A paz das
senzalas: famílias escravas e tráfico atlântico, Rio de Janeiro, c. 1790- c. 1850. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1997.
186

número de crianças na documentação. Investigar a quantidade de filhos entre as escravas


casadas para contribuir para elucidar a questão.

Tabela 5.8 – Escravas casadas com filhos menores escravos e ingênuos segundo a
condição social do cônjuge. Ilhéus, 1874-1886.
MÃES ESCRAVAS CASADAS FILHO(A)S (1) FILHO(A)S (2) TOTAL (1+2) MÉDIA
Tipos de Uniões Nº % Nº % Nº % Nº % Nº
Casada c/ escravo 9 64,3 18 45,0 6 15,0 24 60,0 2,6
Casada c/ liberto 2 14,3 1 2,5 3 7,5 4 10,0 2,0
Casada c/outros 3 3 21,4 11 27,5 1 2,5 12 30,0 4,0
Total 14 100,0 30 75,0 10 25,0 40 100,0 2,8
Fonte: APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para libertação pelo fundo de emancipação.
Lv. 7008. Ilhéus, 1874-1886.
(1) Filhos menores escravos.
(2) Filhos ingênuos.
(3) Condição do cônjuge não mencionada no documento.

A Tabela 5.8 demonstra que o maior número de filhos estava presente entre as
escravas casadas com escravos, 60% dos filhos provinha de casamentos entre cativos, 10% da
união entre escravas e libertos e os outros 30% eram filhos de escravas casadas, mas o
documento não cita a condição do cônjuge, informa apenas que era casada368.
No geral os dados da Tabela 5.8 evidenciam que a reprodução natural ocorreu com
maior frequência entre parceiros de cativeiro, o que pode ser um indício da interferência dos
escravistas, estimulando casamentos para obter vantagens com reprodução natural de seus
cativos. Ao que parece as famílias escravas foram importantes para o crescimento e
manutenção do escravismo em Ilhéus, ao mesmo tempo em que serviram como elo entre os
escravos, no fortalecimento de suas culturas, muito importantes para a conquista das alforrias
e a resistência ao cativeiro.
Não obstante o matrimônio consagrado na Igreja não era acessível a grande parte dos
escravizados. De acordo com a documentação compulsada a maior parcela das mães
escravizadas em Ilhéus não alcançou o casamento legítimo e estabeleceram outros tipos de
uniões, as chamadas uniões consensuais, realizadas pelos próprios cativos, fora da Igreja,
como ocorreu com as escravas classificadas como solteiras.

368
APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos pelo fundo de emancipação. Lv. 7008.
Ilhéus, 1874-1886.
187

5.4 – As escravas solteiras e seus filhos. Ilhéus, 1874-1886

Parte das escravas solteiras também viveu com seus filhos a experiência do cativeiro
em Ilhéus. Assim como as casadas, elas desempenharam vários papéis na economia e
sociedade, trabalharam como escravas e criaram os filhos no cativeiro369.
Entre as 443 mulheres escravas, constatamos que 393 eram solteiras, 38 casadas e 12
viúvas. As casadas, abordadas na seção anterior, detinham apenas 8,6% do total de filhos
menores escravos e somente 15,4% dos ingênuos, evidenciando assim que a maior parcela das
crianças mencionadas no Livro de classificação dos escravos pertencia às escravas solteiras,
pois entre as viúvas não constatamos presença de filhos menores.
Para sistematizar essas informações construímos uma tabela com a distribuição geral
das escravas de acordo com o estado conjugal e a presença de filhos menores, o que permite
conhecer a realidade conjugal dessas mulheres.

Tabela 5.9 – Distribuição das escravas segundo o estado conjugal e a presença


de filhos menores escravos e ingênuos. Ilhéus, 1874-1886
ESTADO CONJUGAL E ESCRAVAS FILHOS 1 FILHOS 2 TOTAL (1+2)
PRESENÇA DE FILHOS Nº % Nº % Nº % Nº %
Solteiras sem filhos 211 47,6 - - - - - -
Solteiras com filhos 182 41,1 315 91,3 55 84,6 370 90,3
Casadas sem filhos 24 5,4 - - - - - -
Casadas com filhos 14 3,2 30 8,7 10 15,4 40 9,7
Viúvas sem filhos 12 2,7 - - - - - -
TOTAL 443 100,0 345 100,0 65 100,0 410 100,0
Fonte: APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para libertação pelo fundo de
emancipação. Lv. 7008. Ilhéus, 1874-1886.
(1) Filhos menores escravos.
(2) Filhos ingênuos.

A Tabela 5.9 apresenta informações importantes para entendermos o papel da


reprodução natural entre a população cativa de Ilhéus. Em primeiro lugar notamos que quase
metade da população escrava feminina tinha filhos menores na época da elaboração do
documento, somando as solteiras com filhos (41,1%) mais as casadas com filhos (3,2%),

APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos pelo fundo de emancipação. Lv. nº
369

7008. Ilhéus, 1874-1886.


188

notamos que 44,5% das mulheres escravas eram mães, o que constitui forte indício da
reprodução natural.
O cruzamento da quantidade de filhos com a estrutura da posse de escravos pode
revelar onde se encontravam os maiores índices de crianças no conjunto dos escravistas de
Ilhéus. A Tabela 5.10 apresenta o resultado dessa distribuição.

Tabela 5.10 – Distribuição das crianças escravas e ingênuas por faixas de tamanho da
posse de cativos. Ilhéus, 1874-1886
Total de
Crianças Crianças
FTP escravos e
escravas ingênuas
ingênuos
Nº Nº % Nº %
1a3 176 21 12,0 14 7,9
4a9 199 51 25,6 16 8,0
10 a 19 203 88 43,3 10 4,9
20 ou + 634 185 29,0 25 4,0
Total 1.212 345 28,4 65 5,4
Fonte: APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para libertação pelo
fundo de emancipação. Lv. 7008. Ilhéus, 1874-1886.
(FTP) Faixas de tamanho da posse de cativos

A Tabela 5.10 mostra que as crianças (escravas e ingênuas) estavam distribuídas em


proporções razoavelmente significativas em todas as faixas de tamanho da posse de escravos,
com exceção da primeira faixa (1 a 3 escravos) em que os percentuais foram menores que nas
demais faixas, onde no mínimo um terço da população cativa, aproximadamente, era
constituída por crianças escravas e ingênuas.
Mafalda, mulher escravizada, foi a que localizamos com maior número de filhos
menores escravos. Classificada como preta, 40 anos de idade, do serviço de lavoura, boa
aptidão para o trabalho, com oito filhos menores escravos, todas propriedades de Fernando
Steiger, um dos maiores escravistas de Ilhéus, que classificou 146 cativos, (41,8%) crianças.
Ele está na lista dos maiores exportadores de cacau e café de Ilhéus370. Segundo Mary Ann
Mahony,

370
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Maço 5459. Livro de imposto sobre exportação de cacau e café, 1871-1885.
189

Pelo menos um senhor de escravos de Ilhéus, Fernando Steiger, tentou


explicitamente estimular a reprodução, encorajando o casamento entre seus
escravos e oferecendo prêmios às escravas que dessem à luz mais de seis
crianças. Ele fugia da regra, mas pode não ter sido o único fazendeiro local a
esperar resolver, com a reprodução natural, alguns de seus problemas com
mão de obra371.

Fernando Steiger não era exceção, ao que parece outros escravistas de Ilhéus adotaram
essa prática. Ernesto de Sá Bitencourt Câmara, grande escravista, classificou 47 cativos dos
quais 32% eram crianças372. Dr. Pedro de Cerqueira Lima classificou 37 escravos, 19%
crianças. Fortunato Pereira Galo classificou 63 cativos, 22% eram crianças. José de Melo Sá
classificou 30 e quase a metade (43%) era constituída por crianças. Paulino Lopes de
Carvalho classificou 46 dos quais 12 (26%) também eram crianças373.
Outros exemplos semelhantes aparecem na documentação, indicando que muitos
escravistas de Ilhéus estavam buscando ampliar o número de escravos incentivando a
reprodução natural de seus cativos. Agora vamos investigar as atividades econômicas em que
essa população estava inserida.
O Livro de classificação dos escravos, embora tenha sido a principal fonte utilizada até
aqui, não permite aprofundar o conhecimento sobre os espaços de trabalho das cativas, já que
não informa nada a respeito das atividades econômicas dos escravistas.
Para avançar nessa questão, crucial para o entendimento dos papeis socioeconômicos
das escravas de Ilhéus, recorremos aos inventários post mortem, que oferecem maiores
possibilidades de investigação a respeito do assunto. Na medida do possível vamos cruzar
informações das duas fontes, com o objetivo de realizar uma abordagem qualitativa do
processo histórico e revelar alguns aspectos do mundo do trabalho, da maternidade e da vida
das escravas que viveram em Ilhéus na segunda metade do século XIX, muitas delas
compartilhando com os filhos a experiência do cativeiro.

371
MAHONY, afro-ásia. P. 103.
372
APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos pelo fundo de emancipação. Lv. nº
7008. Ilhéus, 1874-1886.
373
Ibidem.
190

5.5 - Trabalhar e criar os filhos: as escravas nos inventários de Ilhéus, 1850-1888

Muitas mulheres negras trabalharam como escravas em diversas ocupações durante o


crescimento da economia cacaueira de Ilhéus. Nessa seção vamos analisar as escravas
descritas nos inventários post mortem para entendermos o mundo do trabalho e da escravidão
dessas mulheres. Parte delas também compartilhou com os filhos a experiência do cativeiro.
Em nossa planilha de dados com informações sobre a população escrava declarada nos
inventários reunimos informes referentes a 829 pessoas escravizadas, 423 do sexo feminino
(51%), 397 masculinos (48%) e 8 casos que não foi possível identificar o sexo. Para sabermos
os espaços de trabalho dessas mulheres distribuímos a população cativa de acordo com os
sexos e a ocupação principal dos escravistas. Desse modo, pretendemos identificar as
atividades econômicas que concentraram maior número de escravas. A Tabela 5.10 apresenta
o resultado dessa distribuição.

Tabela 5.11 – População escrava segundo o sexo e a ocupação principal


dos escravistas. Ilhéus, 1850-1888
Total de
OCUPAÇÃO PRINCIPAL Escravistas Escravos Escravas
Escravos
CATEGORIAS Nº % Nº % Nº % Nº %
Produtores de cacau 51 42,1 125 49,6 127 50,4 252 100,0
Negociantes 31 25,6 54 44,3 68 55,7 122 100,0
Donos de Engenho 12 9,9 146 48,8 153 51,2 299 100,0
Produtores de farinha 5 4,1 26 50,0 26 50,0 52 100,0
Produtores de coco 4 3,3 4 57,1 3 42,9 7 100,0
Produtores de café 2 1,7 4 100,0 0 0,0 4 100,0
Outros * 3 2,5 7 63,6 4 36,4 11 100,0
Não identificada 13 10,8 35 47,3 39 52,7 74 100,0
TOTAL 121 100,0 401 48,8 420 51,2 821 100,0
Fonte: APEB, SJ, 121 processos de inventários. Ilhéus, 1850-1888.
(*) Prof. liberais; func. eclesiástico; peq. criadores; madeireiros etc.
OBS: Excluímos 8 escravos sem informação de sexo.

A Tabela 5.11 demonstra acentuado equilíbrio de sexo entre quase todas ocupações
principais dos escravistas, exceção aos produtores de café, que aparecem na tabela sem a
presença de escravas. Entre os produtores de cacau as escravas representavam 50,4% do total
191

de cativos, entre os negociantes 55,7% e entre os donos de engenho 51,2%, comprovando a


importância delas nas mais variadas atividades econômicas.
Contudo, devemos ressaltar que essas mulheres não atuavam apenas nas ocupações
descritas na Tabela 5.9, muitos escravistas de Ilhéus consorciavam mais de uma atividade, e
certamente eles utilizavam as escravas e os escravos, bem como os filhos destes, de acordo
com as circunstância e necessidades do momento.
É oportuno lembrar que na tabela das ocupações (Tabela 3.3, p. 104), apresentada no
capítulo III, ressaltamos que além das ocupações principais havia aquelas que classificamos
como secundárias, com destaque para a produção de farinha, cachaça, café, coco, dendê e
outras. Desse modo, as escravas estavam envolvidas em diversas atividades.
Seja qual for o contexto as elas buscavam obter ganhos e encontrar meios de criar seus
filhos, algumas delas conseguiam acumular pecúlio e livrar a criança do cativeiro.
Os inventários post mortem não informam as habilidades que elas desenvolveram ao
longo de suas vidas para trabalhar e criar os filhos, no geral os cativos são descritos nesta
fonte como bens “semoventes”. Destarte, os historiadores conseguiram investigar os espaços
de trabalho delas a partir da análise do patrimônio de seus proprietários. Esta também foi a
nossa opção para abordar o tema.
Encontramos escravistas com propriedades espalhadas na vila e na zona rural, alguns
tinham casas de negócio na área urbana, sítios com plantações de coco e mandioca, outros
tinham roças de cacau, fazendas com engenho, plantações de cana, café e cacau, espalhados
em diversas partes do território na comarca de Ilhéus. Nesse sentido, acreditamos ser plausível
pensar que as escravas circulavam, atendendo as demandas de seus proprietários, mas também
utilizando os dias de descanso para construírem arranjos de sobrevivência e resistência, muito
importantes para o fortalecimento das suas relações afetivas, dos laços de compadrio, família
e amizade.
As possibilidades, no entanto, deviam ser bem variadas. Muitas escravas viviam
distantes da vila, trabalhando no eito e nos serviços domésticos e as chances de mobilidade
deviam depender de muitos fatores.
No Engenho Castelo Novo, por exemplo, trabalhavam 54 escravos, sendo 13 (24%)
africanos e a maioria (76%) crioulos, entre eles 17 (31%) eram crianças com menos de 10
192

anos de idade, e 28 (52%) eram do sexo feminino. Provavelmente existiam famílias escravas
neste engenho, mas os avaliadores não mencionaram nada a respeito do assunto. Macario,
Estanislao e Maria tinham menos de um ano de idade quando da abertura do inventário, cada
um avaliado em Rs. 100$000; Evaristo e [Paesleiro] tinham dois anos de idade, cada um por
Rs. 200$000; Vitória e Anselma tinham três anos, avaliadas em Rs. 350$000 e Rs. 400$000,
respectivamente, dentre outros374.
O único escravo com ofício declarado entre os cativos do Engenho Castelo Novo foi o
mestre de açúcar, Clarencio, africano, 58 anos de idade, avaliado em Rs. 1.000$000. Sobre as
escravas não encontramos informação a respeito de suas ocupações, as cinco africanas tinham
idade avançada na época da abertura do inventário, a mais nova com 54 anos e a mais velha
com 74. O engenho tinha criação de animais, plantação de cana, cacau, produção de farinha,
açúcar/cachaça, senzalas, casas de morada, balcão de negócio e outros bens. Certamente as
escravas e seus filhos circulavam pelos diferentes espaços, trabalhando nas lavouras e nos
serviços domésticos375.
No Engenho Itacanoeiras trabalhavam dezessete escravos em 1850, quando foi aberto
o inventário de Maria Luiza da Santíssima Trindade. Entre os cativos encontramos 41% com
menos de 10 anos de idade, mas não sabemos nada a respeito de seus pais. Contudo, existiam
duas escravas neste engenho que provavelmente eram adultas, Maria e Margarida, mas o
documento não revela suas idades, nem ocupações. Além da produção de açúcar e cachaça,
este engenho produzia farinha, tinha plantação de cana, cacau e coco, além de animais e casa
de morada. As escravas e seus filhos deviam exercer diversas funções, no eito e nos serviços
domésticos.
Trabalhando nos engenhos, nas casas de negócios, nas plantações cacau, café e nas
casas de farinha, nos serviços domésticos, bem como em outras atividades, as escravas
conseguiam obter ganhos, importantes para a criação dos filhos e para a sobrevivência da
família. Certamente elas não ficavam confinadas nas unidades de produção, mas com certeza
suas liberdades eram restritas em vários aspectos, dependendo de onde trabalhavam e da
relação que mantinham com o proprietário.

374
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Maria José Leola Del Rey e Carolina Leola Del Rey. Est. 02 Cx.
786, Maço 1253, Doc. 06, 28 de fev. 1861.
375
Ibidem.
193

Algumas escravas de Ilhéus consagraram matrimônio perante a Igreja Católica e parte


delas estabeleceu uniões com pessoas livres e libertas, assim, o controle do senhor sobre a
vida destas mulheres também tinha seus limites.
Entre os bens móveis inventariados encontramos muitas canoas e embora nenhuma
escrava tenha sido descrita como canoeira, não podemos descartar a possibilidade de elas
praticarem a pesca e a mariscagem, sustentando a família com crustáceos e peixes,
combinando estes alimentos com farinha de mandioca, dendê, leite de coco etc., obtidos
durante o trabalho e nos dias de descanso. É oportuno lembrar que a pesca e mariscagem
foram pontos abordados no tratado de paz, proposto pelos escravos do Engenho Santana em
meados do século XIX,

Para podermos viver nos hade dar Rede tarrafa e canoas. Não nos hade
obrigar a fazer camboas, nem a mariscar, e quando quiser fazer camboas e
mariscar mande os seus pretos Minas. Para o seu sustento tenha Lanxa de
pescaria ou canoas do alto, e quando quiser comer mariscos mande os seus
pretos Minas376.

Embora os inventários não permitam identificar as habilidades desenvolvidas pelas


escravas durante suas vidas no cativeiro, podemos considerar que elas participaram
ativamente de muitas atividades econômicas desenvolvidas em Ilhéus na segunda metade do
século XIX, sendo que algumas conseguiram obter vantagens nesse contexto. Rosa e
Rosalina, por exemplo, eram escravas que pertenciam à Maria Margarida Ninch, natural da
Alemanha, que tinha fazenda de cacau e produção de farinha na Cachoeira de Itabuna, quando
faleceu em 1886. No inventário desta estrangeira consta o valor de Rs. 900,000 pagos pelas
ditas escravas, que na época já estavam em posse de suas cartas de liberdade. Nos autos do
processo o inventariante declarou que “existem em poder dos herdeiros, Dona Luiza Dionízia
Ninch e Dona Maria Juliana Ninch, três ingênuos, a saber: dois filhos de Rosa de nomes
Firmino, com 15 anos de idade e Ana, com 12 anos de idade, e um de Rosalina, de nome
Landônio, com 12 anos377.

376
SCWARTZ, Stuart. Escravos, roceiros... Op. Cit., p. 119.
377
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Maria Margarida Ninck. Est. 02, Cx. 762, Maço 1228, Doc. 15,
25 de out. 1886.
194

Como essas escravas conseguiam dinheiro para comprar suas alforrias? Infelizmente a
documentação não permite responder. Contudo, existem indícios comprovando que algumas
escravas conseguiam formar pecúlio, seja por meio do apoio de seus parceiros, cônjuges ou
familiares, e a partir de seus próprios esforços. Às vezes, aparecem somas em dinheiros
apresentadas por elas e pelos escravos durante o processo de partilha dos bens, solicitando
cartas de liberdade.
Benta, por exemplo, mulher escrava, parda de 33 anos de idade, trabalhava no
Engenho União e na Fazenda Caldeiras em 1875, quando o proprietário faleceu. A referida
escrava possuía dois filhos, Cirilo (5 anos) e Aquilina (12 anos), que foram libertos durante os
trâmites do processo, ele avaliado em Rs. 400$000 e ela em Rs. 600$000. Infelizmente o
documento não informa os meios utilizados para obtenção destas somas. Não obstante, Benta
foi descrita como filha legítima de Romualdo e Aninha. Talvez, neste caso, a família escrava
tenha contribuído para obtenção das alforrias dessas crianças378.
Nos autos do processo de inventário de Acrísio Januário Cardoso, negociante, dono de
escravos, estabelecido na Cachoeira de Itabuna, consta a seguinte declaração “duzentos e
oitenta e seis mil réis em poder do seu cunhado, Antônio da Cruz Rebelo Leitão, referente ao
pecúlio do escravo Gregório”379. Durante os trâmites do processo ficamos sabendo que se
tratava de um ex-escravo, mas não encontramos nada sobre os meios que ele utilizou para a
conseguir o referido dinheiro380.
De modo semelhante ocorreu no inventário do Capitão Joaquim Ferreira Paiva, onde
os avaliadores descreveram “a quantia de um conto e sessenta mil réis, dinheiro que a
inventariante tinha recebido pela liberdade das escravas Francisca, Maria, Izabel e
Porcidônio”381. Como essas escravas conseguiram dinheiro para comprar suas alforrias?
Infelizmente não temos como responder.
Esses exemplos confirmam o que a historiografia atinente ao tema constatou para
outras regiões escravistas do Brasil, ou seja, que muitas escravas conseguiam pecúlio,
378
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Alferes José Antônio de Guimarães Bastos. Est. 02, Cx. 738,
Maço 1203, Doc. 12, 10 de fev. 1875.
379
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Alferes Acrísio Januário Cardoso. Est. 03, Cx.1298, Maço 1767,
Doc. 08, 21 de abr. 1887.
380
Ibidem.
381
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Capitão Joaquim Ferreira de Paiva. Est. 02, Cx. 737, Maço 1202,
Doc. 23, 15 de abr. 1874.
195

utilizados na compra de suas alforrias ou de seus parentes, sobretudo os filhos. Para isso elas
deviam trabalhar por anos a fio, acumulando pequenos ganho no cotidiano de trabalho e nos
dias de descanso, normalmente domingos e dias santos, contando com apoio de amigos,
familiares e cônjuges382.
A maioria das escravas, no entanto, passou a maior parte de suas vidas no cativeiro,
com ou sem os filhos, juntas ou separadas deles. Essa realidade atingiu muitas famílias,
crioulas e africanas, que viveram em Ilhéus na segunda metade do século XIX. Além de
compartilharem a experiência do cativeiro com os filhos, a documentação demonstra que
muitas delas tiveram que enfrentar a dura realidade de ver seus filhos sendo doados, vendidos
ou arrematados em praça pública, como aconteceu com o filho da escrava Clara, por
exemplo383

Dizemos nós, Jose Borges do Amaral e minha mulher Narciza da Roza Dora,
que entre os demais bens que possuímos livres, desembargados, se
compreende um mulatinho filho da nossa escrava parda, de nome Clara, com
um mês de nascido, batizado com o nome de Moyses, a qual cria na terça de
nós ambos e no valor de quarenta mil reis, doamos, como de facto doado a
havemos ao nosso filho José Miguel Arouca do Amaral, que desde já em
diante ficará possuindo, gosando, e entrará no desfrute de seus serviços logo
que principie a dá-los [...], com isso lhe transferimos todo o direito, ação e
pertença que nela própria tínhamos384.

Encontramos na documentação muitos casos de mães separadas de seus filhos. O


momento da partilha dos bens era o mais propício para esses acontecimentos. Bonifácia
trabalhava no Engenho União em 1875, quando o proprietário faleceu. Essa escrava tinha 22
anos e dois filhos, um mulatinho (um ano) e uma crioulinha (3 anos). Nos autos do processo
de inventário consta que Bonifácia foi doada para a filha do casal, Lina Alexandrina de

382
Cf. ANDRADE, Marcelo Loyola de. Nos labirintos da liberdade: das alforrias na lavoura cacaueira (Ilhéus-
Ba, 1810-1850) à discussão historiográfica acerca das manumissões do Brasil no século XIX. Dissertação
(Mestrado em História). FFLCH-USP. São Paulo, 2013.; GONÇALVES, Victor Santos. Escravos e senhores nas
terras do cacau: alforrias e família escrava (São Jorge dos Ilheos, 1806-1888) Dissertação (Mestrado em
História). FFCH-UFBA, Salvador, 2014.
383
Sobre o assunto ver, entre outros, REIS, Isabel Cristina Ferreira dos. Histórias de vida familiar e afetiva de
escravos na Bahia do século XIX. Salvador: Centro de Estudos Baianos, 2001.; OLIVEIRA, Maria Inês Côrtes
de. Viver e morrer no meio dos seus: nações e comunidades de africanos no século XIX. Revista da USP, n. 28,
p. 174-193, dez./fev. 1995/1996.
384
APEB. Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Narciza da Roza Dora. Est. 02, Cx. 783, Maço 1250, Doc. 15, 23
de ago. 1851.
196

Carvalho Lessa385. Não conseguimos saber o paradeiro dos filhos de Bonifácia, talvez o mais
novo tivesse acompanhado a mãe, e a outra sido separada, mas o documento nada informa
sobre o assunto.
No inventário do negociante Joaquim José da Costa Seabra consta que a escrava Cora,
moça, africana de nação nagô, avaliada em Rs. 1.000$000, foi doada para Manoel José
Spinola Bitencourt386. Em 1862 a escrava Eugênia, de 35 anos, trabalhava na Fazenda de
cacau denominada Jacarandá, onde eram cultivados 3 mil cacaueiros. Após a morte do
proprietário desta fazenda, João Mendes Coelho, a escrava foi a leilão para pagamento das
dívidas, pelo valor de Rs. 800$000. No final do processo de partilha consta que ela foi
arrematada por Rs. 500$000, talvez devido ao seu estado de saúda “doente, atacada de calor
de fígado387.
Tereza, escrava de Manoel Pereira dos Santos, negociante, dono da Fazenda Tapera,
tinha 14 anos de idade quando seu proprietário faleceu, em 1865. Tal escrava foi descrita
como “sabe cozer e costurar”388, e foi dada em dote de casamento à filha do casal, Joana
Laura dos Santos389.
Existem vários exemplos semelhantes, e chama a atenção a quantidade de crianças
escravas, do sexo feminino, descritas como “do serviço doméstico”. Computando-se os
ofícios dos 829 cativos declarados nos inventários post mortem de Ilhéus, verificamos que a
maioria dos casos não contém esse tipo de informação, outra parcela expressiva se refere a
escravos e escravas “do serviço de lavoura”, seguindo por aqueles “do serviço doméstico,
como se pode ver no Gráfico 5.2.

385
Ibidem.
386
APEB. Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Joaquim José da Costa Seabra. Est.08, Cx.3424, Maço n/c, Doc.
06, 17 de set. 1856.
387
APEB. Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. João Mendes Coelho. Est.02, Cx.784, Maço 1251, Doc.13, 10 de
out. 1862.
388
APEB. Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Manoel Pereira dos Santos. Est. 09, Cx. 3901, Maço n/c, Doc.19,
16 de mar. 1865.
389
Ibidem.
197

Gráfico 5.2 – Distribuição dos principais ofícios dos escravos inventariados.


Ilhéus, 1850-1888
0%
0%
1% 1%
Sem informação
5%
Serviço de lavoura
27%
Serviço doméstico
66% Carapina
Alambiqueiro
Pedreiro
Outros ofícios *

Fonte: APEB, SJ, 121 processos de Inventários. Ilhéus, 1850-1888.


(*) Marinheiro, padeiro, carreiro, mestre de açúcar, oficial de ferreiro.

Entre os 220 escravos dos serviços de lavoura notamos acentuado equilíbrio de sexo,
111 masculino (50,5%) e a outra metade do sexo feminino. Ao que parece eles começavam a
trabalhar muito cedo nesse serviço, independente do sexo. Hugo do Nascimento, com sete
anos, e sua irmã, Eugênia, com nove, foram os cativos que encontramos com a menor idade
neste ofício. Ambos eram crioulos, filhos da escrava Romana, e trabalhavam no Engenho
Itaípe em 1875, quando a esposa do proprietário faleceu390.
Entre os 39 escravos descritos como do serviço doméstico encontramos casos de
lavadeira, cozinheira, engomadeira e costureira, porém, a maioria foi descrita simplesmente
como “do serviço doméstico”, sem especificações. Entre estes percebemos que a grande
maioria era do sexo feminino, 33 casos, 85% da categoria. Alice, por exemplo, era uma
criança escrava de 10 anos, irmã de Hugo do Nascimento e Eugênia, filhos de Romana que
também vivia como escrava no Engenho Itaípe, entre as cativas Alice foi a mais nova que
encontramos no ofício de doméstica391.

390
APEB. Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Maria da Piedade Melo e Sá. Est. 02, Cx. 781, Maço1248, Doc.
03, 12 de jul. 1876.
391
Ibidem.
198

Ao todo viviam como escravos no Engenho Itaípe 48 pessoas, isso no ano de 1876,
quando foi aberto o inventário da família392. A maioria dos escravos era do serviço de lavoura
(15), seis do serviço doméstico, dois carapinas, dois pedreiros, um alambiqueiro e nove sem
informação alguma sobre o ofício. A mãe das referidas crianças, a escrava Romana do
Nascimento, foi descrita como parda, 33 anos, solteira, do serviço doméstico, avaliada em Rs.
1.000$000 e os seus filhos, cada um por Rs. 350$000393.
Outro exemplo é o de Januária, criança de 10 anos de idade, que provavelmente foi
separada da família e vivia como escrava na Fazenda Tabocas, em 1873, quando foi aberto o
inventário de Manoel Francisco Dunda, dono da fazenda. Nos autos do processo Januária foi
descrita como cabra, do serviço doméstico, avaliada na quantia de Rs.600$000394.
Narcisa tinha 10 anos em 1872 e vivia como escrava na Fazenda Retiro, junto com sua
irmã Herculana (14 anos) e sua mãe Limoa (36 anos). Todas descritas como pretas, do serviço
de lavoura, com boa saúde, a filha mais nova avaliada em Rs. 500$000, a mais velha em Rs.
1.000$000 e a mãe em Rs. 600$000. Nesta mesma fazenda, propriedade de Manoel Cardoso
da Silva, também viviam Delmira e seus dois filhos de seis anos, Julia e Joaquim, descritos
como fula, de lavoura e com boa saúde. A mãe, na época com 27 anos, foi avaliada em Rs.
800$000, a menina em Rs. 300$000 e o menino em Rs.250$000.395

***

Esse capítulo abordou a presença das escravas em Ilhéus durante a segunda metade do
século XIX, período de crescimento do cultivo do cacau. A proporção considerável de
mulheres e crianças na população cativa indica que a família escrava e a reprodução natural
dos cativos foram características marcantes da escravidão que se desenvolveu naquela
localidade.

392
Ibidem.
393
Ibidem.
394
APEB. Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Manoel Francisco Dunda. Est. 02, Cx. 737, Maço1202, Doc. 18
18 de fev. 1873.
395
APEB. Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Manoel Cardoso da Silva. Est. 02, Cx. 737, Maço1205, Doc. 04,
19 de nov. 1872.
199

A maioria das escravas era solteiras, grande parte envolvida com a criação dos filhos.
Entre as 182 escravas nesta condição computamos o total de 373 filhos menores (escravos e
ingênuos), perfazendo uma média de 2 filhos por escrava. Entre as casadas a média chegou
2,8 filhos, números bem acima da média de outras localidades. Em Salvador (1851-1860), por
exemplo, as mães solteiras escravas tinham médias de filhos inferiores às de Ilhéus. Segundo
Katia de Queirós Mattoso,

A maioria das mães solteiras tem apenas 1 filho (64,2%) e 38,5% delas são
nascidas no Brasil [...]. Recorde-se que, em média, as mães solteiras libertas
na Bahia têm 1,9 filhos, enquanto as mães solteiras livres alcançaram a
média de 1,7. Para as mulheres nagôs a média é de 1,6; para as africanas e as
brasileiras respectivamente 1,5 e 1,4.”396

As escravas de Ilhéus desenvolveram relações afetivas com pessoas de diversas


condições sociais, e o fato de serem classificadas como solteiras não significa ausência de
família. Vários estudos demonstraram a predominância de uniões ilegítima entre os cativos do
Brasil, ressaltando as dificuldades de acesso ao casamento na Igreja, como o pagamento pelas
cerimônias, a distância em relação à paróquia, a indisposição dos senhores, e outras questões
que influenciaram da definição das relações familiares dos escravos397.
Muitas escravas de Ilhéus viviam e trabalhavam longe da vila, distante da Igreja
matriz. Em muitas ocasiões os deslocamentos deviam depender da disposição e boa vontade
dos senhores. De todo modo, esse capítulo demonstrou que elas foram protagonistas não
apenas na família, na escolha dos parceiros e no tipo de relação que desenvolveram, mas
também na economia, trabalhando em várias atividades.
As escravas trabalhavam nos engenhos, cuidavam do canavial, das plantações de
mandioca e outras culturas e nos serviços domésticos. Além da produção de açúcar e
aguardente os engenhos tinham criações de animais, casas de farinha e outros móveis que
396
MATTOSO, Kátia M. de Queirós. Família e sociedade na Bahia do século XIX. São Paulo: Corrupio, 1988.
p. 114-115.
397
Ver, entre outros, COSTA, Iraci del Nero da.; SLENES, Robert W.; SCHWARTZ, Stuart B. A Família
escrava em Lorena (1801). In: LUNA, Francisco Vidal; COSTA, Iraci del Nero da.; KLEIN, Herbert S.
Escravismo em São Paulo e Minas Gerais. São Paulo: EDUSP. Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2009.
p. 519-570; MOTTA, José Flávio & MARCONDES, Renato Leite. “A família escrava em Lorena e Cruzeiro
(1874)”. População e família. São Paulo: Humanitas, CEDHAL, FFLCH/USP, n. 3, p. 93-128, 2000.
200

exigiam cuidados permanentes com limpezas. As escravas trabalhavam em todos serviços, na


cozinha da casa grande, no cuidado com a criação dos filhos dos senhores e com os filhos da
senzala.
Ademais, muito provavelmente as mulheres escravas foram importantes na
disseminação das mudas de cacaueiros pelas fazendas, roça e sítios instalados no território da
comarca de Ilhéus, visto que a planta exige cuidados especiais durante mais ou menos três
anos até se tornar frutífera, assim, muitos cacaueiros devem ter recebido cuidados das
escravas.
Nesses espaços elas conseguiram criar os filhos e acumularam pecúlio, resgatando
parentes do cativeiro por meio da cobra da alforria. A escravidão não retirou a capacidade das
mulheres escravas desenvolverem habilidades, tanto no sentido da criação dos filhos quanto
no que diz respeito à exploração dos recursos naturais dos espaços em que estavam inseridas,
criando alternativas econômicas para si e para suas famílias. A pesca, a mariscagem, a
exploração de fibras vegetais, a arte de costurar e preparar comidas, dentre outras habilidades,
influenciaram a vida dessas mulheres e contribuíram para o desenvolvimento da economia de
Ilhéus.
Elas conjugaram o trabalho escravo com a criação dos filhos no eito e nos espaços
urbanos, produziram mercadorias que aumentaram a riqueza de seus senhores e conviveram
com o risco iminente de serem vendidas, terem filhos doados e membros da família
separados.
No próximo capítulo abordamos a vida material dos inventariados, revelando
características das casas, dos móveis, das canoas, das ferramentas e equipamentos de trabalho,
bem como da criação de animais. Assim, o próximo capítulo contém informações que
permitem ampliar o entendimento sobre a vida e os espaços de trabalho das escravas e dos
cativos de madeira geral.
201

CAPÍTULO VI
O CACAU NO TEMPO DAS CANOAS, DOS CARROS DE BOI E DO TRABALHO
ESCRAVO. ILHÉUS, 1850-1888

6.1 - Introdução

Durante a segunda metade do século XIX a economia de Ilhéus se dinamizou e a


lavoura cacaueira se expandiu pelo interior da mata atlântica, sobretudo pelas margens dos
rios, riachos e ribeirões espalhados na mata. Nesse capítulo vamos analisar os imóveis, os
bens móveis e os animais declarados nos inventários post mortem de Ilhéus para
averiguarmos a estrutura de produção da economia e alguns aspectos da vida material da
população. Queremos saber o que esses bens revelam sobre o funcionamento da economia, se
mostram a existência de uma estrutura interna dinâmica, relacionada com a produção,
transporte e comercialização de cacau e outras mercadorias.
O estudo dos imóveis, por exemplo, pode revelar os tipos de construções e os preços
de avaliação, as edificações relacionadas com a produção de cacau, café, açúcar, cachaça e
farinha de mandioca. Avaliar a proporção dessas construções entre os inventariados pode
indicar os setores da economia que estavam se destacando naquela época. Ademais, podemos
comparar algumas nas habitações dos moradores e tentar relacionar tais diferenças com as
atividades econômicas dos inventariados.
Investigar os bens móveis também ajuda no entendimento de vários aspectos
econômicos. Os inventários contêm descrições detalhadas dos móveis de casas e da lavoura,
dentre outros objetos. Assim, podemos conhecer os principais equipamentos de trabalho dos
escravos, as ferramentas, os móveis dos engenhos e da lavoura cacaueira, bem como os
gêneros das casas de negócio e seus preços. Destarte, podemos avaliar se houve mudanças no
patrimônio das famílias com relação aos utensílios domésticos, adereços pessoais, como joias
de ouro e prata, dentre outros artigos que revelam alguns aspectos íntimos da vida dos
moradores de Ilhéus no período 1850-1888.
Por fim estudamos os animais para conhecermos quais os grupos que se destacaram
nos inventários, o que pode revelar muito sobre o ritmo e a dinâmica dos transportes das
202

mercadorias durante a expansão do cultivo do cacau. Queremos saber se nessa época havia
tropas de muares nas fazendas, se esses animais eram utilizados para transportar cacau e
outras mercadorias ou se ainda não existia animais de cargas.
A nossa hipótese é que na segunda metade do século XIX a economia de Ilhéus estava
se estruturando com relação ao desenvolvimento da economia cacaueira. Numa época de
escassez de transportes mecanizados e precariedade das estradas, o uso das canoas e dos
carros de boi marcou a primeira fase da disseminação da cultura do cacau (1850-1888).
Outrossim, a maioria dos produtores deste fruto habitavam moradias simples e não tinham
muitos recursos para adquirir animais, sendo mais comum o uso de canoas entre eles. As suas
casas de morada não eram dotadas de muitos móveis e normalmente eles não tinham casas de
beneficiar cacau.
Por outro lado, acreditamos que os grandes escravistas, donos de engenho, negociantes
e produtores de cacau viviam em moradias mais sofisticadas, suas casas eram dotadas de
utensílios domésticos e móveis, normalmente eles tinham animais em suas propriedades,
casas para beneficiar cacau, casas de farinha e outros bens que os diferenciava da maioria dos
inventariados.
Para abordar esse assunto selecionamos nos inventários post mortem de Ilhéus os
registros correspondentes aos imóveis, bens móveis e aos animais. Cada grupo será abordado
individualmente, mas desdobramos os itens que compõe cada um, a fim de aprofundar suas
particularidades e evidenciar as nuances relacionadas com a expansão da lavoura cacaueira, o
trabalho escravo e a economia.
203

6.2 - Os imóveis nos inventários

Os imóveis declarados nos inventários post mortem de Ilhéus compõe um grupo com
diversos tipos de edificações e construções. O mais comum foi a descrição de casas de taipas
cobertas de palha, muitas localizadas na costa marítima, outras nas margens de rios, riachos e
ribeirões e na área urbana, no território da vila, onde as casas com paredes de pedra e cal,
cobertas de telhas, algumas assoalhadas, sobrados e casas de negócios, eram mais frequentes.
Em Ilhéus, assim como em outras partes do Brasil, as pessoas se diferenciavam não só
pelo número de escravos que possuíam, mas também pelo tipo de moradia que habitavam.
Normalmente os menos abastados eram donos de apenas um imóvel e residiam em
moradias simples, com repartimentos de no máximo dois cômodos, quarto e sala e sem muitos
móveis. A estrutura era de varas de madeiras e os vãos das paredes tapados com argila,
retirada do leito dos rios, com coberturas de palha, proveniente dos coqueiros existentes na
costa marítima.
Foram, principalmente, pessoas que residiam em moradias desse tipo que
disseminaram o plantio do cacau pelo território da comarca de Ilhéus, espalhando as
plantações nas proximidades dos rios, formando as primeiras roças de cacaueiros.
Os grupos mais privilegiados economicamente tinham mais de um imóvel, podiam ter
moradia nos sítios e fazendas e na vila, na rua do porto, na rua da igreja matriz, na rua do
colégio, entre outras. As construções eram diversificadas, muitos tinham casas de negócio e
suas moradias eram dotadas de móveis e utensílios domésticos diversificados.
Além das casas de morada existiam construções com várias finalidades. Investigar
esses imóveis ajuda a entender o contexto socioeconômico de Ilhéus no período de
disseminação do cultivo do cacau. Queremos saber se existiam muitas casas de beneficiar
cacau ou não, qual a importância desses imóveis naquele contexto, a quantidade de casas de
farinha e engenhos, dentre outros imóveis descritos nos inventários de Ilhéus que permitem
avaliar a importância do processamento das culturas, bem como as diferenças entre as
moradias dos habitantes da localidade no período assinalado. Inicialmente delimitamos os
inventários com presença de imóveis para sabermos a proporção deles no conjunto dos
204

processos investigados ao longo das décadas. O Gráfico 6.1 apresenta o resultado dessa
distribuição.

Gráfico 6.1 – Distribuição dos inventários segundo a presença de imóveis.


Ilhéus, 1850-1888
140
120
Nº DE INVENTÁRIOS

100
80
60
40
20
0
1850-1859 1860-1869 1870-1879 1880-1888
TÍTULO DO EIXO

Com imóveis Sem imóveis


Fonte: APEB, SJ. 333 inventários. Ilhéus, 1850-1888.

De acordo com o Gráfico 6.1 a maior parte dos processos investigados apresentou
algum tipo de imóvel entre os bens declarados. Do total de 333 inventários constatamos que
261 (78,3%) era de pessoas ou famílias que possuíam algum imóvel. Inclui-se no conjunto
destes bens propriedades como a de Felipe Benicio Mendes, lavrador de cacau, dono de “uma
morada de casa coberta de palha, no lugar coronel, distrito de Almada, tão estragada que os
avaliadores não lhes deram valor algum”398, até imóveis como os de Dona Helena Lavigne
Schaum, que quando faleceu em 1885 possuía, além de quatro escravos e outros bens, “uma
casa sita a rua direita do porto, com todos os utensílios para padaria, inclusive armação,
avaliada em um conto e seiscentos mil réis”; “outra casa velha, na rua que vai para São
Sebastião, por duzentos mil réis”; e “um quinhão em uma casa com frente para a rua direita
do porto e para a de São Sebastião, em comum com os herdeiros deste inventário, por
duzentos mil réis”399.

398
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Felipe Benício Mendes. Ilhéus, Est. 02, Cx. 753, Maço 1219, Doc. 04,
28 de jun. 1879.
399
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Helena Lavigne Schaum. Ilhéus. Est. 02, Cx. 761, Maço 1227, Doc. 12,
05 de jun. 1885.
205

Para dar conta dessa diversidade agrupamos os imóveis em seis tipos diferentes, de
acordo com a função e a frequência dos registros no Banco de dados, a saber: casas e
sobrados; casas de farinha; engenhos e engenhocas, casas de beneficiar cacau; casas de
negócios e outros imóveis. A Tabela 6.1 apresenta o resultado da distribuição global dos
registros de imóveis no período 1850-1888. A primeira coluna, da esquerda para direita,
apresenta os tipos de imóveis, em seguida o número e o percentual dos registros referentes a
cada um deles, a localização (rural/urbana) e os preços correspondentes.

Tabela 6.1 – Distribuição dos registros de imóveis nos inventários. Ilhéus, 1850-1888
Registros de imóveis nos Total de Soma dos Preços dos
Rural Urbano
inventários registros imóveis
TIPOS DE IMÓVEIS Nº % Nº % Nº % (em réis) %
Casas e sobrados 234 57,2 175 42,8 409 60,2 226.818,000 65,0
Casas de farinha 113 100,0 - - 113 16,7 9.832,073 2,8
Engenhos e engenhocas 36 100,0 - - 36 5,3 41.578,774 12,0
Casas de beneficiar cacau 37 100,0 - - 37 5,4 6.082,000 1,7
Casas de negócio 20 43,5 26 56,5 46 6,8 36.418,600 10,5
Outros Imóveis * 37 97,4 1 2,6 38 5,6 27.711,000 8,0
TOTAL 477 70,2 202 29,8 679 100,0 348.440,447 100,0
Fonte: APEB, SJ. Ilhéus, 261 processos de inventários, 1850-1888.
(*) Senzalas, telheiro p/ canoas, serrarias, ranchos, sítios, olaria, tanques etc.

Os dados da Tabela 6.1 evidenciam que o mais comum foi a descrição de casas e
sobrados, correspondendo este grupo a 60,2% do total dos registros referentes a imóveis, com
certo equilíbrio na localização dos mesmos, 57,2% na zona rural e 42,8% na área urbana.
Estão incluídas nesse grupo as construções que eram utilizadas, na maior parte das vezes,
como habitação, a maioria dos registros refere-se explicitamente às casas de morada (49%),
outros imóveis foram descritos apenas como casa, sem mencionar se eram de morada (45%),
a menor parte refere-se a sobrados (2,8%), lanço de casa (1%) e o restante, (2,2%), são
habitações que consorciavam casa de morada e de fazer farinha ou casa de morada e negócio
juntas.
No geral os sobrados eram mais valorizados que as casas. Apesar de numericamente
inferiores, eles responderam por 15% do total de Rs.226.818$000 alocados no grupo. Essas
206

construções pertenciam a comerciantes e donos de engenho, sendo que o sobrado que obteve
maior preço de avaliação pertencia ao negociante José Lopes da Silva

um sobrado, obra de alvenaria, na rua do porto, com 12 metros e 40 cm de


frente, tendo nesta 3 portas e duas janelas na loja, e 5 janelas no primeiro
andar, em terrenos foreiros, limitando-se pelo lado do sul com casa de dona
Paulina kahene de Sá, e pelo lado do norte com terreno ocupado por um
princípio de edificação pertencente ao inventariado, avaliado na quantia de
seis contos e quinhentos mil réis400.

A valorização dos imóveis dependia de muitos fatores. Além do estado de


conservação, da estrutura e da cobertura das construções, o tipo de terreno em que se
localizava também influenciava nos preços. Encontramos edificações construídas em terrenos
próprios, em terrenos foreiros e em terras de marinha, mas nem sempre essas informações
aparecem.
As casas de farinha, apesar de concentrarem apenas 2,8% dos investimentos em
imóveis, ocupam o segundo lugar em ordem de importância numérica, abrangendo 16,7% do
total de registros. As situações dessas casas também variaram muito. O produtor de cacau
Manoel Antônio Lisboa, por exemplo, possuía entre seus bens uma casa de farinha tendo
apenas roda e alguidar, descrita como sem valor algum401. Já a casa de farinha da Fazenda
Itariri, como 18 escravos e 15.100 cacaueiros, era coberta de telha, com dois alguidares de
ferro, roda movida por água, prensa e mais pertences, e foi avaliada em Rs. 170$000 no ano
de 1878402.
Nem sempre todos os móveis das casas de farinha foram descritos e, às vezes, eles
foram avaliados separadamente. Estão incluídas no grupo todas as casas de farinha arroladas
nos inventários junto com seus móveis. Porém, não incluímos entre os donos de casas de
farinha os casos de pessoas que tinham apenas alguns móveis relacionados com a essa
atividade, como aconteceu, por exemplo, com Manoel Rodrigues de Brito, morador de

400
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Manoel Antônio Lisboa. Est. 02, Cx. 760, Maço 1226, Doc. 04,
10 de ago. 1888.
401
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Manoel Antônio Lisboa. Est. 03, Cx. 1270, Maço 1739, Doc. 11,
20 de ago. 1863.
402
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Maria Lavigne. Est. 02, Cx. 750, Maço 1216, Doc. 09, 23 de set.
1878.
207

Itabuna, que não tinha casa de farinha, mas possuía, entre outros bens, “uma roda de ralar
mandioca bastante velha, com seu competente cobre um tanto estragado, avaliada em
Rs.12$000”403.
A existência de vários casos como o de Manoel Rodrigues, junto com o expressivo
número de casas de farinha entre os inventariados, atesta que essa atividade estava
disseminada na população. Se tomarmos como referência o total de 333 processos
investigados notamos que pelo menos um, em cada três inventariados, estava envolvido com
esta atividade. A maioria dos homens que trabalhavam no cultivo do cacau normalmente
morava em casas de taipas cobertas de palha e frequentemente se dedicavam à produção de
farinha de mandioca para subsistência.
Na maioria das vezes cada proprietário era detentor de apenas uma casa de farinha,
com diferenciações relacionadas mais com a estrutura e acessórios dessas casas do que com a
quantidade de imóveis possuídos. As rodas de ralar mandioca, por exemplo, podiam ser
movidas a água, a mão ou em roda de fieira, o que certamente influenciava na velocidade da
produção, interferindo assim nos preços desses imóveis.
As casas e sobrados, junto com as casas de farinha, respondem por 76,9% dos
registros de imóveis e concentraram 67,8% dos investimentos alocados neste tipo de bem.
Assim, temos que a maioria dos imóveis declarados nos inventários de Ilhéus referia-se às
casas de morada e às casas de farinha, quiçá ambas as coisas juntas. Eliza Ferreira Alves
Brasil, por exemplo, possuía entre seus bens “uma casa de morada feita de taipa, coberta de
palha, onde faz farinha com os mais acessórios deste trabalho, avaliada em duzentos mil réis,
Rs. 200$000”404.
Avaliando agora o grupo de engenhos e engenhocas, formado por imóveis
relacionados com a produção de açúcar e aguardente de cana (cachaça), notamos que eles
abrangeram 5,3% dos registros, mas concentrou 12% do total de investimentos alocados em
imóveis. A maioria referia-se explicitamente aos engenhos e seus móveis (61%), outros às
casas de engenhoca e acessórios, incluindo alguns alambiques (39%), sendo que algumas

403
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Manoel Rodrigues de Brito. Est. 02, Cx. 783, Maço 1250, Doc.
10, 12 de maio 1855.
404
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Eliza Ferreira Alves Brasil. Est. 02, Cx. 785, Maço 1252, Doc.
03, 22 de out. 1866.
208

engenhocas também fabricavam farinha, todos em condições de uso e situações diversas. Os


primeiros (engenhos) concentraram 95% dos investimentos no grupo. Vale ressaltar que não
incluímos na avaliação os tachos de cobre, formas, espumadeiras e outros acessórios do tipo,
que serão tratados no grupo dos bens móveis, abordados em outra seção, contudo, em alguns
casos a avaliação foi realizada em conjunto, não sendo possível tal separação.
A casa do Engenho Castelo Novo, por exemplo, foi a que recebeu o maior preço de
avaliação “[...] a casa de fabricar açúcar com seu pé de moenda, cilindro, roda, bisame, levado
e tanque, tudo na quantia de nove contos de réis”405.
A casa do Engenho União foi descrita da seguinte forma,

um engenho de fabricar açúcar e aguardente com todos os seus


pertences, constante de dois alambiques, usados, cinco caixões usados,
uma tina, quatro tachos, uma espumadeira, um bueiro, uma roda e pé
de moenda, caboto, casa de engenho e tachos, quatro dorna, dezessete
quartolhas, nove ditas pequenas, um tendal, dois balcões para secar
açúcar, 97 formas de zinco, uma casa de purgar, um braço de balança,
quatro alavancas, três canos grandes velhas, três ditas pequenas, três
tarefas de cerca, tudo na quantia de seis contos e trinta e sete mil
réis406

Esses tipos de descrições comprometem a avaliação dos engenhos e dificulta, ou


inviabiliza, comparações.
Com relação às casas de beneficiar cacau, que respondem por 5,4% dos registros,
normalmente elas eram descritas como casas com balcões para fermentar e/ou secar cacau. A
Fazenda Ermo Nobre, por exemplo, possuía “uma casa com três balcões para secar cacau,
avaliada em oitenta mil réis, Rs. 80$000407. Às vezes essas casas se diferenciavam pelo tipo
de cobertura, podendo ser de palha ou de telha, com variações nas quantidades de balcões e na
condição deles (pequenos, grandes, novos, estragados). A casa de beneficiar cacau que

405
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Maria José Leola Del Rey e Carolina Leola Del Rey. Est. 02, Cx.
786, Maço 1253, Doc. 06, 28 de fev. 1861.
406
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Alferes José Antônio de Guimarães Bastos. Est. 02 Cx. 738,
Maço 1203, Doc. 12, 10 de fev. 1875.
407
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Luiza Amélia Vaill Benevides. Est. 02, Cx. 740, Maço 1205,
Doc. 07, 17 de jul. 1871.
209

alcançou o preço mais alto estava na Fazenda Olandi, propriedade de Aristides Francisco de
Vasconcelos Gusmão, negociante, que possuía, entre outros bens, “uma casa coberta de telha
com balcões para secar cacau, avaliada na quantia de um conto de réis”408. Entre os 333
inventários analisados encontramos apenas 37 casas de beneficiar cacau, que começaram a
aparecer com mais frequência da documentação a partir da década de 1870.
As casas de negócios, embora tenham representado apenas 6,8% dos registros de
imóveis foram responsáveis por concentrar 10,5% dos investimentos neste tipo de bem. Não
incluímos nas avaliações os gêneros comercializados nessas casas, itens inclusos no grupo dos
bens móveis. Todavia, em alguns casos a avaliação foi realizada em conjunto, não sendo
possível separar os investimentos. No inventário de Adão Schaum, por exemplo, os
avaliadores descreveram, entre outros bens, “uma casa de taipa e frente de pedra e cal, em que
está a padaria, com todos seus pertences, avaliada na quantia de um conto e quatrocentos mil
réis, Rs. 1.400$000”409. Nessas situações, ainda que minoria, não é possível separar o preço
dos gêneros do valor individual do imóvel, pois a avaliação foi feita em conjunto.
A maioria dos registros referia-se a casas de negócio ou casas com balcões e/ou
armação para venda (78%), outros a armazéns/depósito (13%) e a minoria a casas de
arrecadação (9%). Não sabemos ao certo como funcionavam essas casas de arrecadação,
possivelmente serviam para cobrança de impostos, mas as descrições dos avaliadores não são
muito reveladoras. O tenente coronel Domingos Lopes da Silva, por exemplo, era negociante,
dono de várias propriedades em Ilhéus, inclusive “um quinhão na casa de arrecadação no
lugar denominado Banco, avaliado na quantia de cem mil réis” 410. O Major Bernardo
Sellmam, que foi presidente da Câmara Municipal, era negociante, com ligações comerciais
na praça de Salvador, dentre seus imóveis consta “uma casa que serve para arrecadação na
mesma fazenda, avaliada em oitenta mil réis”411.

408
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Aristides Francisco de Vasconcelos Gusmão. Est. 02, Cx. 762,
Maço 1228, Doc. 09, 30 de ago. 1886.
409
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Adão Schaum. Est. 02, Cx. 781, Maço 1248, Doc. 02, 05 de nov.
1877.
410
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Tenente Coronel Domingos Lopes da Silva. Est. 02, Cx. 759,
Maço 1225, Doc. 03, 10 de out. 1883.
411
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Major Bernardo Sellmam. Est. 02, Cx. 755, Maço 1221, Doc.
01, 11 de nov. 1881.
210

Por fim, temos o grupo denominado “outros imóveis”, que contempla as diversas
construções que aparecem esporadicamente nos inventários, nem por isso menos importantes.
De modo geral eles representam 5,6% dos registros e concentram 8% dos investimentos em
imóveis. Os registros mais frequentes referem-se às fazendas englobando os imóveis nela
existente (24%); senzalas (18%); telheiro para canoa (16%); serrarias (10,5%); sítio (10,5%);
rancho (8%) e outros (13%).
As fazendas eram descrições que incluíam vários bens juntos. O Tenente João Batista
Gualberto, por exemplo, morava na Cachoeira de Itabuna e seu inventário foi um processo de
arrecadação de bens, pois as dívidas passivas (a pagar) superavam o montante de sua fortuna,
assim, nas descrições constam, além de quatro escravos, “uma fazenda com plantação de
coqueiros e cacaueiros, uma pequena casa de morar coberta de palha, tudo em terrenos
próprios, no lugar denominado Velozo”412. Dentro do grupo de “outros imóveis” as fazendas
concentraram 47% dos investimentos.
As senzalas, se comparadas aos demais imóveis, eram construções que aparecem com
preços baixos nos inventários post mortem de Ilhéus. As quinze senzalas de morada dos
escravos do Engenho Castelo Novo foram avaliadas em quarenta mil réis, Rs. 40$000413. As
nove senzalas do Engenho Itaípe, descritas como arruinadas, foram avaliadas em Rs.
50$000414. O Major Joaquim José de Oliveira, produtor de cacau com fazenda na Cachoeira
de Itabuna, possuía 22 escravos quando faleceu em 1875, sendo que as senzalas da sua
fazenda foram descritas como arruinadas415.
Dentre os demais imóveis as serrarias se destacaram em termos de investimentos.
Embora pouco frequentes, esses imóveis tinham muita importância para a economia, pois
eram responsáveis pelo corte e beneficiamento das madeiras. Já demonstramos nos dois
primeiros capítulos da tese a exploração de madeiras em Ilhéus, com participação destacada

412
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Tenente João Batista Gualberto. Est. 02, Cx. 737, Maço 1202,
Doc. 22, 30 de mar. 1874.
413
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Maria José Leola Del Rey e Carolina Leola Del Rey. Est. 02, Cx.
786, Maço 1253, Doc. 06, 28 de fev. 1861.
414
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Maria da Piedade Melo e Sá. Est. 02, Cx. 781, Maço 1248, Doc.
03, 12 de jul. 1876.
415
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Major Joaquim José de Oliveira. Est. 02, Cx. 749, Maço 1215,
Doc. 07, 30 de out. 1875.
211

dos negociantes nessa atividade, pagando imposto pelo direito de explorar madeiras, outras
pelo direito de exportá-las, sobretudo jacarandá416.
Os outros imóveis aparecem de modo esporádico na documentação. Às vezes constam
ranchos com imóveis inclusos, outras vezes mencionam-se construção de tanque, olaria,
viveiro e telheiros para canoas.

6.3 – Os bens móveis nos inventários

Os bens móveis compõem-se de uma variedade de objetos, equipamentos, dinheiro,


ouro, prata e outros gêneros e mercadorias diversas, que merecem investigação minuciosa,
muito importante para o entendimento da cultura material dos povos que viveram e
trabalharam em Ilhéus entre 1850 e 1888. As descrições dos avaliadores são ricas em
informações e bastante reveladoras dos preços dos produtos, bem como das mudanças nas
formas de investimento. Nessa seção vamos analisar esse assunto, sem a pretensão de esgotar
toda a potencialidade da fonte. O objetivo é entender e discutir alguns aspectos do mundo do
trabalho dos habitantes da localidade, e as possíveis mudanças que ocorreram ao longo do
tempo. Para isso dividimos os bens móveis em seis grupos, a saber: móveis das casas e
sobrados; móveis da lavoura; embarcações; ferramentas e equipamentos; gêneros da lavoura e
comércio; outros bens móveis.
A nossa hipótese é que na segunda metade do século XIX as canoas e os carros de boi
foram componentes importantes no processo de crescimento da lavoura cacaueira, que
começava a se afirmar na economia de Ilhéus. Já vimos que entre os inventários não foram
descritas muitas casas de beneficiar cacau, agora podemos investigar outros bens que
permitem entender a dinâmica da lavoura cacaueira no período assinalado.
Antes de iniciar as análises dos dados é importante delimitar os inventários com
presença de bens móveis, para sabermos a proporção deles no conjunto dos processos
investigados ao longo do tempo. O Gráfico 6.2 apresenta o resultado dessa distribuição.

416
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de Lançamento dos rendimentos relativos a direitos de madeira. Maço
5438. Ilhéus, 1862-1870; APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de Jacarandá. Maço
5443. Ilhéus, 1870-1879.
212

Gráfico 6.2 – Distribuição dos inventários segundo a presença de bens móveis.


Ilhéus, 1850-1888
140
120
Nº DE INVENTÁRIOS

100
80
60
40
20
0
1850-1859 1860-1869 1870-1879 1880-1888

Com móveis Sem móveis


Fonte: APEB, SJ. 333 inventários. Ilhéus, 1850-1888.

O Gráfico 6.2 mostra que a maioria dos processos investigados apresentou ao menos
um tipo de bem móvel, podendo ser móveis de casas e sobrados; ferramentas; equipamentos;
móveis da lavoura; gêneros do comércio, dentre outros. Do total de 333 inventários
constatamos que 64,5% possuíam alguns desses bens. Outra parte (35,5%) não possuía
nenhum destes, mas isso não significava que eles não tinham acesso aos mesmos.
O tipo mais comum de bens móveis foi o que classificamos como “móveis de casas e
sobrados”, que inclui, principalmente: cadeiras, mesas, cômodas, tamboretes, sofás, camas,
guarda roupas, armários, entre outros móveis semelhantes. Também incluímos nesta categoria
os utensílios domésticos e objetos/adereços pessoais, como por exemplo: panelas, candieiros,
oratórios, roupas, pulseiras, anéis, brincos, argolas etc.
O segundo item em ordem de importância numérica foram os bens móveis que
classificamos como “móveis da lavoura”, categorias que inclui, principalmente: móveis
relacionados com fabricação de açúcar/cachaça (tachos de cobres, espumadeira, bolandeira,
aguilhões de ferro para moendas etc.). Também incluímos neste grupo os móveis das casas de
farinha (alguidar, roda de ralar mandioca, prensa etc), bem como móveis destinados ao
213

beneficiamento de cacau, café e outros gêneros (moinho, balcões para secar cacau, roda de
ralar coco etc.), além desses também incluímos na categoria “móveis das lavouras” os carros
de bois, carroças, materiais de construção, moveis de serrarias etc. A diversidade é grande e
nossos agrupamentos não dão conta de todas particularidades.
O terceiro grupo de bens móveis que definimos foi classificado como “embarcações”,
incluindo, principalmente as canoas, e em menor proporção barcos e lanchas. O quarto grupo
de bens móveis foi denominado como “ferramentas e equipamentos”, grupo composto
principalmente por enxadas, machados, foices e facões. Outrossim, também incluímos neste
grupo equipamentos para animais (selim, cela, cangalha, bride etc.); equipamentos para pesca
(redes e tarrafas); dentre outros.
O quinto grupo foi classificado como “gêneros da lavoura e comércio”, no qual
incluímos, as arrobas de cacau e café colhidos, as madeiras extraídas, farinha já preparada
(torrada), feijão, arroz, inhames e, principalmente, os gêneros vendidos nas casas de negócio,
dentre outros bens semelhantes. O último grupo foi classificado como “outros bens móveis” e
inclui principalmente dinheiro, ouro, prata, armas e os bens não identificados devido ao
estado de conservação dos documentos.
Essas seis categorias pretendem explicar a dimensão dos bens móveis declarados nos
inventários post mortem de Ilhéus. Vamos analisar os investimentos alocados nesses grupos
para entendermos um pouco da importância deles no contexto socioeconômico da época.

Tabela 6.2 – Distribuição dos registros de bens móveis nos inventários.


Ilhéus, 1850-1888
Registros de bens móveis nos Total de Soma dos Preços dos
inventários Registros bens móveis
TIPOS DE BENS MÓVEIS Nº % (em réis) %
Móveis de casas e sobrados 710 46,4 11.710,820 6,7
Móveis das lavouras 197 12,9 7.048,980 4,0
Embarcações 174 11,4 17.880,597 10,3
Ferramentas e equipamentos 146 9,5 1.946,000 1,1
Gêneros do comércio e lavouras 74 4,8 48.192,378 27,9
Outros bens móveis * 230 15,0 86.617,772 50,0
TOTAL 1.531 100,0 173.396,547 100,0
Fonte: APEB, SJ. Ilhéus, 215 processos de inventários, 1850-1888.
(*) Dinheiro, ouro, prata, cobre, armas, objetos não identificados etc.
214

Os dados da Tabela 6.2 revelam aspectos importantes sobre a distribuição dos


registros dos bens móveis nos inventários de Ilhéus. Notadamente os móveis de casa e
sobrados foram os mais frequentes, 46,4% dos registros, porém a soma de seus preços
corresponde apenas a 6,7% dos investimentos. Os móveis da lavoura também foram
frequentes, 12,9% dos registros, entretanto, assim como as ferramentas e equipamentos, 9,5%
dos registros, esses bens não concentraram somas expressivas dos investimentos alocados
neste tipo de bem, sendo que os percentuais representam 4% e 1,1%, respectivamente.
A Tabela 6.2 revela ainda que a maior parte dos investimentos em bens móveis se
concentrou nos seguintes itens: “embarcações” (10,3%); “gêneros da lavoura e comércio”
(27,9%) e aqueles agrupados na categoria “outros bens móveis”, que concentrou (50%) dos
investimentos.
Entre as embarcações as canoas se destacaram em termos numéricos, mas as lanchas e
barcos eram mais valorizados. Os gêneros do comércio sobressaíram em relação aos da
lavoura e o dinheiro foi o principal item de valor da categoria “outros bens móveis”.
Isso não significa que todos inventariados tinham esses componentes em suas
riquezas. Tampouco significa que esses índices foram os mesmos durante todo o período
1850-1888. A Tabela 6.3 permite notar as variações que ocorreram ao longo do tempo.

Tabela 6.3 – Porcentagem dos investimentos alocados em bens móveis por


décadas. Ilhéus, 1850-1888
TIPOS DE BENS MÓVEIS 1850-1859 1860-1869 1870-1879 1880-1888
Móveis de casas e sobrados 15,6 3,9 12,1 8,1
Móveis das lavouras 4,6 4,0 8,4 3,1
Embarcações 49,2 6,5 12,0 9,7
Ferramentas e equipamentos 0,8 0,5 6,4 0,7
Gêneros do comércio e lavouras 27,1 22,0 41,0 33,0
Outros bens móveis * 2,7 63,1 20,1 45,4
TOTAL 100,0 100,0 100,0 100,0
Fonte: APEB, SJ. Ilhéus, 215 processos de inventários, 1850-1888.
(*) Dinheiro, ouro, prata, cobre, armas, objetos não identificados etc.
215

Os dados da Tabela 6.3 mostram que ao longo das décadas os tipos de bens móveis
que mais concentraram investimentos foram os “gêneros do comércio e lavouras” e aqueles
agrupados na categoria “outros bens móveis”, que inclui principalmente dinheiro.
Esse crescimento indica mudanças na forma de investimentos ao longo do tempo,
aparecendo aplicações financeiras e empréstimos a juros, que começam a surgir com maior
frequência a partir da década de 1870. O Alferes José Antônio de Guimarães Bastos, por
exemplo, dono do Engenho União e da Fazenda Caldeira, entre outros bens, possuía “cem
apólices da estrada de ferro denominada paraguassu, cada uma no valor de vinte libras
esterlinas, com entrada feita na importância de quatro contos, trezentos cinquenta e nove mil e
duzentos réis”417. Entre os bens declarados no inventário de Maria Lavigne, aberto em 1878,
constam, entre outros bens, “seis contos dados a prêmio de 5% ao ano em poder do
negociante Antônio Penha de Cardoso, da cidade da Bahia”418. No inventário de Manoel José
Vieira, morador da freguesia de Una, constam, entre outros bens “oitocentos mil réis de
dinheiro de apólices da Associação Perser Apolice Banca Brasileira” 419. Esses exemplos
ilustram as mutações que estão se processando nas formas de investimento e acumulação da
riqueza em Ilhéus.
Outro grupo que ao longo das décadas concentrou grande parte dos investimentos em
bens móveis foram os “gêneros do comércio e lavouras”. Os negociantes concentraram,
sobretudo, os gêneros do comércio, eles se abasteciam de mercadoria em Salvador e em
Ilhéus, vendendo diversos produtos em suas casas de negócio. Normalmente suas casas eram
mais mobiliadas, com quantidade maior de utensílios domésticos. Muitos eram escravistas,
alguns tinham barcos ou lanchas e suas fortunas eram privilegiadas entre os inventariados,
além disso possuíam ramificações familiares com donos de engenhos, alguns com balcões e
armação para negócio, entre eles havia também membros da guarda nacional, que ao longo de
suas vidas adquiriram patentes mais elevadas.

417
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Alferes José Antônio de Guimarães Bastos. Est. 02, Cx. 738,
Maço 1203, Doc. 12, 10 de fev. 1875.
418
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Maria Lavigne. Est. 02, Cx. 750, Maço 1216, Doc. 09, 23 de set.
1878.
419
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Manoel José Vieira. Est. 02, Cx. 761, Maço 1227, Doc. 05, 05
de jul. 1884.
216

Os negociantes diversificaram seus investimentos, comprando e vendendo cacau e


outros gêneros dos pequenos lavradores e oferecendo crédito à população, além de
empréstimos a juros. Provavelmente eles tinham acesso mais frequente às armas de fogo.
Ademais, a Câmara municipal controlava a venda de pólvora, por meio da cobrança de
420
impostos . Os negociantes pagaram muitos impostos para terem o direito de vender
mercadorias e exportar gêneros da lavoura, como foi demonstrado nos dois primeiros
capítulos da tese.
Um componente importante para a distribuição dessas mercadorias foram as canoas.
Encontramos o total de 166 canoas entre os 333 inventários investigados. Isso significa que a
cada dois inventariados pelo menos um tinha canoa. Estas eram de tamanhos e tipos de
madeira variados, além disso o valor delas dependia muito do estado de conservação.
Uma avaliação minuciosa dessas canoas implica em reconhecer todas essas nuances.
Vamos nos aproximar do assunto considerando os tipos de madeiras, mas cada canoa tinha
suas particularidades, que neste momento não temos a pretensão de aprofundar. A Tabela 6.4
apresenta a distribuição das canoas conforme os tipos de madeiras, entre elas constam
embarcações de vários tamanhos, em estado de conservação diverso.

Tabela 6.4 – Distribuição das canoas inventariadas. Ilhéus, 1850-1888


Canoas inventariadas Canoas Soma dos Preços Preços médios
TIPOS DE CANOAS Nº % (em réis) % (em réis)
Canoas de madeira 72 43,3 2.559,000 40,7 44,895
Canoas de madeira vinhático 49 29,5 2.187,000 34,8 47,543
Canoas de madeira putumujú 14 8,5 490,000 7,8 37,692
Canoas de madeira cedro 10 6,0 204,000 3,3 20,400
Canoas (outras madeiras) * 21 12,7 838,500 13,4 41,925
Total 166 100,0 6.278,500 100,0 43,003
Fonte: APEB, SJ. 94 inventários. Ilhéus, 1850-1888
(*) Jacarandá, oiticica, pique, jueirana, louro, jequitibá; tapinhoam

420
APEB, SCP. Livro de imposto sobre vendagem de pólvora e fogos de artifício. Maço 5454. Ilhéus, 1862-
1890.
217

Os dados da Tabela 6.4 indicam que o tipo mais comum foi a descrição de canoas de
madeira, sem especificar a origem (43,3%). Outra categoria frequente foi de canoas de
madeira vinhático (29,5%); putumujú (8,5%); cedro (6,0) e outras madeiras (12,7%),
incluindo nesta última categoria as canoas de madeira jacarandá, oiticica, pique, jueirana,
tapinhoam e louro.
Percebe-se a variedade de madeiras que servia para a fabricação de canoas.
Normalmente cada inventariado tinha uma canoa, mas algumas propriedades tinham mais. Na
Fazenda Santa Cruz, por exemplo, localizada na Cachoeira de Itabuna, havia quatro canoas
em 1849: uma grande de vinhático (Rs. 10$000); uma de cedro (Rs. 18$000); uma canoa
pequena de louro, arruinada, sem valor algum e outra de vinhático por Rs. 2$000. Entre os
bens desta fazenda encontramos plantação de cacau, produção de farinha, além de sete
pessoas escravizadas, crioulos e africanos, que certamente transportavam o cacau e outras
mercadorias pelo rio Cachoeira, que ligava o distrito de Itabuna ao porto de exportação de
Ilhéus421.
Outros exemplos semelhantes podem ser encontrados entre os negociantes e donos de
engenho, que também eram escravistas e utilizavam canoas e outras embarcações no
transporte de suas mercadorias pelos caminhos fluviais e pela costa marítima. Joaquim José
da Costa Seabra, por exemplo, tinha dois escravos com ofício de marinheiro: Pedro, crioulo
de 35 anos de idade, avaliado em Rs. 1.200$000 e Antônio, crioulo de 28 anos, avaliado em
Rs. 1.000$000. Ademais, este negociante possuía um barco, denominado Oriente, avaliado
em Rs. 3.000$000 e três canoas, todas por Rs. 105$000, entre outros bens avaliados em seu
inventário, aberto em 1856, por ocasião da sua morte422.
Em 1861 o Engenho Castelo Novo possuía duas canoas grandes, cada uma avaliada
em Rs.100$000, sendo que neste engenho trabalhavam como escravos 54 pessoas, entre
crioulos e africanos, adultos, idosos e crianças, de ambos os sexos. Este engenho tinha

421
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. João Segismundo Cordier. Est. 08, Cx. 3424, Maço n/c, Doc. 06,
25 de maio 1849.
422
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Joaquim José da Costa Seabra. Est. 08, Cx. 3424, Maço n/c,
Doc.06, 17 de set. 1856.
218

plantação de cacau, produzia açúcar, cachaça, farinha e tinha balcão com armação para
negócio423.
Outros exemplos como estes podem ser citados para ilustrar a importância das canoas
na economia cacaueira, bem como a participação do trabalho de crioulos, africanos e
indígenas nessas embarcações, transportando cacau, café, cachaça, farinha e outras
mercadorias. É oportuno lembrar da intensa exploração de madeira em Ilhéus nessa época,
sendo comum extração de paus de cedro, jacarandá e paus de jangada. 424 Essa atividade era
lucrativa e dela participaram diversos grupos sociais, em posições diferenciadas. Os grupos
escravizados deviam trabalhar no corte e beneficiamento das madeiras, que eram entregues ou
vendidas aos negociantes, que pagavam imposto pelo direito de praticar a atividade, com
vistas à exportação ou abastecimento interno.
Encontramos serrarias entre os bens inventariados em Ilhéus nesse período, embora
com baixa frequência. Elas tinham importância para a economia e nelas também trabalhavam
escravos. No Engenho Itaipe, por exemplo, onde viviam 44 pessoas escravizadas,
encontramos, entre outros bens, “uma máquina para serrar madeiras com todos os seus
pertences, avaliada na quantia de um conto e cem mil réis”425. No inventário do negociante de
madeira Manoel Brígido da Silva, morador da povoação de Una, dono de dois escravos,
encontramos, entre outros “uma máquina de serrar madeira, nova, com todos os seus
acessórios, avaliada na quantia de dois contos e duzentos mil réis”426. Na Fazenda Bom
Sucesso, onde trabalhavam como escravos onze pessoas, consta, entre outros bens “uma serra
d`água com tanque, avaliada na quantia de dois contos de réis”427
Esses exemplos mostram o alto valor que as serrarias tinham naquele contexto. Poucas
pessoas tinham serrarias ou serras para beneficiar madeiras. Assim, os donos desses

423
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Maria José Leola Del Rey e Carolina Leola Del Rey. Est. 02, Cx.
786, Maço 1253, Doc. 06, 28 de fev. 1861.
424
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de Lançamento dos rendimentos relativos a direitos de madeira. Maço
5438. Ilhéus, 1862-1870. Sobre o assunto ver, entre outros, DIAS, Marcelo Henrique. Farinhas, madeiras e
cabotagem: a capitania de Ilhéus no antigo sistema colonial. Ilhéus: Editus, 2011.
425
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Maria da Piedade Melo e Sá. Est. 02, Cx. 781, Maço 1248, Doc.
03, 12 de jul. 1876.
426
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Manoel Brígido da Silva. Est. 02, Cx. 786, Maço 1253, Doc. 12,
18 de jul 1856.
427
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Alferes Augusto de Sá Bitencourt Câmara. Est. 02, Cx. 785,
Maço 1252, Doc. 13, 05 de nov. 1868.
219

equipamentos deviam obter bons lucros com a venda e/ou fabricação de móveis. Os
indígenas, crioulos e africanos (escravos, livres e libertos) também deviam participar dessa
atividade em proveito próprio, mas as suas chances de lucros deviam ser bem menores que a
dos donos de serrarias. Nas casas de negócios era possível encontrar machados, facões e
foices, ferramentas com preços mais acessíveis à população menos favorecida
economicamente. A derrubada das árvores podia ser feita com machado, porém cortes mais
sofisticados exigiam ferramentas mais fortes, como era o caso das serras e serrarias. Os donos
desses equipamentos deviam lucrar muito, explorando o trabalho escravo nas lavouras,
derrubada de matas, na fabricação dos móveis de madeira e outras atividades. No caso dos
móveis das casas e sobrados, descritos nos inventários post mortem de Ilhéus, encontramos
vários tipos de madeira que serviam para a fabricação deles, como demonstra o Gráfico 6.3.

Gráfico 6.3 – Principais madeiras utilizadas na fabricação dos móveis de


casas e sobrados. Ilhéus, 1850-1888

2% 1%
Madeira
11%
29%
Madeira Jacarandá
17%
Madeira Vinhático
Madeira Louro
18% 22%
Madeira Branca
Madeira Putumujú
Outras Madeiras *

Fonte: APEB, SJ. 215 inventários. Ilhéus, 1850-1888.


(*) Cedro, oiticica, pinho, mogno.

O Gráfico 6.3 mostra que 29% dos móveis de casas e sobrados foram construídos com
madeiras, mas os avaliadores não discriminaram o tipo. A outra parcela expressiva era
composta por móveis fabricados com madeira jacarandá (22%), seguida por vinhático (18%),
220

louro (17%) e madeira branca (11%), sendo os demais fabricados com cedro, oiticica, pinho e
mogno.
A casa do negociante Joaquim José da Costa Seabra era dotada de várias mesas,
cadeiras e marquesas de madeiras, além colheres de platina para sopa, colheres de platina para
chá, quatro pianos, sendo um inglês e outro hamburguês, entre outros bens que compunham
sua riqueza e o diferenciava da maior parte dos inventariados428.
A casa dos proprietários do Engenho Castelo Novo possuía mesa de jantar de madeira
branca, cadeiras, guarda roupas, camas e cômodas de madeira branca, garfos e colheres de
metal, bandejas, entre outros móveis429.
Adelina Sellmam, casada com o negociante Bernardo Sellmam, possuía casa
mobiliada com camas francesas de madeira vinhático, lavatório de jacarandá, sofás, cadeiras,
cômodas, guarda louça e outras mobílias de madeira jacarandá430. Essas mobílias eram típicas
das casas dos negociantes, donos de engenho e alguns inventariados que pertenciam a família
rica, como os Sá Bitencourt Câmara, por exemplo.
A maioria residia em casas simples, feitas de taipa e cobertas de palha, sem variedades
de móveis e utensílios domésticos. Narcisa Maria da Conceição, por exemplo, morava no
lugar Ponta do Ramo quando faleceu em 1885, tinha plantação de cacau, coco e casa de
farinha. Sua casa foi descrita como arruinada e os únicos bens móveis descritos em seu
inventário foram dois tachos de cobre e os utensílios de fazer farinha431.
Antes de falecer em 1884 Constança Aranha morava na Cachoeira de Itabuna, no lugar
denominado molha farinha, onde tinha plantação de cacau. Sua casa foi descrita como “uma
casa de palha velha na fazenda molha farinha”432, sem nenhum tipo de móveis descritos em
seu inventário433.

428
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Joaquim José da Costa Seabra. Est. 08, Cx. 3424, Maço n/c,
Doc.06, 17 de set. 1856.
429
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Maria José Leola Del Rey e Carolina Leola Del Rey. Est. 02, Cx.
786, Maço 1253, Doc. 06, 28 de fev. 1861.
430
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Adelina Sellman. Est. 02, Cx. 781, Maço 1248, Doc. 07, 13 de
mar. 1876.
431
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Narcisa Maria da Conceição. Est. 02, Cx. 762, Maço 1228, Doc.
04, 05 de out. 1885.
432
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Constança Aranha. Est. 02, Cx. 760, Maço 1226, Doc. 09, 29 de
set. 1884.
433
Ibidem.
221

Bernardo José Demétrio morava no lugar Sambaituba, onde tinha plantação de cacau
antes de falecer, em 1883434. Sua morada foi descrita como uma casa coberta de palha, entre
seus bens móveis constam duas arcas de madeira louro, uma bacia de ferro, dois machados
estragados, um pilão, um cordão e uma medalha de ouro e um alfinete de peito, também de
ouro.
Esses exemplos mostram alguns contrastes no modo de vida da população residente no
território da comarca de Ilhéus na segunda metade do século XIX. Ademais, é oportuno
lembrar que somente aqueles que tinham bens para legar realizavam a abertura de inventário,
representando estes uma fração pequena da população. Desse modo, podemos inferir que a
maioria vivia com poucos recursos, em moradias simples, feitas de taipas e cobertas de palha,
com poucos mantimentos.
Nesse contexto a exploração do trabalho escravo assumiu importância crucial para
aqueles que pretendiam aumentar a riqueza. Talvez isso explique os elevados investimentos
em escravos, como demonstramos no quarto capítulo da tese. Podemos avaliar melhor essa
hipótese investigando a presença de animais nos inventários. O que permitirá compreender,
entre outras questões, a importância que tiveram no contexto econômico de Ilhéus da segunda
metade do século XIX.

6.4 - Os animais nos inventários

Entre os inventários de Ilhéus encontramos diversos tipos de animais que serviram,


principalmente, como força de tração, sem criações de grandes rebanhos. Talvez por isso eles
não tenham assumido posição de destaque no conjunto dos bens inventariados de Ilhéus,
sobretudo se comparado com o peso relativo dos escravos e cacaueiros. Isso não significa
ausência de importância.
Ao longo das décadas, as mudanças nos transportes marítimos dinamizaram as trocas
de mercadorias entre a capital e as vilas litorâneas da Bahia, mas as fazendas de cacau se
espalharam sobretudo pelo o interior da mata atlântica, e entre elas e o porto da cidade as

434
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Bernardo José Demétrio. Est. 02, Cx. 759, Maço 1225, Doc. 02,
14 de ago. 1883.
222

distâncias eram consideráveis. Assim o uso das canoas foi imprescindível no transporte dos
gêneros da lavoura e outras mercadorias, ao passo que os animais eram utilizados como força
de tração, principalmente, no interior das fazendas e engenhos.
A combinação desses fatores, aliado ao uso do trabalho escravo, promoveram a
circulação da produção destinada ao abastecimento interno e à exportação, sendo incomum
nesse período as tropas de muares para carregamento e transporte de mercadorias. Assim,
notamos que nessa época a lavoura cacaueira estava condicionada pelo ritmo das canoas e dos
carros de boi, sendo que as enchentes dos rios interferiam no transporte das mercadorias.
Para investigar essa questão inicialmente vamos analisar a participação dos inventários
com presença de animais durante o período 1850-1888, o que permitirá saber se houve
crescimento da presença deles nos inventários de Ilhéus ao longo do tempo.

Gráfico 6.4 – Distribuição dos inventários segundo a


presença de animais. Ilhéus, 1850-1888
140
120
Nº DE INVENTÁRIOS

100
80
60
40
20
0
1850-1859 1860-1869 1870-1879 1880-1888

Com animais Sem animais


Fonte: APEB, SJ. Ilhéus, 333 processos de inventários, 1850-1888

Observando os dados do Gráfico 6.4 percebemos que ao longo das décadas não houve
acelerado crescimento do número de inventários com presença de animais. Do total de 333
processos investigados 145 (43,5%) continha ao menos uma referência a algum tipo de
criação, demonstrando que esta atividade não se disseminou muito entre os inventariados. A
maior parte se concentrou no período 1880-1888, quando 53% dos processos tinham animais.
223

As principais criações declaradas entre os inventariados eram constituídas,


principalmente, pelos grupos dos bovinos e equinos. Entre os primeiros, o mais comum foi a
descrição de bois, utilizados nos serviços das lavouras, geralmente em dupla, as chamadas
juntas de bois de brocha, que serviam como meio de transporte de cargas, ou carros de boi.
Entre os equinos, destacam-se os cavalos, normalmente de cela, mas alguns deles eram
utilizados nos serviços da lavoura. Além destes, encontramos em menor proporção
inventários com criações de vacas, novilhas, bezerros, outros com criações de porcos,
carneiros, burros, dentre outras descrições.
Para dimensionar e avaliar as criações dividimos os animais em grupos específicos,
quais sejam: bovino, equino, suíno, caprino, ovino e muares. Isso ajuda a entender a
distribuição dos diferentes tipos de animais nos inventários e a saber quais os grupos mais
importantes, tanto em termos quantitativos quanto em termos de alocação dos investimentos.
A Tabela 6.5 apresenta a distribuição dos animais nos inventários. Na primeira coluna,
da esquerda para a direita, apresentamos os diferentes grupos, em seguida mostramos o
número e o percentual de registros referentes a cada grupo animal, depois a quantidade de
animais e o percentual correspondente, por último a soma dos preços de cada grupo com seus
respectivos percentuais.
Vale advertir que um registro pode conter a descrição de vários animais. No inventário
de Francisco Gomes de Castro Aguiar, por exemplo, os avaliadores descreveram “uma
criação com sete cabeças de gado, entre grandes e pequenos, dados de meia a Fortunato
Pereira Galo, cada um por Rs.18$000 e todos pela quantia de Rs.126$000, entre outros
bens435. Neste caso, contabilizamos um registro que corresponde a sete bois. Nos casos de
crias descritas junto com as mães, também contabilizamos um registro, porém com duas
cabeças de animais, como ocorreu no inventário de Adelina Tavares Bronze, moradora da
Cachoeira de Itabuna, em que os avaliadores descreveram, entre outros bens, uma vaca com
uma cria, ambas no valor de Rs. 60$000436. O mesmo procedimento foi adotado nos casos das
juntas de bois. Agora que explicamos a metodologia podemos analisar os resultados.

435
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Francisco Gomes de Castro Aguiar. Est. 02, Cx. 783, Maço
1250, Doc. 12, 27 de maio 1856.
436
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Adelina Tavares Bronze. Est. 02, Cx. 737, Maço 1202, Doc. 20,
18 de ago. 1874.
224

Tabela 6.5 – Distribuição dos animais nos inventários.


Ilhéus, 1850-1888
Inventários c/ animais Registros Animais Somas dos Preços
GRUPO ANIMAL Nº % Nº % (em réis) %
Bovino 285 70,1 560 67,2 22.529,000 67,6
Equino 98 24,1 105 12,6 7.870,000 23,6
Suíno 6 1,5 10 1,2 75,000 0,2
Caprino 8 1,9 99 12,0 244,000 0,8
Muares 7 1,7 30 3,6 2.521,000 7,6
Ovino 3 0,7 29 3,4 72,000 0,2
TOTAL 406 100,0 833 100,0 33.311,000 100,0
Fonte: APEB, SJ. Ilhéus, 145 processos de inventários, 1850-1888.

Analisando os dados da Tabela 6.5 percebemos que tanto em termos quantitativos


quanto em termos de avaliação, o grupo de bovinos se destacou entre as criações declaradas
nos inventários de Ilhéus. No computo geral somamos o total de 560 cabeças de bovinos, que
representam 67,2% de todos animais declarados nos inventários.
As maiores criações foram localizadas no Engenho Castelo Novas, com vinte e três
bois, seis garrotes, seis vacas, duas novilhas, duas bezerras e quatro bezerros, totalizando 43
cabeças de gado. Neste engenho viviam como escravo o total de 54 pessoas, entre crioulos
africanos, adulto, crianças e idoso, alguns deles deviam cuidar desses animais437. Na Fazenda
Piratiquisse encontramos, entre outros bens, um touro, cinco bois, três garrotes, seis bezerros,
quatorze vacas e quatro novilhas, totalizando 33 cabeças de gado, além de 20 pessoas que
viviam como escravos438. Desse modo, as duas maiores propriedades juntas continham 76
bovinos, que corresponde a 13,5% do total, demonstrando que a posse destes animais não
estava concentrada.
Os preços dos animais variavam de acordo com as condições de saúde, o peso ou
tamanho, a idade e as funções que exerciam. No geral os bois especializados, descritos como
bois de brocha, do serviço, de carga, de canga, de cangalha ou de carro, eram os mais

437
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Maria José Leola Del Rey e Carolina Leola Del Rey. Est. 02, Cx.
786, Maço 1253, Doc. 06, 28 de fev. 1861.
438
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Capitão Pascoal Gonçalves de Paiva. Est. 02, Cx. 750, Maço
1216, Doc. 13, 17 de set. 1878.
225

valorizados. Entre os 293 bois descritos nos inventários, 191 (65%), possuíam algumas dessas
especializações.
Na década de 1850 um boi de brocha chegou ao valor máximo de Rs. 50$000 em
Ilhéus439. Os vinte e três bois de carro do Engenho Castelo Novo foram avaliados em Rs.
1.380$000, cada um por Rs. 60$000440. Na década de 1880 um boi do serviço alcançou valor
máximo de Rs. 80$000441. Acima desses valores encontramos apenas os bovinos declarados
como touros, que provavelmente eram reprodutores. O touro malabar da Fazenda Piratiquisse
foi avaliado em Rs. 180$000442 e o touro da Fazenda São João do Pasto, da raça guadima, foi
avaliado em Rs.100$000443.
Além desses bovinos existiam as vacas, que no geral possuíam valor inferior ao dos
bois de serviço. No computo geral, o preço médio deles chegou a Rs. 71$000 e o delas a Rs.
60$000. Em relação aos bezerros, garrotes, novilhas, de ambos os sexos, o preço médio
alcançou a cifra de Rs. 33$000.
Analisando agora os equinos, segundo grupo em importância nos inventários,
percebemos que esse tipo de criação estava menos disseminado que os bovinos. Do total de
145 inventários com criações encontramos equinos em 75 processos, 52% dos casos. O
registro mais frequente foi de um cavalo por propriedade. O maior número de equinos entre
os inventariados foi localizado na Fazenda Olandi, que possuía quatro cavalos, sendo três de
cela e um ruivo, muito velho, avaliado em Rs. 30$000444.
A soma de todos os equinos totalizou 105 animais, dos quais cem (95%) eram cavalos
e apenas cinco (5%) éguas. Entre os cavalos 29% foram descritos como cavalos de cela, com
preço médio de Rs.93$000, outros dez (10%) foram descritos como do serviço de carga ou
cangalha e o preço médio destes alcançou Rs. 62$000. As éguas, por sua vez, obtiveram preço

439
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. João Luiz de Magalhães. Est. 02, Cx. 786, Maço 1253, Doc. 11,
16 de nov. 1856.
440
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Maria José Leola Del Rey e Carolina Leola Del Rey. Est. 02, Cx.
786, Maço 1253, Doc. 06, 28 de fev. 1861.
441
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Adão Felipe Brait. Est. 02, Cx. 758, Maço 1224, Doc. 16, 12 de
nov. 1883.
442
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Capitão Pascoal Gonçalves de Paiva. Est. 02, Cx. 750, Maço
1216, Doc. 13, 17 de set. 1878.
443
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Firmino Pires Caldas. Est. 03, Cx. 1372, Maço 1841, Doc. 14, 10
mar. 1888.
444
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Alferes Francisco Vitorio de Sales Leite. Est. 04, Cx. 1372,
Maço 1841, Doc. 01, 24 de fev. 1875.
226

médio de Rs. 38$000. Assim, de modo geral os cavalos de cela eram os animais mais
valorizados entre os equinos.
Os caprinos estão entre os tipos de animais menos frequentes nos inventários de
Ilhéus. Do total de 145 processos com criações declaradas apenas seis inventários, 4% dos
casos, possuíam caprinos. Ao todo contabilizamos 99 cabeças, estando a maior criação (42%)
no Engenho Castelo Novo445. O preço médio dos caprinos chegou a Rs. 2$500.
As criações de suínos raramente aparecem nos inventários de Ilhéus. Apenas três
processos declararam a existência deste tipo de animal, contendo juntos 10 cabeças de porcos,
dos quais cinco eram propriedade de Manuel José de Carvalho Lessa, declarados como
pequenos, cada um avaliado em Rs. 8$000446, outros quatro pertenciam a José Lopes da Silva,
dono da Fazenda Morro de São Francisco, sendo um capado, avaliado em Rs. 8$000, outro
descrito como barrão, no valor de Rs. 5$000 e duas porcas, uma por Rs. 8$000 e outra por Rs.
5$000447.
O grupo de ovino também estava entre os menos frequentes. Apenas três inventários
possuíam criações de ovelhas, totalizando 29 cabeças desse tipo de animal. A maior parte na
Fazenda Jetimana-Acu, que possuía, entre outros bens, quinze ovelhas, cada uma avaliada em
Rs. 2$400448, preço que corresponde à maior avaliação. Outras nove ovelhas estavam na
Fazenda Morro de São Francisco, cada uma avaliada em Rs. 2$000449.
O grupo dos muares estava presente em apenas seis inventários, totalizando 30
cabeças deste tipo animal. Jose de Carvalho da Silva Lessa possuía dez burros quando faleceu
em 1885, cada um avaliado em Rs. 80$000450. Neste mesmo ano faleceu o Capitão Raimundo
Nonato do Amaral, que possuía, entre outros bens, dez burros encangalhados, cada um

445
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Maria José Leola Del Rey e Carolina Leola Del Rey. Est. 02, Cx.
786, Maço 1253, Doc. 06, 28 de fev. 1861.
446
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Manoel José de Carvalho Lessa. Est. 02, Cx. 737, Maço 1202,
Doc. 06, 23 de jul. 1872.
447
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. José Lopes da Silva. Est. 02, Cx. 760, Maço 1226, Doc. 04, 10 de
ago. 1888.
448
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Felipa de Melo Sá Bandeira. Est. 02, Cx. 785, Maço 1252, Doc.
07, 16 de mar. 1866.
449
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. José Lopes da Silva. Est. 02, Cx. 760, Maço 1226, Doc. 04, 10
de ago. 1888.
450
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. José de Carvalho da Silva Lessa. Est. 03, Cx. 1295, Maço 1764,
Doc. 12, 05 de mar. 1885.
227

avaliado em Rs. 100$000451. O negociante Acrísio Januário Cardoso morava na Cachoeira de


Itabuna antes de falecer em 1887, era dono de uma plantação com 4.155 cacaueiros e de sete
escravos, entre outros bens constantes em seu inventário encontramos cinco burros, todos
avaliados em Rs. 500$000452. Porcina Groeszner de Figueredo Rocha e o seu marido também
eram negociantes estabelecidos na Cachoeira de Itabuna. Antes de ela falecer, em 1888, o
casal possuía plantação com 4.444 cacaueiros e dois burros de cargas, entre outros bens453.
Esses exemplos confirmam que os burros de cargas só começaram a aparecer nos
inventários de Ilhéus a partir do período 1880-1888. Antes disso a maior parte das
mercadorias era transportada pelas águas, utilizando-se sobretudo canoas, onde o trabalho de
crioulos, africanos e indígenas preponderou, seja na condição de livres, libertos ou
escravizados.

***

Esse capítulo abordou alguns aspectos da vida material, da estrutura de produção e do


mundo do trabalho de uma parte da população de Ilhéus, por meio da investigação dos
imóveis, dos bens móveis e dos animais descritos nos inventários.
Notamos diferenças significativas nos tipos de habitações dos moradores da
localidade, sendo que frequentemente os donos de engenho e negociantes possuíam moradias
mais sofisticadas que a da maioria dos inventariados. Suas casas possuíam muitas mobílias,
móveis de madeira e suas edificações normalmente eram cobertas de telhas, sendo que a
riqueza desses grupos se apoiou, sobretudo, na exploração do trabalho escravo.
A maioria dos lavradores, incluindo aqueles dedicados ao cultivo de pequenas
plantações de cacau, vivia em moradias simples, feitas de taipas e cobertas de palhas. Essas
pessoas desempenharam papel importante no processo de disseminação do cultivo do cacau
em Ilhéus, utilizando principalmente as canoas como meios de transportes. Muitas não tinham

451
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Raimundo Nonato do Amaral. Est. 02, Cx. 762, Maço 1228,
Doc. 5, 29 de set. 1885.
452
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Alferes Acrísio Januário Cardoso. Est. 03, Cx. 1298, Maço 1767,
Doc. 08, 21 de abr. 1887.
453
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Ilhéus. Porcina Groeszner de Figueredo Rocha. Est. 03, Cx. 1372, Maço
1841, Doc. 11, 05 de jun. 1888.
228

recursos suficientes para comprar escravos e nem animais e recorreram ao trabalho familiar e
à produção de farinha como meio de garantir a sobrevivência.
A grande quantidade de casas de farinha, bem como de móveis relacionados com essa
atividade, demonstra o quanto esse alimento foi importante naquele contexto, certamente
servindo à exportação e ao abastecimento interno.
Em contra partida observamos que as casas de beneficiar cacau não se mostraram
muito numerosas, bem com os muares que apareceram com pouca frequência nos inventários.
Do total de 333 processos investigados encontramos 37 casas de beneficiar cacau contra 113
casas de farinha, e 166 canoas contra 30 burros de carga.
Ao que parece, muitos dos pequenos produtores, que não tinham condições de
beneficiar a produção, entregavam o cacau colhido aos negociantes como pagamento pelas
compras realizadas nas casas de negócio, sendo que essa relação pautou a vida de muitos
lavradores de Ilhéus no período 1850-1888.
Ademais, percebemos que os gêneros vendidos nessas casas tinham importância
econômica significativa no conjunto dos bens móveis. Ao longo da tese evidenciamos que os
negociantes, junto com os donos de engenho, possuíam no geral, as maiores fortunas. A
riqueza dos negociantes, muito provavelmente, provinha dessas relações com os pequenos
lavradores, que forneciam a produção a eles como pagamento. Dessa forma, os negociantes,
que normalmente tinham casas para beneficiar cacau e transportes marítimos, além de
contatos na capital, exportavam os produtos e obtinham maiores lucros com a
comercialização.
No próximo capítulo vamos analisar as dívidas ativas e passivas declaradas nos
inventários post mortem de Ilhéus, para entendermos o funcionamento do sistema de crédito e
as relações entre os credores e devedores. Este último capítulo da tese possui importância
fundamental para entendermos essas relações, um dos traços marcantes da economia de Ilhéus
durante a expansão do cultivo do cacau.
229

CAPÍTULO VII
CREDORES E DEVEDORES NA ECONOMIA DE ILHÉUS, 1850-1888

7.1 - Introdução

Muitos historiadores analisaram as dívidas ativas e passivas declaradas nos inventários


post mortem para entender vários aspectos das relações sociais e econômicas do passado
brasileiro. Entre as possibilidades de investigação existem aqueles relacionados com análises
sobre o sistema de crédito, o endividamento, bem como as relações dos grupos
socioeconômicos que participavam das operações454. Nosso objetivo nesse capítulo é
investigar o comportamento do sistema de crédito entre os inventariados de Ilhéus. Queremos
saber se no decorrer das décadas houve disseminação ou restrição desse sistema e quais
grupos participavam dele.
Estamos interessados em compreender, entre outras questões, a dinâmica interna e
externa dos negócios realizados em Ilhéus para identificar o lugar dos produtores de cacau,
donos de engenho, negociantes e os demais inventariados nesse contexto. Também
pretendemos entender as conexões dos inventariados de Ilhéus com a praça de Salvador,
investigando suas dívidas passivas.
No primeiro momento analisaremos as dívidas ativas para sabermos os grupos que
distribuíam ou concentravam crédito e qual o comportamento das dívidas ao longo do tempo.
Para realizar essa tarefa calculamos apenas as dívidas acatadas pelos juízes nos processos de
inventários, pois várias dívidas eram rejeitadas por falta de provas, às vezes os valores
apresentados eram contestados pelo inventariante e nem sempre os credores conseguiam
receber os valores que reclamavam. Assim, só incluímos nos cálculos os valores considerados
pelos juízes na partilha dos processos.
Na segunda parte do capítulo analisamos as dívidas passivas, abordando as
características dos devedores, bem como o comportamento dessas dívidas ao longo do tempo.
454
Sobre o assunto ver, entre outros, CARRARA, Angelo Alves (Org.). À vista ou a prazo: comércio e crédito
nas Minas setecentista. Juiz de Fora: Ed. UFJF, 2010. GUIMARÃES, Carlos Gabriel; SARAIVA, Luiz Fernando
(Org.). Crédito & descrédito: relações sociais de empréstimos na América – séculos XVIII ao XX. Niterói:
Eduff, 2018.
230

Estamos interessados em saber se no decorrer das décadas os produtores de cacau se


endividaram e qual o lugar dos negociantes, donos de engenho e demais inventariados nesse
processo. O procedimento metodológico adotado é o mesmo utilizado na abordagem das
dívidas ativas, ou seja, consideramos as somas incluídas na partilha final, isto é, que foram
acatadas pelos juízes.
Conhecer os grupos de credores e devedores que atuaram em Ilhéus durante os anos de
1850 e 1888 será de grande utilidade para o entendimento do sistema de crédito, da circulação
de mercadorias e das trocas comerciais internas e externas. O cacau se expandiu na época de
desenvolvimento do capitalismo industrial, o que fez aumentar a oferta de produtos
industrializados e a demanda por matérias primas, muitas delas produzidas por trabalhadores
escravizados.
Nesse período muitos negociantes atuaram em Ilhéus, comprando e vendendo
mercadorias, oferecendo crédito à população e se endividando. Esse capítulo pretende
explicar algumas peculiaridades dessas trocas comerciais e da relação entre Ilhéus e a praça
de Salvador455.

455
Algumas análises sobre o sistema de crédito em Ilhéus podem ser vistas em: SANTOS, Leandro Dias dos;
SANTOS, Zildemar Alves; DIAS, Marcelo Henrique. Mecanismo de acesso ao crédito na vila de Ilhéus na
primeira metade do século XIX: o caso de Joaquim José da Costa Seabra. Revista de História Econômica &
Economia Regional Aplicada. Juiz de Fora, v.7, n. 12, jan./jun. 2012.; SILVA, Neila Oliveira da. A elite local na
vila de São Jorge dos Ilhéus, século XVIII. In: DIAS, Marcelo Henrique; CARRARA, Ângelo (Org.). Um lugar
na História: a capitania e comarca de Ilhéus antes do cacau. Ilhéus: Editus, 2007. p. 169-181.
231

7.2 - As dívidas ativas nos inventários

Durante a segunda metade do século XIX muitas pessoas faleceram em Ilhéus com
dívidas ativas na praça, ou seja, aquelas em que os inventariados eram credores. Às vezes os
valores desses créditos compunham parte significativa da riqueza do falecido, e os herdeiros
tinham interesse nas somas. Nessa seção vamos avaliar os grupos que detinham as maiores e
menores porções dessas dívidas para entender o sistema de crédito em Ilhéus. Queremos saber
se havia grupos que controlavam esse sistema e qual o lugar dos produtores de cacau,
negociantes, donos de engenho e demais inventariados nesse contexto.
As origens dos créditos descritos nos inventários post mortem de Ilhéus são
diversificados, porém, infelizmente, na maioria das vezes elas não foram mencionadas com
detalhes. Encontramos indicação de dívidas provenientes de letras (empréstimos com nota
assinada), dívidas de compras realizadas nas casas de negócio, dinheiro de herança (legítima)
e dinheiro de transações comerciais, entre outras origens.
Inicialmente vamos analisar a distribuição dos inventários que apresentaram dívidas
ativas ao longo do período. Isso permitirá conhecer, num primeiro momento, a movimentação
da oferta de crédito ao longo do tempo.

Gráfico 7.1 – Distribuição dos inventários por décadas segundo a


presença de dívidas ativas. Ilhéus, 1850-1888
140
120
Nº DE INVENTÁRIOS

100
80
60
40
20
0
1850-1859 1860-1869 1870-1879 1880-1888

Com dívidas ativas Sem dívidas ativas


Fonte: APEB, SJ. 333 inventários. Ilhéus, 1850-1888
232

Os dados do Gráfico 7.1 mostram que no decorrer das décadas as dívidas ativas
ficaram relativamente concentradas em poucos inventários. Ao que parece o sistema de
crédito estava restrito nas mãos de poucas pessoas. Analisar a distribuição dessas dívidas de
acordo com a ocupação principal dos inventariados pode ajudar a entendermos quem eram os
credores mais importantes de Ilhéus nessa época. Para realização dessa tarefa cruzamos os
dados sobre as categorias ocupacionais de acordo com o montante das dívidas ativas alocadas
em cada um dos inventários. A Tabela 7.1 mostra o resultado dessa distribuição na década de
1850.

Tabela 7.1 – Dívidas ativas segundo a ocupação principal dos inventariados.


Ilhéus, 1850-1859
Inventários c/ dívidas ativas Inventários Soma das dívidas ativas
OCUPAÇÕES PRINCIPAIS Nº % (em réis) %
Produtores de cacau 1 16,7 2.492,945 10,2
Negociantes 3 50,0 21.388,790 87,3
Produtores de farinha/café/coco - 0,0 0,000 0,0
Donos de Engenho - 0,0 0,000 0,0
Outros * 2 33,3 603,875 2,5
Não Identificada - 0,0 0,000 0,0
TOTAL 6 100,0 24.485,610 100,0
Fonte: APEB, SJ, 06 inventários. Ilhéus, 1850-1859
(*) Prof. liberais; func. eclesiástico; peq. criadores; madeireiros etc.

Analisando os dados da Tabela 7.1 percebemos que os negociantes representavam


50% dos credores e concentraram 87,3% da soma de todos os créditos declaradas. O
negociante Joaquim José da Costa Seabra, falecido em 1856, tinha a maior dívida ativa (Rs.
15.762$560), sendo que a lista de seus devedores é grande, incluindo escravos, forros, índios
e diversos grupos sociais, espalhados por lugares como Cachoeira de Itabuna, Almada,
Iguape, Rio de Contas, Una, Belmonte, entre outros. Esse negociante, sozinho, concentrou
64% das dívidas ativas declaradas nos inventários da década de 1850. Ele tinha um barco,
233

denominado oriente e ao que parece transportava mercadorias, incluindo escravos, para serem
comercializadas nas vilas e povoações da província da Bahia e outras partes do Império.456
Quanto aos produtores de cacau, o único com dívida ativa declarada no inventário foi
João Segismundo Cordier, dono da Fazenda Santa Cruz, localizada na Cachoeira de Itabuna.
Ele faleceu em 1849 e a lista de seus devedores também é grande e diversificada, entre seus
devedores encontramos Fernando Steiger, Guilherme Mor, Pedro Bonin, Firmino Pires
Caldas, além de índios da aldeia de ferradas, escravos, crioulos forros e outros. 457
Ao que parece o sistema de crédito estava em expansão em Ilhéus desde a primeira
metade do século XIX, sendo que os negociantes eram os principais agentes dessa expansão.
Todavia, a década de 1850 apresenta o problema da baixa representatividade do número de
processos investigados, apenas 19 inventários, dos quais 6 (31,6%) declararam algum tipo de
dívida ativa. Vamos avançar no estudo das próximas décadas para saber se esse quadro
mudou. A década de 1860, por exemplo, apresenta uma quantidade maior de processos
investigados, o que permite conferir essa hipótese com mais segurança.

Tabela 7.2 – Dívidas ativas segundo a ocupação principal dos inventariados.


Ilhéus, 1860-1869
Inventários c/ dívidas ativas Inventários Soma das dívidas ativas
OCUPAÇÕES PRINCIPAIS Nº % (em réis) %
Produtores de cacau 8 34,8 1.077,400 3,0
Negociantes 7 30,4 32.773,125 90,0
Produtores de farinha/café/coco 14 21,8 604,000 1,7
Donos de Engenho 2 8,7 1.686,840 4,6
Outros * 1 4,3 242,880 0,7
Não Identificada - 0,0 0,000 0,0
TOTAL 23 100,0 36.384,245 100,0
Fonte: APEB, SJ, 23 inventários. Ilhéus, 1860-1869
(*) Prof. liberais; func. eclesiástico; peq. criadores; madeireiros etc.

O Gráfico 7.2 mostra que os negociantes representavam 30,4% dos inventariados com
dívidas ativas e concentraram 90% da soma dos créditos. Isso confirma que na década de

456
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Joaquim José da Costa Seabra. Ilhéus. Est. 08, Cx. 3424, Maço n/c,
Doc.06, 17 de set. 1856.
457
APEB, Seção Judiciária, Inventários, João Segismundo Cordier. Ilhéus. Est. 08, Cx. 3424, Maço n/c, Doc.06,
25 de maio 1849.
234

1860 eles continuaram retendo a maior parte dos créditos, indicando que eles foram os
principais responsáveis pela expansão desse sistema. O negociante que concentrou maior
parte dos créditos, Joaquim Lopes da Silva, faleceu em 1866 com o montante de Rs.
13.645$288 em dívidas ativas, perfazendo 78% do monte-mor, sendo que a lista de seus
devedores é extensa: José, escravo de Luiz Carlos Cordier, lhe devia a quantia de Rs. 4$480;
Manuel Nunes Melgaço, a quantia de Rs. 30$630; Felippe, escravo de José Lopes, a quantia
de Rs.8$940; Fulgêncio, marinheiro, a quantia de Rs.5$220; Pedro, escravo da senhora Ana,
viúva, a quantia de Rs. 4$440; Ignacio Jorge, índio, a quantia de Rs.9$840; entre outros.458
Olhando para os dados da Tabela 7.2 e 7.1 notamos que os negociantes preponderaram
na distribuição do sistema de crédito. Até agora os dados dessas tabelas levam a crer que eles
concentraram o sistema de crédito em Ilhéus.
Quanto aos donos de engenho, na década de 1860 os proprietários do Engenho Castelo
Novo se destacaram, acumulando dívidas ativas no valor de Rs. 1.648$530, mas apenas
quatro devedores foram listados, sendo um da Barra do Rio de Contas (Miguel Coutinho) que
lhe devia Rs. 100$000; outro tinha uma dívida de saldo de conta corrente no valor de Rs.
1.499$170; os demais tinham dívidas menores referente a letras.459 Isso indica que os donos
deste engenho também participavam do sistema de crédito, mas em proporção bem menor que
os negociantes.
Entre os produtores de cacau as dívidas ativas eram bem reduzidas se comparadas às
dos negociantes. O produtor de cacau com a maior dívida ativa declarada entre os
inventariados da década de 1860 foi Agostinho Antônio da Silva, dono da Fazenda Barão,
com uma Letra no valor de Rs. 400$000 na mão de Feliciano José dos Santos.460 Entre os
produtores de farinha/café/coco as dívidas ativas foram ainda mais reduzidas, demonstrando
que no geral a participação dos lavradores na distribuição do crédito era insignificante.
Vamos avançar na investigação das próximas décadas para conferirmos se houve
alteração nesse quadro.

458
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Joaquim Lopes da Silva. Ilhéus. Est. 02, Cx. 785, Maço 1252, Doc. 06,
24 de abr. 1866.
459
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Maria José Leola Del Rey e Carolina Leola Del Rey. Ilhéus. Est.02, Cx.
786, Maço 1253, Doc. 06, 28 de fev. 1861.
460
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Agostinho Antônio da Silva. Ilhéus. Est. 02, Cx. 742, Maço 1207, Doc.
08, 28 de jun. 1869.
235

Tabela 7.3 – Dívidas ativas segundo a ocupação principal dos inventariados.


Ilhéus, 1870-1879
Inventários c/ dívidas ativas Inventários Soma das dívidas ativas
OCUPAÇÕES PRINCIPAIS Nº % (em réis) %
Produtores de cacau 16 53,3 17.201,453 19,0
Negociantes 9 30,0 52.701,589 58,0
Produtores de farinha/café/coco 2 6,7 291,350 0,3
Donos de Engenho 2 6,7 20.542,707 22,6
Outros * - - 0,000 0,0
Não Identificada 1 3,3 14,980 0,1
TOTAL 30 100,0 90.752,079 100,0
Fonte: APEB, SJ, 30 inventários. Ilhéus, 1870-1879
(*) Prof. liberais; func. eclesiástico; peq. criadores; madeireiros etc.

Na década de 1870 a participação dos negociantes no montante das dívidas continua


elevada, eles concentraram a maior parte das somas (58%). O negociante que acumulou a
maior dívida nesta década foi o Tenente Bernardo Sellman, que teve seu inventário aberto em
1876 por ocasião da morte de sua esposa, Adelina Sellman. O casal tinha casa de negócio na
vila de Ilhéus, no distrito de Cachoeira de Itabuna e na vila de Olivença, totalizando uma
quantia de Rs. 20.605$645 em dívidas ativas, entre outros bens. A lista de seus devedores
também é grande: Antônio das Ferradas, lhe devia a quantia de Rs. 3$000; João Camilo
Cordier, a quantia de Rs. 5$000; Capitão Joaquim de Barros Seixas Loureiro, a quantia de Rs.
31$920; Capitão Christiano Alexandre Homem de El`Rey, a quantia de Rs. 144$930; Basílio
(pescador), a quantia de Rs.3$040; Miguel (escravo de Eduardo de Sá), a quantia de Rs.
3$250; João Vigário (índio), a quantia de Rs. 1$000; Luzia de Lima (parteira), a quantia de
29$870, entre outros.461
Quanto aos produtores de cacau eles acumularam 19% das dívidas ativas declaradas
nos inventários da década de 1870, porém, boa parte desse montante era de apenas um
produtor, o Major Joaquim José de Oliveira, que tinha uma fazenda de cacau na Cachoeira de
Itabuna, e uma quantia de Rs. 8.979$824 em dívidas ativas nas mãos de dez devedores, a

461
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Adelina Sellman. Ilhéus. Est. 02, Cx. 781, Maço 1248, Doc. 07, 13 de
mar. 1876.
236

maior parte delas referente a letras.462 Ao que parece ele era exceção, pois ao longo das
décadas percebemos que a maioria dos produtores de cacau não atuou como credores.
O dono do Engenho União, José Antônio de Guimarães Bastos, acumulou o valor de
19.342$707 em dívidas ativas, sendo que a lista de seus devedores é grande, alguns com conta
em livro, outros com dívidas de letra, porém na maior parte das vezes não foi declarada a
origem dessas dívidas, apenas os nomes dos devedores.463
Esses exemplos demonstram a existência de um sistema de crédito distribuído
amplamente na sociedade de Ilhéus, mas que estava concentrado, sobretudo, nas mãos dos
negociantes. Os donos de engenho também emprestavam dinheiro e ofereciam crédito à
população, assim como ocorreu com determinados produtores de cacau. Todavia, se
comparados aos negociantes as diferenças são notórias, como se ver nos dados das tabelas
(7.3; 7.2 e 7.1).
A oferta de crédito acompanhou o crescimento da economia cacaueira. Vamos
conferir se no período 1880-1888 a participação dos negociantes nesse sistema se intensificou
ou se houve disseminação para outros segmentos da população inventariada.

Tabela 7.4 – Dívidas ativas segundo a ocupação principal dos inventariados.


Ilhéus, 1880-1888
Inventários c/ dívidas ativas Inventários Soma das dívidas ativas
OCUPAÇÕES PRINCIPAIS Nº % (em réis) %
Produtores de cacau 4 18,1 3.158,924 1,4
Negociantes 15 68,1 200.312,125 89,5
Produtores de farinha/café/coco 1 4,6 227,000 0,1
Donos de Engenho 1 4,6 20.159,448 9,0
Outros * - 0,0 0,000 0,0
Não Identificada 1 4,6 150,000 0,0
TOTAL 22 100,0 224.007,497 100,0
Fonte: APEB, SJ, 22 inventários. Ilhéus, 1880-1888
(*) Prof. liberais; func. eclesiástico; peq. criadores; madeireiros etc.

462
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Major Joaquim José de Oliveira. Ilhéus. Est. 02, Cx. 749, Maço 1215,
Doc. 07, 30 de out. 1875.
463
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Alferes José Antônio de Guimarães Bastos. Ilhéus. Est. 02, Cx. 738,
Maço 1203, Doc. 12, 10 de fev. 1875.
237

Na década de 1880 a proporção de negociantes entre os inventariados com dívidas


ativas atinge o percentual de 68,1% e eles concentraram 89,5% da soma de todos os créditos
declarados. Isso mostra que tanto a participação quanto a concentração dos negociantes no
sistema de crédito continuam acentuadas. O Tenente Coronel Domingos Lopes da Silva,
negociante, acumulou Rs. 40.238$078 em crédito, disseminado nas mãos de dezenas de
pessoas, comprometendo 59% de toda fortuna inventariada.464 Por que será que esse
negociante estava ofertando tanto crédito na praça de Ilhéus? Havia chances dessas dívidas
serem quitados? No caso deste negociante as suas dívidas foram divididas em cobráveis
(Rs.12.870$000); demoradas (Rs. 26.933$163) e perdidas (Rs. 6.757$116). A julgar por essa
divisão, a maior parte dos devedores tinha potencial para pagamento, sendo que o juiz não
considerou na partilha final as dívidas declaradas como perdidas.465
Voltando atenção para os dados da Tabela 7.4 percebemos que os negociantes
concentraram a distribuição do crédito em Ilhéus. Olhando para as outras tabelas (7.3; 7.2 e
7.1) percebemos que esse quadro de concentração se repete de modo mais ou menos
semelhante e entre 1880 e 1888 essa oferta de crédito estava mais disseminada ainda, visto
que os negociantes correspondiam a 68,1% dos credores.
Luiz Adami foi outro negociante que se destacou nesse período, suas dívidas ativas
custaram Rs. 35.886$468, comprometendo 77% de toda sua fortuna inventariada.466 Na lista
de seus devedores constam: Acrísio Januário Cardoso, negociante da Cachoeira de Itabuna
(Rs. 1.500$000); Os herdeiros do Engenho São João, localizado na Cachoeira de Itabuna,
Firmino Pires Caldas (Rs. 200$000) e Joaquim Pereira Caldas (Rs. 300$000); José Carlos
Adami, filho do inventariado, que também era negociante (Rs. 7.792$502); outro filho do
inventariado, Domingos Adami de Sá, coletor da mesa de rendas provinciais, devia Rs.
5.500$000; entre outras dezenas de devedores espalhados em Almada, na vila de Olivença e
outros lugares.467

464
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Tenente Coronel Domingos Lopes da Silva. Ilhéus. Est. 02, Cx. 759,
Maço 1225, Doc. 03, 10 de out. 1883.
465
Ibidem.
466
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Luiz Adami. Ilhéus. Est. 03, Cx. 1372, Maço 1841, Doc. 18, 28 de maio
1887.
467
Ibidem.
238

Analisando esses exemplos percebemos que os negociantes tinham uma rede de


crédito entre eles e com a população de maneira geral. Os negociantes de maior porte
abasteciam os pequenos com mercadorias e assim eles conseguiam disseminar o sistema de
crédito em várias partes do território, no litoral e pelo interior, como Cachoeira de Itabuna,
por exemplo, que nessa época se tornou um dos mais importantes distritos escravistas e
produtor de cacau de Ilhéus, distante cerca de 30 Km do litoral, com rios, riachos e ribeirões
no interior da mata atlântica, propiciando condições climáticas ideais ao cultivo de cacaueiros.
Acrisio Januário Cardoso era negociante neste distrito, tinha sete escravos, entre
outros bens. Ele devia ao negociante Luiz Adami a quantia de Rs. 1.500$000, mas também
possuía uma extensa lista de devedores, incluindo: Antônio Máximo das Ferradas (Rs.
62$220); Alberto Steiger (Rs. 23$380); Carlos Luiz Cordier (Rs. 602$708); Felix Severino do
Amor Divino (Rs. 112$953); Virgílio Sellman (Rs. 69$000), entre outros. As dívidas ativas
deste negociante (Rs. 33.224$000) correspondiam a 71% de toda fortuna inventariada468.
Aristides Francisco de Vasconcelos Gusmão foi outro negociante que se destacou
nesse período, suas dívidas ativas somaram a quantia de Rs. 15.012$673 e comprometeram
49% de sua fortuna. Em sua lista constam dezenas de devedores, entre eles: Guilhermina,
escrava de Vitória Basto (Rs. 19$806); Pedro Escola Homem Del Rey (Rs. 3$000); Alberto
Steiger (Rs. 51$910); Antônio, escravo de [Fm.] Alves (Rs. 23$990); Ignácio, escravo de Juca
(Rs. 8$410); Pedro gato, escravo de João de Meneses (Rs. 9$800); Alice, escrava do capitão
Evaristo (Rs. 5$000); Benvenuto africano (Rs. 11$400); Antônio, seu escravo (Rs. 4$800),
entre outros469.
Entre os produtores de cacau com dívidas ativas no período 1880-1888 se destacou o
Alferes João Carlos Hohlenweger, dono da fazenda Óculos, no Almada, que entre os
produtores de cacau foi o que concentrou maior parte das dívidas (Rs. 2.485$264),
correspondendo estas à 21% de sua fortuna. Apenas duas pessoas aparecem em sua lista de

468
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Acrísio Januário Cardoso. Ilhéus. Est. 03, Cx. 1298, Maço 1767,
Doc.08, 21 de abr. 1887.
469
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Aristides Francisco de Vasconcelos Gusmão. Ilhéus. Est. 02, Cx. 762,
Maço 1228, Doc.09, 30 de ago. 1886.
239

devedores: Antônio Henrique de Aguiar (Rs. 1.985$264) e Gentil José de Castro (Rs.
500$000)470.
O único dono de engenho que apresentou dívida ativa no período 1880-1888 acumulou
a quantia de Rs. 20.159$448, correspondendo a 33% de sua fortuna. Entre os devedores
constam seu irmão, o Capitão José de Melo Sá (Rs. 3.464$4480); seu genro Fernando Steiger
a quantia de Rs. 800$000 (dinheiro da venda de um escravo); sua nora Paulina Kahene de Sá,
a quantia de 2.450$000 (dinheiro da venda de dois escravos e da liberdade da escrava Lina
que ofereceu seu valor); Tenente Coronel Joaquim José de Calazans Bitencourt (Rs.
4.445$000) e a própria esposa, Rita Constança de Melo Sá, que devia a quantia de Rs.
9.000$000 referente ao dinheiro da venda do Engenho Esperança.471
Esses exemplos mostram alguns aspectos do sistema de crédito que se espalhou pelo
território da comarca de Ilhéus ao longo da segunda metade do século XIX, precisamente
entre 1850-1888. Os negociantes foram os grupos que mais se destacaram entre os credores,
sendo que a principal oferta de crédito era por via de compras realizadas em suas casas de
negócio. Não obstante, eles emprestavam dinheiro e cobravam juros por esses empréstimos,
que muitas vezes aparecem nos inventários com a descrição de letras. Alguns donos de
engenho também tinham balcão com armação para negócio, forneciam crédito e emprestava
dinheiro, como ocorria nos engenhos Castelo Novo e União.
Por outro lado, a maioria dos produtores de cacau, bem como os demais lavradores
tinham participação relativamente baixa no sistema de crédito. Existiam famílias abastadas
envolvidas com plantação de cacau que emprestavam dinheiro, mas no geral eles não eram os
principais credores da praça de Ilhéus.
Analisar as dívidas passivas ajudará a entender o outro lado desse sistema, ou seja,
quais os grupos que mais acumularam dívidas passivas. Qual o lugar dos produtores de cacau,
negociantes, donos de engenho e demais inventariados nesse sistema? Na próxima seção
tentamos elucidar essas questões.

470
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Alferes João Carlos Hohlenwegner. Ilhéus. Est. 02, Cx. 762, Maço
1228, Doc. 12, 20 de abr. 1886.
471
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Rita Constança de Melo Sá. Ilhéus. Est. 02, Cx. 759, Maço 1225, Doc.
04, 28 de ago. 1880.
240

7.3 - As dívidas passivas nos inventários

As dívidas passivas permitem avaliar os devedores que foram descritos nos inventários
post mortem de Ilhéus. Já constamos que os negociantes concentraram os créditos (dívidas
ativas), agora queremos saber quais foram os grupos que mais acumularam dívidas a pagar, as
chamadas dívidas passivas. Estamos interessados em verificar se os produtores de cacau eram
os principais devedores e qual o lugar dos negociantes, donos de engenho e demais
inventariados nesse contexto.
Inicialmente vamos analisar a distribuição dos inventários que apresentaram dívidas
passivas ao longo do período 1850-1888. Isso permitirá conhecer, num primeiro momento, a
movimentação dessas dívidas no decorrer das décadas.

Gráfico 7.2 – Distribuição dos inventários por décadas segundo a


presença de dívidas passivas. Ilhéus, 1850-1888
140
120
Nº DE INVENTÁRIOS

100
80
60
40
20
0
1850-1859 1860-1869 1870-1879 1880-1888

Com dívidas passivas Sem dívidas passivas


Fonte: APEB, SJ. 211 inventários. Ilhéus, 1850-1888

O Gráfico 7.2 mostra que ao longo das décadas ocorreu aumento do número de
inventários com dívidas passivas. Ao que parece durante a expansão da lavoura cacaueira
muitas pessoas se endividaram. Conhecer essas pessoas pode revelar outro aspecto importante
do sistema de crédito que se desenvolveu em Ilhéus no período 1850-1888. Vamos avaliar
241

cada década separadamente para entendermos as particularidades de cada período e no final


discutiremos a tendência geral.

Tabela 7.5 – Dívidas passivas segundo a ocupação principal dos inventariados.


Ilhéus, 1850-1859
Inventários c/ dívidas passivas Inventários Soma das dívidas passivas
OCUPAÇÕES PRINCIPAIS Nº % (em réis) %
Produtores de cacau 2 20,0 2.119,892 1,2
Negociantes 2 20,0 41.293,646 94,0
Produtores de farinha/café/coco 1 10,0 268,270 0,6
Donos de Engenho - 0,0 0,000 0,0
Outros * 3 30,0 1.027,697 2,3
Não Identificada 2 20,0 878,117 1,9
TOTAL 10 100,0 45.587,622 100,0
Fonte: APEB, SJ. 10 inventários. Ilhéus, 1850-1859
(*) Prof. liberais; func. eclesiástico; peq. criadores; madeireiros etc.

Na década de 1850 os negociantes acumularam a maior parte das dívidas passivas,


concentrando 94% da soma em apenas 2 inventários, 20% do total. O negociante Joaquim
José da Costa Seabra, acumulou a maior parte dessas dívidas, ou seja, Rs. 40.957$922. Este
valor, no entanto, corresponde apenas ao que foi acatado pelo juiz, pois algumas dívidas
foram contestadas. Esse negociante devia a diversas firmas de Salvador, inclusive o seu
funeral foi realizado na capital, e as despesas foram pagas pelo seu genro, Manoel José
Correia, negociante na praça da Bahia, ao qual o inventariado também devia soma expressiva
(Rs. 22.036$822), dessa quantia foram gastos Rs. 1.013$320 com despesas do funeral, mas
posteriormente os herdeiros contestaram e recorreram ao Tribunal da Relação, alegando que
as despesas declaradas por este genro foram simuladas.472
Joaquim José da Costa Seabra também possuía dívidas com a Irmandade das Almas
(Rs. 30$000); devia dinheiro à Câmara Municipal referente ao imposto da décima urbana (Rs.
45$000); devia ao escrivão do juízo, Antônio Mendes de Castro, a quantia de Rs. 501$999;
devia à Fazenda Nacional a quantia de Rs. 697$738 “das precatória recebidas quando

472
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Joaquim José da Costa Seabra. Ilhéus. Est. 08, Cx. 3424, Maço n/c,
Doc.06, 17 de set. 1856.
242

administrador da mesa de rendas da vila, que não prestou contas na tesouraria mas consta
recibo dos contribuintes”, além de outras dívidas.473
Esse negociante parece ter se destacado em Ilhéus nos meados do século XIX, como
evidenciam os informes do seu inventário. Quanto aos demais inventariados da década de
1850 percebemos que eles ficaram com 6% da soma das dívidas passivas, ou seja, uma
pequena parte, constituída por diferentes tipos de dívidas.
Manoel Rodrigues de Brito, por exemplo, tinha propriedade em Itabuna, criava
bovinos e produzia farinha, seu inventário foi aberto em 1855 e entre as dívidas passivas
consta Rs. 7$360 à Irmandade do Santíssimo Sacramento; despesas com o funeral, Rs.
44$460; despesas com o padre Pedro Januário Cardoso, Rs. 15$760, “de exigências feitas
pelo falecido”.474
Manoel Brígido da Silva era negociante em Ilhéus, dono de dois escravos e serraria
quando faleceu em 1856, ano de abertura de seu inventário.475 Entre suas dívidas passivas
consta o valor de Rs. 1.998$054 devido à Constantino Pereira da Costa, da vila de Camamu,
que declarou ao juiz “que emprestou diversas quantias ao inventariado quando vivo, para
compras de jacarandá, arroz e outros gêneros”476. Nos autos do processo a viúva reconheceu a
dívida como verdadeira e disse “que há muito tempo o suplicante supria com dinheiro seu
marido para carregamento das embarcações, tendo a meação dos lucros e prejuízos”.477
Todavia, no final do processo o juiz acatou apenas o valor de Rs. 335$724 para pagamento
desta dívida.
Esses exemplos ilustram algumas das articulações dos negociantes de Ilhéus com a
praça de Salvador e com outras vilas do sul da Bahia. Essa dinâmica parece ter se
intensificado ao longo das décadas, influenciada pelo crescimento do número de engenhos e
pela expansão do cultivo de cacau, que motivou os negociantes a expandirem o sistema de

473
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Joaquim José da Costa Seabra. Ilhéus. Est. 08, Cx. 3424, Maço n/c,
Doc.06, 17 de set. 1856.
474
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Manoel Rodrigues de Brito. Ilhéus. Est. 02, Cx. 783, Maço 1250, Doc.
10, 12 de maio 1855.
475
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Manoel Brígido da Silva. Ilhéus. Est. 02, Cx. 786, Maço 1253, Doc.12,
18 de jul. 1856.
476
Ibidem.
477
Ibidem.
243

crédito em Ilhéus. Vamos avançar na investigação das próximas décadas para avaliar melhor
essa hipótese.

Tabela 7.6 – Dívidas passivas segundo a ocupação principal dos inventariados.


Ilhéus, 1860-1869
Inventários c/ dívidas passivas Inventários Soma das dívidas passivas
OCUPAÇÕES Nº % (em réis) %
Produtores de cacau 23 57,5 9.168,258 22,3
Negociantes 8 20,0 19.664,137 48,0
Produtores de farinha/café/coco 7 17,5 4.401,494 10,7
Donos de Engenho 1 2,5 393,250 0,9
Outros * 1 2,5 7.467,139 18,1
Não Identificada - 0,0 0,000 0,0
TOTAL 40 100,0 41.094,278 100,0
Fonte: APEB, SJ. 40 inventários. Ilhéus, 1860-1869
(*) Prof. liberais; func. eclesiástico; peq. criadores; madeireiros etc.

Observando os dados da Tabela 7.6 percebemos que na década de 1860 o quadro de


alocação das dívidas passivas entre os inventariados se mostrou um pouco diferente daquele
apresentado na Tabela 7.5. Do total de 40 inventários com dívidas passivas a maior parte
(57,5%) era constituída por produtores de cacau, sendo que eles acumularam 22,3% da soma
das dívidas.
Podemos cogitar a possibilidade de algum produtor de cacau ter concentrado a maior
parte das dívidas passivas declaradas nos inventários da década de 1860, mas não foi o que
ocorreu. O dono da maior quantia possuía 15,3% do montante, Eugênia Renaud Vinch, que
devia Rs. 1.408$352 a Afonso Ayala Vasconcelos, negociante de Ilhéus.478 A falecida era
casada com Jacob Vinch, o casal possuía quatro filhos, uma plantação com 836 cacaueiros,
entre outros bens, sendo a fortuna da família calculada no valor de Rs. 1.497$600, a maior
parte destinada ao pagamento das dívidas.479

478
Ver o nome de Afonso de Ayala Vasconcelos no livro de imposto sobre casas de negócio. APEB, SCP.
Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre casas de negócios. Maço 5455. Ilhéus, 1874-1892.
479
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Eugenia Renaud Vinch. Ilhéus. Est. 02, Cx. 742, Maço 1207, Doc. 10,
09 de set. 1869.
244

Antes de falecer, em 1860, Maria Alexandrina de Jesus era casada com Domingos da
Silva Santos e o casal possuía três filhos com idades entre 6 e 15 anos, uma plantação com
311 cacaueiro no lugar Itaípe, além de plantações de café, coco e dendê, entre outros bens,
sendo a fortuna da família calculada no valor de Rs. 1.181$780 e entre as dívidas passivas
constam as seguintes somas: Rs. 523$000 ao negociante Joaquim Lopes da Silva, referente
aos suprimentos que lhe fizera em vida; Rs. 20$000 ao médico estrangeiro, morador na vila,
pelas visitas feitas; e Rs. 240$000 à filha de Joaquim, sem especificação da origem480.
Esse quadro revela que durante o processo de expansão da lavoura cacaueira os
produtores de cacau contraíram dívidas com os negociantes, que lhes forneciam suprimentos
essenciais para a sobrevivência, pagos com cacau e outros gêneros da lavoura, como
ressaltamos em várias passagens da tese.
Na década de 1860 os negociantes continuam concentrando a maior parcela das
dívidas passivas (48%), mas a outra parte, pouco mais da metade, estava disseminada entre os
inventariados com menos cabedal econômico, constituída por produtores de cacau (22,3%);
produtores de farinha/café/coco (10,7%) e demais inventariados, a exemplo dos profissionais
liberais, funcionários eclesiásticos, pequenos criadores etc., que acumularam 18,7% das
dívidas passivas declaradas nos inventários da década de 1860.
Entre os negociantes Joaquim Lopes da Silva foi o que acumulou a maior parte das
dívidas passivas (Rs. 6.850$454), devendo para três firmas estabelecidas na praça de
Salvador, quais sejam: Manoel Joaquim Rodrigues & Cia, a quantia de Rs. 332$625; Batista
& Silva, a quantia de Rs. 562$795 e a José de Souza Rocha & Irmão, a quantia de Rs.
5.955$034, todas referentes a artigos comerciais e sortimentos comprados para sua casa de
negócio em Ilhéus. A fortuna desse negociante foi calculada em Rs. 17.501$615.481
Antônio da Cunha Marelim foi outro negociante que possuía dívidas na praça de
Salvador, proveniente de gêneros comprados para abastecimento de sua casa de negócio em
Ilhéus, entre as firmas da capital que ele devia encontramos: José de Souza Rocha & Irmão,
devia Rs. 1.052$712; Gomes & Irmão, Rs. 77$380; Bastos & Almeida, Rs. 85$856, entre

480
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Maria Alexandrina de Jesus. Ilhéus. Est.02, Cx. 784, Maço 1251, Doc.
20, 24 de ago. 1864.
481
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Joaquim Lopes da Silva. Ilhéus. Est.02, Cx. 785, Maço 1252, Doc. 06,
24 de abr. 1866.
245

outras dívidas que o negociante tinha na praça de Ilhéus. A fortuna desse negociante foi
calculada em Rs. 11.700$473.482
Esses exemplos demonstram que havia uma dinâmica intrínseca entre os negociantes
que atuavam em Ilhéus com aqueles estabelecidos em Salvador, capital da província, que
abrigava um dos maiores portos do Império, recebendo mercadorias vindas de outras partes
do Brasil e de países estrangeiros.
Analisar as outras décadas pode revelar se o quadro de alocação das dívidas passivas
sofreu alteração ou se a tendência do decênio anterior se manteve.

Tabela 7.7 – Dívidas passivas segundo a ocupação principal dos inventariados.


Ilhéus, 1870-1879
Inventários c/ dívidas passivas Inventários Soma das dívidas passivas
OCUPAÇÕES PRINCIPAIS Nº % (em réis) %
Produtores de cacau 56 66,0 39.519,275 32,6
Negociantes 8 9,4 39.960,246 33,0
Produtores de farinha/café/coco 3 3,5 2.656,739 2,1
Donos de Engenho 4 4,7 31.454,140 26,0
Outros * 2 2,3 615,590 0,5
Não Identificada 12 14,1 7.047,443 5,8
TOTAL 85 100,0 121.253,433 100,0
Fonte: APEB, SJ. 85 inventários. Ilhéus, 1870-1879
(*) Prof. liberais; func. eclesiástico; peq. criadores; madeireiros etc.

Na década de 1870 os produtores de cacau concentraram 32,6% da soma de todas as


dívidas passivas e passaram a constituir o principal grupo a acumular dívidas (66%). O
produtor de cacau que acumulou a maior dívida passiva foi José Joaquim Monteiro, com Rs.
3.281$701, correspondente a 8,3% da soma. Ele devia ao Major Fortunato Pereira Galo, dono
de engenho, a quantia de Rs. 2.476$390, referente a uma letra passada; ao negociante Luiz
Adami e seu filho, Domingos Adami de Sá, a quantia de Rs. 202$840 de compras realizadas

482
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Antônio da Cunha Marelim. Ilhéus. Est.02, Cx. 785, Maço 1252, Doc.
02, 06 de ago. 1866.
246

na loja; a José Gonçalves Barreiro, comerciante de Salvador, a quantia de Rs. 196$460 e a


Francisco José Gomes devia a quantia de Rs. 406$011, cuja origem não foi especificada. 483
Os negociantes acumularam 33% da soma das dívidas passiva declaradas nos
inventários da década de 1870. O Alferes Francisco Vitório de Salles Leite, dono da Fazenda
Olandi e outras propriedades, foi o negociante que concentrou a maior quantia, Rs.
12.540$505, a maior parte era composta por dívidas com negociantes da praça de Salvador: a
Domingos Mendonça de Athayde e Cia devia Rs. 5.929$106, uma parte paga com remessas
de cacau; a Vicente Ferreira da Silva Amaral e Cia, devia Rs. 480$310; a Antônio de Oliveira
Guerra devia Rs. 1.850$520, entre outras484.
Adelina Sellman, esposa de Bernardo Sellman, falecida em 1876, acumulou Rs.
11.021$449 em dívidas passivas, a maior parte contraída com negociantes de Salvador. Este
casal tinha casas de negócio em Ilhéus, Cachoeira de Itabuna e Olivença, além de fazendas,
fornecendo créditos para a população e figurando entre os donos de grandes somas em dívidas
passivas: devia para [Vougham MC Nair] e Cia a quantia de Rs. 5.251$863; devia para
Francisco Pinto Gonçalves Pereira a quantia de Rs. 3.217$299; entre outras dívidas com
negociantes de Salvador, proveniente de transações comerciais.485
As conexões mercantis entre os negociantes de Ilhéus com a praça de Salvador eram
fortes, como evidenciam os exemplos até aqui analisados e os valores das dívidas contraídas.
Ao que parece essas relações se intensificaram junto com o processo de expansão da lavoura
cacaueira.
O último período do nosso estudo foi o que concentrou a maior parte dos cacaueiros
arrolados nos inventários de Ilhéus. Vamos avaliar a distribuição das dívidas passivas nesse
período para entendermos o comportamento do sistema de crédito no período de arranque da
economia cacaueira e desagregação do sistema escravista.

483
APEB, Seção Judiciária, Inventários, José Joaquim Monteiro. Ilhéus. Est. 02, Cx. 753, Maço 1219, Doc. 10,
26 de jul. 1876.
484
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Alferes Francisco Vitório de Salles Leite. Ilhéus. Est. 04, Cx. 1372,
Maço 1841, Doc. 01, 24 de fev. 1875.
485
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Adelina Sellmam. Ilhéus. Est. 02, Cx. 781, Maço 1248, Doc. 07, 13 de
mar. 1876.
247

Tabela 7.8 – Dívidas passivas segundo a ocupação principal dos inventariados.


Ilhéus, 1880-1888
Inventários c/ dívidas passivas Inventários Soma das dívidas passivas
OCUPAÇÕES PRINCIPAIS Nº % (em réis) %
Produtores de cacau 49 64,5 63.354,673 24,2
Negociantes 16 21,0 183.934,618 70,2
Produtores de farinha/café/coco 4 5,2 2.400,237 0,9
Donos de Engenho 1 1,3 1.478,976 0,6
Outros * 3 4,0 9.268,569 3,5
Não Identificada 3 4,0 1.610,520 0,6
TOTAL 76 100,0 262.047,593 100,0
Fonte: APEB, SJ. 76 inventários. Ilhéus, 1880-1888
(*) Prof. liberais; func. eclesiástico; peq. criadores; madeireiros etc.

Os dados da Tabela 7.8 mostram que os produtores de cacau representaram 64,5% dos
inventariados com dívidas passivas e concentraram quase um quarto (24,2%) da soma dessas
dívidas na década de 1880. Os negociantes, acumularam a maior parte das dívidas passivas
neste período (70,2%), mas representaram 21% dos inventariados.
O produtor de cacau com a maior soma em dívidas passivas foi Carlos Stephanie
Hohlenweger, dono da Fazenda São Thiago, com uma quantia de Rs. 7.384$228 de dívidas
contraídas com os seguintes negociantes: Tenente Antônio Henrique de Aguiar (Rs.
3.000$000) e ao seu sogro, Domingos José de Lemos, a quantia de Rs. $.384$228. Ele
também pagava suas dívidas com cacau.486
A viúva Adelaide de Melo Sá Oliveira, que tinha fazenda de cacau na Cachoeira de
Itabuna, acumulou dívidas no valor de Rs. 4.546$366. Ela devia ao negociante de Salvador,
Major José da Cunha Marelim, a quantia de Rs. 1.232$388 proveniente de conta corrente,
incluindo compras de gêneros e empréstimos; devia ao negociante de Ilhéus, Albino Francisco
Martins, a quantia de Rs. 2.415$998, entre outras dívidas.487

486
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Carlos Stephanie Hohlenweger. Ilhéus. Est. 02, Cx. 762, Maço 1228,
Doc. 10, 20 de abr. 1886.
487
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Adelaide de Melo Sá Oliveira. Ilhéus. Est. 08, Cx. 3424, Maço n/c, Doc.
04, 17 de fev. 1888.
.
248

Francisca Xavier dos Santos, também tinha fazenda de cacau na Cachoeira de Itabuna,
no lugar denominado jacarandá e acumulou dívidas passivas no valor de Rs. 3.662$441, boa
parte contraída com Albino Francisco Martins (Rs. 3.429$761), negociantes de Ilhéus.
Existem outros exemplos semelhantes, indicando que frequentemente os produtores de cacau
contraíam dívidas, sobretudo com os donos de casas de negócio.
As dívidas passivas dos negociantes representaram somas expressiva na década de
1880, totalizando Rs. 183.934$618. O Tenente Coronel Domingos Lopes da Silva concentrou
(33%), ou seja, Rs. 60.400$245, correspondente a dívidas com credores de Ilhéus e Salvador.
O monte-mor deste negociante chegou a Rs.68.103$308 e as dívidas passivas comprometeram
88% da sua fortuna, sendo que a viúva, por meio do seu curador, reuniu os credores e fez uma
partilha amigável com eles, sobrando para ela a quantia de Rs. 6.500$000.488
Bernardo Sellman foi outro negociante que se destacou neste período, falecendo com
dívidas passivas no valor de Rs.33.884$699, sendo que o montante da sua fortuna (Rs.
26.718$588) foi insuficiente para o pagamento de todas as dívidas. Neste processo o juiz
separou os credores em dois grupos: credores privilegiados, que ficaram com Rs. 10.043$577
e os não privilegiados, que ratearam entre eles Rs. 16.675$015. Este homem, que atuou como
presidente da Câmara municipal, devia a diversos negociantes de Ilhéus e Salvador, além
disso, também devia impostos municipais489.
Esses exemplos demonstram que a relação dos negociantes de Ilhéus com a praça de
Salvador foi constante durante todo o período 1850-1888. Encontramos muitos casos
comprovando essas ligações, evidenciando assim uma rede de trocas de mercadorias entre as
aludidas localidades. Os negociantes compravam mercadorias na capital para abastecer o
mercado interno de Ilhéus, oferecendo crédito aos agricultores que pagavam suas contas com
produtos da lavoura, que eram remetidos para a capital, onde eram comercializados e
utilizados para pagamento de dívidas.

488
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Tenente Coronel Domingos Lopes da Silva. Ilhéus. Est. 02, Cx. 759,
Maço 1225, Doc. 03, 10 de out. 1883.
489
APEB, Seção Judiciária, Inventários, Major Bernardo Sellmam. Ilhéus. Est. 02, Cx. 755, Maço 1221, Doc.
01, 11 de nov. 1881.
249

***

Esse capítulo abordou as dívidas ativas e passivas declaradas nos inventários post
mortem de Ilhéus entre 1850-1888. Os informes obtidos com a compulsão dos dados indicam
forte concentração do sistema de crédito nas mãos dos negociantes. Contudo, as compras
realizadas nas casas de negócio não constituíram o único mecanismo de acesso ao crédito, o
sistema monetário parece estar se expandindo em Ilhéus nesta época e foi comum
encontrarmos empréstimos entre os inventariados, sobretudo a partir da década de 1870.
Os negociantes se tornaram os principais agentes da expansão desse sistema, com
casas de negócio espalhadas na vila e no interior. Constatamos a existência de redes de
ramificações entre eles, sendo que os mais afortunados abasteciam os pequenos negociantes,
que por sua vez se espalharam pelo interior, fornecendo crédito a várias pessoas, inclusive
indígenas, crioulos e africanos.
Notamos que as dívidas passivas dos produtores de cacau cresceram ao longo das
décadas investigadas, embora os negociantes também concentrassem boa parte delas. Se por
um lado os negociantes forneciam crédito, do outro encontramos muitos produtores de cacau
se endividando ao longo do período. Essa relação incidiu entre muitos inventariados e as
implicações disso merecem estudo aprofundado, que no momento não temos condições de
realizar.
Existem evidências indicando que os produtores de cacau e outras pessoas que
contraíam dívidas e ao fim da vida não podiam quitá-las perdiam suas propriedades.
Encontramos vários inventários com termos de transmissão de propriedade no final do
processo. Outrossim, encontramos herdeiros que se queixavam das contas apresentados ao
juiz pelos negociantes. Esses casos mostram um emaranhado de relações de trocas
estabelecidas no mercado interno de Ilhéus.
Os negociantes e donos de engenho estavam entre os mais ricos inventariados que
investigamos e neste capítulo percebemos que muitos tinham fortes relações comerciais com a
praça de Salvador, onde eles também contraíam dívidas. Encontramos muito negociantes
cujas riquezas estavam comprometidas com dívidas passivas e outros cujo patrimônio foram
completamente destinados ao pagamento das dívidas, isso ocorreu, por exemplo, como
250

Bernardo Sellman490 e com José Simeão Moreno491, este último um dos homens que mais
atuou na economia de exportação de Ilhéus.
Esses e outros casos em que as dívidas passivas comprometeram parcela significativa
da riqueza do falecido sugere que, talvez, naquela época a rentabilidade da lavoura cacaueira
ainda não era capaz de gerar divisas suficiente para compensar os gastos com compras de
mercadorias em Salvador, destinadas ao abastecimento do mercado interno de Ilhéus.
Todavia, essa situação certamente se modificou nos próximos decênios, quando as plantações
cresceram e os preços do cacau no mercado externo se elevaram. Não obstante, a escravidão
estava com os dias contados e o trabalho escravo não participou dessa nova fase de
consolidação da economia cacaueira em Ilhéus, porém, acreditamos que a estrutura de oferta
de crédito pelos negociantes continuou, além do sistema de cobrança de impostos, que
impunham dificuldades ao enriquecimento dos pequenos produtores e favoreciam o aumento
dos lucros dos negociantes, como ressaltou Antônio Fernando Guerreiro de Freitas492.

490
APEB, Seção Judiciária, Inventários. Ilhéus. Major Bernardo Sellman. Est. 02, Cx. 755, Maço 1221, Doc. 01,
11 de nov. 1881.
491
APEB, Seção Judiciária, Inventários. Ilhéus. José Simeão Moreno dos Reis. Ilhéus. Est. 02, Cx. 781, Maço
1248, Doc. 10, 09 de jul. 1881.
492
FREITAS, Antônio Fernando Guerreiro. Os donos dos frutos de ouro. Dissertação (Mestrado em Ciências
Sociais). ICS-UFBA. Salvador, 1979.
251

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Essa pesquisa analisou a comarca de Ilhéus entre 1850 e 1888 dedicando atenção aos
aspectos econômicos e às relações escravistas. A documentão que serviu de suporte para as
análises é composta, principalmente, por inventários post mortem, Livros de cobrança de
impostos e o Livro de classificação dos escravos493.
Inicialmente o estudo demonstrou alguns aspectos do mercado interno até agora pouco
examinado pela historiografia. Os livros de cobrança de impostos revelaram a existência de
diversos estabelecimentos comerciais, com negociantes oferecendo carne bovina e suína,
ferramentas, pólvora, utensílios domésticos, e outros gêneros necessários à sobrevivência da
população.
Esses negociantes desempenharam papel relevante no processo de abastecimento
interno, vendendo mercadorias, fornecendo crédito, promovendo a circulação de produtos e a
exploração dos recursos do território. Os negócios incluíam a derrubada da mata para extração
de madeiras, exportações de cacau, café, cachaça, piaçava e couros.
Os negociantes foram agentes importantes do processo de expansão da lavoura
cacaueira e dinamizaram a economia de Ilhéus como um todo. Não só porque ofereciam
crédito, mas também porque detinham os recursos necessários à exportação dos artigos e
comercialização na capital (Salvador) e outras regiões do Império.
José Carlos Adami, por exemplo, dono da Loja e armazém Guarany, se destacou nesse
contexto494. Muitos inventariados faleceram com dívidas referentes às compras realizadas em
sua casa de negócio. Ademais, ele aparece, juntamente com o seu pai, Luiz Adami, na lista
dos principais exportadores de cacau e café de Ilhéus495. Essa família se destacou nas relações
comerciais internas e nas exportações. Outro integrante desse grupo, Domingos Adami de Sá,
era coletor da mesa de rendas provinciais e integrou a junta de classificação dos escravos para

493
Ver listagem dos inventários e Livros de impostos em Anexo. p. 289.
494
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre casas de negócios. Maço 5455. Ilhéus, 1874-1892.
495
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de cacau e café. Maço 5459. Ilhéus, 1871-
1885.
252

libertação pelo fundo de emancipação do município496. Entre os grandes escravistas da


localidade estavam presentes vários membros da família Sá Bitencourt Câmara.
Além da presença marcante nas atividades relacionadas com o abastecimento interno e
economia de exportação, identificamos outros negociantes, até então pouco conhecidos pela
historiografia, que se destacaram nas exportações, controlando parcela expressiva dessa
atividade, como foi o caso da família de José Simeão Moreno dos Reis.
Esse negociante tinha uma lancha em sociedade com Bernardo Sellman, um dos
presidentes da Câmara municipal de Ilhéus, com vínculos comerciais na praça de Salvador.
Eles cobravam fretes pelo transporte de mercadorias e repartiam o lucro das viagens, como
consta nos autos dos processos de inventários497.
A nossa pesquisa contribuiu para mostrar detalhes importantes sobre os principais
grupos envolvidos no abastecimento interno e nas exportações de Ilhéus, revelando os nomes
dos agentes que se destacaram em cada atividade, os produtos negociados e a cobrança de
impostos.
A pesquisa também possibilitou conhecer aspectos relacionados com as redes de
abastecimento interno e as ligações com a praça de Salvador. As listas de compras que os
negociantes apresentavam ao juiz nos autos do processo de inventários de seus devedores são
ricas em informações sobre as mercadorias consumidas em Ilhéus e os preços de venda,
merecendo investigação aprofundada. As dívidas passivas, por sua vez, fornecem dados
relevantes sobre a ligação dos negociantes de Ilhéus com as casas comerciais da capital
baiana. Com frequência, eles despachavam produtos para Salvador e se abasteciam por lá com
mercadorias vindas do exterior e de outras partes do Brasil, comercializando-as em Ilhéus.
Ao que parece essa atividade possibilitou o acúmulo de riquezas para os negociantes,
que estavam entre os grupos mais abastados. Esta foi outra constatação da pesquisa.
Analisando as hierarquias sociais por meio da comparação das fortunas inventariadas
percebemos que os donos de engenho e negociantes estavam entre os grupos sociais mais
ricos de Ilhéus na época. Sugerindo que a produção de açúcar e as atividades comerciais eram

496
APEB, SCP. Livro de classificação dos escravos para serem libertos pelo fundo de emancipação. Lv. 7008.
Ilhéus, 1874-1886.
497
APEB, Seção Judiciária, Inventários. Ilhéus. José Simeão Moreno dos Reis. Est. 02, Cx. 781, Maço 1248,
Doc. 10, 09 de jul. 1881; APEB, Seção Judiciária, Inventários. Ilhéus. Major Bernardo Sellman. Est. 02, Cx. 755,
Maço 1221, Doc. 01, 11 de nov. 1881.
253

os ramos mais rentáveis da economia. A investigação dos bens móveis das casas desses
grupos revelou a diversidade de mobílias: utensílios domésticos, talheres de prata, objetos de
ouro, sofás, cômodas e mesas de madeira branca, dentre outros móveis.
Por outro lado, a maioria dos produtores de cacau, café, coco e farinha de mandioca
era composta por pequenos lavradores, pessoas de pouco cabedal econômico, que no geral
viviam em casas de taipa cobertas de palha, com poucos móveis e algumas ferramentas.
Analisando a distribuição da população escrava entre os diferentes grupos sociais
percebemos alguns desses contrastes. A posse de escravos estava disseminada em 36% dos
inventários, com muitas propriedades contendo entre 1 e 3 cativos, sendo que a maior
concentração de escravos se encontrava nos engenhos. Os donos do Engenho Castelo Novo,
com 54 escravos, dentre outros bens, foi a família com a maior fortuna inventariada,
Rs.89.797$030498.
Também encontramos escravos nas fazendas de cacau e outras atividades, mas a
maioria dos lavradores deste fruto (76,3%) era formada por famílias que não possuíam cativos
e a maior parte dos cacaueiros era cultivada com uso do trabalho familiar, sendo que no geral
as plantações eram pequenas, grande parte chegando no máximo a 5 mil cacaueiros.
Embora estivesse presente na pauta de exportações da Bahia desde o início do século
XIX, o cacau não se destacou entre os principais itens de exportação, pelo menos até a década
de 1870. Mesmo assim, aos poucos a cultura foi sendo disseminada no sul da Bahia, com
várias espécies da planta sendo testadas e adaptadas ao território. A partir de 1880 o produto
alcançou maior valorização, chegando a custar Rs. 7$000 o preço da arroba499.
Ao longo desse período a cultura do cacau se expandiu principalmente por meio das
pequenas propriedades, instaladas nas margens dos rios e no interior da mata. Nessa época os
preços dos escravos sofreram elevação e poucas famílias tinham condições de comprar
cativos para investir na expansão da cultura. Assim, muitos lavradores também se dedicavam
à fabricação de farinha de mandioca, consorciando plantações de cacau com café, coco, dendê
e outras culturas, importantes para a subsistência.

498
APEB, Seção Judiciária, Inventários. Ilhéus. Maria José Leola Del Rey e Carolina Leola Del Rey. Est. 02, Cx.
789, Maço 1253, Doc. 06, 28 de fev. 1861.
499
Ver, por exemplo: APEB, Seção Judiciária, Inventários. Ilhéus. Tenente Coronel Domingos Lopes da Silva.
Est. 02, Cx. 759, Maço 1225, Doc. 03, 10 de out. 1883.
254

Esses dados são bastantes reveladores da dinâmica da economia de Ilhéus. Muitos


habitantes recorriam às casas de negócios para comprar mantimentos e pagavam suas compras
com produtos da lavoura.
Embora o volume das exportações de muitas mercadorias analisadas tenha se
reduzido, a economia mostrou-se bastante diversificada, com circulação de muitos itens.
Ademais, uma parte da produção devia escapar da fiscalização e alguns produtos deviam ser
isentos de tributos, como o açúcar e a farinha, por exemplo. Outros estavam sujeitos às
oscilações da demanda externa, sobretudo o cacau. Desse modo, é importante salientar que os
livros de cobrança de impostos não dão conta de explicar toda a dinâmica da economia.
No que diz respeito à escravidão a tese apresentou dados sobre a estrutura da posse de
escravos, as características demográficas da população cativa e os preços dos escravizados ao
longo das décadas. O estudo dessas variáveis permitiu conhecer algumas particularidades da
escravidão em Ilhéus e a relação com o contexto econômico.
Notamos, por exemplo, que poucas famílias tinham grandes escravarias, com mais de
vinte cativos. A maior parte dos plantéis possuía de um a três escravos. Além disso
encontramos elevado percentual de mulheres e crianças entre os escravizados, indicando que
houve incentivo à reprodução natural e à formação de famílias.
Ao que parece esse foi um dos mecanismos utilizados pelos escravistas de Ilhéus para
prolongar a escravidão na localidade. A exploração do trabalho escravo continuou sendo a
principal fonte de acumulação de riqueza até a véspera da abolição. Os escravos eram parte
significativa do patrimônio de muitos inventariados. No geral, as famílias mais ricas eram as
que possuíam maior número de cativos.
A tese também avançou na análise de algumas questões sobre a vida dos escravizados.
Ainda que as fontes selecionadas não sejam muito reveladoras de suas estratégias de
sobrevivência e resistência conseguimos perceber o protagonismo deles em várias ocasiões.
Encontramos escravas casadas na Igreja com escravos, homens livres e libertos,
algumas conseguiram comprar a alforria e as quantias pagas por elas aparecem nos autos do
processo de inventários. Alguns cativos possuíam plantações de cacau, indicando que eles
cultivavam pequenas lavouras e certamente comercializavam os produtos no mercado interno.
255

Vários escravos possuíam dívidas com os negociantes, possivelmente pagas com produtos da
lavoura e/ou prestação de serviços.
A escravidão marcou de modo indelével a vida dessas pessoas. Encontramos vários
casos de crianças separadas de seus familiares, sendo doadas ou vendidas. Outras eram
exploradas desde tenra idade nos serviços domésticos e nas lavouras sendo que essa questão
merece estudo particular, que infelizmente não conseguimos realizar na tese.
Em algumas situações encontramos escravizados sendo arrematados em praça pública
para o pagamento das dívidas dos inventariados, bem como a declaração de escravos
foragidos. A abertura dos inventários e divisão do patrimônio entre herdeiros e credores era
quase sempre um momento de incertezas para os escravizados, talvez por isso alguns
optassem pela fuga.
De todo modo, viver como fugitivo também significava enfrentar diversos riscos,
próprios da escravidão. Assim, acreditamos que eles se articularam e resistiram de diferentes
formas ao cativeiro. Trabalhar, construir família, criar os filhos e estabelecer laços de
solidariedade pode ter sido a opção de muitos, mesmo com os riscos de separação dos entes
queridos.
Essa tese abordou a escravidão com maior atenção nos aspectos econômicos e
demográficos. Muitas questões merecem aprofundamentos, como é o caso da resistência e da
família escrava. Outrossim, existem Livros de Notas contendo várias transações, inclusive
registros de compra e venda de cativos que não conseguimos investigar. A análise desses
registros pode revelar se durante a expansão da lavoura cacaueira os escravistas de Ilhéus
estavam comprando ou vendendo mais cativos, o que pode contribuir para confirmar ou não
algumas de nossas hipóteses.
No que diz respeito à economia e abastecimento interno existem outros livros de
impostos aguardando investigação: relativos às décimas urbanas, à vendagem de pólvora,
espíritos fortes e os relativos aos impostos sobre balança grande e direitos de passagem 500. O

500
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto das décimas urbanas. Maço 5431. Ilhéus, 1857-1858; Livro
de imposto das décimas urbanas. Maço 5450. Ilhéus, 1872-1888; Livro de imposto sobre vendagem de pólvora e
fogos de artifício. Maço 5454. Ilhéus, 1862-1890. Livro de imposto sob direitos de balança grande. Maço 5452.
Ilhéus, 1880-1888; Livro de imposto sob direitos de passagens. Maço 5440. Ilhéus, 1865-1878.
256

estudo dessa documentação pode contribuir para descortinar outros aspectos do contexto
socioeconômico de Ilhéus na segunda metade do século XIX. A nossa expectativa é que as
problemáticas analisadas e discutidas nessa pesquisa possam contribuir com a historiografia e
estimular outros estudos.
257

FONTES E BIBLIOGRAFIA

1. Fontes Manuscritas

ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA - (APEB)

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APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre gado suíno abatido. Maço 5447.
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APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de lançamento dos rendimentos relativos a direitos de
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APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de Jacarandá. Maço 5443.
Ilhéus, 1870-1879.
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APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de piaçava. Maço 5458.
Ilhéus, 1879-1888.

APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de couros secos ou
salgados. Maço 5456. Ilhéus, 1879-1888.

APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre vendagem de pólvora e fogos de
artifício. Maço 5454. Ilhéus, 1862-1890.

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APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto das décimas urbanas. Maço 5449. Ilhéus,
1874-1887.

APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto das décimas urbanas. Maço 5450. Ilhéus,
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APÊNDICE METODOLÓGICO

Em geral os Livros de cobrança de impostos da Câmara Municipal de Ilhéus


apresentam bom estado de conservação, mas existem problemas de diversas ordens que
necessitam de explicação, sobretudo quando se trata de conversões das unidades de medidas.
A formatação desses Livros normalmente segue um padrão, contendo uma folha de
abertura, assinada e datada pelo Presidente da Câmara Municipal, na qual ele descreve
resumidamente o objetivo a que se destina aquele livro, diferenciando assim produtos
exportados daqueles relacionado com o abastecimento interno.
Os lançamentos no interior dos livros seguem praticamente o mesmo modelo,
contendo descrição sobre a receita de cada mês, onde se ver o dia e o nome da pessoa, a
quantidade e o valor do imposto pago. No final da lista de cada mês o procurador apresenta a
soma do total arrecadado, descreve a quantia por extenso, data e assina, procedimento que se
repete ao longo dos anos dentro do período de cada livro.
Nem todos os meses ocorriam cobranças de impostos, portanto muitos livros
apresentam lacunas. Também não é possível identificar o destino das exportações, nem os
preços de venda das mercadorias. Frequentemente ocorre abreviações dos nomes lançados nos
livros, sendo que a experiência com a transcrição serviu como critério de identificação.
Assim, por exemplo, percebemos que o nome de José Simeão Moreno dos Reis aparece
descrito da seguinte forma: José Simeão; José Simeão M.; José Simeão M. dos Reis e José
Simeão Moreno dos Reis.
Afora essas observações gerais sobre a documentação, é importante explicar as
peculiaridades de cada livro, já que são utilizadas diferentes unidades de medidas na descrição
dos produtos. Desse modo, o principal objetivo aqui é demonstrar essas singularidades,
analisar se houve mudanças na forma de descrição e na base de cálculo dos impostos e,
sobretudo, explicar como foram feitas as conversões e sistematizações entre os dados
apresentados nos documentos originais e aqueles constantes nas Tabelas em anexo, as quais
serviram de base para a redação da tese.
278

Livro de impostos sobre casas de negócios. Ilhéus, 1871- 1885 501

O Livro de cobrança de impostos sobre casas de negócios foi aberto em 30 de


setembro de 1874, assinado por Joaquim Pereira Caldas, presidente da Câmara Municipal. O
procurador que arrecadou os impostos foi Francisco Antônio de Sales Silva. O primeiro
lançamento foi realizado em 1875 e se estende até 31 de outubro de 1892.
O livro fornece listas com os nomes dos negociantes que pagaram impostos para
manter em funcionamento suas casas de negócios. O imposto cobrado era de Rs. 2$000 (dois
mil réis) anuais, mantendo-se inalterado até o final do período.
Nem todos negociantes pagavam impostos no mesmo mês. A primeira lista de receita
do ano de 1875 data do mês de setembro, com o nome de onze pessoas, a segunda cobrança
foi realizada em outubro, com apenas um negociante pagando imposto, a terceira concluiu-se
em dezembro, contendo nome dois negociantes. Como não há repetição de nomes nesses três
meses acreditamos que o procurador fazia a cobrança ao longo do ano, porém, a
documentação não informa nada sobre como se realizava a cobrança.
No decorrer dos anos percebemos que a quantidade de negociantes que pagaram
impostos oscilou e no geral a tendência foi de crescimento. Para contabilizarmos o total de
negociantes no período consideramos cada um individualmente, independente da frequência
com que aparecem no decurso do tempo. Assim, computando-se o período como um todo,
chegamos ao total de 100 negociantes e mais 5 firmas.

Livro de impostos sobre gado vacum abatido. Ilhéus, 1862-1879 502

Esse Livro está muito deteriorado e não contém a folha de abertura, provavelmente se
perdeu. Como o presidente também rubricava as folhas de dentro do Livro, no canto superior
direito, conseguimos identificar que se tratava de Bernardo Sellmam, pois a sua rubrica
(Sellmam) aparece nos demais livros.

501
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre casas de negócios. Maço 5455. Ilhéus, 1874-1892
502
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre gado vacum abatido. Maço 5442. Ilhéus, 1862-1879.
279

O procurador da Câmara foi Francisco Antônio de Salles Silva, que utilizou as


primeiras folhas para lançar o imposto da décima urbana, sendo que só em fevereiro de 1864 é
que começou lançamento do imposto de Rs. 0$820 réis por cada boi abatido, tarifa que se
manteve por todo período.
Para contabilizarmos o total de pessoas que abatiam gado vacum em Ilhéus e pagam
impostos consideramos cada um individualmente e depois somamos os totais de abatimento a
partir da frequência com que eles aparecem no decurso do tempo. Assim conseguimos
identificar os maiores fornecedores. A distribuição da quantidade abatimentos por mês e ano
pode ser vista em anexo.

Livro de impostos sobre gado vacum abatido. Ilhéus, 1879-1888 503

O segundo Livro de cobrança de impostos sobre gado vacum abatido contém a folha
de abertura que foi assinada, datada e rubricada em 12 de fevereiro de 1879 por Bernardo
Sellmam, presidente interino da Câmara Municipal de Ilhéus, sendo o procurador Francisco
Antônio de Salles Silva.
Inicialmente a cobrança de impostos continuou no valor de Rs. $820 (oitocentos e
vinte réis) por cada boi abatido, porém essa tarifa foi reajustada em novembro de 1883 para
Rs.1$000, mantendo assim até o final do período.
Os procedimentos adotados para calcular a quantidade de fornecedores e de gado
vacum abatido são os mesmos descritos na seção anterior. De modo geral, essa metodologia
também foi adotada para os cálculos dos outros livros, mas em alguns as tarifas oscilaram
muito no decorrer do tempo, além disso houve necessidade de proceder com a conversão de
medidas, como será explicado na devida ocasião.

Livro de impostos sobre gado suíno abatido. Ilhéus, 1872-1885 504

503
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre gado vacum abatido. Maço 5451. Ilhéus, 1879 - 1888.
504
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre gado suíno abatido. Maço 5447. Ilhéus, 1872-1885.
280

O Livro de imposto sobre gado suíno abatido contém folha de abertura assinada em 28
de junho de 1872, por Joaquim Pereira Caldas, presidente da Câmara Municipal de Ilhéus,
sendo o procurador Francisco Antônio de Salles Silva. Identificamos nesse livro a presença de
outra pessoa que também atuou como procurador, Joaquim Roiz de Santa Ana.
O lançamento da primeira receita foi realizado em julho de 1872 e a última
arrecadação data do mês de setembro de 1885. O imposto cobrado pelo abatimento de cada
suíno foi da quantia de Rs. $320 (trezentos e vinte réis), tarifa que se manteve até o final do
período. Normalmente cada pessoa realizava um abatimento no mês e as listas não são
extensas, além disso existem lacunas.
Para contabilizarmos o total de pessoas que pagaram imposto pelo abatimento de gado
suíno em Ilhéus consideramos cada um individualmente e depois somamos os totais de
abatimento a partir da frequência com que eles aparecem no decurso do tempo. Desse modo
conseguimos identificar os maiores fornecedores, a quantidade de suínos abatidos e o valor
dos impostos pagos. A distribuição da quantidade de abatimentos por mês ao longo dos anos
pode ser vista em anexo.

Livro de impostos sobre exportações de cacau e café. Ilhéus, 1871- 1885 505

Vamos começar pelo Livro de impostos sobre exportação de cacau e café (1871-
1885), assinado por Joaquim Pereira Caldas, presidente da Câmara Municipal, e por Francisco
Antônio de Salles Silva, procurador responsável pela arrecadação dos impostos mês a mês. Na
maior parte do período, que vai de janeiro de 1871 até junho de 1885, com algumas lacunas,
os lançamentos dos dois produtos foram feitos em arrobas, por isso decidimos converter todas
as exportações para esta unidade de medida, que equivale a 14,746 quilogramas (1 arroba =
14,746 Kg). Entre outubro de 1874 e junho de 1877 as exportações foram registradas em
quilogramas, e a conversão para arrobas foi simples. Todavia, em poucas ocasiões, quais
sejam outubro de 1877 e julho de 1878 houve registros de exportações de cacau e café em
sacas, o que dificultou a conversão desejada, pois não conseguimos saber a capacidade de

505
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de cacau e café. Maço 5459. Ilhéus, 1871-
1885.
281

armazenamentos dessas sacas. Nestes casos, a saída encontrada foi se basear na cobrança de
impostos. Como nos meses anteriores e posteriores aos referidos casos analisados o imposto
era de Rs. 0,120 (cento e vinte réis por arroba) e permanece sendo o mesmo para cada saca
exportada, seja de cacau ou café, acreditamos ser plausível pensar que cada saca equivalia a
uma arroba (1 saca = 1 arroba = 14,746 kg). Parece ser justo pensar assim porque quando as
exportações foram registradas em quilogramas o imposto sofreu modificação e nos casos dos
registros em sacas a tarifa permanece a mesma. Esse procedimento, no entanto, apresenta
riscos mas foi o caminho possível que encontramos para elucidar a questão.
Com relação a cobrança de impostos as oscilações são significativas durante o
período. Os dois produtos começam recebendo a mesma tributação, ou seja Rs. 0,020 (vinte
réis) por cada arroba exportada, isso até setembro de 1873. No mês seguinte essa tarifa foi
ajustada para Rs.0,040 (quarenta réis), vigorando assim até setembro de 1874. Em seguida os
produtos passam a serem exportados em quilogramas, e o imposto incidente é de Rs. 0,002
(dois réis) por cada Kg de cacau ou café exportados, o que permanece até junho de 1877. Em
Julho do dito ano as exportações voltam a ser registradas em arrobas e percebe-se uma
diferenciação nas tarifas dos produtos, sendo que sobre o cacau recaía Rs. 0,120 (cento e vinte
réis) por cada arroba exportada e sobre o café Rs. 0,090 (noventa réis). A partir de outubro de
1878, as tarifas serão ajustadas, respectivamente, para Rs. 0,200 (duzentos réis) e Rs. 0,150
(cento e cinquenta réis), permanecendo assim até o final do período.

Livro de impostos sobre exportações de aguardente (cachaça). Ilhéus, 1870-1878 506

Livro de imposto sobre exportação de aguardente/cachaça (1870-1878), assinado por


Joaquim Pereira Caldas, como presidente da Câmara e por Francisco Antônio de Salles Silva,
como procurador. Os lançamentos iniciam-se em outubro de 1870 e os registros da bebida
foram feitos em canadas até setembro de 1874, o que na Bahia equivale, segundo Bert J.
Barickman, a 6,85 litros (1 canada = 6,85 litros). Entre novembro de 1874 e junho de 1877 as
exportações foram registradas em litros. Assim, convertemos, com certa segurança, a maior

506
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de aguardente de cana (cachaça). Maço
5441. Ilhéus, 1870-1878.
282

parte do período para litros. O problema começa a partir de julho de 1877, quando as
exportações da bebida passam a ser registradas em quartadas, o que dificultou a conversão
desejada, já que não conseguimos avaliar, nem encontrar referências a respeito desta unidade
de medida. Houve também nesse período alguns poucos registros em barris, ao todo foram
seis registros totalizando 10 barris exportados. Neste caso adotamos a referência do barril
mineiro, que segundo Marcelo Magalhães Godoy equivale a 21 litros. Ficamos então com a
questão da quartada, e mais uma vez a única saída possível foi se basear na cobrança de
imposto para tentar avaliar o volume dessa unidade de medida. Ao que parece a quartada tem
capacidade quatro vezes maior que a do barril, tendo em vista que o imposto que incidia sobre
este era quatro vezes que o incidente sobre a quartada. Em 19 de novembro de 1877 uma
pessoa exportou 1 quartada de aguardente e pagou Rs. 0,600 de imposto, no mesmo dia ela
também exportou 1 barril e pagou Rs. 0,150. Nesse sentido, acreditamos ser possível pensar
que uma quartada podia ter capacidade de 4 barris, ou seja, 84 litros (1 Quartada = 4 Barris =
84 litros).
Inicialmente o imposto cobrado pelas exportações da bebida foi de Rs.0,010 por
canada, isso até setembro de 1874. Quando as exportações passaram a ser registradas em
litros o imposto reduziu para Rs. 0,005 por cada litro exportado, sendo que em outubro de
1875 reduziu-se ainda mais, indo para Rs. 0,002 por litro. A partir de julho de 1877 as
exportações passam a ser registradas em quartadas, incidindo o imposto de Rs.0,600 por cada
quartada, nos poucos casos de registros em barris o imposto foi de Rs. 0,150 por cada barril, o
que permanece até o final do período.

Livro de imposto sobre exportação de Jacarandá. Ilhéus 1870-1879 507

Livro de imposto sobre exportação de Jacarandá (1870-1879). Assinado por Joaquim


Pereira Caldas, presidente da Câmara e por Francisco Antônio de Salles Silva, procurador.
Livro com 24 folhas, abrangendo o período compreendido entre outubro de 1870 até julho de
1879. As exportações foram sempre registradas em paus, por isso optamos por manter esta

507
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de Jacarandá. Maço 5443. Ilhéus, 1870-
1879.
283

unidade de medida para confecção da tabela e análise dos dados. Cada pau podia significar o
tronco das árvores cortadas nas matas, com prováveis variação de tamanhos, mas a
documentação nada informa a esse respeito. Na maior parte do período o imposto foi de Rs.
0,167 por cada pau de Jacarandá exportado, exceção em outubro de 1873 (Rs. 0,169); março
de 1864 (Rs. 0,168); dezembro de 1875 (Rs. 0,166) e durante o ano de 1879, quando houve
aumento para Rs. 0,333 por cada pau de Jacarandá exportado.

Livro de imposto sobre exportação de piaçava. Ilhéus, 1878-1892 508

Livro de imposto sobre exportação de piaçava (1878-1892). Assinado por Bernardo


Sellman, presidente da Câmara, e por Francisco Antônio de Salles Silva, procurador. Abrange
período compreendido entre janeiro de 1879 até março de 1891. As exportações foram sempre
registradas em Molhos, o que deve significar uma certa quantidade de piaçava enrolada e
amarrada como um feixe, mas a documentação nada informa a esse respeito. Mantivemos essa
unidade de medida para a confecção da Tabela e análise dos dados. Quanto aos impostos a
cobrança inicial, até setembro de 1879, foi de Rs. 0,020 por cada molho de piaçava exportado,
no mês seguinte ocorre uma redução do tributo para Rs. 0,015, o que permanece até fevereiro
de 1889. A partir dali ocorrem apenas cinco registros, de agosto de 1890 até março de 1891,
quando se verifica aumento exponencial do imposto, passando a Rs.0,150, nos dois primeiros
casos, e Rs. 0,040, nos três últimos.

Livro de imposto sobre exportação de couros. Ilhéus, 1878-1892 509

Livro de imposto sobre exportação de couros (1878-1892). Assinado por Bernardo


Sellman, presidente da Câmara, e Francisco Antônio de Salles Silva, procurador. Livro com
36 folhas, abrangendo o período compreendido entre outubro de 1878 até junho de 1892. As
exportações foram sempre registradas em unidades de couros secos ou salgados, assim

508
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de piaçava. Maço 5458. Ilhéus, 1878-
1892.
509
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de couros secos ou salgados. Maço 5456.
Ilhéus, 1879-1892.
284

mantivemos essa unidade de medida para confecção da Tabela e análise dos dados. O imposto
inicial era de Rs. $100 por cada couro deportado, a partir de janeiro de 1874 aumentou para
Rs. 0,320, sofrendo redução para Rs. 0,200 em abril de 1890, permanecendo este último valor
até o final do período.
285

Anexos
286

ANEXO I – RELAÇÃO DOS LIVROS DE COBRANÇA DE IMPOSTOS UTILIZADOS NA TESE


Quadro 1 - Listagem dos donos das casas de negócios. Ilhéus, 1875-1892
Acrisio Januário Cardoso Domingues Fernandes da Silva Hermínio de Figueiredo Rocha Luiz Adami
Adão Schaum Domingos José de Lemos Idelbrando Correia da Silva Luiz Francisco de Andrade
Afonso Ayala Vasconcelos Dona Helena Schaum João Anteacho Coutinho Manoel Assencio
Albino Francisco Martins Dona Paulina Rodrigues Guimarães João Batista Adami Manoel Francisco de Andrade
Alferes Henrique de Aguiar e Silva Dona Porfiria Maria Paiva Leite João Domingues Bonin Manoel Guimarães Bastos
Alferes Henrique Francisco Soares Lopes Dona Senhorinha da Silva Lins Pitoresco João Dias de Cerqueira Manoel Guimarães de Brito
Alfredo Navarro de Amorim Eduardo José Viana João Lopes da Silva Manoel Joaquim da Silva
Amálio de Britos Emília José Seabra João Navarro de Amorim Manoel Odurico de Sacramento
Antônio da Cruz Rabelo Leitão Ernesto Navarro de Amorim João Simeão Moreno Manoel Pancrário
Antônio da Silva Rapozo Estácio de Sá Bitencourt Camara Joaquim de Salles Silva Manoel Suarez do Bonfim
Antônio Henrique Marques Oliveira Felipe Brait Joaquim Lopes da Silva Paulino Rodrigues de Guimarães
Antônio Henrique Aguiar Felismino Antônio da Silva Joaquim Maximiano Roiz Pedro Augusto de Cerqueira Lima
Antônio José de Amorim Bastos Firmino Amaral José Albino Magarao Pedro Gonçalves Vasconcelos Gusmão
Antônio Lopes da Silva Firmino Ferreira de Pinho José Calazans Bastos Plínio Cardoso do Nascimento
Antônio Luiz da Costa Francisco Antônio de Oliveira José Carlos Adami Policarpo Lopes da Silva
Antônio Marques de Oliveira Pitoresco Francisco Antônio Ruiz Guimarães José Carlos S. Valett Porfirio Francisco Suares
Antônio Simeão Moreno Francisco Correia da Silva Junior José das Neves Cezar Brasil Rodolfo de Melo Vieira
Aristides Francisco Vasconcelos Gusmão Francisco de Brito [Clofe] José Domingues Correia Valério Vicente do Sacramento
Bernardo Sellmam Francisco Faustino de Sales Silva José Firmino Alves Veridiano Luiz Damásio
Caetano Lafeme Francisco Luiz de Andrade José Francisco de Oliveira Filho FIRMAS
Camilo Brilha [Fristmate] Cezar Brasil José Henrique de Aguiar (Amorim & Filho); (Aguiar & Lyra)
Capitão Henrique Francisco Soares Gregório José da Silva José Joaquim da Costa Seabra (Bitencourt & Castro); (C.F. [Kirlo} & Cia)
Carlos Carilo Henrique Alves dos Reis José Pereira de Andrade (Luiz Adami & Filho); (Lopes & Irmão)
Cecilio Calazans Henrique Berbet José Pinto da Silva Amorim (Lyro & Luz); (Maximiano & Irmão)
Constantino Galo Henrique de Aguiar e Silva José Simeão Moreno dos Reis (Seabra Filho & Cia); (Vieira & Irmão)
Domingos Antonio Ruiz Guimarães Henrique Francisco Suarez José Veríssimo da Silva
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre casas de negócios. Maço 5455. Ilhéus, 1874-1892
287

Tabela 1 – Gado vacum abatido (em unidade). Ilhéus, 1864-1879


MÊS/ANO 1864 1865 1866 1867 1868 1869 1870 1871 1872 1873 1874 1875 1876 1877 1878 1879 TOTAL MÉDIA
JAN. 5 4 5 9 6 2 1 7 6 8 10 9 9 6 87 6,2
FEV. 2 4 3 4 7 5 1 4 2 4 2 7 6 3 8 9 71 4,4
MAR. 3 3 4 5 5 7 6 3 5 5 5 8 6 4 8 6 83 5,1
ABR. 6 3 6 4 5 3 6 1 4 5 6 9 3 7 68 4,8
MAIO 6 2 6 2 6 6 4 2 2 7 4 12 6 6 71 5,0
JUN. 3 4 2 5 3 3 4 6 9 5 9 9 6 5 73 5,2
JUL. 4 2 4 2 4 5 2 2 4 6 3 10 6 6 4 64 4,2
AGO. 3 4 4 2 4 2 1 4 4 8 8 10 5 10 7 76 5,0
SET. 8 5 5 3 5 10 4 6 3 8 10 7 4 11 5 94 6,2
OUT. 3 3 5 4 5 3 2 4 4 3 4 8 5 6 6 65 4,3
NOV. 3 3 3 6 7 4 3 2 3 5 5 7 4 8 2 65 4,3
DEZ. 7 8 5 6 6 6 7 3 7 6 9 9 9 12 6 106 7,0
TOTAL 48 46 51 43 68 57 38 40 42 72 66 101 73 84 73 21 923 58,0
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre gado vacum abatido. Maço 5442. Ilhéus, 1862-1879.
288

Tabela 2 –Imposto sobre gado vacum abatido (em réis). Ilhéus, 1864-1879
MÊS/ANO 1864 1865 1866 1867 1868 1869 1870 1871 1872 1873 1874 1875 1876 1877 1878 1879 TOTAL MÉDIA
JAN. 4,100 3,280 4,100 7,380 4,920 1,640 0,820 5,740 4,920 6,560 8,200 7,380 7,380 4,920 71,340 5,096
FEV. 1,640 3,280 2,460 3,280 5,740 4,100 0,820 3,280 1,640 3,280 1,640 5,740 4,920 2,460 6,560 7,380 58,220 3,639
MAR. 2,460 2,460 3,280 3,280 4,100 5,740 4,920 2,460 4,100 4,100 4,100 6,560 4,920 3,280 6,560 4,920 67,240 4,203
ABR. 4,920 2,460 4,920 3,280 4,100 2,460 4,920 0,820 3,280 4,100 4,920 7,380 2,460 5,740 55,760 3,983
MAIO 4,920 1,640 4,920 1,640 4,920 4,920 3,280 1,640 1,640 5,740 3,280 9,840 4,920 4,920 58,220 4,159
JUN. 2,460 3,280 1,640 4,100 2,460 2,460 3,280 4,920 7,380 4,100 7,380 7,380 4,920 4,100 59,860 4,276
JUL. 3,280 1,640 3,280 1,640 3,280 4,100 1,640 1,640 3,280 4,920 2,460 8,200 4,920 4,920 3,280 52,480 3,499
AGO. 2,460 3,280 3,280 1,640 3,280 1,640 0,820 3,280 3,280 6,560 6,560 8,200 4,100 8,200 5,740 62,320 4,155
SET. 6,560 4,100 4,100 2,460 4,100 8,200 3,280 4,920 2,460 6,560 8,200 5,740 3,280 9,020 4,100 77,080 5,139
OUT. 2,460 2,460 4,100 3,280 4,100 2,460 1,640 3,280 3,280 2,460 3,280 6,560 4,100 4,920 4,920 53,300 3,553
NOV. 2,460 2,460 2,460 4,920 5,740 3,280 2,460 1,640 2,460 4,100 4,100 5,740 3,280 6,560 1,640 53,300 3,553
DEZ. 5,740 6,560 4,100 4,920 4,920 4,920 5,740 2,460 5,740 4,920 7,380 7,380 7,380 9,840 4,920 86,920 5,795
TOTAL 39,360 37,720 41,820 34,440 55,760 46,740 31,160 32,800 34,440 59,040 54,120 82,820 59,860 68,880 59,860 17,220 756,040 47,253
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre gado vacum abatido. Maço 5442. Ilhéus, 1862-1879.
289

Tabela 3 – Gado vacum abatido (em unidade). Ilhéus, 1879-1888


MÊS/ANO 1879 1880 1881 1882 1883 1884 1885 1886 1887 1888 TOTAL MÉDIA
JAN. 22 4 7 7 12 13 3 8 76 9,5
FEV. 11 5 8 5 13 13 6 61 8,7
MAR. 15 7 11 10 15 15 9 4 86 10,7
ABR. 8 12 9 6 7 10 15 15 6 88 9,7
MAIO 11 14 4 6 6 8 16 13 6 84 9,3
JUN. 11 17 7 7 8 5 9 12 5 81 9,0
JUL. 6 9 6 6 12 10 12 7 7 75 8,3
AGO. 14 16 10 9 18 12 18 8 6 111 12,3
SET. 12 12 6 7 13 9 10 9 7 85 9,4
OUT. 15 10 8 7 13 11 10 6 80 10,0
NOV. 11 17 9 10 12 11 13 5 88 11,0
DEZ. 14 20 16 13 24 12 14 7 120 15,0
TOTAL 102 175 91 97 135 128 158 3 91 55 1.035 103,5
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre gado vacum abatido. Maço 5451. Ilhéus, 1879-1888.
290

Tabela 4 – Imposto sobre gado vacum abatido (em réis). Ilhéus, 1879-1888
MÊS/ANO 1879 1880 1881 1882 1883 1884 1885 1886 1887 1888 TOTAL MÉDIA
JAN. 18,040 3,280 5,740 5,740 12,000 13,000 3,000 8,000 68,800 8,600
FEV. 9,020 4,100 6,560 4,100 13,000 13,000 6,000 55,780 7,969
MAR. 12,300 5,740 9,020 8,200 15,000 15,000 9,000 4,000 78,260 9,783
ABR. 6,560 9,840 7,380 4,920 5,740 10,000 15,000 15,000 6,000 80,440 8,938
MAIO 9,020 11,480 3,280 4,920 4,920 8,000 16,000 13,000 6,000 76,620 8,513
JUN. 9,020 13,940 5,740 5,740 6,560 5,000 9,000 12,000 5,000 72,000 8,000
JUL. 4,920 7,380 4,920 4,920 9,840 10,000 12,000 7,000 7,000 67,980 7,553
AGO. 11,480 13,120 8,200 7,380 14,760 12,000 18,000 8,000 6,000 98,940 10,993
SET. 9,840 9,840 4,920 5,740 10,660 9,000 10,000 9,000 7,000 76,000 8,444
OUT. 12,300 8,200 6,560 5,740 12,820 11,000 10,000 6,000 72,620 9,078
NOV. 9,020 13,940 7,380 8,200 12,000 11,000 13,000 5,000 79,540 9,943
DEZ. 11,480 16,400 13,120 10,660 24,000 12,000 14,000 7,000 108,660 13,583
TOTAL 83,640 143,500 74,620 79,540 119,340 128,000 158,000 3,000 91,000 55,000 935,640 93,564
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre gado vacum abatido. Maço 5451. Ilhéus, 1879 - 1888.
291

Tabela 5 – Gado suíno abatido (em unidade). Ilhéus, 1872-1885


MÊS/ANO 1872 1873 1874 1875 1876 1877 1878 1879 1880 1881 1882 1883 1884 1885 TOTAL MÉDIA
JAN. 3 2 5 2,5
FEV. 3 1 4 2
MAR. 3 2 3 1 2 2 13 2,1
ABR. 1 2 1 2 2 3 3 14 2
MAIO 1 2 5 1 5 14 2,8
JUN. 4 3 1 2 1 3 2 16 2,2
JUL. 2 1 3 1 1 1 9 1,5
AGO. 2 3 3 4 3 15 3
SET. 1 7 3 1 4 2 1 2 21 2,6
OUT. 1 5 2 3 2 1 2 2 18 2,2
NOV. 1 2 3 6 2
DEZ. 3 4 4 5 2 1 2 21 3
TOTAL 8 26 28 20 11 11 5 3 6 14 5 19 156 13
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre gado suíno abatido. Maço 5447. Ilhéus, 1872-1885.
292

Tabela 6 – Imposto sobre gado suíno abatido (em réis). Ilhéus, 1872-1885
MÊS/ANO 1872 1873 1874 1875 1876 1877 1878 1879 1880 1881 1882 1883 1884 1885 TOTAL MÉDIA
JAN. 0,960 0,640 1,600 2,500
FEV. 0,960 0,320 1,280 2,000
MAR. 0,960 0,640 0,960 0,320 1,000 0,820 4,700 2,100
ABR. 0,320 0,640 0,320 0,640 0,640 0,960 0,960 4,480 2,000
MAIO 0,320 0,640 1,600 0,320 1,600 4,480 2,800
JUN. 0,320 0,960 0,320 0,640 0,320 0,960 0,640 4,160 2,200
JUL. 0,640 0,320 0,960 0,320 0,320 0,320 2,880 1,500
AGO. 0,640 0,960 0,960 1,280 0,960 4,800 3,000
SET. 0,320 2,240 0,960 0,320 1,280 0,640 0,320 0,640 6,720 2,600
OUT. 0,320 1,600 0,640 0,960 0,640 0,320 0,640 0,640 5,760 2,200
NOV. 0,320 0,640 0,960 1,920 2,000
DEZ. 0,960 1,280 1,280 1,600 0,640 0,320 0,640 6,720 3,000
TOTAL 2,560 7,360 8,960 6,400 3,520 3,520 1,600 0,960 1,920 4,840 1,600 6,260 49,500 13,000
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre gado suíno abatido. Maço 5447. Ilhéus, 1872-1885.
293

Tabela 7 - Exploração de madeiras. Ilhéus, 1863


MÊS/TIPO DE MADEIRA JAN. FEV. MAR. ABR. MAIO JUN. JUL. AGO. SET. OUT. NOV. DEZ. TOTAL MÉDIA
PAUS DE JACARANDÁ 83 145 135 26 227 135 138 65 67 127 78 1.226 111
PAUS DE JANGADA 6 42 24 12 6 12 12 12 72 30 228 23
PAUS DE CEDRO 70 205 132 62 66 12 26 78 60 76 274 1.061 96
PAUS DE CONDURÚ 55 55
DUZIA DE TABUADOS 43 43
DUZIA DE LOURO 1 1
TÁBUAS DE LOURO 12 60 72 36
CARRADAS DE CAIXARIAS 62 172 234 117
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de lançamento dos rendimentos relativos a direitos de madeira. Maço 5438. Ilhéus, 1862-1870.
294

Tabela 8 - Exportação de cacau (em arrobas). Ilhéus, 1871-1885


ANO/MÊS 1871 1872 1873 1874 1875 1876 1877 1878 1879 1880 1881 1882 1883 1884 1885 TOTAL MÉDIA

JAN. 5.656 12.230 3.772 1.742 1.547 3.249 1.108 1.062 1.509 741 748 1.511 1.390 1.323 934 38.522 2.568
FEV. 6.692 3.569 - 1.300 24 333 668 218 73 52 273 169 630 297 265 14.563 1.040
MAR. 568 322 512 200 120 119 - 40 - 538 10 41 230 - - 2.700 245
ABR. 178 - - 32 108 8 8 92 8 30 72 3 - 25 15 579 48
MAIO 48 291 604 144 - 100 328 872 113 236 896 91 23 158 17 3.921 280
JUN. 552 364 1.484 316 - 752 1.532 1.591 848 5 1.745 462 6 2.132 256 12.045 860
JUL. 718 1.312 2.972 1.268 660 3.188 674 2.176 1.587 1.416 2.396 1.037 225 2.883 - 22.512 1.608
AGO. 976 2.443 4.540 1.500 816 7.916 482 1.741 951 2.206 791 2.012 1.394 2.856 - 30.624 2.187
SET. 2.922 2.561 3.432 3.128 1.349 3.352 511 740 1.645 1.218 3.101 835 772 1.337 - 26.903 1.922
OUT. - - 1.636 3.772 3.284 3.823 529 2.001 779 1.207 524 492 1.641 2.504 - 22.192 1.849
NOV. - 5.356 1.072 1.211 4.476 1.550 880 1.356 580 958 2.061 472 1.000 2.287 - 23.259 1.789
DEZ. 3.019 8.890 4.560 1.700 5.116 4.300 812 699 1.023 1.913 1.536 1.508 1.401 586 - 37.063 2.647

TOTAL 21.329 37.338 24.584 16.313 17.500 28.690 7.532 12.588 9.116 10.520 14.153 8.633 8.712 16.388 1.487 234.883 15.659
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de cacau e café. Maço 5459. Ilhéus, 1871-1885.
295

Tabela 9 - Imposto sobre exportação de cacau (em réis). Ilhéus, 1871-1885


MÊS/ANO 1871 1872 1873 1874 1875 1876 1877 1878 1879 1880 1881 1882 1883 1884 1885 TOTAL MÉDIA

JAN. 113.120 244.600 75.440 69.920 46.410 97.470 33.240 127.440 301.800 88.920 89.760 271.980 250.200 238.140 168.120 2.216.560 147.770

FEV. 133.840 71.380 52.000 720 9.990 20.040 26.160 14.600 6.240 32.760 30.420 113.400 53.460 47.700 612.710 43.765

MAR. 11.360 6.440 10.240 8.000 3.600 3.570 4.800 64.560 1.200 7.380 41.400 162.550 14.777

ABR. 3.560 1.280 3.240 240 240 11.040 1.600 3.600 8.640 540 4.500 2.700 41.180 3.431

MAIO 960 5.820 12.080 5.760 3.000 9.840 104.640 22.600 28.320 107.520 16.380 4.140 28.440 3.060 352.560 25.182

JUN. 11.040 7.280 29.680 12.640 22.560 45.960 190.920 169.600 600 209.400 83.160 1.080 383.760 46.080 1.213.760 86.697

JUL. 14.360 26.240 59.440 50.720 19.800 95.640 80.880 261.120 317.400 169.920 287.520 186.660 40.500 518.940 2.129.140 152.081

AGO. 19.520 48.860 90.800 60.000 24.480 237.480 57.840 208.920 190.200 264.720 94.920 362.160 250.920 514.080 2.424.900 173.207

SET. 58.440 51.220 68.640 125.120 40.470 100.560 61.320 88.800 329.000 146.160 372.120 150.300 138.960 240.660 1.971.770 140.840

OUT. 65.440 113.160 98.520 114.690 63.480 327.800 93.480 144.840 62.880 88.560 295.380 450.720 1.918.950 159.912

NOV. 107.120 42.880 36.330 134.280 46.500 105.600 271.200 69.600 114.960 247.320 84.960 180.000 411.660 1.852.410 142.493

DEZ. 60.380 177.800 182.400 51.000 153.480 129.000 97.440 139.800 122.760 229.560 276.480 271.440 252.180 105.480 2.249.200 160.657

TOTAL 426.580 746.760 637.040 585.930 525.000 860.700 575.880 1.762.640 1.632.640 1.262.400 1.790.520 1.553.940 1.568.160 2.949.840 267.660 17.145.690 1.143.046

APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de cacau e café. Maço 5459. Ilhéus, 1871-1885.
296

Tabela 10 - Exportação de café (em arrobas). Ilhéus, 1871-1885


MÊS/ANO 1871 1872 1873 1874 1875 1876 1877 1878 1879 1880 1881 1882 1883 1884 1885 TOTAL MÉDIA
JAN. 207 183 327 2 51 770 154
FEV. 21 18 48 24 60 171 34
MAR. 24 18 2 44 14
ABR. 309 27 15 6 20 74 6 48 505 63
MAIO 992 423 642 191 30 32 34 2.344 334
JUN. 579 84 604 24 93 13 70 10 59 38 1.574 157
JUL. 234 123 304 170 204 6 15 39 10 62 1.167 116
AGO. 66 346 39 9 6 18 1 106 591 74
SET. 63 117 16 21 64 19 116 2 127 4 16 565 51
OUT. 123 42 150 30 36 381 76
NOV. 140 3 19 10 172 43
DEZ. 12 63 75 37
TOTAL 2.243 1.278 1.947 90 342 789 545 224 196 317 167 183 38 8.359 643
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de cacau e café. Maço 5459. Ilhéus, 1871-1885.
297

Tabela 11 - Imposto sobre exportação de café (em réis). Ilhéus, 1871-1885


MÊS/ANO 1871 1872 1873 1874 1875 1876 1877 1878 1879 1880 1881 1882 1883 1884 1885 TOTAL MÉDIA
JAN. 4.140 5.490 9.810 300 4.590 24.330 4.866
FEV. 420 540 1.440 3.600 10.800 16.800 3.360
MAR. 480 540 300 1.320 440
ABR. 6.180 810 450 180 3.000 6.660 540 8.640 26.460 3.308
MAIO 19.840 8.460 12.840 5.730 900 2.880 3.060 53.710 7.673
JUN. 11.580 1.680 12.080 960 2.790 1.170 10.500 900 10.620 6.840 59.120 5.912
JUL. 4.680 2.460 6.080 5.100 6.120 540 1.350 5.850 900 5.580 38.660 3.866
AGO. 1.320 6.920 780 270 540 1.620 150 9.540 21.140 2.643
SET. 1.260 2.340 320 840 1.920 1.710 10.440 300 11.430 360 2.880 33.800 3.073
OUT. 4.920 1.260 4.500 3.240 3.240 17.160 3.432
NOV. 2.800 90 570 900 4.360 1.090
DEZ. 480 1.890 2.370 1.185
TOTAL 44.860 25.560 41.640 3.150 10.260 23.670 18.810 20.700 27.240 28.530 15.030 32.940 6.840 299.230 23.018
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de cacau e café. Maço 5459. Ilhéus, 1871-1885.
298

Tabela 12 - Exportação de cachaça (em litros). Ilhéus, 1871-1878


MÊS/ANO 1870 1871 1872 1873 1874 1875 1876 1877 1878 TOTAL MÉDIA
JAN. - 5.960 9.385 11.529 9.590 2.200 6.275 7.500 3.360 55.798 6.974
FEV. - 4.179 1.425 8.220 6.439 1.320 5.700 4.125 2.016 33.423 4.177
MAR. - 4.959 9.385 1.644 5.069 640 300 600 2.940 25.537 3.192
ABR. - 720 2.171 2.192 6.850 1.120 4.400 7.800 2.436 27.689 3.461
MAIO - 8.015 7.124 6.097 2.055 56 4.500 3.000 1.302 32.148 4.018
JUN. - 5.138 2.295 5.549 5.549 960 3.900 7.500 - 30.889 4.412
JUL. - 6.645 4.487 10.686 7.398 2.220 11.595 1.512 1.701 46.243 5.780
AGO. - 6.371 12.878 7.946 5.206 160 6.900 4.578 5.124 49.163 6.145
SET. - 8.220 7.261 6.473 10.652 1.480 2.700 966 2.604 40.356 5.044
OUT. 10.720 5.138 14.728 16.166 - 1.400 24.000 1.428 - 73.579 10.511
NOV. 2.877 6.501 6.919 6.576 3.500 12.600 15.600 735 - 55.307 6.913
DEZ. 7.001 8.001 9.796 12.056 924 7.400 27.600 840 - 73.817 9.202
TOTAL 20.598 69.843 87.851 95.133 63.231 31.556 113.470 40.584 21.483 543.949 60.417
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de aguardente de cana (cachaça). Maço 5441. Ilhéus, 1870-1878
299

Tabela 13 – Imposto sobre exportação de cachaça (em réis). Ilhéus, 1870-1878.


MÊS/ANO 1870 1871 1872 1873 1874 1875 1876 1877 1878 TOTAL MÉDIA
JAN. - 8.700 13.700 16.830 14.000 11.000 12.550 15.000 24.000 115.780 14.473
FEV. - 6.100 2.080 12.000 9.400 6.600 11.400 8.250 14.400 70.230 8.779
MAR. - 7.240 13.700 2.400 7.400 3.200 600 1.200 21.000 56.740 7.093
ABR. - 1.050 3.170 3.200 10.000 5.600 8.800 15.600 17.400 64.820 8.103
MAIO - 11.700 10.400 8.900 3.000 280 9.000 6.000 9.300 58.580 7.323
JUN. - 7.500 3.350 8.100 8.100 4.800 7.800 15.000 0 54.650 7.807
JUL. - 9.700 6.550 15.600 10.800 11.100 23.190 10.800 12.150 99.890 12.486
AGO. - 9.300 18.800 11.600 7.600 800 13.800 32.750 36.600 131.250 16.406
SET. - 12.000 10.600 9.450 15.550 7.400 5.400 6.900 18.600 85.900 10.738
OUT. 15.650 7.500 21.500 23.600 - 2.800 12.000 10.200 - 93.250 13.321
NOV. 4.220 9.490 10.100 9.600 17.500 25.200 7.800 5.250 - 89.160 11.145
DEZ. 10.220 11.800 14.300 17.600 4.620 14.800 13.800 6.000 - 93.140 11.643
TOTAL 30.090 102.080 128.250 138.880 107.970 93.580 126.140 132.950 153.450 1.013,390 112.599
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de aguardente de cana (cachaça). Maço 5441. Ilhéus, 1870-1878
300

Tabela 14 - Exportação de jacarandá (em paus). Ilhéus, 1870-1879


ANO/MÊS 1870 1871 1872 1873 1874 1875 1876 1877 1878 1879 TOTAL MÉDIA
JAN. - - 121 - 18 48 - - - 61 248 62
FEV. - - 9 - - - - - - - 9 9
MAR. - - - - 5 - - - - - 5 5
ABR. - - - - - 44 - - - 44 44
MAIO - - 17 43 - - - - 13 66 139 35
JUN. - - - 84 - - - - - 36 120 60
JUL. - 288 - - 74 24 - 69 43 76 574 96
AGO. - - 203 66 - - - 377 - - 646 215
SET. - - - 208 - - - 42 82 - 332 111
OUT. ILEG. 72 202 70 - 38 51 84 - - 517 86
NOV. 77 47 61 108 - 253 - - - - 546 109
DEZ. 64 139 135 67 - 200 - 167 - - 772 129
TOTAL 141 546 748 646 97 607 51 739 138 239 3.952 395
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de Jacarandá. Maço 5443. Ilhéus, 1870-1879.
301

Tabela 15 - Imposto sobre jacarandá exportado (em réis). Ilhéus, 1870-1879


ANO/MÊS 1870 1871 1872 1873 1874 1875 1876 1877 1878 1879 TOTAL MÉDIA
JAN. - - 20.166 - 3.000 8.000 - - - 20.333 51.499 12.875
FEV. - - 1.500 - - - - - - - 1.500 1.500
MAR. - - - - 840 - - - - - 840 840
ABR. - - - - - 7.332 - - - - 7.332 7.332
MAIO - - 2.830 7.166 - - - - 2.160 22.000 34.156 8.539
JUN. - - - 14.000 - - - - - 12.000 26.000 13.000
JUL. - 47.998 - 12.320 4.000 - 11.500 7.160 25.333 108.311 18.052
AGO. - - 33.832 11.000 - - - 62.840 - - 107.672 35.891
SET. - - - 34.660 - - - 7.000 13.660 - 55.320 18.440
OUT. ILEG. 11.998 33.660 11.832 - 6.320 8.500 14.000 - - 86.310 14.385
NOV. 12.832 7.832 10.160 18.000 - 42.160 - - - - 90.984 18.197
DEZ. 10.662 23.166 22.500 11.160 - 33.330 - 27.820 - - 128.638 21.440
TOTAL 23.494 90.994 124.648 107.818 16.160 101.142 8.500 123.160 22.980 79.666 698.562 69.856
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de Jacarandá. Maço 5443. Ilhéus, 1870-1879.
302

Tabela 16 - Exportação de piaçava (em molhos). Ilhéus, 1879-1888


MÊS/ANO 1879 1880 1881 1882 1883 1884 1885 1886 1887 1888 TOTAL MÉDIA
JAN. 13.652 2.832 1.232 736 600 1.200 850 600 500 22.202 2.467
FEV. 1.600 845 210 648 973 400 650 1.050 6.376 797
MAR. 5.194 1.700 883 268 8.045 2.011
ABR. 4.700 5.085 1.334 800 510 569 420 200 900 14.518 1.613
MAIO 2.765 600 946 184 1.140 1.103 550 500 7.788 974
JUN. 6.266 140 833 1.274 1.339 1.200 11.052 1.842
JUL. 3.572 1.229 700 193 1.550 1.000 216 650 9.110 1.139
AGO. 6.018 1.326 580 673 853 850 460 200 10.960 1.370
SET. 4.528 2.384 366 320 840 700 200 9.338 1.334
OUT. 3.832 728 280 2.132 1.270 400 360 9.002 1.286
NOV. 301 1.585 193 72 850 800 1.600 280 5.681 710
DEZ. 2.281 600 432 1.430 874 700 6.317 1.053
TOTAL 54.709 18.914 6.413 7.053 8.645 8.212 5.693 1.250 5.170 4.330 120.389 12.039
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de piaçava. Maço 5458. Ilhéus, 1879-1888.
303

Tabela 17 – Imposto sobre exportação de piaçava (em réis). Ilhéus, 1879-1888


MÊS/ANO 1879 1880 1881 1882 1883 1884 1885 1886 1887 1888 TOTAL MÉDIA
JAN. 273.040 42.480 18.480 10.020 9.000 18.000 12.750 9.000 7.500 400.270 44.474
FEV. 32.000 12.675 3.150 9.720 14.595 6.000 9.750 15.750 103.640 12.955
MAR. 103.880 25.500 13.245 4.020 146.645 36.661
ABR. 94.000 76.275 20.010 12.000 7.650 8.535 6.300 3.000 13.500 241.270 26.808
MAIO 55.300 9.000 14.190 2.760 17.100 16.545 8.240 7.500 130.635 16.329
JUN. 125.320 2.100 12.495 19.120 20.080 18.000 197.115 32.853
JUL. 71.440 17.175 10.500 2.895 23.250 15.000 3.240 9.750 153.250 19.156
AGO. 119.360 19.890 8.700 10.095 12.780 9.740 6.940 3.000 190.505 23.813
SET. 90.560 35.760 5.490 4.800 12.000 10.500 3.000 162.110 23.159
OUT. 57.480 10.920 4.180 31.980 19.050 6.000 5.400 135.010 19.287
NOV. 4.515 24.825 2.895 1.080 12.750 12.000 23.850 4.200 86.115 10.764
DEZ. 34.210 9.000 6.480 21.450 13.110 10.500 94.750 15.792
TOTAL 1.061,105 283.500 96.175 104.775 129.675 122.575 82.370 18.750 77.440 64.950 2.041,32 170.109
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de piaçava. Maço 5458. Ilhéus, 1879-1888.
304

Tabela 18 – Exportação de couros secos ou salgados (em unidade). Ilhéus, 1878-1888


MÊS/ANO 1878 1879 1880 1881 1882 1883 1884 1885 1886 1887 1888 TOTAL MÉDIA
JAN. 64 25 63 37 85 27 36 337 48
FEV. 35 12 14 25 30 38 154 26
MAR. 45 100 10 67 78 26 30 70 426 53
ABR. 16 27 9 15 26 4 97 16
MAIO 29 18 36 25 18 126 126
JUN. 34 114 23 77 8 24 280 280
JUL. 85 76 25 5 52 24 267 45
AGO. 79 53 12 42 7 193 39
SET. 86 20 19 10 33 20 188 31
OUT. 185 40 4 30 259 65
NOV. 19 75 7 12 60 24 8 10 215 27
DEZ. 18 23 37 68 34 180 36
TOTAL 204 315 322 253 258 157 244 406 57 275 231 2.722 247
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de couros secos ou salgados. Maço 5456. Ilhéus, 1879-1888.
305

Tabela 19 – Imposto sobre exportação de couros secos ou salgados (em réis). Ilhéus, 1878-1888
MÊS/ANO 1878 1879 1880 1881 1882 1883 1884 1885 1886 1887 1888 TOTAL MÉDIA
JAN. 6,400 2,500 6,300 11,840 27,200 8,640 11,520 74,400 10,629
FEV. 3,500 1,200 4,480 8,000 9,600 12,160 38,940 6,490
MAR. 4,500 10,000 1,000 6,700 7,800 8,440 9,600 22,400 70,440 8,805
ABR. 1,600 2,700 0,900 4,800 8,320 1,280 19,600 3,267
MAIO 2,900 5,760 11,520 8,000 5,760 33,940 6,788
JUN. 3,400 11,400 7,360 24,640 2,560 7,680 57,040 9,507
JUL. 8,500 7,600 8,000 1,600 16,440 7,680 49,820 8,303
AGO. 7,900 16,960 3,840 13,440 2,240 44,380 8,876
SET. 8,600 2,000 1,900 3,200 10,560 6,400 32,660 5,443
OUT. 18,500 4,000 1,280 9,600 33,380 8,345
NOV. 1,900 7,500 0,700 1,200 19,200 7,680 2,560 3,200 43,940 5,493
DEZ. 1,800 2,300 3,700 21,760 10,880 40,440 8,088
TOTAL 20,400 31,500 32,200 25,300 25,800 15,700 78,080 130,040 18,240 87,800 73,920 538,980 48,998
APEB, SCP. Câmara de Ilhéus. Livro de imposto sobre exportação de couros secos ou salgados. Maço 5456. Ilhéus, 1879-1888.
306

ANEXO II - RELAÇÃO DOS PROCESSOS DE INVENTÁRIOS UTILIZADOS NA TESE


ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA (APEB) - SEÇÃO JUDICIÁRIA (SJ) – SÉRIE INVENTÁRIOS

Nº DATA Nº Nº PÉS Nº MONTE-MOR


EST. CAIXA MAÇO NOME DO INVENTARIADO NOME OU LOCAL DA PROPRIEDADE OCUPAÇÃO PRINCIPAL
ORDEM INICIAL PROC. CACAU ESCRAVOS (réis)
1 1849 8 3424 6 JOÃO SEGISMUNDO CORDIER FAZENDA SANTA CRUZ PRODUTOR DE CACAU 2.877 7 11.154,997
ENGENHO CONCEIÇÃO DE
2 1850 2 783 1250 8 MARIA LUIZA DA SANTÍSSIMA TRINDADE DONO DE ENGENHO 100
ITACANOEIRAS 17 15.988,366
3 1851 2 783 1250 15 NARCIZA DA ROSA DOREA ENGENHO UNIÃO E OUTRAS DONO DE ENGENHO 0 10 6.402,380
4 1854 3 1270 1739 2 ANA MARIA DE SÃO JOSE NO RIO UNA INDEFINIDA 0 16 5.333,823
5 1855 2 783 1250 11 FLORENTINA MARIA DOS REIS FAZENDA MAMOAM PRODUTOR DE COCO 30 1 775,000
6 1855 2 783 1250 10 MANOEL RODRIGUES DE BRITO EM ITABUNA PRODUTOR DE FARINHA 0 0 89,000
7 1856 2 783 1250 9 FRANCISCA DE JESUS FAZENDA BOM RETIRO PRODUTOR DE CACAU 247 0 599,000
8 1856 2 783 1250 13 FRANCISCA ROMANA DA VITORIA NÃO IDENTIFICADA NÃO IDENTIFICADA 0 1 727,012
9 1856 2 783 1250 12 FRANCISCO GOMES DE CASTRO AGUIAR NÃO IDENTIFICADA NÃO IDENTIFICADA 0 3 3.522,670
10 1856 2 783 1250 14 GUILHERME MOR FAZENDA BOA VISTA PRODUTOR DE CACAU 1.950 1 4.044,000
11 1856 JACOB MOR FAZENDA BOA VISTA PRODUTOR DE CACAU 500 0 1.310,000
12 1856 2 786 1253 10 JOÃO ADOLFO SCHIMIDT FAZENDA BOA VISTA PRODUTOR DE CACAU 1.300 0 1.398,280
13 1856 2 786 1253 9 JOAO ANTONIO VIANA NÃO IDENTIFICADA NÃO IDENTIFICADA 0 3 1.250,000
14 1856 2 786 1253 11 JOÃO LUIZ DE MAGALHAES EM OLIVENCA CRIA BOVINOS 0 0 696,905
15 1856 8 3424 6 JOAQUIM JOSE DA COSTA SEABRA NÃO IDENTIFICADA NEGOCIANTE 0 16 47.132,213
16 1856 2 786 1253 12 MANOEL BRIGIDO DA SILVA SERRARIA SERRA D`ÁGUA NEGOCIANTE 0 2 7.386,260
17 1857 2 786 1253 13 LUCIA MARIA BRANDÃO CASA NA VILA NÃO IDENTIFICADA 0 0 264,000
18 1859 2 786 1253 15 ANTONIA DE MELO SA NÃO IDENTIFICADA NÃO IDENTIFICADA 0 1 850,000
19 1859 2 786 1253 16 FRANCISCO JOSE BERNARDES NÃO IDENTIFICADA NEGOCIANTE 0 5 9.564,950
307

20 1860 3 1270 1739 5 DOMINGOS ANTONIO BIZERRA FAZENDA PIMENTA PRODUTOR DE CACAU 2.250 4 9.547,920
21 1860 3 1270 1739 6 JOÃO PEREIRA GUILHERME FAZENDA JOEIRANA PRODUTOR DE FARINHA 0 0 581,400
22 1860 3 1270 1739 7 VITORIA INACIA DO AMPARO CASA NA VILA PRODUTOR DE CACAU 50 0 316,000
23 1861 2 783 1250 18 ANACLETO BARBOSA DOS SANTOS FREIRE CASA NA VILA NÃO IDENTIFICADA 0 0 500,000
24 1861 2 786 1253 3 CATHARINA GONCALVES DOS SANTOS NA FREGUESIA DE UNA PRODUTOR DE COCO 0 4 3.315,300
25 1861 2 783 1250 19 FRANCISCO SOARES FERREIRA NÃO IDENTIFICADA NEGOCIANTE 0 1 14.016,091
26 1861 2 786 1253 1 JOÃO PEDRO SITIO EM UNA PRODUTOR DE CACAU PLT 0 30,000
27 1861 2 786 1253 5 DOUTOR JOAQUIM THEODORO MOREIRA FAZENDA DA ILHA NEGOCIANTE 0 1 8.117,780
MARIA JOSE LEOLA DELREI E CAROLINA LEOLA
28 1861 2 786 1253 6 ENGENHO CASTELO NOVO DONO DE ENGENHO 2.000
DELREI 54 89.797,030
29 1861 2 786 1253 7 ROSA ALEXANDRA WENS FAZENDA DA LAGE PRODUTOR DE CACAU 2.800 5 9.015,000
30 1862 3 1270 1739 9 ANGELICA MARIA SOARES TENDA DE FERREIRO NEGOCIANTE 0 7 6.820,000
31 1862 2 784 1251 15 SANTOS ANTONIO TEIXEIRA SITIO JACARANDA PRODUTOR DE CACAU 125 1 940,000
32 1862 2 786 1253 19 BERNARDINO PEREIRA DA SILVA ENGENHO ITACANOEIRA DONO DE ENGENHO 80 3 4.765,000
33 1862 2 786 1253 8 DOMINGOS ALVES DOS REIS FAZENDA DA BARRA DO ITAIPE DONO DE ENGENHOCA 0 0 541,394
34 1862 2 784 1251 12 DOMINGOS ALVES DA SILVA EM ARITACUA PRODUTOR DE CACAU 250 0 1.181,533
35 1862 2 784 1251 13 JOAO MENDES COELHO FAZENDA JACARANDA PRODUTOR DE CACAU 3.000 2 8.710,000
36 1862 2 784 1251 14 JOSE ALEXANDRE DA SILVA FAZENDA CABRUNEMA PRODUTOR DE COCO 0 1 417,000
37 1862 3 1270 1739 8 MARCELINO DE ARAUJO SANTIAGO ARITANA PRODUTOR DE CAFE 0 0 395,000
38 1863 2 784 1251 16 JOÃO BERNARDINO SITIO EM UNA PRODUTOR DE FARINHA 0 0 160,000
39 1863 2 784 1251 18 JOAO DE SOUZA TAVARES BONZE EM OLIVENCA NEGOCIANTE 0 0 4.663,376
40 1863 2 784 1251 19 JOSEFA MARIA DA VITORIA FAZENDA ALDEIA VELHA PRODUTOR DE COCO 0 0 1.090,000
41 1863 3 1270 1739 11 MANOEL ANTONIO LISBOA NA ILHA DO BARBOSA PRODUTOR DE CACAU 400 0 200,000
42 1863 2 784 1251 11 MANOEL JOAQUIM DE SANTA ANA NO LUGAR JACARANDA PRODUTOR DE CACAU 830 4 2.465,000
43 1864 2 784 1251 20 MARIA ALEXANDRINA DE JESUS EM ITAIPE PRODUTOR DE CACAU 311 0 1.181,780
44 1864 2 784 1251 3 JOSE DE SOUZA VIEIRA COMERCIO NA VILA NEGOCIANTE 0 1 2.001,000
308

45 1864 2 784 1251 2 MANOEL DA ENCARNACAO FAZENDA URUCUTUCA PRODUTOR DE FARINHA 0 18 11.999,420
46 1864 2 784 1251 4 MANOEL IZIDORIO FURTADO LUGAR [MULUCUGE] E OUTRO PRODUTOR DE CACAU 243 0 347,000
FAZENDA PONTAL DA BARRA ITAIPE E
47 1865 2 784 1251 6 ANTONIO FRANCISCO DE ECA E CASTRO PRODUTOR DE COCO 60
TARIRI 0 808,940
48 1865 3 1270 1739 13 ANTONIO MANOEL DA COROA DE CRSITO LUGAR PUTUMUJU PRODUTOR DE CACAU PLT 0 346,080
49 1865 2 784 1251 7 FREDERICO HOEVERMAN [SCHRODER] LUGAR CACHOEIRA PRODUTOR DE CACAU 1.134 2 2.182,200
50 1865 2 784 1251 9 JOAO ADAO SCHAUM PADARIA NA VILA NEGOCIANTE 0 7 5.182,000
51 1865 2 784 1251 8 JOSE FRANCISCO DE ABREU NO PONTAL E TARIRI PRODUTOR DE CACAU 750 7 7.397,300
52 1865 9 3901 19 MANOEL PEREIRA DOS SANTOS FAZENDA DA TAPERA NEGOCIANTE 0 6 11.023,950
53 1866 2 785 1252 2 ANTONIO DA CUNHA MARELIM COMERCIO NA VILA NEGOCIANTE 0 1 11.700,473
54 1866 3 1270 1739 15 ANTONIO NUNES DA SILVA PROCESSO INCOMPLETO PROCESSO INCOMPLETO 0 0 EXCLUIDO
55 1866 2 785 1252 3 ELIZA FERREIRA ALVES BRASIL TENDA DE FERREIRO E OUTRAS PRODUTOR DE CAFE 0 0 1.810,000
56 1866 2 785 1252 7 FELIPA DE MELO SA BANDEIRA FAZENDA JETIMANA-ACU PRODUTOR DE FARINHA 0 14 16.935,600
57 1866 2 785 1252 4 JANUARIO DOS REIS FIGUEREDO FAZENDA MAMOAM E OUTRAS PRODUTOR DE COCO PLT 1 2.263,000
58 1866 2 785 1252 5 JOÃO FRANCISCO DA MATA SITIO SAMBAITUBA PRODUTOR DE CACAU 570 0 595,000
59 1866 2 785 1252 6 JOAQUIM LOPES DA SILVA COMERCIO NA VILA NEGOCIANTE 0 3 17.501,615
60 1867 2 786 1253 22 ALBINA CAETANA SITIO PERUANHAGA E OUTROS PRODUTOR DE CACAU 355 0 543,440
61 1867 2 785 1252 8 APOLONIO DE SANTIAGO E SILVA SITIOS UNA E [CABRENUMA] PRODUTOR DE CACAU 225 0 558,000
62 1867 2 786 1253 20 BERNARDA MARIA DE SANTA ANA FAZENDA BOA VISTA PRODUTOR DE CACAU 3.400 1 4.916,400
63 1867 2 785 1252 10 HENRIQUE DIAS DE MENDONÇA EM UNA PRODUTOR DE CACAU 49 0 86,800
64 1867 2 786 1253 1 MANOEL GOMES BARACHO PROCESSO INCOMPLETO PROCESSO INCOMPLETO 0 0 EXCLUIDO
65 1867 2 786 1253 21 MARIA DA COSTA PROCESSO INCOMPLETO PROCESSO INCOMPLETO 0 0 EXCLUIDO
66 1868 2 785 1252 13 ALFERES AUGUSTO DE SA BITENCOURT CAMARA FAZENDA BOM SUCESSO PRODUTOR DE CACAU 5.500 11 20.697,800
67 1868 2 742 1207 1 FLORIANA GOMES BARACHO LUGAR OUTEIRO E OUTRO PRODUTOR DE COCO 0 0 900,000
68 1868 2 742 1207 2 JOAO PEDRO BONIN FAZENDA MONTE ALTO E OUTRA PRODUTOR DE CACAU 2.415 4 7.973,000
69 1868 2 742 1207 3 JOAQUIM RODRIGUES DA SILVA FAZENDA ÁGUA BRANCA E OUTRA PRODUTOR DE CACAU 643 0 1.475,880
309

70 1868 3 1270 1739 16 MANOEL GERALDO DE NAZARET EM TARIRI PRODUTOR DE CACAU 188 0 412,000
71 1868 2 742 1207 5 MARCOS FRANCISCO ANTONIO DA GLORIA FAZENDA UNA E OUTRA PRODUTOR DE CACAU 493 0 1.729,000
72 1868 2 742 1207 4 MARIA DE JESUS AFONSO FAZENDA PORTO DOS BARCOS PRODUTOR DE FARINHA 0 16 12.394,260
73 1868 2 742 1207 6 PEDRO RENAUD FAZENDA BOA VISTA PRODUTOR DE CACAU 1.000 1 3.148,000
74 1868 3 1270 1739 17 VERISSIMO BATISTA DA LAPA FAZENDA SÃO JOSÉ PRODUTOR DE CACAU 1.250 0 2.554,000
75 1869 2 742 1207 8 AGOSTINHO ANTONIO DA SILVA FAZENDA BARAO PRODUTOR DE CACAU 1.085 1 2.403,000
76 1869 2 742 1207 7 ANTONIO JOAQUIM DUARTE NA ILHA ALFANDEGA PRODUTOR DE CACAU 236 0 677,000
PRODUTOR DE
77 1869 3 1270 1739 1 TENENTE CANDIDO NARCISO SOARES CALDEIRAS E RIO DE UNA 0
MADEIRA 7 11.303,410
78 1869 2 742 1207 9 DOMINGOS JOSE DE CARVALHO NÃO IDENTIFICADA PRODUTOR DE CACAU 526 0 576,000
79 1869 2 742 1207 10 EUGENIA RENAUD VINCH NÃO IDENTIFICADA PRODUTOR DE CACAU 834 0 1.497,600
80 1869 2 742 1207 11 FRANCISCO ANTONIO DA GLORIA EM CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 1.606 0 2.920,140
81 1869 2 742 1207 13 JOANA FRANCISCA DE ECA E CASTRO PROCESSO INCOMPLETO PROCESSO INCOMPLETO 0 0 EXCLUIDO
82 1869 2 742 1207 12 JOÃO RIBEIRO DE VASCONCELOS NA FREGUESIA DE UNA PRODUTOR DE CAFE 48 2 639,600
83 1869 2 741 1206 1 JOAQUIM FRANCISCO BARROSO EM PONTA DO RAMO PRODUTOR DE CACAU 1.000 0 806,000
84 1869 2 741 1206 2 JOSE ANTONIO COUTINHO NÃO IDENTIFICADA PRODUTOR DE CACAU 640 0 891,000
85 1869 2 741 1206 3 MARIA ANA DO AMPARO NÃO IDENTIFICADA PRODUTOR DE CACAU 1.360 0 1.165,500
86 1869 2 741 1206 4 MARIA DA CONCEICAO NÃO IDENTIFICADA PRODUTOR DE CACAU 3.360 0 2.350,000
87 1870 2 741 1206 7 ANA ROSA DOS REIS NÃO IDENTIFICADA NÃO IDENTIFICADA 0 0 700,000
88 1870 2 741 1206 6 ANA JOAQUINA DE JESUS EM ARITAQUA PRODUTOR DE CACAU 600 0 1.496,000
89 1870 2 741 1206 8 DONA EMERENCIANA DE PAIVA AROUCA FAZENDA SÃO THIAGO PRODUTOR DE CACAU 1.065 1 4.114,185
90 1870 2 741 1206 9 FREDERICO BALDOINO RODRIGUES DE SOUZA NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 342 0 792,000
91 1870 2 741 1206 10 JOÃO RIBEIRO DE VASCONCELOS NA POVOACAO DE UNA PRODUTOR DE CAFE 48 2 2.683,170
92 1870 2 741 1206 11 JOSE CARDOSO DE JESUS NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 300 0 240,000
93 1870 2 741 1206 12 JOSE PEDRO DA PENHA FAZENDA BURUNDANGA PRODUTOR DE CACAU 776 0 676,000
94 1870 2 741 1206 13 LIDIA FLORENTINA DIAS ESCRIVAO DO JUIZO (CONJUGE) ESCRIVAO (CONJUGE) 0 0 905,000
310

95 1870 2 741 1206 14 PEDRO ANTONIO PUPE NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 261 0 205,000
96 1871 2 740 1205 1 ANA MARIA AFONSO DE GUSMAO NA POVOACAO DE UNA NEGOCIANTE 0 2 16.299,851
97 1871 2 740 1205 18 APOLONIA DA ESCADA NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 250 0 200,000
98 1871 2 740 1205 3 ERMELLINA DE FIGUEIREDO DA PEDRA BRANCA NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 1.000 0 1:170$000
99 1871 2 740 1205 5 JOÃO MAURICIO DE SOUZA NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 128 0 140$000
100 1871 2 740 1205 4 JULIAO RODRIGUES NO LUGAR PAU BRASIL PRODUTOR DE CACAU 734 0 734$000
101 1871 2 740 1205 6 LUCIO ANTONIO BRANDAO FAZENDA MORRO DOS MIRIQUIS PRODUTOR DE CACAU 365 0 465$000
102 1871 2 740 1205 7 LUIZA AMELIA VAILL BENEVIDES FAZENDA ERMO NOBRE PRODUTOR DE CACAU 2.268 0 5: 819$000
103 1871 2 740 1205 8 MARIA FRANCISCA DOS SANTOS NÃO IDENTIFICADA PRODUTOR DE CACAU 4.066 0 2.984,000
104 1871 2 740 1205 9 MARIA JULIANA SCHAUM NÃO IDENTIFICADA NÃO IDENTIFICADA 0 8 6.530,000
105 1871 2 740 1205 12 SERAFINA DO AMARAL NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 100 0 160,000
106 1871 2 740 1205 11 TITO GALIÃO NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 1.278 0 1.538,000
107 1872 2 740 1205 14 AMELIA MARIA DOS NASCIMENTO CASA NA VILA NÃO IDENTIFICADA 0 0 600,000
108 1872 3 1372 1841 7 ANGELA MARIA FAZENDA BARRA NOVA PRODUTOR DE CACAU 261 0 502,900
109 1872 2 740 1205 13 ANTONIO LIBORIO AMBROZIO SITIO PAU BRASIL PRODUTOR DE CACAU 2.525 0 2.128,000
110 1872 2 740 1205 15 CATARINA DE SOUZA GOMES UNA/ EM COMANDATUBA NÃO IDENTIFICADA 0 0 1.000,000
111 1872 2 737 1202 1 JOAQUIM DA SILVA VELOZO NÃO IDENTIFICADA PROCESSO INCOMPLETO 0 0 EXCLUIDO
112 1872 2 740 1205 16 JOSE ANTONIO BITENCOURT NA FREGUESIA DE UNA NÃO IDENTIFICADA 0 0 134,000
113 1872 2 740 1205 17 JOSEFA MARQUES DO AMARAL SOUZA FAZENDA MARUY PRODUTOR DE CACAU 800 4 11.200,000
114 1872 2 737 1205 4 MANOEL CARDOSO DA SILVA FAZENDA RETIRO NÃO IDENTIFICADA 0 9 10.190,000
115 1872 2 737 1202 6 MANOEL JOSE DE CARVALHO LESSA SITIO JAQUEIRA PRODUTOR DE FARINHA 0 0 787,400
116 1872 2 737 1202 7 MANOEL LUCIANO JESUS SITIO SAPUCAEIRA PRODUTOR DE CACAU PLT 0 500,000
117 1872 2 737 1202 9 MANOEL PLACIDO SÃO THIAGO EM ÁGUA BRANCA PRODUTOR DE CACAU 376 0 906,916
118 1872 2 737 1202 8 MANOEL VICENTE ROCHA VIEIRA NA CACHOEIRA DE ITABUNA NEGOCIANTE 0 0 1.288,466
119 1872 2 737 1202 5 MANOEL E JOSE NA FREGUESIA DE UNA NÃO IDENTIFICADA 0 19 9.778,980
311

120 1872 2 737 1202 2 MARIA MADALENA DE JESUS NÃO IDENTIFICADA NÃO IDENTIFICADA 0 0 27,000
121 1872 2 737 1202 10 PEDRO RIBEIRO DE CARVALHO NA COLONIA DE COMANDATUBA NÃO IDENTIFICADA 0 5 2.050,000
122 1872 3 1372 1841 6 QUINTINA MARTA DE ABREU FAZENDA ITARIRY DO PORTO PRODUTOR DE CACAU 531 0 1.293,770
123 1873 2 737 1202 11 CLAUDINA MARIA DE JESUS PROCESSO INCOMPLETO PROCESSO INCOMPLETO 0 0 EXCLUIDO
124 1873 2 737 1202 12 EZEQUIEL DE AMORIM NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU PLT 0 500,000
125 1873 2 737 1202 13 IGNEZ MARIA DO ESPÍRITO SANTO FAZENDA TABOCAS PRODUTOR DE CACAU 700 0 1.474,000
126 1873 2 737 1202 14 JOAQUIM IGNACIO DE ARAUJO CARNEIRO SITIO SÃO JOAO PRODUTOR DE CACAU PLT 0 720,000
127 1873 3 1372 1841 5 LUIZA DA CRUZ DO ESPÍRITO SANTO CASA NA VILA NÃO IDENTIFICADA 0 0 300,000
128 1873 2 737 1202 17 MANOEL ANTONIO CALIXTO SITIO PERUANHAGA PRODUTOR DE CACAU 50 0 209,000
129 1873 2 737 1202 18 MANOEL FRANCISCO DUNDA FAZENDA TABOCAS PRODUTOR DE CACAU 6.020 3 8.304,800
130 1873 2 737 1202 19 MANOEL SERAFIM DOS ANJOS SITIO SÃO JOÃO PRODUTOR DE CACAU PLT 0 350,000
131 1873 2 737 1202 16 MARIA MADALENA DE CASTRO CASA NA VILA NÃO IDENTIFICADA 0 2 1.024,980
JOSE FRANCISCO RENOVATO E INGNEZ MARIA DO
132 1873 2 737 1202 25 NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 568
ESPÍRITO SANTO 0 568,000
133 1874 2 737 1202 20 ADELINA TAVARES BRONZE NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 2.500 0 2.320,000
134 1874 3 1372 1841 4 CLAUDINA BEZERRA DAS NEVES CASA NA VILA NÃO IDENTIFICADA 0 0 480,000
135 1874 2 737 1202 21 JOANA MARIA DA CONCEICAO NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 518 0 507,480
136 1874 2 737 1202 22 TENENTE JOAO BATISTA GUALBERTO NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU PLT 4 EXCLUIDO
137 1874 2 737 1202 23 CAPITAO JOAQUIM FERREIRA DE PAIVA CASA NA VILA NÃO IDENTIFICADA 0 0 4.500,000
NO LUGAR CAPITAO E PONTA DO
138 1874 2 737 1202 24 JOAQUINA MARIA DA CONCEICAO PRODUTOR DE CACAU 200
RAMO 0 225,000
TENENTE CORONEL JOSE VICENTE DO AMORIM FAZENDA ROSARIO DO ITAHIPE E
139 1874 2 738 1203 1 NÃO IDENTIFICADA 0
BEZERRA OUTRAS 0 1.335,780
140 1874 4 1372 1841 3 LUIZ JOSE DE CARVALHO (IRMAO J.J. SEABRA) FAZENDA JARDIM DA SAUDADE PRODUTOR DE CACAU 4.154 2 7.895,590
141 1874 2 738 1203 2 MANOEL JOSE FERREIRA NO LUGAR CAPITAO PRODUTOR DE COCO 0 0 309,500
142 1874 2 738 1203 4 NARCIZA DOS ANJOS NÃO IDENTIFICADA NÃO IDENTIFICADA 0 0 EXCLUIDO
143 1874 2 738 1203 3 REQUELINA MARIA DA CONCEICAO NO LUGAR ILHA DA ALFANDEGA PRODUTOR DE CACAU 667 0 1.645,000
312

144 1874 2 738 1203 5 THOMAS DIAS DOS INOCENTES NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 430 0 434,500
145 1874 2 738 1203 6 VITORIANA DE JESUS NO LUGAR BANCO RASO PRODUTOR DE CACAU 1.490 0 1.191,000
146 1875 2 738 1203 7 DOMINGOS JOSE LEANDRO NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 320 0 268,000
147 1875 4 1372 1841 1 ALFERES FRANCISCO VITORIO DE SALES LEITE FAZENDA OLANDI E OUTRAS NEGOCIANTE 2.509 8 29.240,772
148 1875 2 738 1203 8 FREDERICO CARLOS DE SA NO LUGAR ALMADA PRODUTOR DE CACAU 500 3 1.855,000
EMPREGADO
149 1875 2 738 1203 9 FREDERICO DEFAMBISSES NÃO IDENTIFICADA 0
TELEGRÁFICO 0 92,300
150 1875 2 750 1216 3 HERCULANO QUINTINO DOS SANTOS NO LUGAR ALMADA PRODUTOR DE CACAU 620 0 558,500
151 1875 2 738 1203 11 JOAO RODRIGUES CEZAR LUGAR PERUANHAGA PRODUTOR DE CACAU 300 0 392,000
152 1875 2 749 1215 7 MAJOR JOAQUIM JOSE DE OLIVEIRA FAZENDA NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 19.404 28 62.180,824
ENGENHO UNIAO E FAZENDA
153 1875 2 738 1203 12 ALFERES JOSE ANTONIO DE GUIMARÃES BASTOS DONO DE ENGENHO 400
CALDEIRAS 16 55.042,167
154 1875 2 738 1203 13 JOSE DIAS RIBEIRO NO IGUAPE PRODUTOR DE CACAU 500 3 2.279,300
155 1875 2 738 1203 10 LUIZ DE GRAVA NÃO IDENTIFICADA FREI 0 0 1.473,760
156 1875 2 749 1215 1 MANOEL ANTONIO VIANA NA CACHOEIRA DO ITAIPE PRODUTOR DE CACAU 361 3 1.895,600
157 1875 2 749 1215 3 PEDRO DE CALAZANS NO LUGAR BARRA NÃO IDENTIFICADA 0 3 5.066,900
158 1875 2 749 1215 4 UMBELINA MARIA DE SOUZA NÃO IDENTIFICADA PRODUTOR DE CACAU 3.000 0 1.420,000
159 1876 2 781 1248 7 ADELINA SELLMANN CASAS DE COMERCIO E FAZENDA NEGOCIANTE 0 2 47.317,404
160 1876 2 749 1215 5 ANA MARIA VELOZO FAZENDA PIMENTA PRODUTOR DE CACAU 85 5 3.833,400
161 1876 2 749 1215 6 ANTONIO ALVES DE CERQUEIRA LUGAR ÁGUA BRANCA PRODUTOR DE CACAU 1.150 1 3.748,965
162 1876 2 781 1248 8 ANTONIO MATHEUS DA SILVA NOBRE OLIVENCA/LUGAR AQUI NEGOCIANTE 0 0 594,180
163 1876 2 781 1248 6 CAETANO JOSE FIGUEREDO LUGAR JACARANDA PRODUTOR DE CACAU 248 0 214,000
JOAO VIEIRA DE SOUZA (VIGARIO DA VILA DE
164 1876 2 781 1248 5 VIGARIO DE OLIVENCA 0 0
OLIVENCA) VILA DE OLIVENCA 531,000
165 1876 2 753 1219 10 JOSE JOAQUIM MONTEIRO LUGAR ALMADA PRODUTOR DE CACAU 3.150 1 5.431,307
166 1876 2 781 1248 4 LIBORIO FRANCISCO AMBROZIO LUGAR ALMADA PRODUTOR DE CACAU 3.228 0 3.192,100
167 1876 3 1372 1841 8 MANOEL GONCALVES DE ARAUJO CASA NA VILA NÃO IDENTIFICADA 0 0 520,000
313

168 1876 2 781 1248 3 MARIA DA PIEDADE MELO E SA ENGENHO ITAIPE DONO DE ENGENHO 0 48 53.097,000
169 1876 2 753 1219 11 SEVERIANO JOSE DA ROCHA (CAPITAO) SITIO BOA VISTA NÃO IDENTIFICADA 0 3 1.270,000
170 1877 2 781 1248 2 ADAO SCHAUM PADARIA NA VILA COMERCIANTE/PADARIA 0 4 9.286,610
171 1877 2 750 1216 14 CAROLINA MARIA DE JESUS AGREGADO NO ALMADA PRODUTOR DE CACAU 1.700 0 1.360,000
172 1877 2 750 1216 15 FRANCISCO JOAQUIM PEREIRA NO ENGENHO ALMADA PRODUTOR DE CACAU 1.482 0 1.786,000
173 1877 2 750 1216 16 HERMENEGILDO FRANCISCO DA SILVA COMERCIO NO LUGAR ÁGUA BRANCA NEGOCIANTE 885 1 4.409,076
NA ILHA DOS QUIRICOS/CACHOEIRA
174 1877 2 750 1216 17 JOANA DIONIZIA DA VITORIA PRODUTOR DE CACAU 383 0
DE ITABUNA 383,000
175 1877 2 750 1216 19 JOAO ALVES DA SILVA FAZENDA BOQUEIRÃO E OUTRAS PRODUTOR DE CACAU 5.290 0 8.591,325
176 1877 2 750 1216 20 JOSE DO NASCIMENTO MOREIRA FAZENDA NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 2.101 0 2.221,718
177 1877 2 750 1216 21 MARIA MADALENA NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 1.100 0 880,000
178 1877 2 750 1216 12 RAIMUNDO DOS REIS E SILVA FAZENDA NO LUGAR SAO JOAO PRODUTOR DE CACAU 570 0 1.748,700
179 1878 2 751 1217 1 ANA FRANCISCA PLACIDA CASA NA VILA PROCESSO INCOMPLETO 0 0 EXCLUIDO
180 1878 2 751 1217 3 CRISPIM DOMINGUES DO COUTO (LIBERTO) TERRA DENOMINADA CONSCIENCIA PRODUTOR DE INHAME 0 0 526,250
181 1878 2 750 1216 1 FRANCISCA FLORENTINO VILAS BOAS LEMOS TERRA NO MORRO PERNAMBUCO NÃO IDENTIFICADA 0 0 1.000,000
182 1878 2 750 1216 4 IGNEZ MARIA DA CONCEICAO NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 500 0 500,000
183 1878 2 750 1216 5 IGNEZ MARIA DA VITORIA NO LUGAR TERRA NOVA PRODUTOR DE CACAU 400 0 400,000
JOAO DIAS PEREIRA GUIMARAES CALDAS
184 1878 2 750 1216 6 PRODUTOR DE COCO 0 0
(PROFESSOR) NÃO IDENTIFICADA 3.895,000
185 1878 2 750 1216 11 MANOEL FRANCISCO DA RESSUREICAO NO ALMADA PRODUTOR DE CACAU 2.458 0 2.279,040
186 1878 2 750 1216 10 MANOEL JOSE DE SANTO AMARO NO ALMADA PRODUTOR DE CACAU 3.800 0 2.073,200
187 1878 2 750 1216 8 MARIA CLEIFA DE MENEZES SOUZA NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 906 0 2.100,000
188 1878 2 750 1216 9 MARIA LAVIGNE FAZENDA ITARIRI PRODUTOR DE CACAU 15.100 18 36.341,500
189 1878 2 750 1216 7 MARIANA JOAQUINA DE QUEIROS CALDAS ENGENHO SAO JOAO DONO DE ENGENHO 0 22 22.186,960
190 1878 2 751 1217 4 ELIZA MARIA BONIN FAZENDA MONTE ALTO PRODUTOR DE CACAU 600 1 2.990,000
191 1878 2 750 1216 13 PASCOAL GONCALVES DE PAIVA (CAPITAO) FAZENDA PIRATAQUISSE PRODUTOR DE CACAU 20.889 21 49.742,100
314

192 1878 2 753 1219 1 PEDRO BELIZARIO DE SOUZA FAZENDA BANCO PRODUTOR DE CACAU 906 0 6.326,000
193 1878 2 781 1248 17 PEDRO VALLETE NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 6.254 0 5.603,200
194 1879 2 751 1217 2 ANA VITORIA FRANCISCA DOS REIS NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 2.000 0 2.040,000
195 1879 3 1295 1764 5 ANTONIO HENRIQUE MARQUES DE OLIVEIRA CASA DE NEGÓCIO NEGOCIANTE 0 4 31.995,006
196 1879 2 753 1219 2 CRISTIANO MANOEL DE SA BITENCOURT CAMARA ENGENHO ITAIPE DONO DE ENGENHO 0 23 17.674,200
NO LUGAR SAMBAITUBA/SESMARIA
197 1879 2 753 1219 3 DOMINGOS ANTONIO FERREIRA PRODUTOR DE CACAU 1.600 0
ITAIPE 1.121,000
198 1879 2 753 1219 4 FELIPE BENICIO MENDES NO LUGAR CORONEL/ALMADA PRODUTOR DE CACAU 2.438 0 1.775,200
SITIO JACARANDA DE
199 1879 2 781 1248 9 FLORENCIA DIAS DOS SANTOS PRODUTOR DE CACAU 1.700 0
DENTRO/CACHOEIRA DE ITABUNA 1.665,000
FLORINDA FRANCISCA DA VITORIA PAIVA (SOGRA
200 1879 4 1372 1841 2 PRODUTOR DE CACAU 10.059 11
DO PRESIDENTE DA CAMARA J.P. CALDAS) FAZENDA PIRATAQUICE 24.206,503
201 1879 2 753 1219 5 FREDERICO BERGINN NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 2.798 0 2.743,000
JACARANDA DE DENTRO/CACHOEIRA
202 1879 2 753 1219 7 GUILHERMINA EUSEBIO DE ASSUNCAO MENDES PRODUTOR DE CACAU 600 0
DE ITABUNA 444,000
SEQUEIRO DO IMBU/ CACHOEIRA DE
203 1879 2 753 1219 8 JOAQUIM PRIMO DA COSTA PRODUTOR DE CACAU 1.931 0
ITABUNA 1.924,800
EM SAMBAITUBA, URUCUTUCA E
204 1879 4 1406 1875 24 JOAQUINA ISMERIA DOS REIS MARQUES PRODUTOR DE CACAU 1.327 0
SESMARIA ITARIRI 1.728,600
205 1879 2 753 1219 9 JOSE PEREIRA DE ANDRADE CASA DE NEGÓCIO NA RUA DA BANCA NEGOCIANTE 0 0 2.479,751
206 1879 2 754 1220 2 LUIZ GASTAO LAVIGNE FAZENDA ITARIRI PRODUTOR DE CACAU 7.906 6 19.420,000
FAZENDA MOLHA
207 1879 2 754 1220 5 MACRINA DA COSTA LOUP PRODUTOR DE CACAU 2.800 0
FARINHA/CACHOEIRA DE ITABUNA 2.795,000
208 1879 2 754 1220 4 MANOEL JOSE DOS SANTOS NÃO IDENTIFICADA NÃO IDENTIFICADA 0 3 2.962,500
209 1879 4 1406 1875 25 MANOEL JOSE FELIX NO LUGAR ÁGUA BRANCA/ITAIPE PRODUTOR DE CACAU 1.600 0 1.890,000
210 1879 2 754 1220 3 MARIA DO CARMO MENDES LUGAR BANCO DO PEDRO PRODUTOR DE CACAU 500 0 2.377,000
FAZENDA E ENGENHO NO IGUAPE E
211 1879 2 754 1220 1 LOURENCO DIAS RIBEIRO DONO DE ENGENHO 0 15
OUTROS 17.457,800
212 1879 2 755 1221 13 QUINTINO FRANCISCO DE ECA E CASTRO FAZENDA BARREIRO PRODUTOR DE CACAU 3.547 0 6.890,200
213 1880 2 754 1220 10 CAROLINO JOSE DUARTE FAZENDA ILHA DA ALFANDEGA PRODUTOR DE CACAU 1.175 0 1.625,140
315

214 1880 2 754 1220 13 ETELVINA MARIA RAMOS FAZENDA CAJUEIRO PRODUTOR DE CACAU 2.500 0 2.915,200
215 1880 2 754 1220 7 ANTONIO FERNANDES SOL FAZENDA IGUAPE PRODUTOR DE CACAU 1.320 0 1.400,000
216 1880 2 754 1220 6 ANA MARIA DA CONCEICAO EM SAMBAITUBA PRODUTOR DE CACAU 750 0 990,500
EM UNA, LUGAR CAJUEIRO E
217 1880 2 754 1220 12 EUCLIDES COUTINHO DOS SANTOS PRODUTOR DE CACAU 1.104 0
ARITAQUA 935,200
218 1880 2 755 1221 7 JOVENCIO JOSE DUARTE ITAIPE/LUGAR ARITAQUA PRODUTOR DE CACAU 1.136 0 1.064,480
219 1880 2 755 1221 8 MARIA FRANCISCA DE JESUS ITAIPE/LUGAR SÃO JOÃO PRODUTOR DE CACAU 458 0 1.503,000
220 1880 2 755 1221 9 MARTINHA MARIA DA CONCEICAO LUGAR SAMBAITUBA PRODUTOR DE CACAU 2.000 0 1.575,000
221 1880 2 755 1221 14 ROMUALDO JOSE CAETANO EM PONTA DO RAMO PRODUTOR DE CACAU 1.400 0 1.345,000
222 1880 2 755 1221 6 HIPOLITO GASTAO LAVIGNE LUGAR BARRA PRODUTOR DE FARINHA 0 1 339,700
223 1880 2 755 1221 12 PEDRO ANTONIO DO BONFIM ALMADA/LUGAR BARBOZINHA PRODUTOR DE CACAU 3.027 0 2.927,000
224 1880 2 754 1220 8 ANTONIO JOSE DE CASTRO LUGAR MORRO DOS MIRIQUIS PRODUTOR DE CACAU 400 0 460,000
EGIDIO LUIZ DE SA BITENCOURT CAMARA
225 1880 2 754 1220 11 PRODUTOR DE CACAU 11.622 29
(CAPITAO) FAZENDA BOA VISTA SA E OUTRAS 25.575,000
226 1880 4 1406 1875 26 CLAUDINO JOSE DE OLIVEIRA FAZENDA MAPENDIPE E OUTRAS PRODUTOR DE FARINHA 0 3 4.773,840
POCO DO JUNDIAY/CACHOEIRA DE
227 1880 2 755 1221 10 MELANIA EUGENIA DO ESPÍRITO SANTO PRODUTOR DE CACAU 4.600 0
ITABUNA 4.580,000
228 1880 2 754 1220 9 BONIFACIO ALVES DA SILVA AREAL DE CIMA/RIO ITAIPE PRODUTOR DE CACAU 800 1 1.615,000
229 1881 2 757 1223 3 PEDRO GONCALVES DE VASCONCELOS GUSMAO CASA DE COMERCIO NA VILA NEGOCIANTE 0 0 1.489,470
230 1881 2 757 1223 5 ROMAO TELES DE SOUZA LUGAR RIACHO PRODUTOR DE CACAU 4.048 0 5.199,000
231 1881 2 757 1223 4 ROSA CANDIDA DE CASTRO LUGAR BARREIRO PRODUTOR DE CACAU 327 0 502,500
232 1881 2 755 1221 2 BENVENUTA RIBEIRO LOPES NA VILA NEGOCIANTE 0 2 9.004,016
233 1881 2 781 1248 11 IGNACIO MANUEL DO BONFIM LUGAR PONTA DO RAMO PRODUTOR DE CACAU 500 0 590,000
234 1881 3 1298 1767 2 PORFIRIA MARIA DE PAIVA GUSMAO FAZENDA OLANDI E OUTRAS NEGOCIANTE 150 7 17.266,411
235 1881 4 1406 1875 28 ANTONIO MANOEL DO BONFIM LUGAR TERRA NOVA PRODUTOR DE CACAU 1.780 0 1.038,000
236 1881 2 781 1248 10 JOSE SIMIAO MORENO DOS REIS CASA DE COMERCIO NA VILA NEGOCIANTE PLT 1 4.249,902
237 1881 3 1298 1767 3 THOME ALVES DOS REIS NO IGUAPE PRODUTOR DE CACAU 1.062 0 1.222,000
316

238 1881 4 1406 1875 27 ANA JOAQUINA DE ALVES NUNES LUGAR ITARIRI PRODUTOR DE CACAU 1.861 0 2.826,600
LUGAR QUIRICOS/CACHOEIRA DE
239 1881 2 755 1221 4 FELIPE WENSE PRODUTOR DE CACAU 725 1
ITABUNA 2.080,000
FAZENDA RIBEIRAO DAS
240 1881 2 781 1248 12 FRANQUELINA FERREIRA DA SILVA PRODUTOR DE CACAU 4.500 0
ALEGRIAS/CACHOEIRA DE ITABUNA 5.570,000
JACARANDA DE DENTRO/CACHOEIRA
241 1881 2 757 1223 1 MANOEL FAUSTINO TEIXEIRA MENDES PRODUTOR DE CACAU 2.000 0
DE ITABUNA 2.220,000
RIBEIRAO DAS PREGUICAS/CACHOEIRA
242 1881 2 781 1248 13 FRANCISCA BAZILIA DA SILVA PRODUTOR DE CACAU 1.635 0
DE ITABUNA 1.378,000
243 1881 4 1406 1875 23 MARIA FRANCISCA DE AMORIM NA VILA PRODUTOR DE COCO 0 0 495,000
JACARANDA DE DENTRO/CACHOEIRA
244 1881 2 757 1223 2 MARTINHO JOSE DA SILVA PRODUTOR DE CACAU 1.380 0
DE ITABUNA 1.134,000
245 1881 2 755 1221 1 BERNARDO SELLMAM (MAJOR) CASA DE COMERCIO NA VILA NEGOCIANTE 0 3 26.718,588
246 1882 2 758 1224 11 PEDRO CARDOSO DO NASCIMENTO NO LUGAR BARRA DO ITAIPE PRODUTOR DE CAFE 0 0 884,600
247 1882 2 758 1224 12 PEDRO JOSE DUARTE EM SAMBAITUBA PRODUTOR DE CACAU 70 0 365,000
JOSEFA AMALIA IZABEL DE BITENCOURT SA DE
248 1882 2 781 1248 16 PROCESSO INCOMPLETO 0
ELREI PROCESSO INCOMPLETO 0 EXCLUIDO
249 1882 2 758 1224 10 MARIANA NASCIMENTO BENEVIDES CASA NA VILA PRODUTOR DE CACAU PLT 0 1.300,000
250 1882 2 758 1224 17 JOSE VERISSIMO MARQUES NO LUGAR TERRA NOVA PRODUTOR DE CACAU 1.577 0 1.727,000
251 1882 2 758 1224 9 MANOEL FELIX DA SILVA LUGAR SAO JOAO - RIO ITAIPE PRODUTOR DE CACAU 600 0 1.029,000
252 1882 2 758 1224 8 MANOEL APOLINARIO BATISTA SANTOS LUGAR TABOCAS PRODUTOR DE CACAU 3.600 0 3.349,400
253 1882 2 758 1224 13 ROBERTO GASTON LAVIGNE FAZENDA ALMADA PRODUTOR DE CACAU 3.000 1 4.809,900
254 1882 2 758 1224 15 SOFIA CLAUDENTINA BATISTA FAZENDA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 7.100 1 8.600,000
255 1882 2 758 1224 2 JOAO ADOLFO SCHIMIDT LUGAR TABOCAS PRODUTOR DE CACAU PLT 0 349,800
256 1882 2 758 1224 7 MARIA CAETANA DA ESCADA RIO ALMADA PRODUTOR DE CACAU 303 0 322,700
257 1882 2 757 1223 6 ANA JOAQUINA DA SILVA LUGAR ARITAQUA - RIO ITAIPE PRODUTOR DE CACAU 400 0 748,000
258 1882 2 758 1224 5 LODONIO FRANCISCO DE CAMARGO LUGAR SAMBAITUBA PRODUTOR DE CACAU 1.818 0 2.330,500
259 1882 2 758 1224 14 VERISSIMO FRANCISCO DAS CHAGAS FAZENDA JACARANDA DE DENTRO PRODUTOR DE CACAU 971 0 1.061,000
260 1882 2 757 1223 9 AUGUSTO FERREIRA ESCHER FAZENDA RIO COMPRIDO PRODUTOR DE CACAU 13.890 12 23.006,000
317

RIBEIRAO DAS PREGUICAS/CACHOEIRA


261 1882 2 757 1223 7 BELMIRA MARIA DE JESUS PRODUTOR DE CACAU 400 0
DE ITABUNA 760,000
262 1882 2 757 1223 11 HIPOLITO JOSE TRAVASSO LUGAR JACARANDA DE DENTRO PRODUTOR DE CACAU 1.192 0 1.404,000
263 1882 2 758 1224 4 JOAO NEPOMUCENO LUGAR ITARIRI DE DENTRO PRODUTOR DE CACAU 1.700 0 1.700,000
264 1882 3 1298 1767 4 ANTONIO PEDRO DE FARIA LUGAR TERRA NOVA PRODUTOR DE CACAU 2.000 0 2.600,000
265 1882 2 758 1224 3 JOAO CARLOS HOLENVERGNER FAZENDA SAO THIAGO PRODUTOR DE CACAU 2.000 5 4.800,000
266 1882 2 758 1224 6 LUIZA THEODOLINA DE SA ADAMI CASA DE COMERCIO NA VILA NEGOCIANTE 0 8 59.728,503
267 1882 2 757 1223 10 EVARISTO ALVES DOS REIS NÃO IDENTIFICADA NÃO IDENTIFICADA 0 0 2.500,000
268 1882 3 1298 1767 5 JOSE FURTADO DA SILVA TENDA DE FERREIRO FERREIRO 0 0 450,000
269 1882 2 758 1224 1 JOANA SOARES E JOAO JOSE PINTO (CASAL) CASA NA VILA NÃO IDENTIFICADA 0 0 200,000
270 1880 2 759 1225 4 RITA CONSTANCA DE MELO SA FAZENDA SANTA MARIA E OUTRAS DONO DE ENGENHO PLT 73 57.889,448
271 1883 2 759 1225 1 AUGUSTO BATISTA GUALBERTO FAZENDA AREAL DE CIMA E OUTRAS PRODUTOR DE CACAU 1.930 0 2.120,000
272 1883 2 758 1225 8 INOCENCIO MARIANO DE FIGUEREDO LUGAR [RICHIADO] PRODUTOR DE CACAU 3.005 1 4.435,000
273 1883 2 760 1226 6 LUDOVICO LUIZ DO NASCIMENTO LUGAR TERRA NOVA PRODUTOR DE CACAU 3.600 0 4.890,000
274 1883 2 759 1225 6 FELICIA MARIA DE ABREU E CASTRO FAZENDA ITARIRI PRODUTOR DE CACAU 1.579 7 2.815,500
275 1883 2 760 1226 2 JOAQUIM MANOEL DE OLIVEIRA LUGAR CABRUNEMA PRODUTOR DE CACAU 2.000 0 3.650,000
LUGAR PAU DO PEIXE-CACHOEIRA DE
276 1883 2 759 1225 7 FELIPE MIGUEL NINCH PRODUTOR DE CACAU 3.513 1
ITABUNA 4.355,520
LUGAR PICO E LUGAR ÁGUA BRANCA -
277 1883 2 760 1226 7 MARIA JOAQUINA DA SILVA PRODUTOR DE CACAU 497 0
RIO ITAIPE 697,000
RIBEIRAO DO JACARANDA-CACHOEIRA
278 1883 2 760 1226 14 ROSALINA FRANCISCA KRUSCHEVSCHIS PRODUTOR DE CACAU 1.200 0
DE ITABUNA 500,000
279 1883 2 759 1225 2 BERNARDO JOSE DEMETRIO LUGAR SAMBAITUBA PRODUTOR DE CACAU 1.847 0 1.712,000
280 1883 2 759 1225 5 ERCILIA SCHAUM MONTEIRO FAZENDA JARDIM-ALMADA PRODUTOR DE CACAU 3.350 1 5.284,000
FAZENDA MELOY-CACHOEIRA DE
281 1883 2 760 1226 8 PORFIRIO FELICIANO FONTES PRODUTOR DE CACAU 2.648 0
ITABUNA 4.315,200
282 1883 2 760 1226 3 JOSE DOS SANTOS DA ROCHA LUGAR JACARANDA DE DENTRO PRODUTOR DE CACAU 1.300 0 1.100,000
283 1883 2 759 1225 3 DOMINGOS LOPES DA SILVA (TENENTE CORONEL) VÁRIAS PROPRIEDADES NEGOCIANTE PLT 5 68.103,308
318

284 1883 2 760 1226 1 JOAO DOS SANTOS DA ROCHA NO LUGAR PAU BRASIL PRODUTOR DE CACAU 600 0 720,000
LUGAR QUEBRA CANELA-CACHOEIRA
285 1883 2 758 1224 16 ADAO FELIPE BRAIT PRODUTOR DE CACAU 2.350 0
DE ITABUNA 6.942,200
286 1883 3 1298 1767 6 JOAQUINA MARIA MOREIRA LUGAR PONTA DO RAMO PRODUTOR DE CACAU 5.250 0 6.905,000
287 1884 2 761 1227 6 PEDRO JOSE MENDES LUGAR BANCO DO PEDRO PRODUTOR DE CACAU 2.563 0 2.163,000
LUGAR BOM JESUS-CACHOEIRA DE
288 1884 2 761 1227 8 TEODORO CONSTANTINO DE SANTANA PRODUTOR DE CACAU 2.200 0
ITABUNA 1.570,000
289 1884 2 760 1226 12 JOAO LODUVICO MARTINS NA VILA PROCESSO INCOMPLETO 0 0 EXCLUIDO
290 1884 2 760 1226 11 JOAO BATISTA HOMEM DEL REI (CAPITAO) ENGENHO SANTANA DONO DE ENGENHO 0 10 11.219,000
LUGAR RIBEIRAO DAS CANABRAVAS-
291 1884 2 760 1226 10 EMILIA MARIA NINCH PRODUTOR DE CACAU 4.540 1
CACHOEIRA DE ITABUNA 5.530,000
292 1884 2 760 1226 13 JOAQUIM DA COSTA FUCHS NA FREGUESIA DE UNA PRODUTOR DE CACAU 330 0 500,000
293 1884 2 761 1227 5 MANOEL JOSE VIEIRA NA FREGUESIA DE UNA NEGOCIANTE 0 3 11.891,890
POCO DO JUNDIAY/CACHOEIRA DE
294 1884 2 761 1227 4 LUIZA MARIA DA MOTA PRODUTOR DE CACAU 3.100 0
ITABUNA 3.060,000
LUGAR MOLHA FARINHA-CACHOEIRA
295 1884 2 760 1226 9 CONSTANCA ARANHA PRODUTOR DE CACAU 2.380 0
DE ITABUNA 1.840,000
FAZENDA CONCEICAO-CACHOEIRA DE
296 1884 2 761 1227 7 ROMAO GOMES PACHECO PRODUTOR DE CACAU 14.000 1
ITABUNA 14.300,000
297 1884 3 1298 1767 7 TRIFINA DE MELO E SA BANDEIRA NA VILA NÃO IDENTIFICADA Z 0 10.127,733
FAZENDA MASSAQUARA-CACHOEIRA
298 1884 2 761 1227 1 JORGE MATHIAS SCHER PRODUTOR DE CACAU 4.400 0
DE ITABUNA 5.674,000
FAZENDA RIBEIRAO DAS
299 1884 2 761 1227 9 THEODORA MARIA DOS SANTOS PRODUTOR DE CACAU 900 0
ALEGRIAS/CACHOEIRA DE ITABUNA 960,000
LUGAR RIBEIRAO DAS ALEGRIAS-
300 1884 2 761 1227 3 JOVINO MANOEL FRANCISCO PRODUTOR DE CACAU 300 0
CACHOEIRA DE ITABUNA 370,000
LUGAR MESSO, VILA DE OLIVENCA E
301 1885 3 1295 1764 12 JOSE DE CARVALHO DA SILVA LESSA TROPEIRO (10 BURROS) PLT 1
SAMBAITUBA 3.858,400
302 1885 2 762 1228 7 SILVANO JOSE DE SANTA ANA LUGAR CANABRAVA PRODUTOR DE CACAU PLT 0 210,000
303 1885 2 761 1227 13 JOAQUIM ALVES DA SILVA LUGAR ARITAQUA E OUTROS PRODUTOR DE CACAU 3.687 17 8.058,000
304 1885 3 1295 1764 14 APOLONIA LAURIANA DE BRITO LOPES CASA DE COMERCIO NA VILA NEGOCIANTE 0 3 17.472,027
305 1885 2 761 1227 12 HELENA LAVIGNE SCHAUM CASA DE COMERCIO NA VILA NEGOCIANTE 0 4 12.910,480
319

LUGAR PAU DO PEIXE-CACHOEIRA DE


306 1885 2 762 1228 2 MARIA CAROLINA NINCH PRODUTOR DE CACAU 3.699 1
ITABUNA 4.292,500
LUGAR QUIRICOS/CACHOEIRA DE
307 1885 2 762 1228 3 MARIA JULIANA WENSE PRODUTOR DE CACAU 2.336 1
ITABUNA 3.550,000
308 1885 2 761 1227 11 ESMERINA ZEFERINA DA VITORIA LUGAR SAO JOAO PRODUTOR DE CACAU 475 0 749,000
LUGAR RICHIADO-CACHOEIRA DE
309 1885 2 761 1227 15 JUSTA RUFINA DA CONCEICAO PRODUTOR DE CACAU 2.200 0
ITABUNA 2.465,000
LUGAR ALEGRIA-CACHOEIRA DE
310 1885 2 762 1228 6 RITA VITORIA ALVES PRODUTOR DE CACAU 2.336 1
ITABUNA 3.550,000
VILA DE OLIVENCA E CAHOEIRA DE
311 1885 2 762 1228 5 RAIMUNDO NONATO DO AMARAL (CAPITAO) NEGOCIANTE 9.980 1
ITABUNA 25.986,877
312 1885 2 762 1228 4 NARCISA MARIA DA CONCEICAO LUGAR PONTA DO RAMO PRODUTOR DE CACAU 3.413 0 4.395,000
313 1885 3 1295 1764 10 JOSE FRANCISCO GOMES LUGAR CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 1.750 0 3.220,000
314 1885 2 762 1228 8 VICENTE FERREIRA DIAS (ESCRIVAO) CASAS NA VILA TABELIAO 0 0 5.236,000
315 1885 3 1295 1764 13 ATANASIO FRANCISCO MARTINS CASA NA VILA NÃO IDENTIFICADA 0 0 500,000
316 1885 3 1295 1764 7 MARIA LIDIA DE VASCONCELOS NA CACHOEIRA DE ITABUNA NEGOCIANTE 0 1 1.456,660
317 1885 2 761 1227 14 JOAO CABOCLO (INDIO) PROCESSO INCOMPLETO PROCESSO INCOMPLETO 0 0 EXCLUIDO
318 1885 2 761 1227 10 ANANIAS CADOS NA VILA NEGOCIANTE 0 0 1.072,358
319 1885 2 762 1228 1 JOAO FRANCISCO DA MATA LUGAR CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU PLT 3 7.300,000
320 1886 2 762 1228 10 CARLOS STEPHANI HOHLENWEGER FAZENDA SAO THIAGO PRODUTOR DE CACAU 3.282 1 11.559,000
321 1886 2 762 1228 12 JOAO CARLOS HOHLENWEGNER (ALFERES) FAZENDA OCULOS-ALMADA PRODUTOR DE CACAU 8.561 2 11.622,944
322 1886 3 1298 1767 12 MANOEL JOSE DE SANTA ANA FAZENDA BOA VISTA PRODUTOR DE COCO 0 0 1.954,000
323 1886 2 762 1228 9 ARISTIDES FRANCISCO DE VASCONCELOS GUSMAO FAZENDA OLANDI E OUTRAS NEGOCIANTE 2.600 1 30.502,773
MARIA MARGARIDA NINCK (NATURAL DA
324 1886 2 762 1228 15 PRODUTOR DE CACAU 1.302 0
ALEMANHA) LUGAR CACHOEIRA DE ITABUNA 2.234,600
325 1886 2 762 1228 11 GENESIO MALAQUIAS DE CASTRO LUGAR ARITAQUA PRODUTOR DE CACAU 4.000 0 4.650,000
326 1886 2 762 1228 14 JOSE PEDRO MENDES LUGAR BANCO DO PEDRO PRODUTOR DE CACAU 6.279 0 6.297,500
327 1886 3 1298 1767 11 TEREZA PETRONILHA BARBOSA NA VILA PRODUTOR DE CACAU 2.260 0 2.391,000
LUGAR RIBEIRAO DAS PREGUICAS-
328 1886 2 762 1228 13 JOAQUIM IGNACIO DOS SANTOS PRODUTOR DE CACAU 950 0
CACHOEIRA DE ITABUNA 800,000
320

329 1887 3 1372 1841 15 MATHEUS ROQUE DE ARAUJO LUGAR ÁGUA BRANCA-ITAIPE PRODUTOR DE CACAU 1.500 0 970,000
330 1887 3 1298 1767 8 ACRISIO JANUARIO CARDOZO (ALFERES) NA CACHOEIRA DE ITABUNA NEGOCIANTE 4.155 7 46.864,778
331 1887 3 1295 1764 6 MARIA SEVERA DE FARIA CASA NA VILA NÃO IDENTIFICADA 0 0 500,000
332 1887 3 1372 1841 18 LUIZ ADAMI NA VILA NEGOCIANTE 0 5 46.707,468
ANTONIO NUNES MELGACO E ANA MARQUES
333 1887 3 1298 1767 9 PRODUTOR DE CACAU 343 0
MELGACO NO LUGAR ITARIRI E SAMBAITUBA 374,876
334 1887 3 1298 1767 1 FLORENCIO MARCELINO BANDEIRA LUGAR ITARIRI PRODUTOR DE CACAU 730 0 696,000
335 1887 3 1372 1841 16 MARIA IZABEL DE SOUZA NA VILA PRODUTOR DE CACAU 700 0 1.050,000
336 1887 3 1298 1767 10 BERNARDO FERNANDES DA SILVA NA CACHOEIRA DE ITABUNA PRODUTOR DE CACAU 8.978 0 20.679,000
337 1887 4 1372 1841 19 LEONIDIA MARIA DOS SANTOS FAZENDA UNIAO-ALMADA PRODUTOR DE CACAU 4.104 0 3.994,000
FAZENDA MASSAQUARA-CACHOEIRA
338 1888 3 1372 1841 10 JOAO PINHEIRO DO NASCIMENTO PRODUTOR DE CACAU 4.500 0
DE ITABUNA 3.310,000
FAZENDA SERIGUE-CACHOEIRA DE
339 1888 3 1372 1841 13 JOSE PINHEIRO DO NASCIMENTO PRODUTOR DE CACAU 5.200 0
ITABUNA 3.300,000
FAZENDA BOA VISTA DO BOM GOSTO-
340 1888 8 3424 4 ADELAIDE DE MELO SA OLIVEIRA PRODUTOR DE CACAU 7.500 0
CACHOEIRA DE ITABUNA 16.294,909
341 1888 3 1372 1841 14 FIRMINO PIRES CALDAS FAZENDA SAO JOAO DO PASTO DONO DE ENGENHO 0 9 11.275,000
FAZENDA VISTA DO PARAISO-
342 1888 3 1372 1841 11 PORCINA GROESZNER DE FIGUEREDO ROCHA NEGOCIANTE 4.444 0
CACHOEIRA DE ITABUNA 10.801,076
LUGAR JACARANDA-CACHOEIRA DE
343 1888 3 1372 1841 12 MARIA IGNEZ DA CONCEICAO PRODUTOR DE CACAU 5.000 0
ITABUNA 5.510,000
LUGAR JACARANDA-CACHOEIRA DE
344 1888 2 755 1221 5 FRANCISCA XAVIER DOS SANTOS PRODUTOR DE CACAU 5.607 0
ITABUNA 6.056,660
345 1888 2 760 1226 4 JOSE LOPES DA SILVA FAZENDA MORRO DE SAO FRANCISCO NEGOCIANTE 8.030 0 27.694,020

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