Ética
Ética
Ética
2018
Copyright © UNIASSELVI 2018
Elaboração:
Prof. Me. Kevin Daniel dos Santos Leyser
L685e
ISBN 978-85-515-0233-4
CDD 170.1
Apresentação
Caro acadêmico, antes de apresentar o conteúdo deste livro, gostaria
de me apresentar a você.
NOTA
Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para
você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano,
há novidades em nosso material.
O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.
Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.
IV
V
VI
Sumário
UNIDADE 1 - METAÉTICA.................................................................................................................... 1
TÓPICO 1 - A NATUREZA DA MORALIDADE................................................................................ 3
1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................................... 3
2 DEFINIÇÃO DE TERMOS-CHAVE: ÉTICO, MORAL, ANTIÉTICO, IMORAL...................... 3
2.1 CARACTERÍSTICAS DO BOM, MAU, CERTO, ERRADO, FELICIDADE OU PRAZER...... 4
2.2 O AMORAL E O NÃO MORAL...................................................................................................... 6
3 ABORDAGENS DO ESTUDO DA MORALIDADE....................................................................... 7
4 A MORALIDADE E SUAS APLICAÇÕES........................................................................................ 9
4.1 A ÉTICA E A ESTÉTICA................................................................................................................... 9
4.2 BOM, MAU, CERTO E ERRADO USADO EM UM SENTIDO NÃO MORAL...................... 10
4.3 A MORAL E AS BOAS MANEIRAS OU ETIQUETA................................................................. 11
4.4 A QUEM OU O QUE SE APLICA A MORALIDADE?.............................................................. 13
4.5 QUEM É MORAL OU ETICAMENTE RESPONSÁVEL? ........................................................ 16
5 DE ONDE VEM A MORALIDADE?................................................................................................. 17
5.1 A AVALIAÇÃO DE POSIÇÕES OBJETIVAS E SUBJETIVAS.................................................... 18
5.2 UMA SÍNTESE E POSSÍVEL RESPOSTA PARA A ORIGEM DA MORALIDADE............... 20
6 MORALIDADE COSTUMEIRA E MORALIDADE REFLEXIVA ............................................. 21
7 MORALIDADE, LEI E RELIGIÃO.................................................................................................... 23
7.1 A MORALIDADE E A LEI.............................................................................................................. 23
7.2 MORALIDADE E RELIGIÃO........................................................................................................ 24
8 A TEORIA DO DESENVOLVIMENTO MORAL DE KOHLBERG........................................... 26
8.1 DEFINIÇÃO DE ETAPAS MORAIS.............................................................................................. 27
9 POR QUE OS SERES HUMANOS DEVEM SER MORAIS?....................................................... 28
10 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ..................................................................................................... 29
RESUMO DO TÓPICO 1....................................................................................................................... 31
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................. 35
VII
2 O REALISMO MORAL....................................................................................................................... 64
3 AS CINCO CARACTERÍSTICAS CENTRAIS PARA A MORALIDADE................................. 65
4 ALTERNATIVAS METAÉTICAS EM RELAÇÃO A QUESTÕES DO REALISMO................ 68
4.1 PASSO 1 – AS AFIRMAÇÕES MORAIS POSSUEM CONTEÚDO COGNITIVO?................ 70
4.2 PASSO 2 – AO MENOS ALGUNS JUÍZOS MORAIS ESCAPAM À FALSIDADE?............... 71
4.3 PASSO 3 – A LINGUAGEM MORAL ESTÁ SENDO INTERPRETADA LITERALMENTE?..
78
4.4 PASSO 4 – AS CONDIÇÕES DE VERDADE DAS AFIRMAÇÕES MORAIS SÃO
INDEPENDENTES DO SUJEITO?................................................................................................ 80
4.5 PASSO 5 – OS FATOS MORAIS PODEM EXPLICAR NÃO TRIVIALMENTE NOSSAS
OPINIÕES MORAIS?...................................................................................................................... 85
5 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES........................................................................................................ 87
RESUMO DO TÓPICO 3....................................................................................................................... 88
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................. 90
VIII
TÓPICO 3 - A ÉTICA DA VIRTUDE................................................................................................. 141
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 141
2 DEFINIÇÃO DE TERMOS............................................................................................................... 141
3 A ÉTICA NICOMAQUEIA DE ARISTÓTELES........................................................................... 142
3.1 O CARÁTER E O FLORESCIMENTO HUMANO................................................................... 143
3.2 AVALIANDO A CONCEPÇÃO ARISTOTÉLICA DE FLORESCIMENTO ......................... 145
3.3 ABORDAGENS CONTEMPORÂNEAS AO FLORESCIMENTO.......................................... 146
3.4 A ESTRUTURA DAS VIRTUDES EM ARISTÓTELES............................................................. 148
4 O AUTOCULTIVO MORAL CONFUCIANO.............................................................................. 153
4.1 OS ANALECTOS CONFUCIANOS............................................................................................ 153
4.2 HARMONIA CONFUCIONISTA................................................................................................ 155
4.3 A ÉTICA CONFUCIONISTA DOS PAPÉIS............................................................................... 157
5 ANÁLISE CONTEMPORÂNEA DA ÉTICA DA VIRTUDE..................................................... 159
5.1 ANÁLISE DE ALASDAIR MACINTYRE DA ÉTICA DA VIRTUDE.................................... 159
5.2 DESVANTAGENS OU PROBLEMAS......................................................................................... 161
6 QUEM É A PESSOA VIRTUOSA IDEAL?.................................................................................... 162
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................................. 164
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 166
RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 179
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 182
IX
5.2 O PRINCÍPIO DA MAXIMIZAÇÃO DO BEM-ESTAR UTILITÁRIO................................... 221
5.3 O PRINCÍPIO DA JUSTIÇA SOCIAL......................................................................................... 221
5.4 UMA ABORDAGEM QUASE-FUNDACIONAL – OS "QUATRO PRINCÍPIOS"............... 222
5.5 CASUÍSTICA.................................................................................................................................. 223
5.6 ÉTICA DA VIRTUDE.................................................................................................................... 223
5.7 ÉTICA NARRATIVA..................................................................................................................... 224
5.8 ÉTICA FEMINISTA....................................................................................................................... 224
5.9 BIOÉTICA GEOCULTURAL........................................................................................................ 224
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................................. 225
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 226
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 228
X
UNIDADE 1
METAÉTICA
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir dos estudos desta unidade, você será capaz de:
PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você
encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.
1
2
UNIDADE 1
TÓPICO 1
A NATUREZA DA MORALIDADE
1 INTRODUÇÃO
Ética vem do termo grego ethike que provém de ethos, que por sua vez
deriva de duas matizes distintas, uma que designa costumes normativos e outra
que designa constância do comportamento, hábito ou caráter. Na verdade, o
termo ethos é uma transposição metafórica de um termo que denota a morada dos
animais (VAZ, 2006). Os gregos antigos ao fazerem essa transposição queriam se
referir ao mundo humano, quanto aos seus costumes e o próprio agir humano
3
UNIDADE 1 | METAÉTICA
Moral vem do latim moralis, que significa costumes ou hábito, mas com
uma maior amplitude de sentido. Termo este que foi usado para traduzir para
o latim o termo grego ethike, Ética (VAZ, 2006). A ética, contudo, normalmente,
é entendida como pertencente ao caráter individual de uma pessoa ou pessoas,
enquanto a moralidade parece apontar para as relações entre os seres humanos. No
entanto, na linguagem comum, se chamarmos uma pessoa de ética ou moral, ou
um ato de antiético ou imoral, realmente, não faz qualquer diferença significativa.
Na filosofia, no entanto, o termo Ética também é usado para se referir a uma área
específica de estudo: a área da moral, que se concentra na conduta humana e
valores humanos.
4
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE
árduos e até mesmo dolorosos por dois dias a fim de ganhar dinheiro que lhes
trará prazer e felicidade para uma semana ou duas.
E quanto às ações que levarão algum bem a uma pessoa, mas que causarão
dor a outra, como aqueles atos de um sádico que obtêm prazer de maltratar
violentamente outro ser humano? Nossa declaração original era de que tudo
o que é bom trará alguma satisfação, prazer ou felicidade a alguém, mas essa
afirmação não necessariamente funciona no sentido inverso – que tudo o que traz
satisfação a alguém é necessariamente bom. Certamente há "prazeres maliciosos".
William Frankena (1975, p. 91) afirma que tudo o que é bom também,
provavelmente, envolverá "algum tipo ou grau de excelência". Ele continua
dizendo que "o que é mau em si é assim por causa da presença de dor ou
infelicidade ou de algum tipo de defeito ou falta de excelência". A excelência
é uma importante adição ao prazer ou à satisfação, na medida em que torna
“experiências ou atividades melhores ou piores do que seriam de outra forma".
Por exemplo, o prazer ou a satisfação obtida ao ouvir um concerto, ver um bom
filme, ou por ler um bom livro é devido, em grande medida, à excelência dos
criadores e apresentadores desses eventos (compositores, artistas, diretores, atores
e escritores). Outro exemplo, talvez mais profundo, da importância da excelência
é que se alguém obtiver satisfação ou prazer de testemunhar um caso judicial bem
conduzido e de ver e ouvir o juiz e os advogados cumprirem bem suas funções,
essa satisfação será aprofundada se o juiz e os advogados também são pessoas
excelentes, isto é, se são seres humanos bondosos, justos e compassivos, além de
inteligentes e capazes.
5
UNIDADE 1 | METAÉTICA
Sempre que uma decisão ou uma escolha deve ser feita com relação
ao comportamento, a decisão moral será aquela que trabalha para
a criação de confiança e integridade nos relacionamentos. Deve
aumentar a capacidade dos indivíduos para cooperar, e aumentar a
sensação de autorrespeito no indivíduo. Atos que criam desconfiança,
suspeita e mal-entendidos, que constroem barreiras e destroem a
integridade, são imorais. Eles diminuem o senso de autorrespeito
do indivíduo e, ao invés de produzir uma capacidade de trabalhar
juntos, separam as pessoas e rompem a capacidade de comunicação
(KIRKENDALL, 1961, p. 6).
Dois outros termos que devemos definir são amoral e não moral.
6
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE
DICAS
A obra The Onion Field, de Joseph Wambaugh, foi levada às telas do cinema no
filme Assassinato a sangue frio de 1979.
Tudo isso não significa que os criminosos amorais não devem ser
culpados e punidos por seus erros. Na verdade, essas pessoas podem ser ainda
mais perigosas para a sociedade do que aqueles que podem distinguir o certo do
errado, porque, geralmente, eles são moralmente ineducáveis.
7
UNIDADE 1 | METAÉTICA
Deve-se notar aqui que a metaética, embora sempre usada por todos os
eticistas até certo ponto, tornou-se o único interesse de muitos filósofos éticos
modernos (NERI, 2004). Isto pode ser devido, em parte, à crescente dificuldade
de formular um sistema de ética aplicável a todos ou mesmo à maioria dos seres
8
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE
humanos. Nosso mundo, nossas culturas e nossas vidas se tornaram cada vez
mais complicadas e pluralistas, e encontrar um sistema ético que subjaz as ações
de todos os seres humanos é uma tarefa difícil, senão impossível. Portanto, esses
filósofos sentem que poderiam fazer o que outros especialistas fizeram e se
concentrarem na linguagem e na lógica, em vez de tentar chegar a sistemas éticos
que ajudem os seres humanos a viver juntos mais significativamente e eticamente.
9
UNIDADE 1 | METAÉTICA
FIGURA 1 – GUERNICA
10
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE
uma faca é boa, queremos dizer que há algo, mecanicamente, (mas não moral ou
esteticamente) errado com o motor do carro ou que a faca é afiada e corta bem.
Em suma, o que geralmente queremos dizer com tal afirmação é que a coisa em
questão é boa porque pode ser usada para cumprir algum tipo de função. Isto é,
está em "bom" funcionamento ou tem sido bem treinado.
Ao longo dos anos, muitas questões foram levantadas sobre esta teoria
(KRAUT, 2009). Alguns duvidam se Aristóteles realmente conseguiu identificar
a função dos seres humanos – por exemplo, algumas religiões afirmam que a
função primária de um ser humano é servir a Deus. Outros questionam se ser
moral pode ser diretamente ligado apenas ao funcionamento. O ponto dessa
discussão é que os mesmos termos que são usados no discurso moral, muitas
vezes, também são usados de forma não moral, e nem Aristóteles nem ninguém
realmente quis dizer que esses termos, quando aplicados a coisas como facas,
cães ou carros, têm algo, diretamente, a ver com o moral ou o ético.
11
UNIDADE 1 | METAÉTICA
como conduta errada por muitos, mas, basicamente, são uma ofensa ao gosto, em
vez de uma de ofensa à moralidade.
12
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE
em que essa prática é coibida, buscando visibilidade para esse público” (GREEN;
TRINDADE, 2005, p. 320). Ou seja, estas ações violavam as “boas maneiras” para
apontar e tentar resolver os problemas morais associados à desigualdade de
tratamento e à negação da dignidade aos seres humanos.
Por exemplo, numa lenda grega, uma filha (Antígona) enfrenta um rei
(Creonte), quando ela procura contrariar a ordem do rei enterrando seu irmão
morto. Na peça de Sófocles (C. 496-406 a.C.), Antígona se opõe a Creonte por
causa da lei superior de Deus. No entanto, a Antígona na peça de Jean Anouilh,
opõe-se a Creonte não por causa da lei divina, da qual ela não reivindica nenhum
conhecimento, mas por causa de suas próprias convicções individuais sobre o que
é certo fazer ao lidar com seres humanos, até seres humanos mortos (POCIÑA et al.,
2015). Este aspecto também pode referir-se a essa área da moralidade preocupada
com as obrigações que os indivíduos têm para com eles próprios (promover seu
próprio bem-estar, desenvolver seus talentos, ser fiel ao que acreditam etc.). Os
mandamentos nove e dez (figura anterior), embora também aplicáveis à moral
social, como veremos a seguir, são bons exemplos de pelo menos uma exortação à
moralidade individual. O propósito de dizer "não cobiçarás" parece ser a criação
de um controle interno dentro de cada indivíduo para que nem sequer pensem
em roubar os pertences ou o cônjuge de um vizinho. De qualquer modo, esses
mandamentos parecem enfatizar uma moralidade individual, assim como uma
moralidade social.
14
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE
sistemas éticos permitiriam que o que ele faria a si mesmo é estritamente uma
questão que importa só a ele, desde que não prejudique ninguém.
Como, então, devemos usar esses aspectos? Podemos recorrer a eles como
distinções efetivas que nos permitirão pensar em termos mais amplos sobre a
aplicabilidade da ética humana. No espírito de síntese, entretanto, podemos
ser sábios em manter essas distinções abertas em unidade para que possamos
aceitar, em uma ética humana ampla, os aspectos religiosos, naturais, individuais
15
UNIDADE 1 | METAÉTICA
DICAS
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TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE
Há três maneiras de olhar para os valores quando eles são tomados como
sendo totalmente objetivos: 1. Eles vêm de algum ser, ou seres, sobrenatural; 2. Há
leis morais de alguma forma embutidas dentro da própria natureza; 3. O mundo
e seus objetos têm valor com ou sem a presença da valorização dos seres humanos
(HEGENBERG, 2010a; NERI, 2004; SÁNCHEZ VÁZQUEZ, 2007).
17
UNIDADE 1 | METAÉTICA
(os hindus), para citar alguns. Eles acreditam, além disso, que esses seres ou
princípios incorporam o próprio bem supremo e revelam aos seres humanos o
que é certo ou bom e o que é mau ou errado (NERI, 2004). Se os seres humanos
querem ser morais (e geralmente são encorajados em tais desejos por algum tipo
de recompensa temporal ou eterna), então eles devem seguir esses princípios ou
os ensinamentos desses seres. Se não o fizerem, eles acabarão sendo desobedientes
à moralidade mais elevada (Deus, por exemplo), serão considerados imorais e,
geralmente, receberão algum castigo temporal ou eterno por suas transgressões.
No caso de eles acreditarem em um princípio, em vez de um ser sobrenatural ou
seres, então eles estarão sendo não verdadeiros, desleais, ao mais alto princípio
moral (HEGENBERG, 2010a).
Agora vejamos o caso da teoria do direito natural. Outros acreditam
que a moralidade de alguma forma está incorporada na natureza e que existem
"leis naturais" às quais os seres humanos devem aderir se quiserem ser morais.
Santo Tomás de Aquino (1225-1274) defendeu isso tanto quanto defendeu a base
sobrenatural da moralidade (CORTINA; MARTÍNEZ, 2005; VAZ, 2006). Por
exemplo, algumas pessoas afirmarão que a homossexualidade é imoral porque vai
contra a "lei moral natural" – isto é, que seria é contra a lei da natureza que seres
do mesmo sexo desejem ou amem sexualmente uns aos outros ou se envolvam
em atos sexuais.
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TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE
19
UNIDADE 1 | METAÉTICA
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TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE
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UNIDADE 1 | METAÉTICA
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TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE
Tudo isso significa que não há relação entre lei e moralidade? Uma
resposta "sim" a essa pergunta seria extremamente difícil de sustentar, porque
grande parte de nossa moralidade se tornou encarnada em nossos códigos legais
(COMPARATO, 2006). Tudo o que temos a fazer é rever qualquer um dos nossos
estatutos legais em qualquer nível de governo, e encontramos sanções legais
contra furtar, estuprar, matar e causar maus tratos físicos e mentais aos outros.
Encontraremos muitas outras leis que tentam proteger os indivíduos que vivem
juntos em grupos de danos e fornecer resoluções de conflitos decorrentes de
diferenças – muitas delas estritamente morais – entre os indivíduos que compõem
esses grupos.
24
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE
Além disso, a religião serviu (como tem até muito recentemente) como
uma sanção poderosíssima para levar as pessoas a comportar-se moralmente.
Ou seja, se por trás de uma proibição moral contra o assassinato reside o poder
punitivo e recompensador de um ser ou seres sobrenaturais todo-poderosos,
então os líderes de uma cultura têm a maior sanção possível para a moralidade
que querem que seus seguidores abracem. As sanções do castigo e da recompensa
tribal empalidecem ao lado da ideia de uma punição ou recompensa que pode ser
mais destrutiva ou prazerosa do que qualquer outra pessoa poderia administrar.
Primeiro, para provar que se deve ser religioso para sermos morais,
teríamos de provar conclusivamente que existe um mundo sobrenatural e que a
moralidade existe lá, assim como no mundo natural. Mesmo que isso pudesse ser
provado, o que é duvidoso, teríamos que mostrar que a moralidade existente no
mundo sobrenatural tem alguma conexão com o que existe no mundo natural.
Parece óbvio, no entanto, que ao lidar com a moralidade, a única base que temos
é este mundo, as pessoas que nele existem e as ações que realizam.
25
UNIDADE 1 | METAÉTICA
Além disso, fornecer uma base racional para um sistema ético é difícil
o suficiente sem também ter que fornecer uma base racional para a religião
que, supostamente, funda o sistema ético. Mesmo se as religiões pudessem ser
racionalmente fundadas, qual religião deveria ser a base da ética humana? Dentro
de uma determinada religião, essa questão é respondida, mas, obviamente, não
é respondida satisfatoriamente para membros de outras religiões conflitantes
ou para aqueles que não acreditam em nenhuma religião. Outra questão é como
resolvemos os conflitos decorrentes de vários sistemas éticos baseados na religião
sem recorrer a um sistema de moralidade mais amplo – uma base mais ampla
para tomar decisões éticas? Devemos estabelecer uma base para a moralidade
de fora da religião, mas deve ser uma em que a religião está incluída. Este é um
primeiro passo necessário para uma sociedade moral e um mundo moral.
26
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE
27
UNIDADE 1 | METAÉTICA
28
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE
presos.
Esperamos que, quando você terminar este livro e outros assim, você
tenha uma base muito melhor em ética do que a maioria daqueles que falam,
superficialmente, sobre os valores, talvez sem saber do que eles estejam falando.
10 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Neste tópico discutimos muito sobre o que a moralidade ou ética não
é, mas ainda não apresentamos detalhadamente o que ela é. Aqui está uma
definição de moralidade: A moralidade lida, basicamente, com os seres humanos
e como eles se relacionam com outros seres, tanto humanos como não-humanos.
Lida com questões de como os seres humanos tratam os outros seres de modo a
promover bem-estar, crescimento, criatividade e significado mútuos à medida
que se esforçam pelo que é bom sobre o que é mau, pelo o que é certo sobre o que
é errado.
29
UNIDADE 1 | METAÉTICA
NOTA
30
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:
• Amoral significa não ter sentido moral ou ser indiferente ao certo e ao errado.
• Os termos bom, mau, certo e errado também podem ser usados em um sentido
não moral, geralmente, em referência a como alguém ou algo funciona.
31
preocupa com o comportamento ético.
• Há uma diferença entre "leis naturais", que são descritivas, e "leis morais e
sociais", que são prescritivas. E não há provas conclusivas de que existem "leis
morais naturais".
• Os valores são subjetivos e objetivos. Eles são determinados por três variáveis.
A primeira variável é a coisa de valor, ou a coisa valorizada. A segunda é um
ser consciente que valoriza, ou o avaliador. A terceira é o contexto ou situação
32
em que a valorização ocorre.
• Parece ser necessário uma ética que não seja nem estritamente religiosa, nem
estritamente humanista, mas que inclua esses dois extremos e o meio-termo
também.
33
• Nível pós-convencional, autônomo ou de princípios: Esse nível de
desenvolvimento moral requer moralidade reflexiva e capacidade de envolver
o raciocínio ético, independentemente da identificação e autoridade do grupo.
Estágios: 5 - A Orientação do Contrato Social; 6 - A Orientação Princípio-Ético-
Universal.
• Foram postuladas várias razões para ser moral. É nossa conclusão que a
moralidade ocorreu por causa das necessidades humanas comuns e pelo
reconhecimento da importância de viver juntos de forma cooperativa e
significativa, a fim de alcançar a maior quantidade possível de amizade, amor,
felicidade, liberdade, paz, criatividade e estabilidade na vida de todos os seres
humanos.
34
AUTOATIVIDADE
35
36
UNIDADE 1
TÓPICO 2
1 INTRODUÇÃO
Comumente, consideramo-nos uns aos outros como agentes moralmente
responsáveis. Às vezes, culpamos alguém por fazer algo que ele não deveria ter
feito, ou elogiamos alguém por um comportamento exemplar. Geralmente se
pensa que somos responsáveis por tais coisas somente se as fizermos livremente
(ou coisas que resultarem nelas). Duas questões filosóficas fundamentais que
surgem aqui são: qual é a natureza da responsabilidade moral, e que tipo de
liberdade ela requer? Somente com respostas a estas perguntas podemos decidir
se somos de fato moralmente responsáveis.
Antes de nos voltarmos para essas questões, vamos concentrar nosso foco
em distinguir o tópico aqui de algumas coisas relacionadas às quais podemos
falar usando as palavras “responsabilidade” ou “responsável”. Por exemplo,
podemos dizer que é responsabilidade da Suelen alimentar o gato, ou que ela é
responsável por ver se o gato foi alimentado. Neste caso, estaríamos dizendo que
a Suelen tem certa obrigação ou dever, talvez uma que ela adquiriu prometendo
cuidar do gato. Este tipo de responsabilidade é, frequentemente, chamado de
responsabilidade prospectiva. Se a Suelen é alguém que leva suas obrigações a
sério e, geralmente as realiza, podemos dizer que ela é uma pessoa responsável.
Mas agora suponha que, embora a Suelen, geralmente, faça o que ela deve
fazer, e embora ela tenha uma obrigação, neste caso, de alimentar o gato, ela de
fato não o faz. Podemos então culpá-la pelo gato passar fome. Ao atribuir culpa,
estaríamos achando a Suelen responsável no sentido em questão neste tópico.
Se a Suelen é alguém que pode ser responsável nesse sentido, então ela é, nesse
sentido, uma agente responsável. Esse tipo de responsabilidade é frequentemente
chamado de responsabilidade retrospectiva.
38
TÓPICO 2 | LIBERDADE, RESPONSABILIDADE E RELATIVISMO MORAL
3 A QUESTÃO DA COMPATIBILIDADE
Se eu sou responsável por algo que fiz, então, isso é geralmente aceito,
devo ter exercido certo tipo de liberdade ao realizar essa ação, ou ao fazer algo que
me levou a realizar essa ação. Uma questão fundamental sobre responsabilidade
é se a liberdade exigida é algo que poderíamos exercer mesmo se o determinismo
for verdadeiro, ou se, ao contrário, seu exercício requer indeterminismo.
39
UNIDADE 1 | METAÉTICA
DICAS
DICAS
40
TÓPICO 2 | LIBERDADE, RESPONSABILIDADE E RELATIVISMO MORAL
Suponha, por exemplo, que o Alberto considere se ele rouba uma maçã,
decide fazê-lo e rouba uma maçã. Suponha que, sem o conhecimento de Alberto,
a Elizabete estivesse monitorando suas deliberações (ela tem os meios para isso),
e se ele tivesse pensado seriamente em refrear-se e não roubar a maçã, a Elizabete
teria detectado esse fato, ela teria intervindo, e ela teria se assegurado de que o
Alberto decidisse roubar a maçã e executasse essa decisão. O Alberto não pensou
seriamente em refrear-se de roubar a maçã, e a Elizabete não interveio; ela não
precisou. O Alberto fez o que a Elizabete queria que ele fizesse, mas ele fez isso
totalmente por conta própria. Parece que, se alguém pode ser responsável por
qualquer coisa, Alberto pode ser responsável por roubar a maçã. Todavia, também
parece que, dada a prontidão de Elizabete em intervir, Alberto não poderia ter
feito outra coisa senão roubar a maçã. Tais situações são comumente chamadas
de cenários de Frankfurt, por causa do autor que as introduziu na literatura sobre
responsabilidade.
41
UNIDADE 1 | METAÉTICA
ação é determinada por algo sobre o qual não se tem controle (PEREBOOM, 2001;
STUMP, 1996; ZAGZEBSKI, 2000). Mas por que pensar que a responsabilidade
requer esse tipo de fonte de origem?
42
TÓPICO 2 | LIBERDADE, RESPONSABILIDADE E RELATIVISMO MORAL
43
UNIDADE 1 | METAÉTICA
DICAS
44
TÓPICO 2 | LIBERDADE, RESPONSABILIDADE E RELATIVISMO MORAL
45
UNIDADE 1 | METAÉTICA
NOTA
46
TÓPICO 2 | LIBERDADE, RESPONSABILIDADE E RELATIVISMO MORAL
47
UNIDADE 1 | METAÉTICA
Um argumento para esta última visão observa que as ações pelas quais
somos responsáveis são (pelo menos tipicamente) coisas que fazemos por razões.
Quando alguém age por uma certa razão, faz o que se faz por causa da maneira
como este alguém é, mentalmente falando. Para ser responsável pelo que se faz,
então, deve-se ser responsável por ser como é. Todavia, para ser responsável por
ser assim, é preciso ter feito isso, e é preciso ser responsável por ter-se causado.
Ao fazer isso, este alguém terá agido por razões; então, este alguém terá agido
por causa do modo como era, mentalmente falando. A responsabilidade por essa
ação exigirá que essa pessoa seja responsável por como ela foi; e assim por diante,
infinitamente. Para ser responsável por qualquer coisa, então, essa pessoa deve
ter completado uma sequência infinita de ações pelas quais ela foi responsável,
criando, portanto, a si mesma, com relação a como esta pessoa é mentalmente.
No entanto, tal autocriação é impossível, pelo menos para seres finitos como nós.
A responsabilidade moral, então, é impossível, pelo menos para seres como nós
(STRAWSON, 2002).
5 O RELATIVISMO MORAL
Uma dificuldade para qualquer tentativa de explicar e avaliar o
relativismo moral é que tantas doutrinas diferentes, mesmo mutuamente
incompatíveis, estiveram sob esse nome, não apenas nas discussões populares,
mas também nos debates dos filósofos acadêmicos. O objetivo aqui é distinguir
algumas das doutrinas mais importantes que foram chamadas relativistas, expor
suas motivações e observar alguns problemas que elas enfrentam. É possível,
é claro, ser relativista sobre outros assuntos além da moralidade: nesse caso, o
48
TÓPICO 2 | LIBERDADE, RESPONSABILIDADE E RELATIVISMO MORAL
relativismo moral pode ser apenas uma aplicação de uma doutrina mais geral
(e, é claro, controversa). Aqui, no entanto, vamos nos focar quase inteiramente
em relativismos mais seletivos, aqueles que adotam uma linha relativista sobre
moralidade (e talvez, um pouco mais geral, sobre valores), mas não sobre outras
questões. Em parte, essa limitação é para manter a discussão gerenciável; mas
também se justifica pelo fato de que esse tipo de relativismo seletivo teve uma
influência considerável no pensamento popular e entre alguns filósofos.
49
UNIDADE 1 | METAÉTICA
Uma razão para distinguir esses dois tipos de visões – grosso modo, que
devemos julgar os outros por suas próprias crenças, e que devemos julgá-los
pelas nossas próprias crenças – é que eles se confundem em discussões populares
e antropológicas (embora tipicamente não filosóficas). Outra é que, na medida
em que pode mantê-los distintos, o pensamento popular tende a ser atraído
mais para o relativismo do agente, uma visão que não teve muitos defensores
filosóficos; quando os filósofos levam o relativismo a sério, como alguns fazem, é
mais comumente a versão do avaliador que eles têm em mente. Vamos falar algo
sobre ambas as versões, começando com o relativismo do agente.
50
TÓPICO 2 | LIBERDADE, RESPONSABILIDADE E RELATIVISMO MORAL
51
UNIDADE 1 | METAÉTICA
semelhante a qualquer teoria ética que implique, como Gilbert Harman, certa
vez, argumentou que sua versão do relativismo do agente implicava, que não foi
errado Hitler ordenar o Holocausto (HARMAN, 2015).
Por exemplo, não é controverso que uma ação pode estar certa em uma
circunstância, mas errada em outra por causa de promessas diferentes que o agente
tenha feito, ou por causa das diferenças nos dois casos quanto as alternativas para
ação e suas consequências. Às vezes, a visão de que isso pode acontecer é chamada
de “relativismo circunstancial” (mas, assim, todo mundo seria um relativista
circunstancial). Então, o que há de especial nas circunstâncias variáveis às quais
uma versão do relativismo do agente irá apelar? Provavelmente, a resposta é que
isso pode incluir não apenas as crenças morais do agente, mas também outros
estados do agente que são como crenças, na medida em que são normalmente
consideradas como respostas apropriadas ao acerto e ao erro das ações. Estas
podem incluir padrões para a formação de crenças morais (se estas não forem as
próprias crenças), e podem incluir emoções morais como a desaprovação (então
uma visão relativista de um agente pode dizer que uma ação está errada apenas
no caso de o agente desaprová-la, ou que a desaprovaria depois de um certo tipo
52
TÓPICO 2 | LIBERDADE, RESPONSABILIDADE E RELATIVISMO MORAL
Essas são algumas das dificuldades que afetam o relativismo dos agentes.
53
UNIDADE 1 | METAÉTICA
54
TÓPICO 2 | LIBERDADE, RESPONSABILIDADE E RELATIVISMO MORAL
Com base nessa compreensão do que eles estão dizendo, é fácil ver como
Alice e Bárbara poderiam estar certas. Cada uma delas está simplesmente falando
sobre como seus próprios padrões se aplicam a Cláudia. Não há contradição.
Agora há outro problema. Isso é, que também fica claro nesse entendimento
que Alice e Bárbara não estão realmente discordando: elas estão simplesmente
falando sobre assuntos diferentes. E aqui está a nossa observação acima, de que
é enganoso dizer que o relativismo moral repousa na suposição de divergências
profundas e insolúveis. Para o relativismo do agente, isso ocorre porque as
55
UNIDADE 1 | METAÉTICA
Há muitas maneiras pelas quais alguém pode achar esse argumento pouco
convincente. Por um lado, o expressivismo (que será visto com mais detalhes no
próximo tópico desta unidade) é uma visão concorrente que também promete
salvar o discurso em face de discordâncias insolúveis, fornecendo um ponto (se
não um conteúdo) para os juízos de Alice e Bárbara. O expressivismo considerará
sua discordância como uma genuína “discordância em atitude", e não como uma
situação em que duas ou mais pessoas falam sobre assuntos diferentes, enquanto
acreditam que estão falando sobre a mesma coisa. Assim, o relativista precisa de
um argumento para descartar o expressivismo, uma questão muito vasta para
poder ser explorada aqui, mas que pode encontrar alguns aliados entre os não
relativistas que também rejeitam o expressivismo.
Por outro lado, não está tão claro por que o discurso precisa ser salvo.
Mesmo colocando o expressivismo de lado, não é como se nossas únicas escolhas
fossem continuar usando o discurso moral como antes (na medida em que o
entendemos como um relativista o faria) ou não dizer nada. Existe também a
opção de falar de maneira mais subjetiva, do que é importante para nós e por
quê isso seria importante. Além disso, certamente é discutível se Alice e Bárbara
considerariam uma compreensão relativista de suas posições como sendo
respeitosa. Pois, mesmo que as imaginássemos reconhecendo que sua disputa é
insolúvel, elas poderiam facilmente achar bastante desdenhosa a sugestão de que
elas estão simplesmente falando sobre seus próprios pontos de vista e não estão
realmente em discordância.
56
TÓPICO 2 | LIBERDADE, RESPONSABILIDADE E RELATIVISMO MORAL
sua doutrina não se aplica a todas as divergências morais. Eles querem que se
aplique àquelas divergências que seriam insolúveis se tratadas como genuínas,
mas não a outras que são racionalmente solucionáveis. Todavia, isso torna ainda
mais urgente a questão de por que devemos querer salvar o restante do discurso.
Fazê-lo da maneira relativista produzirá uma descrição surpreendentemente
desarticulada dos juízos morais. Isto é, alguns seriam vistos como verdadeiros
com referência ao que for que os faça serem objetivamente verdadeiros, outros
seriam vistos como verdadeiros simplesmente com referência às crenças dos
avaliadores (ou suas crenças corrigidas). E pode parecer muito enganoso, para
dizer o mínimo, propor que continuemos falando da mesma maneira solidamente
objetiva sobre questões cujo status é pensado ser tão diferente.
6 SOLUCIONANDO DISCORDÂNCIAS
Como deve ter ficado claro, não contamos como relativista a mera tese
de que algumas discordâncias morais, até mesmo aquelas discordâncias morais
centrais, sejam irresolúveis, pois isto é compatível com visões que não são
relativistas. No entanto, alguma forma desta tese – como a proposta de que as
discordâncias são insolúveis exceto pelo apelo ao relativismo do agente, ou como
a proposta de que são insolúveis a menos que interpretada como um relativista do
avaliador as interpretaria – é, no entanto, central para uma perspectiva relativista.
Isso levanta uma questão muito difícil, e vamos apenas expor algumas coisas aqui
para mantê-la em perspectiva.
57
UNIDADE 1 | METAÉTICA
raciocínio ético não estão no mesmo nível (BOYD, 1988; CORBÍ, 2004).
7 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Neste tópico levantamos questões sobre a natureza da responsabilidade
moral e concomitantemente o tipo de liberdade que ela requer. Neste percurso
apresentamos várias questões sobre a compatibilidade, isto é, a relação entre a
liberdade exigida pela responsabilidade e seu exercício frente ao determinismo,
sendo este verdadeiro, ou a possível necessidade de aceitarmos o indeterminismo.
Nesse contexto exploraremos vários argumentos ditos incompatibilistas e aqueles
ditos compatibilistas.
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RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:
59
• Uma teoria compatibilista alternativa concentra-se nos mecanismos (ou
processos) que ocorrem no interior de agentes e que geram seu comportamento.
• Teóricos que pensam que podemos ser responsáveis se, mas apenas se o
indeterminismo for verdadeiro, oferecem explicações incompatibilistas (ou
libertárias) da liberdade requisitada.
60
AUTOATIVIDADE
2 Explique o que seria uma visão incompatibilista e o que seria uma visão
compatibilista da responsabilidade moral.
61
62
UNIDADE 1
TÓPICO 3
1 INTRODUÇÃO
Os debates tradicionais sobre o realismo diziam respeito à existência de
coisas em si mesmas, "coisas-em-si", cuja existência não depende de ser percebida
ou concebida por uma mente. A maioria de nós é realista sobre o mundo externo
nesse sentido, embora as “coisas” em questão não precisem ser entidades
concretas. Os platonistas, por exemplo, eram realistas em relação aos universais,
que consideravam eternos e independentes de qualquer mente ou atividade
mental. Aqueles que negam a existência de um domínio de entidades, como os
céticos sobre o mundo ou os nominalistas sobre os universais, são chamados de
antirrealistas.
2 O REALISMO MORAL
Como poderiam os realistas morais afirmar que a moralidade (entre todas
as coisas!) é uma “coisa em si”, independente da mente? Levantar a pergunta
desse modo pode fazer soar estranho defender o realismo moral. No entanto,
essa é uma maneira enganosa de representar tal posicionamento. O realismo
não é uma visão filosófica independente, como o empirismo ou o racionalismo.
Precisamos saber: realismo sobre o quê? E para entender o que o realismo
sobre X envolve, devemos perguntar que tipo de "coisas" os X seriam se fossem
reais. Substância mental, por exemplo, se fosse real, dificilmente poderia ser
independente da mente. Todavia, poderia ser independente do que pensamos
sobre isso, ela, portanto, não dependente de qualquer percepção ou concepção
real. O que, então, é realismo sobre X quando este X é a moralidade? Essa não é
uma pergunta simples, mas uma resposta curta seria: há fatos genuínos sobre o
que é moralmente certo ou errado – fatos que são independentes do que qualquer
pessoa, ou qualquer sociedade, pensa ser moralmente certo ou errado.
É justo dizer que a maioria dos grandes filósofos morais, eticistas, ao longo
da história tem sido realista nesse sentido. Embora tenham divergido sobre quais
qualidades morais são básicas, corretas ou boas, elas concordaram que existem
fatos genuínos sobre o que deveríamos fazer moralmente e sobre que tipo de
vida é melhor, e que essas não são meras questões de opinião, ou incapaz de ser
verdadeira ou falsa. Tem havido poucos céticos da moral ou antirrealistas (como
os niilistas e, talvez, Nietzsche) e ainda menos irrealistas da moral (embora esse
possa ser o modo certo para entender alguns idealistas pós-kantianos e David
Hume). Contudo, atualmente as coisas estão diferentes. Embora o ceticismo moral
permaneça raro, houve um aumento dramático no irrealismo moral, começando
com a "virada linguística" da filosofia no início do século XX. Com essa virada, o
foco da teoria ética ampliou-se nas questões de primeira ordem sobre o certo e o
bom para incluir perguntas de segunda ordem sobre o que significa chamar algo
de certo ou de bom. Isso abriu a possibilidade na qual o irrealismo se insere, a
saber, aceitar nossa fala moral de primeira ordem de atos como certos ou errados,
ou resultados como bons ou maus, mas então dizer na segunda ordem que não
são necessários “fatos morais” para tornar essas afirmações verdadeiras. Nos
últimos anos, muitas variantes dessa ideia surgiram, e este tópico pretende tanto
caracterizar o realismo moral quanto introduzir uma ampla gama de alternativas
na metaética contemporânea.
64
TÓPICO 3 | O REALISMO E SUAS ALTERNATIVAS
humana, parece que não podemos dizer muito sobre o que equivaleria a uma ou
outra opinião moral ser a correta. Embora algumas injunções morais pareçam
quase universais – proibições de assassinato, agressão e roubo, ou exigências
de cumprir promessas, cuidar de seus filhos e demonstrar lealdade à família
e amigos – isso pode refletir nada mais que amplas semelhanças na natureza
humana e ampla semelhanças na condição humana. Talvez a moralidade não seja
tudo aquilo que supomos que seja.
66
TÓPICO 3 | O REALISMO E SUAS ALTERNATIVAS
67
UNIDADE 1 | METAÉTICA
Por outro lado, estados da mente com força motivacional inerente, como o
desejo de beber ou ser educado, não podem ser meras representações do mundo.
Desejar beber não é apreender como verdadeiro que eu estou bebendo – isso
tornaria o desejo autossatisfatório, e nenhum estímulo à ação de forma alguma.
Pelo contrário, é apreender o beber como algo para ser fazer verdadeiro. O desejo,
portanto, tem uma direção de ajuste do “mundo para a mente” (SEARLE, 2006):
um desejo que “p” motiva o indivíduo a encontrar uma maneira de fazer o “p”
acontecer e executa sua função com sucesso (o desejo é “satisfeito”) somente
quando “p” acontece, digamos, eu sacio a minha sede. Ora, se os juízos morais têm
implicação prática (C5), parece que eles, como os desejos, devem ter uma direção
de ajuste do mundo para a mente – eles apresentam uma ideia de como as coisas
devem ser. Além disso, se esta implicação é categórica (C4), elas devem motivar
por si mesmas, sem necessidade de qualquer desejo adicional. Então parece que
os juízos morais não podem ser simplesmente crenças factuais, como a C1 e a C2
sugerem. Pois como poderia um estado da mente ter ambas as direções de ajuste?
(LEWIS, 1988, 1996; SMITH, 1994).
68
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE
realismo” etc. na ética contemporânea. Será que podemos encontrar algum modo
ordenado de descrever a complexa paisagem da metaética contemporânea e as
questões em jogo?
FONTE: O autor
69
UNIDADE 1 | METAÉTICA
70
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE
roubo pode ser uma marca de bom senso, tal casos como o de Robin Hood. O não
cognitivismo, portanto, parece incapaz de compreender como as reivindicações
morais funcionam no raciocínio. Isso veio a ser denominado de o Problema de
Frege-Geach.
71
UNIDADE 1 | METAÉTICA
“bizzaro” (queer). Além disso, ele acrescentou, se houvesse tais valores, eles não
"impeliriam" os seres humanos a um consenso muito maior em moralidade?
Mackie adotou assim uma "teoria do erro" da moralidade.
72
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE
73
UNIDADE 1 | METAÉTICA
74
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE
algo não evoca impulso algum para a ação. Será que essa pessoa se tornou amoral
ou perdeu sua compreensão da linguagem moral? Ou ela é simplesmente uma
vítima do achatamento de afeto e da perda de motivação?
DICAS
75
UNIDADE 1 | METAÉTICA
Essa teoria ideal pode ser vista como estabelecendo papéis funcionais
complexos ou descrições de funções para conceitos morais fundamentais. Como
a superveniência do normativo sobre o não-normativo (C3) é a priori, sabemos
de antemão que, a menos que o niilismo seja verdadeiro, haverá algumas
propriedades naturais possivelmente complexas que satisfaçam essas descrições
de trabalho. Essas complexas propriedades naturais serão, necessariamente,
coextensivas aos conceitos normativos correspondentes, e assim permitirão
definir esses conceitos. Tais definições, provavelmente, seriam funcionais, e longe
de serem óbvias – as complexas propriedades naturais envolvidas poderiam
carecer de qualquer unidade explicativa do tipo que os naturalistas não-analíticos
buscam. Todavia, essas definições pelo menos estabelecem que não precisamos
nos comprometer com nenhuma extravagância metafísica por meio do uso de
conceitos normativos, e que as verdades normativas podem ter uma base natural
objetiva (C1-C2). Como essas definições funcionais são geradas a partir da teoria
normativa ideal, uma resposta imediata está disponível para a questão de saber
se temos razão para pensar que o que satisfaz essas funções teria implicação
normativa (C5). Na medida em que poderíamos responder a essa pergunta
definitivamente, afirmaríamos que sim.
76
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE
77
UNIDADE 1 | METAÉTICA
eles, a questão sobre se a moralidade é o tudo aquilo que supomos que seja, é se
existem razões práticas categóricas (C4), razões para agir que comprometeria em
obrigação a todos os seres racionais como tais, independentemente de qualquer
variação contingente na motivação ou objetivo (C5). Os adeptos desta abordagem
tomam a perspectiva do agente deliberativo, e argumentam que tal agente deve
se considerar livre no sentido especial de ser regulado por escolha, em vez de
meras causas, e essa escolha só é inteligível como tal, se for baseada em razões.
No entanto, as razões, por sua natureza, são gerais, de um tipo reconhecível por
qualquer ser racional. O resultado é que agir por uma razão é agir como se fosse um
princípio universal, ou seja, um princípio que se compromete obrigatoriamente
a todos os seres racionais. Aqui, então, encontramos o “imperativo categórico”
que está na base da moralidade: devemos agir apenas com base nas máximas
que poderiam, ao mesmo tempo, ser leis universais. Tudo isso é considerado
inevitável da perspectiva deliberativa, proporcionando uma concepção mais
prática do que metafísica da objetividade do juízo moral (C2). Como resultado,
os kantianos contemporâneos tipicamente rejeitam o rótulo de "realista moral" e
preferem falar de si mesmos como construtivistas, por exemplo, Rawls (1980) e
Korsgaard (1996). Embora insistam que existem fatos genuínos sobre o que é certo
ou errado (C1), estes são "fatos da razão" surgindo dentro e através do exercício
da agência, não existindo independentemente fatos naturais ou não naturais que
determinem como a agência deve ser exercida.
78
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE
de Mark Twain (2011). Entrar numa ficção não é pensar que vale tudo, mas entrar
no mundo da ficção, dentro do qual existem muitos fatos, e a verdade e a falsidade
funcionam praticamente como costumeiramente, por exemplo, é verdade que
Huck Finn é um menino e, portanto, não uma menina, e que Pap Finn é um
homem cruel e, portanto, não é um pai modelo.
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UNIDADE 1 | METAÉTICA
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TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE
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UNIDADE 1 | METAÉTICA
primeira para a segunda em numerosos lugares, portanto uma opção pode existir
apesar das dificuldades de compreensão mútua, e seria difícil dizer que nada de
objetivo foi obtido, ou que normas menos xenófobas e mais de neutras referente
ao gênero não estão mais perto de acertar as coisas sobre o significado moral de
nossos companheiros humanos. Além disso, refletindo sobre tais exemplos de
melhoria histórica dramática, podemos perguntar, de maneira significativa, se
nossas próprias sensibilidades morais reais também podem precisar de mudanças
dramáticas. As sensibilidades reais, então, não parecem desempenhar o papel de
fixar nossos conceitos morais que “subjetivistas sensíveis” imaginam.
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TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE
DICAS
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UNIDADE 1 | METAÉTICA
DICAS
Assista a este curto vídeo, que faz parte do projeto Fronteiras do Pensamento de
2012, em que o Simon Blackburn, filósofo britânico, explica as divergências sobre a moralidade
ao longo da história e comenta como chegou a sua visão de um Quase-Realismo. Disponível
em: <https://goo.gl/cRRYjs>.
Para ser claro, o minimalista ortodoxo não acha que ele esteja sendo quase
sobre verdade ou fatos – ele está apenas fornecendo a “verdade” e ao “fato” seu
significado literal, o que acaba sendo muito mínimo. De acordo com o quase-
realista, então, nunca houve uma alternativa de “realismo real”, que “leva a
verdade mais à sério” – simplesmente havia pessoas chamando a si mesmas de
“realistas reais”, presos em uma ilusão do que a verdade deveria ser. Seria tomar
partido em um debate controverso sobre a natureza da verdade se descartarmos
a posição do quase-realista. Digamos, portanto, que os quase-realistas possam
alcançar o passo 4 do realismo moral ao lado de realismos mais antigos, e juntar-
se a eles ao passar para o próximo ponto de escolha.
84
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE
No entanto, o caso moral parece muito mais difícil para os não naturalistas,
já que na ética não temos nada como prova lógica para desempenhar o papel
explicativo. Em vez disso, devemos recorrer diretamente à ideia de que certas
afirmações sobre quais razões temos para agir, e o que a moralidade exige, são
autoevidentes. Todavia, como vimos anteriormente, os apelos à autoevidência
no nível fundamental parecem ser encontrados em todas as formas de inquirição
racional. Será que o fato de que a dor debilitante ser uma razão prima facie para
agir, ou que promessas-prima facie devem ser mantidas, é menos evidente que a
Lei do Terceiro Excluído? Afinal de contas, os lógicos tiveram um longo debate
sobre o terceiro excluído que parece claramente de caráter normativo. Lógicos e
matemáticos, especialmente aqueles no campo “clássico”, têm reivindicado suas
suposições muitas vezes, com o desenvolvimento de um corpo vasto, poderoso,
coerente, útil e maravilhosamente inteligível de resultados autorreforçadores.
Não temos nada tão grandioso no caso moral, e, em efeito oposto aos esforços
kantianos, a quantidade de ética que é autoevidente, ou segue logicamente
daquilo que é autoevidente, é decepcionantemente pequena.
Além disso, os não naturalistas morais tiveram muito menos a dizer do que
86
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA MORALIDADE
5 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Colocando uma série de questões sobre o realismo, pudemos gerar uma
taxonomia quase completa da metaética contemporânea, e isso é razão para pensar
o realismo como uma questão central na filosofia moral. Todavia, tal afirmação
não deve deixar a impressão de que “a questão do realismo” é uma questão.
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RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:
• O realismo moral afirma que há fatos genuínos sobre o que é moralmente certo
ou errado – fatos que são independentes do que qualquer pessoa, ou qualquer
sociedade, pensa ser moralmente certo ou errado.
• O cognitivismo pode ser uma condição necessária para o realismo moral, mas
está longe de ser suficiente.
88
do juízo moral como sua “praticalidade”, e se dividem em expressivistas,
expressivistas de normas etc.
89
AUTOATIVIDADE
90
UNIDADE 2
ÉTICA NORMATIVA
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir dos estudos desta unidade, você será capaz de:
PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade, você
encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.
91
92
UNIDADE 2
TÓPICO 1
1 INTRODUÇÃO
Depois de ler este tópico, você deverá ser capaz de definir as concepções
consequencialistas (teleológicas) e não consequencialistas (deontológicas) da
moralidade. Assim como diferenciar o egoísmo psicológico do egoísmo ético, e
explicar ambas as teorias. Distinguir os três tipos de egoísmo ético e descrever
e analisar criticamente as duas principais teorias consequencialistas, o egoísmo
ético e o utilitarismo. E distinguir entre os dois tipos de utilitarismo.
93
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
2 O EGOÍSMO PSICOLÓGICO
Antes de discutir o egoísmo ético em mais detalhes, devemos fazer uma
distinção entre o egoísmo psicológico, que não é uma teoria ética e egoísmo
ético. Alguns egoístas éticos tentaram basear suas teorias egoísticas no egoísmo
psicológico, por isso é importante examinarmos se esta é uma inferência válida
e termos certeza de que sabemos a diferença entre a forma como as pessoas de
fato agem e a forma como elas deveriam agir (BONJOUR; BAKER, 2010). No
Tópico 1, da primeira Unidade, o egoísmo psicológico foi introduzido a fim de
apontar a diferença entre as abordagens científicas e as filosófico-normativas da
moralidade. Para reiterar, o egoísmo psicológico é uma abordagem científica e
descritiva do egoísmo, enquanto que o egoísmo ético é a abordagem filosófico-
normativa (prescritiva). Veja o quadro a seguir.
94
TÓPICO 1 | TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE
RACHELS, 2014). A forma forte sustenta que as pessoas sempre agem em seu
interesse próprio – que elas são psicologicamente construídas para fazê-lo –,
enquanto que a forma fraca sustenta que as pessoas muitas vezes, mas nem sempre,
agem em seu interesse próprio. Entretanto, nenhuma das duas formas pode operar
como base para o egoísmo ético. Se a forma forte for aceita, então por que dizer
às pessoas fazerem o que não podem deixar de fazer? Se os seres humanos são
psicologicamente construídos de modo a agir sempre por interesse próprio, que
bem fará dizer a alguém que ele deve sempre agir por interesse próprio? Quanto
à forma mais fraca, a afirmação de que os indivíduos muitas vezes agem a partir
do interesse próprio não tem nenhuma conexão em si mesma com a compreensão
do que eles deveriam fazer. Isto é referido na ética como tentando obter "um
deveria de um é" – não há nenhum argumento lógico que prove conclusivamente
que, porque as pessoas estão se comportando de determinadas maneiras, devem
fazê-lo ou continuar a fazê-lo. Alguém poderá ser capaz de mostrar, por meio de
algum argumento racional, que se deve agir sempre a partir do interesse próprio,
mas se fizer isso não constituirá nem um argumento necessário (absolutamente
necessário) tampouco um argumento suficiente de que se deve agir assim.
95
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
exclusão de todas as outras (FEINBERG, 2013). Esta teoria, como a teoria sobre a
existência de um ser sobrenatural, não pode ser provada de forma conclusiva. Na
verdade, há provas do contrário.
3 O EGOÍSMO ÉTICO
O que é o egoísmo ético? Não é necessariamente a mesma coisa que o
egoísmo, que poderia ser um comportamento que não está de nenhum modo
no interesse próprio do egoísta, ou seja, se eu estiver sempre agindo de forma
egoísta, as pessoas podem me odiar e, geralmente, me tratar mal, então talvez
esteja mais no meu interesse próprio não ser egoísta. Eu poderia até chegar ao
ponto de ser altruísta em meu comportamento, pelo menos uma parte do tempo
– quando estiver no meu interesse próprio ser assim, é claro. Portanto, o egoísmo
ético não pode ser equiparado ao egoísmo, nem deve ser equiparado a ter um ego
grande ou ser presunçoso. Um egoísta pode muito bem ser pretensioso e vaidoso,
por outro lado, ele pode parecer ser muito modesto e humilde (RACHELS, 2013).
96
TÓPICO 1 | TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE
97
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
egoísmo ético universal não oferece nenhuma resolução que será verdadeiramente
no melhor interesse de todos. O egoísmo ético torna-se altamente questionável
quando falamos em oferecer conselho moral (RACHELS; RACHELS, 2014).
Tal conselho é inconsistente, na medida em que João deve fazer o que está
em seu interesse próprio, mas deve aconselhar Pedro a agir quer no interesse de
João ou no interesse de Pedro. Se ele aconselhar Pedro a agir em seu interesse, o
de João, então João está recuando para o egoísmo individual. Se ele aconselhar
Pedro a agir em seu próprio interesse, então João não está servindo ao seu
interesse próprio. De qualquer maneira, parece que o propósito subjacente ao
egoísmo ético fica derrotado.
Jesse Kalin (1970) diz que a única maneira de declarar o egoísmo ético
universal consistentemente é defender que João deveria agir em seu interesse
próprio individual e Pedro em seu interesse próprio individual. Tudo então ficará
bem, porque mesmo que a teoria seja anunciada a todos e mesmo que João tenha
que aconselhar Pedro que ele (o Pedro) deveria agir em seu próprio interesse,
João não precisa “querer” que Pedro atue em seu próprio interesse. É neste ponto
que Kalin sente que ele refutou Medlin, pois afirma que o egoísmo ético universal
é inconsistente, porque o que o egoísta “quer” é, obviamente, incompatível, ele
quer que ele vença e quer que todos os outros também vençam. Os interesses
conflitam, pois tem, obviamente, desejos incompatíveis. Kalin usa o exemplo de
João e Pedro jogando xadrez. João, vendo que Pedro poderia mover seu bispo e
colocar o rei de João em cheque, acredita que Pedro “deve” mover seu bispo, mas
não “quer” que ele o faça, não precisa persuadi-lo a fazê-lo. Na verdade, “deve”
sentar-se lá em silêncio, esperando que ele não faça o movimento como deveria.
Com esta afirmação, o problema que ocorreu com o egoísmo ético individual
e pessoal surge novamente no egoísmo ético universal – que o que as pessoas
deveriam fazer não pode ser promulgado (isto é, apresentado para que todos
possam ver). Em outras palavras, temos novamente uma teoria ética que tem de
ser um segredo. Caso contrário, violará ao ser declarada seu próprio princípio
central: o interesse próprio.
Devemos também examinar como Kalin (1970) está usando o termo "deve"
em seu exemplo sobre o jogo de xadrez. Um dos resultados não intencionais do
artigo de Kalin parece ser um ofuscamento da distinção entre o uso moral dos
termos “deve” e “deveria” e um uso não moral dos dois termos. No Tópico 1, da
primeira unidade, descrevemos a grande diferença entre as abordagens científica
e as filosófico-normativas da moralidade como sendo a diferença entre o que “é”
ou o que se “faz” e o que “deve” e o que “deveria” ser feito. Também foi apontado
que as duas últimas palavras (deve e deveria) nem sempre são usadas em um
sentido moral e, com frequência, podem ser usadas em um sentido não moral.
99
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
direito e quiser que estas duas peças se encaixem bem". Não existe um imperativo
moral, a não ser que a montagem incorreta do brinquedo possa custar à criança
sua vida, por exemplo. Raramente, as vidas dependem se jogos como xadrez são
ganhos ou perdidos, ou se dois lados de um brinquedo se encaixam bem. Deveria,
nesses contextos, provavelmente, não ter qualquer ramificação moral.
É óbvio que o que João realmente pensa que o que Pedro deveria fazer é
deixar João e sua esposa em paz. Isto significa, na melhor das hipóteses, que o
egoísmo ético universal é altamente impraticável e, na pior das hipóteses, que é
uma teoria que causa seriamente um conflito nos desejos das pessoas por coisas
boas e que vê a busca da felicidade como sendo algum tipo de jogo intelectual
sobre as regras das quais os seres humanos "devem" ser instruídos a seguir.
Outra crítica ao egoísmo ético, em qualquer de suas formas, é que ela não
fornece a base ética apropriada para as pessoas que estão em profissões ligadas
100
TÓPICO 1 | TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE
O egoísmo ético pode funcionar com sucesso, mas tem severas limitações.
A teoria funcionará melhor enquanto as pessoas estiverem operando em relativo
isolamento, minimizando assim as ocasiões de conflito entre seus interesses
próprios (BONJOUR; BAKER, 2010). Por exemplo, se todos pudessem ser sua
própria comunidade autossuficiente e ser quase totalmente independente, então
o interesse próprio funcionaria bem. No entanto, assim que as esferas individuais
101
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
Rand pode querer argumentar que esses homens não são racionais nem
inteligentes, mas se assim forem, seria difícil aceitar a sua definição de seres
humanos racionais e interesse próprio racional. Além disso, é interessante
especular, nesse sentido, por que Ayn Rand se recusou firmemente a apoiar
qualquer das comunidades ou projetos que foram criados sob suas teorias. Um
deles foi o Projeto Minerva, uma comunidade insular a ser governada sem governo
(STRAUSS, 1999), e outro foi o Libertarianismo, um partido político que nomeou
John Hospers como candidato presidencial em 1972 (SMITH, 2002). Nenhum dos
esforços recebeu a bênção de Rand.
Em conclusão, parece que as pessoas podem ser egoístas éticos com algum
102
TÓPICO 1 | TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE
4 O UTILITARISMO
O utilitarismo é uma teoria ética cujos principais arquitetos foram Jeremy
Bentham (1748-1832) e John Stuart Mill (1806-1873). Deriva seu nome da concepção
de utilidade. O utilitarista diz que um ato é correto (moral) se for útil em produzir
um fim desejável ou bom (MULGAN, 2012). Os utilitaristas, portanto, alegam
que a única coisa que conta moralmente é o que produz a maior quantidade de
utilidade, ou as maiores consequências positivas gerais. No entanto, qual é o
critério apropriado de utilidade? O que tem valor intrínseco? Historicamente, os
utilitaristas têm tomado o prazer e a felicidade como medida de consequências.
Versões mais recentes do utilitarismo voltaram-se para bens mais elevados
("ideais") ou para preferências como medida de consequências. Cada uma dessas
quatro medidas de valor intrínseco tem suas forças e suas limitações.
103
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
104
TÓPICO 1 | TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE
DICAS
105
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
e até absurdo reavaliar cada situação quando há uma escolha de matar ou não
matar. Parece que alguém deveria simplesmente seguir a regra geral e qualquer
de suas qualificações válidas. Como mencionado anteriormente, o fator tempo
na tomada de decisões morais é, muitas vezes, importante. Muitas vezes, uma
pessoa não tem tempo para começar do zero quando confrontada com cada novo
problema moral. Na verdade, ser forçado a começar constantemente de novo
pode resultar em uma incapacidade de cometer um ato moral a tempo.
107
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
108
TÓPICO 1 | TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE
um agressor. Portanto, não poderia ser abortado. Por outro lado, os defensores
da pró-escolha não consideram o feto como um ser humano ou defendem a
precedência da vida da mãe sobre o feto e acreditam que há momentos em que
o feto deve ser abortado (BONJOUR; BAKER, 2010). Como, por exemplo, a regra
utilitarista lida com o aborto do feto quando a vida da mãe está em perigo não
especificamente porque ela está grávida, mas por alguma outra razão? O feto não
pode ser considerado um agressor, então como poderia ser abortado em legítima
defesa?
109
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
110
TÓPICO 1 | TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE
111
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
ético, na medida em que ele tenta levar em consideração em qualquer ação moral
todas as pessoas envolvidas. Ao mesmo tempo, no entanto, ele se depara com a
dificuldade de determinar o que seria bom para os outros, uma dificuldade não
envolvida no egoísmo ético. No utilitarismo de ato, o problema é que não há
regras morais ou guias para conduzir-nos. Uma pessoa deve decidir o que é certo
para todas as pessoas em cada situação que ele enfrenta. No utilitarismo de regras,
o problema é descobrir quais regras abrangem realmente todos os seres humanos
e situações, embora esta forma de utilitarismo evite a ambiguidade de ter que
recomeçar em cada nova situação. O último problema com ambas as formas de
utilitarismo é que ele se presta ao tipo de pensamento de análise custo-benefício,
que muitas vezes resulta no tipo de moralidade em que se busca o "maior bem
para o maior número", ou seja, a noção de que qualquer fim, e, especialmente,
qualquer fim que seja bom, justifica qualquer meio usado para alcançá-lo. Existe
uma questão entre muitos moralistas sobre se devemos nos concentrar apenas
nas consequências ou nos fins e ignorar outras coisas, como meios ou motivos
ao tomar decisões morais. Essa questão será discutida mais adiante quando o
Imperativo Prático de Immanuel Kant for apresentado no próximo tópico.
Outra vantagem que o utilitarismo tem sobre o egoísmo ético é que ele é
muito mais adequado para as pessoas nas profissões de ajuda, como a psicologia,
na medida em que se preocupa com as melhores consequências boas para todos.
112
TÓPICO 1 | TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE
sofrer por três ou quatro anos sob um líder incompetente ou dar precedente ao
ato de assassinato, de modo que quando as pessoas estivessem insatisfeitas, com
razão ou sem razão, com seu líder sentissem que podem usar do assassinato
para removê-lo? No caso do utilitarismo, pela razão de que os indivíduos estão
preocupados com todos os envolvidos na situação, pode-se avaliar com alguma
precisão o efeito que matar ou não matar o líder terá sobre as crianças da sociedade
e até mesmo sobre seus futuros membros que irão nascer? Será que será possível
saber quais serão as consequências, presentes e futuras, de um ato? Se não, então
como se pode julgar cada situação bem o suficiente para tomar a ação correta?
113
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
DICAS
6 A ÉTICA DO CUIDADO
Há uma teoria mais nova chamada "ética do cuidado", e, às vezes, "ética
feminista", que foi estabelecida pela psicóloga Carol Gilligan (1936-) em seu livro
Uma voz diferente (1992). Esta teoria não é geralmente considerada uma teoria ética
consequencialista no sentido formal, como o egoísmo ético e o utilitarismo, mas
parece que se enquadra no consequencialismo mais do que no não sequencialismo.
114
TÓPICO 1 | TEORIAS CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE
Alguns críticos, como Dindia (2006) e Hyde (2005), pensam que, aceitando
a teoria de Gilligan, pode-se elevar os chamados valores femininos muito acima
dos valores masculinos e substituindo um sistema ético injusto por outro sistema
ético injusto, estabelecendo as mulheres como normais e os homens como
inferiores. Além disso, se alguém diz que é a natureza das mulheres ser cuidadosas
e compassivas, não estamos as empurrando de volta para onde estavam antes
de Gilligan? Portanto, ao invés da teoria de Gilligan, oferecer aos homens e às
mulheres mais oportunidades, ela pode criar novas categorias que poderiam
resultar na exclusão de mulheres de trabalhos tradicionalmente masculinos
(por exemplo, engenharia) e homens de trabalhos femininos (por exemplo,
enfermagem). Além disso, os críticos dizem que Gilligan perturbou a filosofia
da igualdade de gênero de modo que uma empresa que queira contratar alguém
com uma boa compreensão de regras legais, por exemplo, não vai contratar uma
mulher para o trabalho, porque ela não tem verdadeiro senso de justiça. Desta
forma, sua teoria psicológica do gênero pode passar de descrever a igualdade
de gênero para prescrever um conjunto de regras sobre quem deve fazer quais
trabalhos.
115
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
UNI
Problema ético
VOCÊ ACIONARIA O INTERRUPTOR?
A filósofa Philippa Foot (1920-2010), em 1967, desenvolveu um experimento de pensamento
ético conhecido como o Dilema do Bonde. Outros filósofos criaram variações deste problema
e uma busca rápida na internet possibilitará a atualização sobre os detalhes.
O experimento segue assim. Um bonde está fora de controle, está acelerando em direção
a um grupo de quatro ou cinco homens que trabalham na trilha. Eles não veem o bonde
vindo e todos serão mortos se nenhuma ação for tomada. No entanto, você pode acionar um
interruptor que desviará o bonde para uma trilha lateral. Isso vai salvar os trabalhadores, mas há
um trabalhador solitário na trilha lateral que será morto se você acionar o interruptor. Você vai
acionar o interruptor? Por que ou por que não?
Depois de ter discutido o problema, pesquise o "Homem gordo", uma variação do Dilema do
bonde. Você empurraria o homem gordo da ponte? Por que ou por que não? Quais são os
limites do pensamento utilitarista estrito?
116
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:
• O egoísmo psicológico não é uma teoria ética, mas é uma teoria descritiva ou
científica que tem a ver com o egoísmo.
• O egoísmo ético tem certas vantagens: 1. É mais fácil para os egoístas saberem
o que está em seu interesse próprio do que para outros moralistas, que se
preocupam em saber o que é do melhor interesse dos outros; 2. Incentiva a
liberdade individual e a responsabilidade e se encaixa melhor, de acordo com
os egoístas, com nossa economia capitalista; 3. Pode funcionar com sucesso,
desde que as pessoas estejam operando em esferas limitadas, isoladas umas
das outras, minimizando conflitos.
117
• As limitações destas vantagens são: 1. Não oferece um método consistente de
resolução de conflitos de interesse próprio; 2. Não vivemos em comunidades
isoladas e autossuficientes, mas em comunidades cada vez mais abarrotadas
onde a interdependência social, econômica e moral são fatos da vida e onde os
interesses próprios conflitam constantemente e, de alguma forma, devem ser
comprometidos.
• O utilitarismo sustenta que todos deveriam executar esse ato ou seguir essa
regra moral que trará o maior bem (ou felicidade) para todos os envolvidos.
• O utilitarismo de ato afirma que todos devem executar esse ato que trará o
maior bem em detrimento do mal para todos os afetados pelo ato.
• O utilitarismo de regras afirma que todos devem seguir a regra ou regras que
trarão o maior número de boas consequências para todos os envolvidos.
• Existe o perigo de tentar determinar o valor social dos indivíduos; "o maior
bem para todos os interessados" pode muitas vezes ser interpretado como "o
maior bem para a maioria", com possíveis consequências imorais para qualquer
pessoa na minoria; até mesmo um bom fim justifica qualquer meio usado para
alcançá-lo, ou devemos também considerar nossos meios e motivos?
• Gilligan (1992) acredita que as atitudes morais dos homens têm a ver com
justiça, direitos, competição, ser independente e viver de acordo com as regras.
As atitudes morais das mulheres têm a ver com generosidade, harmonia,
reconciliação e trabalhar para manter relações íntimas. Estas duas visões são
diferentes, mas igualmente válidas.
118
• As críticas à teoria de Gilligan argumentam que pode estar substituindo uma
teoria problemática por outra. Em vez de sua teoria descrever a igualdade de
gênero, pode prescrever quem deve realizar certas atividades profissionais,
por exemplo.
119
AUTOATIVIDADE
120
UNIDADE 2 TÓPICO 2
TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE
1 INTRODUÇÃO
Depois de ler este tópico, você deverá ser capaz de descrever as teorias
não consequencialistas da moralidade, mostrando como elas diferem das teorias
consequencialistas. Assim como diferenciar entre o não consequencialismo de
ato e de regras e mostrar como eles diferem do utilitarismo de ato e de regras,
respectivamente. Você deverá ser capaz de descrever e analisar criticamente o não
consequencialismo de ato, a teoria do comando divino, a ética do dever de Kant e
os deveres Prima Facie de Ross (os principais exemplos do não consequencialismo
de regras). Em suma, definir e analisar termos e conceitos importantes como
universalizabilidade, imperativo categórico, reversibilidade, seres humanos
como fins e não meios e deveres prima facie.
Por exemplo, Joana d'Arc estava agindo sob as instruções do que ela sentia
ser vozes de Deus. Os egoístas éticos, provavelmente, considerariam seu martírio
como não tendo sido em seu interesse próprio. Eles estariam preocupados com as
consequências de suas ações (sua tortura e morte) ao recusar-se negar as vozes. No
entanto, o teórico do Comando Divino declararia que se deve obedecer a um Ser
sobrenatural e aos seus mandamentos transmitidos aos seres humanos (através
de vozes ou de qualquer outro meio), independentemente das consequências,
simplesmente porque esse Ser é bom e nos diz o que é que devemos fazer (HOOFT,
2013). O que é bom, e o que é correto, é o que este Ser declarou que é bom e
correto. O fato de que as consequências podem envolver a perda de vidas, por
exemplo, não tem nada a ver com a moralidade ou imoralidade de um ato ou uma
pessoa. Deve-se apenas aceitar quaisquer consequências que surjam. Esta teoria
é, provavelmente, o exemplo mais claro de uma teoria não consequencialista da
moralidade, mas não é a única teoria. Na verdade, nem precisamos que tal teoria
se fundamente na existência de um ser sobrenatural.
122
TÓPICO 2 | TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE
individualista – os indivíduos devem decidir o que sentem que seja a coisa certa a
fazer, e depois colocar isso em prática. Não se preocupam com as consequências
– e, certamente, não se preocupam com as consequências de outras situações –, ou
com pessoas que não estão imediatamente envolvidas nesta situação particular.
Todavia, devem fazer o que consideram correto, dada esta situação particular e
as pessoas envolvidas nela.
2.1 INTUICIONISMO
Neste ponto é importante discutirmos o significado de intuição e sua
relação com a moralidade. Em seu livro Direito e Razão, Austin Fagothey (2000)
enumera algumas razões gerais para aceitar ou rejeitar a intuição como base para
a moral. As razões gerais que apoiam o intuicionismo moral são:
123
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
1. Como sabemos que o que intuímos – sem mais nada para nos guiar – será
moralmente correto?
2. Como podemos saber quando temos fatos suficientes para tomar uma decisão
moral?
3. Sendo a moral tão altamente individualizada, como podemos ter certeza de
que estamos fazendo a melhor coisa para qualquer outra pessoa envolvida na
situação?
4. Podemos realmente confiar em nada mais do que nossas intuições momentâneas
para nos ajudar tomar nossas decisões morais?
5. Como seremos capazes de justificar nossas ações, exceto dizendo: “Bem, eu
tive uma intuição que era a coisa certa para fazer?”
124
TÓPICO 2 | TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE
125
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
Kant (2007) acreditava que nada era bom em si, exceto a boa vontade, e
definiu a vontade como a habilidade humana única de agir de acordo com regras,
leis ou princípios morais, independentemente de interesses ou consequências.
Depois de estabelecer a boa vontade como o atributo humano mais importante,
Kant (2003, 2007) então argumentou que a razão era o segundo atributo humano
mais importante e que, portanto, era possível estabelecer regras morais absolutas
válidas com base apenas na razão, não por referência a qualquer ser sobrenatural
ou por evidências empíricas, mas pelo mesmo tipo de raciocínio lógico que
estabelece verdades tão indiscutíveis em matemática e lógica.
126
TÓPICO 2 | TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE
127
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
Kant (2007) chegou até mesmo a dizer que um ato simplesmente não
é totalmente moral a menos que o dever, em vez da inclinação, seja o motivo
por trás dele. Uma pessoa que está meramente inclinada a ser gentil e generosa
com os outros não deve ser considerada moral no sentido mais completo em que
Kant usa a palavra. Somente se esta pessoa, talvez por causa de alguma tragédia
inesperada em sua vida, já não está mais inclinada a ser gentil e generosa com os
outros, mas agora se obriga a ser assim somente por um senso de dever, só então
ela estará agindo de forma totalmente moral. Isso impressiona a maioria das
pessoas como sendo uma abordagem muito severa, mas revela a ênfase de Kant
em seu conceito de dever na medida em que se refere ao seguir regras morais
claramente estabelecidas e absolutas. Kant acreditava que tinha estabelecido
absolutos morais, e lhe parecia óbvio que, para ser moral, deveríamos obedecê-
los por um senso de dever.
128
TÓPICO 2 | TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE
Para mostrar como Kant levou sua teoria à prática, é importante apresentar
aqui uma de suas várias "ilustrações". Kant (2007) descreve um homem que, em
desespero, ainda em posse de sua razão, está contemplando o suicídio. Usando
o sistema de Kant, o homem deve descobrir se uma máxima de sua ação poderia
ser transformada em uma lei universal para todos os seres humanos, então ele
enquadra a máxima da seguinte maneira: "Por amor-próprio eu deveria acabar
com a minha vida sempre que não acabar com ela é provável que traga mais mal
do que bem". Kant afirma então que esta máxima não pode ser universalizada
porque é contraditório acabar com a vida pelo próprio sentimento (amor-
próprio) que impulsiona alguém a melhorar a vida. Portanto, a máxima não pode
existir como uma lei universal para todos os seres humanos, porque é totalmente
inconsistente em si mesma e com o Imperativo Categórico.
129
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
130
TÓPICO 2 | TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE
que não é qualificada (WOOD, 2008). Kant nunca distinguiu entre fazer uma
exceção a uma regra e qualificar essa regra. Por exemplo, se a regra é declarada,
"Não quebrarás promessas, mas eu posso quebrá-las a qualquer momento que
eu quiser", eu estaria fazendo uma injusta exceção de mim mesmo à regra. Kant
pensava que não se deve fazer uma exceção a uma regra geral e, certamente, não
para um único indivíduo. No entanto, o que ocorre se a regra for qualificada para
que se aplique a todos: "Não quebrarás promessas, exceto quando não quebrar
uma promessa gravemente prejudicaria ou mataria alguém”? Aqui a exceção se
aplica à própria regra e não a algum indivíduo ou indivíduos. Kant certamente
tinha um argumento forte a fazer sobre não fazer exceções. Afinal, de que serve
uma regra se alguém pode fazer uma exceção de si mesmo a qualquer momento
que quiser? No entanto, "Não matarás exceto em autodefesa" não é menos
universalizável do que "Não matarás", e a regra anterior parece estar relacionada
à história dos valores humanos e também a uma doutrina de justiça muito melhor
do que a segunda.
Há ainda outra crítica que tem a ver com o conflito entre inclinação e dever
que Kant (2013) descreveu, e isto é, o que acontece quando suas inclinações e
deveres são os mesmos? Por exemplo, se você está inclinado a não matar pessoas,
uma tendência que se encaixa bem com a regra de Kant "Não matarás", que é seu
dever de obedecer. Isso significa que, porque você não está inclinado a matar,
você não seria uma pessoa moral, porque o seu dever não está lhe afastando de
suas inclinações? Muitos moralistas discordam da ideia de que as pessoas não
são morais meramente porque estão inclinadas a ser boas em vez de sempre se
debater com elas mesmas para serem assim. Kant não acreditava que uma pessoa
que age moralmente por inclinação é imoral, mas acreditava que tal pessoa não é
moral no sentido mais verdadeiro da palavra.
131
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
DICAS
O termo prima facie significa, literalmente, "à primeira vista" ou "à superfície
das coisas". Um dever prima facie, então, é aquele que todos os seres humanos
devem obedecer de uma maneira geral antes que qualquer outra consideração
entre em cena. Alguns dos Deveres Prima Facie de Ross (2002) são os deveres
seguintes:
Assim, Ross, como Kant, pensou que existissem regras a que todos os
132
TÓPICO 2 | TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE
seres humanos deveriam aderir porque é sua obrigação moral fazê-lo. Ele também
melhorou muito a proposta kantiana na área do que fazer quando deveres
(especialmente deveres Prima Facie) conflitam.
afirmando que nós sabemos que eles são verdadeiros. Para mim,
parece tão autoevidente como qualquer coisa poderia ser, que fazer
uma promessa, por exemplo, é criar uma reivindicação moral sobre
nós em outra pessoa. Muitos leitores talvez digam que não sabem que
isso é verdadeiro. Se assim for, certamente não posso provar isso para
eles. Só posso pedir-lhes para refletir novamente, na esperança de que
eles acabem por concordar que eles também sabem que é verdadeiro
(ROSS, 2002, p. 20-21).
Deste modo, Ross (2002) está realmente baseando essa seleção de tais
deveres na intuição, ou seja, não há lógica ou evidência para justificar suas
escolhas, mas devemos aceitar o que ele diz com base na intuição. Se não
tivermos as mesmas intuições que ele, então devemos continuar tentando até que
a tenhamos. Obviamente, isto é altamente especulativo e vago em sua aplicação
com todos os problemas que encontramos quando discutimos e avaliamos a base
intuitiva para o não consequencialismo de ato (KOTTOW, 1995).
133
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
Primeiro, até mesmo Kant, que lutou contra as consequências, parece tê-
las contrabandeado por meio de sua doutrina da reversibilidade (ZINGANO,
1989). Mesmo sem essa doutrina, quando alguém pressiona qualquer sistema
ético o suficiente, perguntando por que alguém deveria fazer as coisas prescritas,
as respostas não teriam que trazer as consequências para si, para os outros ou
para todos os interessados? Por exemplo, na Teoria do Comando Divino, não seria
realmente possível justificar os mandamentos mais imediatamente aplicáveis
e práticos como sendo necessidades éticas, quer se acredite ou não que um ser
sobrenatural os prescreva aos seres humanos? Poder-se-ia perguntar por que tal
ser seria tão sábio ao afirmar que os seres humanos não devem matar, roubar ou
cometer adultério e responder que as consequências de não ter algumas regras
nessas áreas seriam muito piores. Se a matança fosse livremente permitida, então
a vida das pessoas estaria constantemente em perigo, o crescimento humano
não seria capaz de acontecer e não haveria sistemas ou culturas morais, apenas
batalhas constantes para evitar a morte. Estes mandamentos e outros como eles
ajudam todos os seres humanos a respeitar os direitos de seus semelhantes e
trazer alguma estabilidade e ordem em um sistema social que de outra forma
estaria em constante estado caótico.
134
TÓPICO 2 | TEORIAS NÃO CONSEQUENCIALISTAS DA MORALIDADE
135
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
Sob outra perspectiva, por mais difíceis que possam ser as consequências
da computação, os não consequencialistas parecem realmente evitar ponto
central da moralidade – certamente da moralidade social – ao tentar ignorar as
consequências de suas regras ou atos. Embora seja útil ter uma série de regras e
guias fortes a ser seguido, o não consequencialismo de regras torna difícil decidir
quais regras seriam essas e como classificá-las em ordem de importância ou
resolver conflitos quando os absolutos se opõem uns aos outros. Além disso, o
não consequencialismo de regras não prevê discussão alguma aberta dos dilemas
morais porque fecha a porta arbitrariamente afirmando o que é certo e o que é
errado, sem qualquer possibilidade de exceção. E o que é certo e errado é baseado
nos supostos comandos de um ser sobrenatural a quem ninguém é permitido
questionar ou sobre uma teoria de consistência lógica que pode mostrar que os
seres humanos não devem ser inconsistentes, mas oferecem poucas outras razões
por que se deve seguir uma regra e não outra.
UNI
PROBLEMA ÉTICO
136
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:
137
em alguma outra base mais racional.
• Uma vez que as regras morais foram descobertas como absolutas, os seres
humanos devem obedecê-las por um senso de dever, em vez de seguir suas
inclinações.
• Ross estabeleceu os Deveres Prima Facie que todos os seres humanos devem
aderir, a menos que haja razões sérias por que eles não deveriam.
138
• Ross enumerou vários deveres Prima Facie: 1. Fidelidade; 2. Reparação;
3. Gratidão; 4. Justiça; 5. Beneficência; 6. Autoaperfeiçoamento; 7. Não
maleficência.
139
AUTOATIVIDADE
140
UNIDADE 2 TÓPICO 3
A ÉTICA DA VIRTUDE
1 INTRODUÇÃO
Depois de ler este tópico, você deverá ser capaz de descrever as teorias da
Ética da Virtude, mostrando como elas diferem das teorias éticas consequencialistas
ou não consequencialistas. Também poderá definir e analisar termos e conceitos
importantes como as virtudes e os vícios. Assim como descrever a Ética a
Nicômaco de Aristóteles e como as virtudes são essenciais para viver uma vida
boa. Descrever a ética de Confúcio nos Analectos e explicar as virtudes à luz da
noção confucionista de autocultivo e explicar as vantagens e desvantagens da
ética da virtude no contexto de uma teoria geral da ética.
Podemos então dizer que outra teoria moral que se tornou significativa
para muitos éticos contemporâneos é conhecida como a "ética da virtude".
Certamente não é uma nova teoria, pois é tipicamente associada aos gregos e,
especialmente com Aristóteles no século IV AEC (Antes da Era Comum). Embora
suas origens na filosofia chinesa sejam ainda mais antigas. Essencialmente, esta
teoria difere de todas as anteriores que discutimos na primeira unidade em que se
concentram não em consequências, intuições ou regras, mas no desenvolvimento
interior dos seres humanos de um caráter moral ou virtuoso por meio do agir tal
como uma pessoa boa ou "virtuosa" agiria.
2 DEFINIÇÃO DE TERMOS
Se olharmos um dicionário de língua portuguesa veremos uma definição
de virtude como “força moral; disposição firme e habitual para a prática do bem;
boa qualidade moral; ato virtuoso; castidade e modo austero de vida” (FERREIRA,
1986, p. 2093). Um dicionário de filosofia descreve o termo virtude como aquele
que “designa uma capacidade qualquer ou excelência, seja qual for a coisa ou o ser
a que pertença [...] capacidade ou potência em geral [...] capacidade ou potência
do homem […] capacidade ou potência moral do homem” (ABBAGNANO, 2007,
141
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
p. 1003).
Como você pode ver, a ênfase está no caráter bom ou virtuoso dos próprios
seres humanos, e não em seus atos ou nas consequências de seus atos, sentimentos
ou regras. Em outras palavras, é o desenvolvimento da pessoa boa ou virtuosa
que é importante nesta teoria moral, e não regras abstratas ou consequências de
atos ou regras, exceto quando derivam de uma pessoa boa ou virtuosa ou fazem
com que essa pessoa seja boa ou virtuosa.
Aristóteles está preocupado com a ação, não como sendo correta ou boa
em si mesma, mas por ser condutiva ao bem humano (ROSS, 1987). Em sua
elaboração teórica da ética, ele parte dos julgamentos morais reais dos seres
humanos e diz que os comparando, contrastando-os e os ponderando, chegamos
à formulação de princípios gerais (ARISTÓTELES, 1984). Observem como isso
difere da Teoria do Comando Divino e das teorias de Kant e Ross, quanto ao modo
como os princípios são estabelecidos. Nas três últimas teorias, os princípios éticos
são objetivos ou externos aos seres humanos e são estabelecidos pelo sobrenatural
ou pela própria razão abstrata. Aristóteles pressupõe que há tendências éticas
naturais implantadas nos seres humanos e que as seguir com uma atitude geral
de harmonia e proporção consistentes constitui uma vida ética.
142
TÓPICO 3 | A ÉTICA DA VIRTUDE
Este processo parece ser circular, exceto que Aristóteles faz uma distinção
entre os atos que criam uma boa disposição, por exemplo, dizer a verdade sem
saber que isso é uma virtude, e aqueles que fluem da boa disposição uma vez que
foi criada, por exemplo, dizer a verdade porque a pessoa a conhece como uma
virtude (SILVEIRA, 2000). Aristóteles afirma ainda que a própria virtude é uma
disposição que se desenvolveu a partir de uma capacidade pelo próprio exercício
dessa capacidade (PERINE, 2006).
143
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
144
TÓPICO 3 | A ÉTICA DA VIRTUDE
145
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
negligenciado. Este é um perigo para o qual Aristóteles às vezes, mas nem sempre,
sucumbe.
146
TÓPICO 3 | A ÉTICA DA VIRTUDE
Outros tipos de fatores externos podem ser menos óbvios para a maioria
de nós. Pense, por exemplo, na relação entre a arquitetura e o florescimento
humano. As formas como estruturamos nossos ambientes de vida e trabalho
refletem e afetam nossas interações com outras pessoas. Locais de trabalho
sem áreas comuns para funcionários incentivam um isolamento e separação
de colegas de trabalho que não são encontrados tão facilmente em ambientes
de trabalho que estimulam a interação (GÜNTER; GUZZO; PINHEIRO, 2004).
Casas em que todas as cadeiras estão voltadas para a televisão refletem uma
concepção diferente de felicidade do que casas em que as cadeiras são situadas
de frente para si (DE BOTTON, 2007). Historicamente, os pensadores utópicos,
muitas vezes, forneceram-nos modelos possíveis de uma vida social que encoraja
o florescimento humano. Muitos desses modelos pressupõem que as pessoas
serão felizes (ou seja, florescerão) se certas condições materiais e sociais possam
ser atendidas (FREITAG, 2006). Muitas versões das teorias sociais marxistas e
capitalistas compartilham esse pressuposto.
DICAS
147
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
Aristóteles nos diz que a virtude é um hexis, termo grego que se refere a
uma disposição ou hábito (SHIELDS, 2010). Não nascemos com virtudes. Elas não
são naturais ou inatas. Em vez disso, elas são adquiridas, muitas vezes, através
da prática. A educação moral para Aristóteles, portanto, se concentra em torno
do desenvolvimento do caráter fundamental de uma pessoa, o que Aristóteles
chama de psique ou "alma".
148
TÓPICO 3 | A ÉTICA DA VIRTUDE
examinamos mais de perto, tem pelo menos dois componentes: medo e confiança
(ROSS, 1987). Podemos errar em relação a qualquer um dos fatores: podemos
ter muito ou pouco medo, ou podemos ter muita ou pouca confiança em nós
mesmos.
O próprio Aristóteles (1984) sugere que este quadro tripartido nem sempre
se aplica. O exemplo que ele dá é o assassinato. Não há, ele nos diz, qualquer
mediania em relação ao assassinato. É apenas um extremo. No entanto, penso
que Aristóteles está confuso sobre este assunto, pois o assassinato não é uma
virtude, nem um vício. É uma ação, não uma qualidade de caráter. Na verdade,
a qualidade de caráter relevante seria algo como o respeito pela vida, que é uma
virtude que pode ter extremos. Por um lado, há aqueles com pouco respeito pela
vida. Eles matam e ferem outros sem levar em conta a dor e o sofrimento que
estão infligindo. Em contrapartida, há aqueles que nem pisam em uma formiga.
Pode-se argumentar que eles têm um respeito excessivo pela vida.
149
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
150
TÓPICO 3 | A ÉTICA DA VIRTUDE
agente da polícia que tenta capturá-los. Outras virtudes estão mais intimamente
relacionadas com o bem moral, e nós podemos chamá-las de Virtudes Morais ou
de Caráter (HOOFT, 2013). A compaixão é claramente uma virtude de caráter, pois
está diretamente ligada a uma preocupação com o bem moral de uma maneira
que a perseverança e a coragem não o estão.
151
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
em sua discussão sobre as virtudes: você não pode ter uma virtude sem ter as
outras, ou seja, há uma reciprocidade das virtudes. Contudo, dada a concepção
de Aristóteles sobre a sabedoria prática, isso faz sentido. As virtudes não existem
isoladamente, elas estão conectadas tanto a situações particulares quanto a uma
concepção geral do florescimento humano. Se este for o caso, então, ter qualquer
virtude específica de modo pleno é ver como ela se encaixa no esquema mais
geral de uma vida boa. E para fazer isso, é preciso ter as outras virtudes que são
necessárias para prosseguir a vida boa também.
152
TÓPICO 3 | A ÉTICA DA VIRTUDE
Podemos ver, portanto, que Confúcio percebe uma clara diferença entre
fazer a coisa certa e ser uma boa pessoa.
154
TÓPICO 3 | A ÉTICA DA VIRTUDE
155
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
156
TÓPICO 3 | A ÉTICA DA VIRTUDE
A reverência familiar é a raiz do Ren que também pode ser traduzida como
bondade ou humanidade (BRANNIGAN, 2005).
Ames e Rosemont estão, de fato, colocando a ética dos papéis como uma
teoria distintamente diferente das teorias morais básicas que emergiram no curso
da tradição ética ocidental.
157
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
158
TÓPICO 3 | A ÉTICA DA VIRTUDE
A ética da virtude tenta criar o ser humano bom ou virtuoso, não apenas
bons atos ou regras e não apenas um robô que segue regras pré-estabelecidas
ou uma pessoa que age por capricho ou tenta conseguir boas consequências. Ela
procura inculcar a virtude ao instar os seres humanos a praticar atos virtuosos
a fim de criar a pessoa habitualmente virtuosa ou boa que então continuará a
agir virtuosamente. Muitos eticistas veem isso como constituindo um de nossos
principais problemas hoje: temos regras e leis e sistemas de ética, mas ainda não
temos seres humanos éticos ou virtuosos. Esses eticistas acreditam que até que
criemos pessoas éticas ou virtuosas, nossas chances de criar uma sociedade moral
159
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
160
TÓPICO 3 | A ÉTICA DA VIRTUDE
161
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
1. Na Grécia homérica antiga, um homem era o que ele fazia. Ou seja, um homem
e seus atos eram considerados idênticos. A moralidade e a estrutura social eram
uma e a mesma coisa em sociedades heroicas. O homem virtuoso ideal era o
guerreiro e as virtudes eram força e coragem.
2. Para Aristóteles, Tomás de Aquino (1225-1274) e para o Novo Testamento, a
virtude é uma qualidade que permite avançar para a realização de um fim
especificamente humano (natural ou sobrenatural). Para Aristóteles, isso era
racionalidade e o homem virtuoso ideal era o cavalheiro ateniense. Para Tomás
de Aquino e o Novo Testamento, as virtudes são fé, esperança, caridade (ou
amor) e humildade, e o homem virtuoso ideal era o santo.
3. Para Benjamin Franklin (1706-1790), a virtude é uma qualidade que tem
utilidade para alcançar o sucesso terrenal e celestial. Seu conceito de virtude
era teleológico, como o de Aristóteles, mas de caráter utilitário. Para Franklin,
as virtudes eram a limpeza, o silêncio, a diligência e a castidade, entre muitos
outros.
162
TÓPICO 3 | A ÉTICA DA VIRTUDE
A Ética da Virtude nos ajuda a ver que uma teoria geral da ética deve
fornecer uma compreensão do caráter moral. Claramente, a filosofia moral
163
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Podemos dizer que o relato de Aristóteles sobre a sabedoria prática nos
fornece uma visão útil do pluralismo ético. A pessoa virtuosa sempre age à
luz de uma concepção geral do florescimento humano. Cada uma das teorias
morais que estudamos nesta Unidade contribui para a nossa compreensão do
florescimento humano, e a pessoa virtuosa de sabedoria prática é capaz de
equilibrar essas teorias concorrentes em situações particulares, discernindo qual
é mais moralmente significativa em um caso específico.
Agora podemos ver como esse relato de sabedoria prática nos permite
164
TÓPICO 3 | A ÉTICA DA VIRTUDE
Há muito mérito nessa crítica, e essa é uma boa razão para dizer que a ética
da virtude está seriamente incompleta sem as tradições morais que consideramos
anteriormente nesta unidade. Não há dúvida de que uma ética do caráter ou da
virtude deve ser completada por uma ética da ação. Podemos cultivar a virtude
da compaixão, por exemplo, mas quando agimos com compaixão, devemos
estar conscientes das preocupações morais levantadas por outras tradições.
Quando atuamos com compaixão em relação a outras pessoas, também devemos
estar cientes de seus direitos, levar em conta as consequências de nossas ações
compassivas e tratar outras pessoas como fins em si mesmas. O bom caráter, em
outras palavras, não evita a necessidade de outros tipos de consideração moral.
UNI
PROBLEMA ÉTICO
BULLYING – O QUE VOCÊ DEVERIA FAZER?
O bullying é uma forma de abuso, emocional, verbal e/ou físico. Sempre envolve um
desequilíbrio de poder com indivíduos ou grupos que impõem sua vontade aos outros. O
bullying e a cyberbullying são prevalentes e são problemas graves na escola e no local de
trabalho.
“Como se já não bastasse os próprios alunos ofenderem outros jovens, em algumas instituições
brasileiras, os próprios “educadores” estimulam a prática do bullying. Em uma escola municipal
na cidade de Osasco, São Paulo, um menino de apenas oito anos foi castigado e agredido
verbalmente por estar acima do peso. O professor queria que ele passasse por uma sessão de
castigos, mas ao se recusar, foi alvo de xingamentos. Além de praticar bullying com o aluno, o
professor incentivou outros estudantes a fazerem o mesmo”
(FONTE: Disponível em: <https://medium.com/educa%C3%A7%C3%A3o-turismo/6-casos-de-
bullying-no-brasil-73ad264a2161>. Acesso em: 13 jul. 2018).
165
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
DICAS
Olhe para essa história e considere outros artigos sobre bullying. Até que ponto o
bullying exibe questões de caráter? Até que ponto vícios como ciúme, inveja e rancor envolvem
tais incidentes? Muitos afirmam que um valentão não tem ou é incapaz de ter empatia com
outros seres humanos. Além disso, as testemunhas de tais atos, muitas vezes, exibem uma falta
de empatia e não se envolvem. Discuta as questões de caráter envolvidas no bullying. O que
pode ser feito para reduzir os atos de bullying e abuso?
LEITURA COMPLEMENTAR
166
TÓPICO 3 | A ÉTICA DA VIRTUDE
Como é evidente, a maior parte das ações – talvez a maioria – não dizem
apenas respeito apenas a nós; dizem respeito também aos outros, e dizem-lhes
respeito de muitíssimos modos diferentes. Algumas das minhas ações podem
beneficiar outras pessoas, ao passo que outras podem prejudicá-las, direta ou
indiretamente, intencionalmente ou não. Posso prejudicar o João diretamente
empurrando-o. Posso empurrá-lo porque estou zangado com ele ou porque quero
ficar com o lugar dele. Ou posso prejudicar o João indiretamente, por exemplo,
obtendo eu a promoção de que ele precisava para financiar cuidados para a sua
mãe, que se encontra às portas da morte. Ou posso ofender o João entregando-me
em privado ao que ele pensa serem práticas sexuais bizarras. Se o fizer, as minhas
práticas privadas afetam-no, apesar de apenas indiretamente, e só por causa das
suas crenças morais. É defensável que é inapropriado dizer que prejudiquei o
João nestes dois últimos casos, ainda que tenha escolhido agir como agi sabendo
que as minhas ações o poderiam afetar (ou afetar outra pessoa) do modo descrito.
Saber isto não resolve o problema de saber como devo agir; limita-se a
determinar o domínio da moralidade. A moralidade, entendida tradicionalmente,
envolve primariamente, e talvez exclusivamente, o comportamento que afeta os
outros. Digo talvez porque algumas pessoas (por exemplo, Kant) pensam que uma
pessoa que se prejudica a si mesma (por exemplo, desperdiçando os seus talentos
ou maltratando o seu corpo) está a fazer algo moralmente errado. Para os nossos
propósitos, contudo, podemos deixar de lado esta interessante e importante
questão. Pois o que toda a gente reconhece é que as ações que claramente afetam
os outros pertencem ao domínio da moralidade.
Podemos discordar sobre como deve o facto de uma ação afetar outras
pessoas negativamente dar forma à nossa decisão sobre como agir. Podemos
também discordar se as ações que afetam os outros apenas indiretamente devem
ser moralmente avaliadas, e até que ponto. Podemos discordar, além disso, sobre
como se distingue o prejuízo direto do indireto. Todavia, se as ações de alguém
afetam outra pessoa direta e substancialmente (beneficiando-a ou prejudicando-a),
então, mesmo que não saibamos ainda se a ação foi correta ou incorreta, podemos
concordar que deve ser avaliada moralmente. Como a devemos avaliar é algo que
discutirei depois.
167
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
A necessidade de teoria
168
TÓPICO 3 | A ÉTICA DA VIRTUDE
169
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
170
TÓPICO 3 | A ÉTICA DA VIRTUDE
Em todos estes casos, há erros com significado moral prático. Seria melhor
para todos se tivéssemos as características pessoais que nos permitissem evitar
estes e outros erros morais. Em última análise, devemos aprender a dar mais
atenção aos outros, estar melhor informados e estar melhor motivados. […]
171
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
Será isto defensável? Não vejo como poderá sê-lo. Mesmo que nenhuns
juízos morais (contenciosos) fossem indiscutivelmente corretos, não deveríamos
concluir que todos os juízos morais são igualmente falíveis. Apesar de não termos
uma maneira clara de decidir com toda a certeza que ações são as melhores,
temos maneiras excelentes de mostrar que algumas são deficientes. Sabemos,
por exemplo, que os juízos morais são maus se forem baseados em informação
distorcida, tacanhez, parcialidade, falta de compreensão ou princípios morais
completamente bizarros. Conversamente, os juízos são mais plausíveis, mais
defensáveis, se forem baseados em informação completa, cálculo cuidado,
percepção astuta, e se tiverem sobrevivido com êxito à crítica alheia no mercado
de ideias.
172
TÓPICO 3 | A ÉTICA DA VIRTUDE
O papel da teoria
Mesmo quando as pessoas concordam que uma questão deve ser avaliada,
pelo menos parcialmente, por critérios de moralidade, discordam muitas vezes
sobre o modo de a avaliar. Ou, para usar a linguagem da secção anterior, as pessoas
discordam sobre os melhores princípios ou juízos, sobre como os interpretar ou
sobre como os devemos aplicar. Em resultado disso, duas pessoas razoáveis e
decentes podem chegar a conclusões completamente diferentes sobre se uma
ação é moralmente apropriada. Eis um caso que claramente exige a avaliação
racional das nossas ações. Devemos examinar, tentar compreender e depois
avaliar as nossas próprias razões e as razões das outras pessoas a favor das nossas
conclusões morais, ou das delas. Afinal de contas, as pessoas têm habitualmente
razões – ou pensam que têm – a favor das suas conclusões.
173
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
174
TÓPICO 3 | A ÉTICA DA VIRTUDE
Consequencialismo
175
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
contudo, rejeitam a ideia de que as decisões morais devam ser decididas caso a
caso. Segundo eles, não devemos decidir se é provável que uma ação particular
promova a maior felicidade para o maior número, mas se um tipo particular
de ação iria promover, se fosse seguida pela maior parte das pessoas, a maior
felicidade para o maior número.
Assim, parece que um utilitarista dos atos poderia decidir que uma
mentira, num caso particular, justifica-se porque maximiza a felicidade de todos
os envolvidos, ao passo que o utilitarista das regras poderia defender que, uma
vez que se toda a gente mentisse, isso diminuiria a felicidade, seria melhor adoptar
uma regra forte contra a mentira. Devemos obedecer a esta regra ainda que, num
caso particular, mentir possa parecer promover melhor a maior felicidade do
maior número.
Deontologia
É por isso que tantas pessoas acham que as teorias deontológicas são
tão atraentes. Por exemplo, a maior parte de nós ficaria ofendida se alguém
nos mentisse, ainda que essa mentira produzisse a maior felicidade para o
maior número. Eu ficaria sem dúvida ofendido se alguém me matasse, ainda
que a minha morte pudesse produzir a maior felicidade para o maior número
(usando os meus rins para salvar a vida de duas pessoas, o meu coração para
salvar uma terceira etc.). Assim, o que há de errado ou certo em mentir ou matar
não pode ser explicado, defendem os deontologistas, unicamente por causa das
suas consequências. Claro que há muito desacordo entre os deontologistas sobre
quais regras são verdadeiras. Também discordam sobre como se determina que
regras são essas. Alguns deontologistas afirmam que a razão abstrata nos mostra
como devemos agir (Kant). Outros (McNaughton) afirmam que as intuições são
o nosso guia. Outros ainda falam de descobrir princípios que se justificam por
um equilíbrio reflexivo (Rawls, por exemplo), ao passo que alguns defendem que
devemos procurar princípios que poderiam ser adoptados por um observador
ideal (Arthur).
Alternativas
176
TÓPICO 3 | A ÉTICA DA VIRTUDE
Teoria das virtudes: A teoria das virtudes não tem sido tão influente
quanto a deontologia ou o consequencialismo na formação do pensamento ético
moderno. Contudo, é anterior a essas duas teorias, pelo menos enquanto teoria
formal. Foi a teoria dominante dos gregos antigos, alcançando a sua expressão
mais clara na obra de Aristóteles, Ética a Nicômaco. Durante muitos séculos, não
foi nem discutida, nem advogada enquanto alternativa séria. Mas por volta dos
finais da década de 1950 começou a reaparecer na bibliografia filosófica (a história
deste reemergir é apresentada nos ensaios reimpressos em Crisp e Slote, 1997).
Grande parte do apelo da teoria das virtudes deriva das falhas encontradas
nas alternativas canónicas. A deontologia e o consequencialismo, defendem os
partidários da teoria das virtudes, dão uma ênfase desadequada (ou nenhuma)
ao agente – ao que o agente deve ser, aos tipos de carácter que o agente deve
desenvolver. Não dão igualmente um âmbito apropriado ao juízo pessoal e
dão demasiada ênfase à ideia de seguir regras (sejam deontológicas sejam
consequencialistas).
Muitos partidários das teorias canónicas acham que estas objecções dos
que defendem a teoria das virtudes são significativas e, ao longo das últimas
duas décadas, modificaram as suas teorias para, em parte, as acomodar. O
resultado, afirma Rosalind Hursthouse, é que “as linhas de demarcação entre
estas três abordagens se têm diluído […] A deontologia e o utilitarismo já não
se caracterizam claramente por darem ênfase às regras ou consequências por
oposição ao carácter” (Hursthouse 1999: 4). As duas teorias dão maior ênfase ao
juízo e ao carácter. Por exemplo, Hill, apesar de ser um deontologista, descreve a
atitude apropriada relativamente ao meio ambiente de um modo que dá ênfase
à excelência ou ao carácter, e Strikwerda e May, que de forma geral não aceitam
a teoria das virtudes, dão ênfase à necessidade de os homens sentirem vergonha
pela sua cumplicidade na violação de mulheres. Contudo, apesar de o juízo e o
carácter poderem desempenhar papéis cada vez mais importantes nas versões
contemporâneas da deontologia ou do consequencialismo, nenhum desempenha
o papel central que desempenha na teoria das virtudes. […]
177
UNIDADE 2 | ÉTICA NORMATIVA
éticas canónicas. A questão é: que nos diz isso sobre tais teorias? Poderemos,
por exemplo, limitar-nos a tirar as partes sexistas da teoria de Aristóteles e ficar
mesmo assim com uma teoria aristotélica que seja adequada para uma época
menos sexista? Podemos eliminar as partes sexistas da ética de Kant e ficar com
uma deontologia não sexista mas viável?
Outros não estavam assim tão certos disso. Por exemplo, Carol Gilligan
(1982) argumentou que as mulheres têm experiências morais diferentes e um
raciocínio moral diferente, e que estas diferenças devem fazer parte de qualquer
tratamento adequado da moralidade. Subsequentemente, advogou uma “ética do
cuidado”, que ela pensava que exemplificava melhor a experiência e o pensamento
das mulheres.
FONTE: LAFOLLETTE, Hugh (Org.). Ethics in practice. Londres: Blackwell, 2001. Tradução de
Desidério Murcho. Disponível em: <https://criticanarede.com/teoriasetica.html>. Acesso em: 5
jun. 2018.
178
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:
• A ética da virtude não é uma teoria nova, tendo tido seu começo com os gregos
e, especialmente, com Aristóteles no IV AEC, embora suas origens na filosofia
chinesa sejam ainda mais antigas. Tornou-se significativo para muitos eticistas
contemporâneos.
• A ênfase está no caráter bom ou virtuoso dos próprios seres humanos, e não
em seus atos, consequências, sentimentos ou regras.
179
realça as relações naturais entre o indivíduo e a comunidade. O ideograma
para Ren é "um-ser-com-outros".
• Li, "propriedade ritual", é a virtude confucionista que deve ser cultivada para
ser um participante pleno na comunidade e torna possível que um indivíduo
apresente uma conduta apropriada em situações específicas.
• Há várias vantagens para a Ética da Virtude: 1. Ela se esforça para criar o ser
humano bom, não meramente bons atos ou boas regras; 2. Ela tenta unificar
a razão e a emoção; 3. Enfatiza a moderação, uma qualidade reconhecida por
muitos eticistas.
180
• Também tem desvantagens: 1. Os seres humanos têm um fim ou propósito?
Se sim, qual é, e como podemos provar qualquer um destes? 2. A moral
é inata, ou é aprendida através da experiência?; 3. O que é virtude e o que
constitui as virtudes? Parece haver uma grande variedade de opiniões sobre
isso, então como podemos decidir o que é realmente a virtude e quais virtudes
são realmente válidas? 4. Quem é o ser humano virtuoso ideal, e como vamos
determinar ou provar isso?
• A pessoa viciosa não é governada pela razão, mas pelo impulso e vive uma
vida atormentada pela tensão interior e pelo caos.
181
AUTOATIVIDADE
182
UNIDADE 3
ÉTICA APLICADA
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade, você en-
contrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.
TÓPICO 2 – BIOÉTICA
183
184
UNIDADE 3
TÓPICO 1
1 INTRODUÇÃO
185
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
186
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA ÉTICA APLICADA
187
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
188
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA ÉTICA APLICADA
189
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
190
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA ÉTICA APLICADA
191
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
192
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA ÉTICA APLICADA
193
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
evidencia diferentes valores éticos. Suponha que tentar manter os idosos vivos em
certos ambientes ameaça toda a comunidade. Em tais circunstâncias, abandonar
os idosos pode não parecer "assassinato gratuito". Aqueles que seguiram a prática
não demonstrariam que tinham valores radicalmente diferentes daquelas culturas
que achavam que os idosos deviam ser tratados com reverência e respeito. De
fato, podemos facilmente imaginar circunstâncias em que a maneira apropriada
de demonstrar reverência e respeito seria abandonar os idosos antes que eles se
tornassem uma ameaça à comunidade que eles mesmos consideravam importante.
Essa visão comum pode ser vista como sendo tanto certa quanto errada.
Podemos ver como é certa contrastando juízos éticos com juízos legais. É parte
integrante do nosso sistema legal que as questões legais podem ser resolvidas
com autoridade por instituições específicas. O papel do tribunal é impor um
julgamento público sobre o que deve ou não ser feito. Não existe uma instituição
ética análoga e, nesse sentido, a visão cética sobre a ética é correta. Se discordarmos
de um assunto ético, posso pensar que você se enganou de uma forma que, após
apelos suficientes, parecerá apenas perverso no caso legal. Meus pontos de
vista morais são alcançados por mim e não há um tribunal ético que possa me
anular. A avaliação de cada pessoa sobre a coisa certa a fazer é, nesse sentido,
pelo menos tão boa quanto a de qualquer outra pessoa. Todavia precisamos ter
cuidado com as implicações disso. A ideia de que a ética é "pessoal" no sentido
de que não possa ser definitivamente sobrepujada por outros em questões éticas
não significa que a ética seja pessoal, pois o gosto é pessoal (HALDANE, 2002).
Assim, o rápido esboço acima torna-se errado. Há várias diferenças relacionadas
que mostram que os casos são significativamente diferentes. Vou simplesmente
delinear as centrais aqui.
194
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA ÉTICA APLICADA
éticos são apenas questões de gosto não parece capturar essa característica dos
juízos morais.
Por outro lado, a maneira como o gosto é pessoal parece tornar certos tipos
de desacordo sobre questões de gosto impossíveis (NEDEL, 2004). Nós realmente
não discordamos quando um de nós diz que "Azeitonas são saborosas" e a outra
diz que "Azeitonas têm um gosto ruim". Cada um de nós pode afirmar sincera e
corretamente nossa opinião. Expressões de julgamentos éticos não parecem ser
assim. Se fossem, duas pessoas expressando o que normalmente consideramos
ser visões éticas conflitantes não expressariam pontos de vista conflitantes. Eles
seriam como duas pessoas "discordando" do gosto das azeitonas. Podemos pensar
que uma visão de ética que não possa explicar nossa percepção de que há um
desacordo genuíno entre pró e antirracistas não pode ser adequada. Talvez mais
revelador, se os juízos éticos fossem apenas questões de gosto, seria estranho e
fútil tentar convencer alguém de que suas visões morais estavam equivocadas,
assim como é estranho e fútil tentar convencer alguém que obviamente está
apreciando sua azeitona que ele estaria equivocado – que ele não está realmente
gostando de jeito nenhum daquela azeitona. Todavia nossas visões éticas podem
ser mudadas pelo argumento e pela razão. Podemos mudar nossas visões éticas
de forma não arbitrária, em resposta a discussões e argumentos, de uma maneira
que parece bastante misteriosa em questão de gosto. A ética, então, não é apenas
uma questão de gosto. Podemos dar sentido à ideia de desacordo moral genuíno,
parece perfeitamente razoável tentar convencer as pessoas de que estão erradas
sobre questões éticas, e mudarmos de opinião sobre esses assuntos em resposta
ao argumento e à razão.
195
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
oferecendo uma razão que mostre minha posição como sendo uma posição ética.
Isso não quer dizer que posições éticas devam ser sem emoção ou desapaixonadas.
Pelo contrário, devemos nos preocupar com nossas visões morais. No entanto,
reações emocionais devem ser estimuladas ou baseadas em juízos morais e não
o contrário. E se minha posição é com base em proposições de fatos que não
são apenas falsas, mas tão implausíveis que fracassam até mesmo nos padrões
mínimos de evidência que eu impus aos outros, provavelmente não oferecerei
razões, mas mostrarei que não consigo pensar em razão genuína alguma para
minha posição. Estas não serão os únicos tipos de razões que não funcionam no
discurso moral – apelos cegos à autoridade ou precedentes podem também entrar
na lista – mas serão suficientes para dar uma noção das restrições impostas pelo
requisito por razões. A lista deve ser ilustrativa e não exaustiva.
196
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA ÉTICA APLICADA
que todos os valores morais podem ser reunidos sob um único padrão. Um crítico
incisivo da ética aplicada, Cheryl Noble (1982) sustenta que esse "monismo" é
necessário, dado o desejo dos teóricos de trazer a diversidade aparentemente
infinita de juízos particulares sob um único princípio ou hierarquia de princípios.
Em terceiro lugar, diz-se que os teóricos concebem o raciocínio moral como
essencialmente dedutivo: supondo que para cada problema moral haja uma
decisão correta, que resultará de um procedimento dedutivo que os agentes
morais racionais devem seguir ao decidir o que fazer. Por isso, Bernard Williams
(2017) afirma que o desejo de produzir um procedimento de decisão racionalista
é precisamente o que ocorre na teoria ética. Os antiteóricos rejeitam esse quadro
dedutivo. Os juízos morais são gerados, eles sustentam, pela atenção não aos
princípios gerais, mas às particularidades dos casos e situações reais.
197
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
porque alguém poderia esperar seguir o outro caminho: Por que tentar manter
um papel para teoria e princípios? Há, possivelmente, várias razões.
198
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA ÉTICA APLICADA
199
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
200
TÓPICO 1 | A NATUREZA DA ÉTICA APLICADA
8 OUTRAS CONSIDERAÇÕES
Nesta última seção, a preocupação foi de esboçar uma concepção
alternativa da teoria moral com um olho nas exigências da ética aplicada. A
concepção é pluralista, rejeita a esperança de um processo decisório universal e
mecânico, aceita a realidade de conflitos irresolúveis e reconhece a necessidade
de a teoria se basear e responder a um conhecimento empírico sólido. Pretende-se
direcionar a atenção para uma abordagem de deliberação ética e ética aplicada, e
não para qualquer teoria ou princípio normativo específico.
201
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
202
RESUMO DO TÓPICO 1
• Existem hoje três grandes subdivisões da ética aplicada: ética biomédica; ética
empresarial e profissional e a ética ambiental.
203
• O subjetivismo nega ao eticista uma posição intersubjetiva a partir da qual se
possa avaliar ou emitir conselhos.
• Os antiteóricos rejeitam um quadro dedutivo e alegam que os juízos morais
não são gerados pela atenção aos princípios gerais, mas às particularidades
dos casos e situações reais.
• Os antiteóricos geralmente afirmam que as práticas devem ser avaliadas do
seu interior.
• Aceitação de alguma forma de "pluralismo de teorias" supõe que a investigação
moral adequadamente conduzida levará em conta mais de uma teoria ou
princípio de ação correta e rejeita a ideia de que há uma teoria ou princípio
exclusivamente correta.
• A deliberação moral deve ser concebida como uma questão de abordar casos
particulares à luz de teorias e princípios gerais de deliberações anteriores
relevantes e de conhecimento adequado das particularidades do caso.
204
AUTOATIVIDADE
1 Quais são as três grandes subdivisões da ética aplicada e quais são as questões
tratadas por cada uma destas subdivisões?
205
206
UNIDADE 3
TÓPICO 2
BIOÉTICA
1 INTRODUÇÃO
207
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
208
TÓPICO 2 | BIOÉTICA
com sua provisão comparativamente baixa para aqueles que não podiam pagar
pelos serviços de saúde (PESSINI; BARCHIFONTAINE, 2007; DRANE; PESSINI,
2005).
209
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
210
TÓPICO 2 | BIOÉTICA
valor. A ética, portanto, não teria nada a ver com a ciência e, de fato, para alguns
dos positivistas mais extremados, a ética era, em todo caso, estritamente absurda
(PESSINI; BARCHIFONTAINE, 2007).
211
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
212
TÓPICO 2 | BIOÉTICA
por que e usando quais critérios e processos? Se não, quem deve executar tal
racionamento, por que e usando quais critérios e processos?
213
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
214
TÓPICO 2 | BIOÉTICA
215
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
216
TÓPICO 2 | BIOÉTICA
217
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
218
TÓPICO 2 | BIOÉTICA
219
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
não compartilham sua religião, seja porque eles têm crenças religiosas diferentes
ou porque não têm nenhuma. Tais princípios buscam fornecer um conjunto
amplamente aceito de pressupostos teóricos éticos, uma abordagem amplamente
aceitável para a análise ética e, pelo menos, elementos de uma linguagem ética
amplamente aceita, adequada aos contextos multiculturais internacionais em que
a bioética é buscada (PESSINI; BARCHIFONTAINE, 2007; DRANE; PESSINI,
2005).
220
TÓPICO 2 | BIOÉTICA
221
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
222
TÓPICO 2 | BIOÉTICA
5.5 CASUÍSTICA
A escola da casuística recentemente revivida não apenas aponta que a
confiança em princípios morais potencialmente conflitantes muitas vezes falha
em fornecer um procedimento de decisão para quando esses princípios conflitam
em contextos específicos, mas também acrescenta que os princípios emergem
da consideração de casos, e não o contrário (JUNGES, 2006). Assim, são casos
particulares e decisões sobre casos particulares, em vez de princípios que são
fundamentais para a bioética. A casuística, da qual Jonsen e Toulmin (1988)
lideram os proponentes contemporâneos, é a aplicação de normas morais gerais
a casos específicos em contextos específicos à luz de comparações e contrastes
com casos claros ou "paradigmáticos" previamente determinados.
223
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
224
TÓPICO 2 | BIOÉTICA
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Embora os desenvolvimentos futuros na bioética sejam imprevisíveis,
uma previsão pode ser feita com segurança. Quer aceitemos ou não a afirmação
de Gracia à Associação Internacional de Bioética de que "a bioética, creio, será
a ética civil de todas as nossas sociedades" (GRACIA, 1993, p. 97), podemos
confiantemente prever que continuará a fornecer uma série de preocupações
éticas importantes e absorventes para as quais um público de interesse sempre
em expansão pode ser igualmente esperado confiadamente.
225
RESUMO DO TÓPICO 2
227
AUTOATIVIDADE
3 Cite aos menos duas das questões morais decorrentes da relação entre
pacientes e seus médicos, enfermeiros ou outros profissionais de saúde.
4 Na pior das hipóteses, quais seriam os problemas que surgem nas abordagens
clínicas à bioética?
228
UNIDADE 3
TÓPICO 3
ÉTICA AMBIENTAL
1 INTRODUÇÃO
2 O ANTROPOCENTRISMO
Uma ética ambiental antropocêntrica confere uma posição moral
exclusivamente aos seres humanos e considera as entidades naturais não
humanas e a natureza como um todo apenas um meio para fins humanos. Em
certo sentido, qualquer perspectiva humana é necessariamente antropocêntrica,
uma vez que podemos apreender o mundo apenas através de nossos próprios
sentidos e categorias conceituais. Consequentemente, alguns defensores da ética
ambiental antropocêntrica tentaram antecipar o debate argumentando que uma
ética ambiental não antropocêntrica é, portanto, um oximoro. Todavia, a questão
em discussão não é: “Podemos apreender a natureza de um ponto de vista não
humano?”. Claro que não podemos. A questão é, antes, "Devemos estender a
consideração moral às entidades naturais não-humanas ou à natureza como um
todo?". E essa questão, é claro, é inteiramente aberta.
229
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
230
TÓPICO 3 | ÉTICA AMBIENTAL
Além disso, Norton (1991) argumenta que devemos, por uma questão de
justiça intergeracional, garantir que os seres humanos futuros possam desfrutar
de abundantes recursos naturais, um ecossistema completo e funcional, toda a
gama de amenidades ambientais e a oportunidade de participar em experiências
psicoespirituais oferecidas pela natureza e explorar intelectualmente a ecologia
e a taxonomia. Se fizermos com que nossa concepção do bem-estar humano seja
ampla e longa, o autor referido acima pensa que podemos fundamentar uma
ética ambiental adequada e eficaz sem navegar para as águas desconhecidas e
traiçoeiras do não-antropocentrismo.
A principal razão pela qual a Norton oferece para preferir uma abordagem
antropocêntrica à ética ambiental é pragmática. O antropocentrismo e o não
antropocentrismo, argumenta ele, apoiam as mesmas políticas ambientais.
Norton (1991) chama essa equivalência prática do antropocentrismo e não
antropocentrismo de “hipótese de convergência”. Por que então advogar o não
antropocentrismo? A maioria das pessoas, incluindo a maioria dos ambientalistas,
afirma ele, aceita a ideia familiar e venerável de que os seres humanos são fins
em si mesmos e que merecem uma posição moral. Por outro lado, a sugestão
de que todos os seres vivos (espécies e ecossistemas) devem receber um status
semelhante não é familiar e é controversa. Se basearmos a ética ambiental em
uma base tão ampla e firme quanto possível, poderemos garantir a sua rápida
implementação. De fato, Norton sugere que o vigoroso esforço filosófico para
desenvolver abordagens não antropocêntricas à ética ambiental realmente fez
um desserviço. O movimento ambiental, como resultado, ficou dividido sobre
questões puramente intelectuais que têm pouca ou nenhuma importância prática.
231
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
3 BIOCENTRISMO
No início, as teorias da ética ambiental que emancipavam moralmente
os seres vivos individuais e os conjuntos naturais, como espécies e ecossistemas,
eram chamadas de “biocêntricas”. Então, Paul W. Taylor (1986) requisitou o termo
para caracterizar sua teoria militantemente individualista da ética ambiental. Não
apenas em deferência à influência e autoridade de Taylor, mas em deferência ao
sentido literal do termo ("centrado na vida"), o "biocentrismo", nesta discussão,
232
TÓPICO 3 | ÉTICA AMBIENTAL
233
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
234
TÓPICO 3 | ÉTICA AMBIENTAL
Uma mera coisa, por mais valiosa que seja para os outros, não tem
nenhum bem por si própria [...] [porque] meras coisas não têm
vida conativa: não há desejos, almejos e esperanças conscientes; ou
incitações e impulsos; ou pulsões, objetivos e metas inconscientes; ou
tendências latentes, direções de crescimento e realizações naturais.
Os interesses devem ser compostos de alguma forma a partir das
conações; por isso, meras coisas não têm interesses, a fortiori, elas
não têm interesses de serem protegidas por regras legais ou morais.
Sem interesses, uma criatura não pode ter um “bem” próprio, cuja
realização pode ser buscada. Meras coisas não são lugares de valor por
direito próprio, mas seu valor consiste inteiramente em serem objetos
de interesses de outros seres.
235
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
moral” – um termo que Goodpaster usa para indicar precisamente o status ético
de pacientes morais (aqueles na extremidade receptora de uma ação), distinto de
agentes morais (aqueles que cometem um ato). Goodpaster concorda com Singer
que sua senciência é uma condição suficiente para estender a consideração moral
aos animais, mas ele discorda que é necessário, porque a senciência evoluiu para
servir algo mais fundamental – a vida:
Taylor (1986) baseia o valor inerente de um ser vivo no fato de que ele
tem um bem próprio, bastante independente de nossa avaliação instrumental
antropocêntrica dele e bastante independente de se o organismo é senciente ou
consciente. Luz, calor, água e solo rico são bons para um ramo de hera venenosa,
embora a hera venenosa não seja boa para nós. Ao contrário das máquinas e
outros artefatos intencionais que projetamos para servir aos nossos próprios fins,
os organismos são fins em si mesmos. Geralmente, eles se esforçam para atingir
um estado de maturidade e se reproduzir. Portanto, assim como insistimos em
que os outros não interfiram em nossos próprios esforços e realizações, assim,
Taylor insta, expressamente seguindo seu raciocínio sobre o pensamento de Kant,
devemos respeitar o esforços e realizações de todos os outros “centros teleológicos
da vida”. Kant argumentou que devemos respeitar, como indivíduos-em-si, todos
os seres racionais e autônomos igualmente. E Taylor argumenta que devemos
respeitar igualmente todos os seres vivos, porque eles também são fins em si
mesmos.
236
TÓPICO 3 | ÉTICA AMBIENTAL
237
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
4 ECOCENTRISMO
Embora o termo “ecocentrismo” seja uma contradição da frase “centrado
no ecossistema”, o ecocentrismo proporcionaria a considerabilidade moral a um
espectro de entidades ambientais não individuais, incluindo a biosfera como
totalidade, espécies, terra, água e ar, bem como ecossistemas. As várias éticas
ambientais holísticas informadas ecologicamente que podem ser apropriadamente
chamadas de ecocêntricas estão menos relacionadas, teoricamente, do que os
conjuntos da ética ambiental antropocêntricas ou biocêntricas.
Lawrence E. Johnson (1991) tentou gerar uma ética ambiental que alcança
espécies e ecossistemas através de uma extensão adicional da abordagem
biocêntrica. Ele faz isso não fazendo o critério de considerabilidade moral mais
inclusivo, mas atribuindo interesses a espécies e ecossistemas. Extensivamente
desenvolvendo a linha de pensamento que Feinberg (1974) provisoriamente e
ambiguamente iniciou, Johnson conclui que deveríamos "dar o devido respeito a
todos os interesses de todos os seres que têm interesses, em proporção aos seus
interesses" (JOHNSON, 1991, p. 118). Como sugere seu princípio moral, Johnson
segue Goodpaster ao permitir que todos os interesses não sejam iguais e, portanto,
que todos os seres interessados, embora moralmente consideráveis, não tenham
igual significância moral. Johnson (1991), no entanto, não fornece princípio ou
método algum para ordenar hierarquicamente os interesses e os seres que os
possuem; ele também não fornece um procedimento ético para julgar conflitos de
interesse entre pessoas, animais e plantas, e, ainda mais difícil, entre todos esses
indivíduos e totalidades ambientais.
238
TÓPICO 3 | ÉTICA AMBIENTAL
239
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
a existência das coisas que ele acredita terem valor intrínseco – seres com um
bem próprio e os bens (seus tipos ou espécies) que tais seres se esforçam para
realizar e perpetuar – é a existência de seus contextos naturais ou matrizes. Como
a lua que brilha por uma luz emprestada, o valor sistêmico parece ser um tipo de
valor intrínseco refletido. Rolston encontra um tipo similar de valor intrínseco
derivado, "valor projetivo", em processos evolutivos elementares e orgânicos que
remontam ao Big Bang, uma vez que tais processos eventualmente produziram
(ou "projetaram") seres vivos com bens próprios.
240
TÓPICO 3 | ÉTICA AMBIENTAL
tinham seus bens próprios; eles poderiam ser danificados e feridos; eles tinham
interesses, quer eles se importassem ou não. O movimento, no entanto, do
fato dificilmente discutível de que os seres vivos possuem objetivamente bens
próprios para a afirmação de que eles têm um valor intrínseco objetivo pode se
transformar em uma ambiguidade no significado de "bem".
241
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
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TÓPICO 3 | ÉTICA AMBIENTAL
5 ECOFEMINISMO
O termo “ecofeminismo” é uma contração da expressão “feminismo
ecológico”, que pode ser entendida como uma análise de questões e preocupações
ambientais do ponto de vista feminista e, vice-versa, como um enriquecimento e
complicação do feminismo com insights extraídos da ecologia. O ecofeminismo é
tanto uma abordagem à ética ambiental quanto um feminismo alternativo.
243
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
Ela observa ainda que “o ecofeminismo faz um lugar central para [os
valores mais femininos, menos masculinos] de cuidado, amizade, confiança e
reciprocidade apropriada – valores que pressupõem que nossos relacionamentos
com os outros são centrais para nossa compreensão de quem somos” (WARREN,
1990, p. 143).
244
TÓPICO 3 | ÉTICA AMBIENTAL
6 ECOLOGIA PROFUNDA
Assim como há democratas (com a letra “D” maiúscula, filiados a um
partido político, por exemplo) e democratas (com um “d” minúsculo, pessoas,
independentemente da filiação partidária, que concordam com Winston
Churchill que a democracia é a pior forma de governo, à exceção de todos os
outros), assim também existem Ecologistas Profundos (com um "E" e "P"
maiúsculos) e ecologistas profundos (com um "e" e "p" minúsculos). Os últimos,
como Aldo Leopold (1949), pensam que a ecologia tem profundas implicações
filosóficas que transforma nossa compreensão do mundo em que vivemos e o que
significa ser um ser humano. Ecologistas Profundos, por outro lado, endossam
a “plataforma” de oito pontos da Ecologia Profunda que Arne Naess (1989) tem
co-autoria com George Sessions (DEVALL; SESSIONS, 2004). Além disso, eles
minimizam a importância da ética ambiental e defendem a realização do Self [com
o “S” maiúsculo]. Em suma, a ecologia profunda é uma orientação filosófica, e a
Ecologia Profunda é uma ideologia.
245
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
7 PLURALISMO
O termo “pluralismo” na ética caracteriza duas coisas igualmente bem.
A primeira é o que poderíamos chamar de “pluralismo social” é a visão de que
perspectivas éticas diversas e muitas vezes inconsistentes devem ser respeitadas
e que pode não haver nenhum princípio moral ou conjunto de princípios, por
mais básico que seja, que todos os agentes morais devam reconhecer. Os direitos
humanos, por exemplo, podem ser amplamente reconhecidos no Ocidente, mas
não em outras partes do mundo; portanto, do ponto de vista de um pluralista
social, para os governos ocidentais, tentar impor padrões de direitos humanos a
sociedades não ocidentais é inadequado.
A segunda é o pluralismo pessoal, que é a visão de que um único agente
moral pode endossar uma variedade de princípios morais diferentes, alguns
dos quais podem ser mutuamente inconsistentes, e empregar um ou outro em
diferentes situações carregadas moralmente. Por exemplo, ao resolver questões
éticas sobre dieta, um pluralista pessoal pode aplicar o princípio de Singer
(2004) de que não se deve causar sofrimento desnecessário aos seres sencientes
e, portanto, decidir não comer carne industrializada. Ao resolver questões éticas
sobre o aborto, ele ou ela pode aplicar o princípio de Schweitzer, de reverência
para a vida, e votar em um candidato antiaborto para um cargo público. E, ao
resolver questões éticas sobre conservação de espécies, a mesma pessoa pode
adotar o princípio de Leopold (1949) de preservar a integridade, estabilidade e
beleza da comunidade biótica e ajudar a salvar uma espécie de planta endêmica
matando as cabras ou os porcos selvagens que a ameaçam.
246
TÓPICO 3 | ÉTICA AMBIENTAL
247
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
LEITURA COMPLEMENTAR
A ética empresarial
Robert C. Solomon
1. Introdução
248
TÓPICO 3 | ÉTICA AMBIENTAL
muitas vezes únicas. Mas, ao contrário destas aplicações, a ética empresarial trata
de uma área do empreendimento humano cujos praticantes, na sua maioria, não
gozam de um estatuto profissional, e de cujos motivos muitas vezes se pensa (e
se diz) serem muito pouco nobres. A cobiça (anteriormente “avareza”) é muitas
vezes citada como o único motor da vida empresarial, e muita da história da ética
empresarial é, consequentemente, pouco lisonjeira para a atividade empresarial.
Num certo sentido, podemos seguir o percurso desta história até à época medieval
e antiga, quando, além dos ataques à atividade empresarial que encontramos
na filosofia e na religião, pensadores tão práticos como Cícero prestaram uma
atenção cuidada à questão da equidade nas transações comerciais correntes. Mas
para muita desta história também, a atenção centrou-se quase totalmente sobre
esse tipo de transações particulares, rodeando este campo de um forte sentido
de ad hoc, uma prática alegadamente não filosófica e afastada a maior parte das
vezes por ser “casuística”.
Mas a própria filosofia virou-se outra vez para o “mundo real”, e a ética
empresarial encontrou ou fez o seu lugar na junção entre os dois. Novas aplicações
e uma renovada sofisticação na teoria dos jogos e na teoria da decisão social
permitiram a introdução de análises mais formais na ética empresarial e, o que
é muito mais importante, a interação com, e a imersão dos, praticantes da ética
empresarial no mundo ativo dos executivos das grandes empresas, sindicatos
de trabalhadores e pequenos empresários consolidou aquilo que tinham sido
elementos duvidosamente amalgamados da ética empresarial numa disciplina,
atraiu o interesse e atenção dos líderes empresariais e transformou praticantes
“acadêmicos” em participantes ativos no mundo empresarial. Por vezes, podemos
acrescentar, até lhes dão ouvidos.
249
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
250
TÓPICO 3 | ÉTICA AMBIENTAL
251
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
252
TÓPICO 3 | ÉTICA AMBIENTAL
253
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
uma tribo isolada das Ilhas Trobriand. Uma cultura empresarial é uma parte
inseparável de uma cultura mais vasta, é no máximo uma subcultura (ou uma
sub-sub-cultura), uma unidade funcional especializada que está num órgão que
está num organismo. Aliás, o que caracteriza todos estes mitos e metáforas é a
tendência para ver o comércio como uma atividade isolada e separada, com valores
diferentes dos valores da sociedade circundante. Acabar com esta perspectiva de
isolamento é a primeira tarefa da ética empresarial.
Por seu lado, a macroética tornou-se uma parte integrante das questões
mais vastas acerca da justiça, da legitimidade e da natureza da sociedade que
constituem a filosofia social e política. Qual é a finalidade do “mercado livre” – ou
é este em algum sentido um bem em si mesmo, com o seu próprio telos? São os
direitos de propriedade privada básicos, precedendo de algum modo a convenção
social (como John Locke ou, mais recentemente, Robert Nozick, defenderam) ou
deve o mercado ser também concebido como uma prática social complexa da qual
os direitos são apenas um ingrediente entre outros? Será o sistema de mercado
livre “justo”? Será a maneira mais eficiente de distribuir bens e serviços numa
sociedade? Prestará suficiente atenção a casos de necessidade desesperada (onde
uma “troca justa” nem sequer está em causa)? Prestará suficiente atenção ao
mérito, nos casos em que não está garantido que haja procura suficiente de virtude
para que esta seja recompensada? Quais são as funções legítimas (e ilegítimas) do
governo na vida dos negócios, e qual é a função da regulação governamental?
Por outras palavras, a macroética é uma tentativa de ter uma imagem global, de
compreender a natureza do mundo dos negócios e das suas funções próprias.
254
TÓPICO 3 | ÉTICA AMBIENTAL
Algumas das falácias presentes neste raciocínio têm a ver com a perspectiva
redutora do comércio como se estivesse orientado para o lucro, e com o retrato
unidimensional e muito pouco lisonjeiro do acionista que foi mencionado
anteriormente; outras (“socialismo puro e duro” e “roubar”) são simplesmente
excessos retóricos. O argumento da “competência” (também defendido por Peter
Drucker no seu influente livro sobre gestão, Management) só faz sentido para
casos em que as empresas levem a cabo projetos de engenharia social que estejam
de facto para além das suas capacidades; mas será que é preciso competências
especiais ou conhecimentos profundos para ter preocupações acerca do emprego
discriminatório, ou das práticas de promoção dentro da empresa, ou dos efeitos
devastadores dos lixos industriais sobre a paisagem envolvente? A resposta geral
a argumentos do tipo do de Friedman que recentemente se tornou popular na
ética empresarial pode ser sintetizada num modesto jogo de palavras: em vez
do “acionista” (stockholder), os beneficiários das responsabilidades sociais da
255
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
Os gestores das empresas têm obrigações para com os seus acionistas, mas
também têm responsabilidades para com outras partes interessadas (stakeholders).
Em particular, têm obrigações para com os consumidores e também para com a
comunidade circundante, assim como para com os seus próprios funcionários
(ver secção 8). O objetivo da empresa é, afinal de contas, servir o público, seja
fornecendo produtos e serviços desejados e desejáveis, seja não prejudicando a
comunidade e os seus cidadãos. Não se pode dizer, por exemplo, que uma empresa
está a cumprir o seu objetivo público se está a poluir o ar ou as reservas de água,
se está a estrangular o trânsito ou a açambarcar recursos comuns, se está (ainda
que indiretamente) a promover o racismo ou o preconceito, se está a destruir a
beleza natural do ambiente, ou se está a ameaçar o bem-estar financeiro ou social
dos cidadãos locais. Em relação aos consumidores, a empresa tem a obrigação
de fornecer bens e serviços de qualidade. Tem a obrigação de garantir que os
seus produtos e serviços são seguros, através de investigação e de instruções
adequadas, de avisos contra eventuais utilizações incorretas. Os produtores são
e devem ser responsáveis pelos efeitos perigosos e pela má utilização previsível
dos seus produtos, por exemplo, a probabilidade de uma criança engolir uma
peça pequena e facilmente destacável de um brinquedo feito especialmente para
o grupo etário a que ela pertence; e hoje alguns grupos de defesa do consumidor
sugerem que tal responsabilidade não deve ser excessivamente qualificada pela
alegação de que “se trata de adultos que sabiam ou deviam saber os riscos do
que estavam a fazer”. Esta última exigência aponta, no entanto, para uma série
de preocupações problemáticas correntes, especificamente, a presunção geral de
maturidade, inteligência e responsabilidade por parte do consumidor e a questão
dos limites razoáveis da responsabilidade por parte do produtor (É óbvio que às
crianças se aplicam considerações especiais). Em que medida deve o produtor
tomar precauções contra utilizações dos seus produtos que sejam claramente
idiossincráticas ou idiotas? Que restrições devem ser impostas a produtores
que vendem e distribuem produtos comprovadamente perigosos, por exemplo,
cigarros e armas de fogo – ainda que haja uma considerável procura desses
produtos por parte dos consumidores – e deve o produtor ser responsável por
256
TÓPICO 3 | ÉTICA AMBIENTAL
Uma questão muito mais séria é, claro está, a mentira pura e simples em
publicidade. Mas aquilo que constitui uma “mentira” não é de todo evidente
neste mundo da sedução, do kitsch e da hipérbole. Talvez ninguém acredite
realmente que uma certa pasta de dentes ou um par de calças de ganga de marca
possa garantir o seu sucesso com a namorada dos seus sonhos (embora milhões
estejam dispostos a arriscar, porque nunca se sabe), mas quando um produto tem
efeitos que podem muito bem ser fatais, a exatidão da publicidade é considerada
com muito mais cuidado. Quando um produto médico é publicitado com base
em informação técnica enganosa, incompleta ou simplesmente falsa, quando um
“remédio para a constipação” é vendido ao balcão com a promessa, mas sem
qualquer prova concreta, de que pode aliviar os sintomas e evitar complicações,
quando efeitos secundários conhecidos e perigosos são ocultados sob a afirmação
genérica “Como no caso de qualquer outro medicamento, consulte o seu médico”,
então a aparentemente simples “verdade na publicidade” torna-se um imperativo
moral e alguns princípios éticos (se não mesmo a lei) foram violados.
257
UNIDADE 3 | ÉTICA APLICADA
258
TÓPICO 3 | ÉTICA AMBIENTAL
direitos com algum tipo de função social” – neste caso, uma função na empresa
(Roles and Values, p. 128). Há certos aspectos do papel e das responsabilidades
de cada um que podem ser especificados num contrato de trabalho e na lei, mas
muitos deles – por exemplo, os costumes locais, os padrões de deferência e outros
aspectos daquilo a que há pouco chamámos “cultura empresarial” – só se tornam
evidentes com o tempo e através do contato com outros empregados. Mais ainda,
não se trata simplesmente de “fazer o nosso trabalho”, mas, por razões de ética e
de economia, de fazer o nosso trabalho o melhor possível. A este respeito parece-
me correto o que diz Norman Bowie: “Um trabalho nunca é apenas um trabalho”.
Tem também uma dimensão moral: orgulho no nosso produto, cooperação com os
colegas e preocupação com o bem-estar da empresa. Mas, é claro, estas obrigações
decorrentes do papel têm os seus limites (por mais que certos gestores tentem
negar isto para sua conveniência). O comércio não é um fim em si, está ao invés
inserido e é sustentado por uma sociedade que tem outras e mais importantes
preocupações, normas e expectativas.
259
RESUMO DO TÓPICO 3
260
• Kenneth Goodpaster argumenta que todos os seres vivos, tanto plantas quanto
animais, têm interesses e merecem “considerabilidade moral”.
• Como o biocentrismo se ocupa exclusivamente de indivíduos biológicos, não
de totalidades biológicas, é uma abordagem da ética ambiental que parece tão
restritiva que seria impossível de praticar, e uma abordagem que tem pouca
relevância para o conjunto de problemas que constituem a crise ambiental.
• O ecocentrismo proporcionaria a considerabilidade moral a um espectro de
entidades ambientais não individuais, incluindo a biosfera como totalidade,
espécies, terra, água e ar, bem como ecossistemas.
• A teoria da ética ambiental de Rolston ordena hierarquicamente indivíduos
intrinsecamente valiosos de uma maneira familiar e convencional.
• Leopold aponta que a ecologia representa os seres humanos como membros
não apenas de múltiplas comunidades humanas, mas também da “comunidade
biótica”.
• O ecofeminismo é uma análise de questões e preocupações ambientais do
ponto de vista feminista e, vice-versa, como um enriquecimento e complicação
do feminismo com insights extraídos da ecologia.
• Ecologistas profundos (com um "e" e "p" minúsculos), pensam que a ecologia
tem profundas implicações filosóficas que transforma nossa compreensão do
mundo em que vivemos e o que significa ser um ser humano.
• Ecologistas Profundos (com um "E" e "P" maiúsculos), endossam a “plataforma”
de oito pontos da Ecologia Profunda e minimizam a importância da ética
ambiental e defendem a realização do Self [com o “S” maiúsculo].
261
AUTOATIVIDADE
262
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