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George

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“George” – Maria Judite de Carvalho

Resumo do conto:
Esta história desenrola-se em torno da mesma personagem feminina, George, desdobrada
na menina, mulher e velha, o que representa as três idades da sua vida.
George saiu de casa com cerca de 18 anos, rumo a Amsterdão, à procura da sua liberdade
e fugindo da sua realidade e da incompreensão dos pais. O seu talento era desenhar.
Agora tem 45 anos e tornou-se numa mulher de sucesso, reconhecida pintora, viajada,
mulher de muitos amores («casou-se, divorciou-se, partiu, chegou, voltou a partir e a
chegar»), cabelos sempre pintados de cor diferente, «malas ricas», «dinheiro no banco» e
a sua casa holandesa.
É com o regresso à sua terra natal, depois de cerca de 20 anos de ausência, que surge a
convivência imaginária entre a George adulta, a Gi adolescente e a Georgina, «velha».
George – Gi: reencontro à saída da estação, quando George vem para vender a casa de
família (falecidos já os pais) – diálogo imaginado que mostra ao leitor a menina de outrora,
indecisa entre ficar em terra ou sair de casa; referência a um namorado antigo, Carlos, e ao
enxoval que a mão lhe andava a fazer para ser uma mulher igual a tantas outras, votada à
lida da casa. Gi termina este diálogo e «sorri o seu lindo sorriso branco de 18 anos. Depois
ambas dão um beijo rápido, breve, no ar, não se tocam, nem tal seria possível, começam a
mover-se ao mesmo tempo devagar (…). Vão ficando mais longe, mais longe, e nenhuma
delas olha para trás.» Este diálogo imaginado, repleto de memórias, está sempre rodeado
de um «ar queimado», que George continuamente sente.
Regressada ao comboio para voltar a Amsterdão, George relembra memórias e afasta-se
desse passado, à medida que o veículo se afasta fisicamente da estação «Agora está à
janela a ver o comboio fugir de dantes, perder para todo o sempre árvores e casas da sua
juventude».
No comboio, fecha os olhos e pensa; quando os abre, vê sentada à sua frente «uma mulher
velha», Georgina, 70 anos e segura de que a vida passa rapidamente, aconselhando
George a não ser dramática, pois viverá feliz na sua casa até morrer. Claro que Georgina é
outra das figuras desdobradas de George, ela mesma, mas na terceira idade. Esta confirma
o retrato dela mesma enquanto «rapariguinha», conservado na mala a vida inteira.
«Porque… o tal crime de que lhe falei, o único sem perdão, a velhice. Um dia vai acordar
na sua casa mobilada…»
George fecha os olhos novamente e, quando os reabre, a «mulher velha» desaparecera. O
seu último pensamento? Confiada na pertença do ainda tempo presente, «Georgina
suspira, tranquilizada. Amanhã estará em Amsterdão na bela casa mobilada, durante
quanto tempo?, vai morar com o último dos seus amores.»
Tópicos de análise em “George”

Infância – adolescência - juventude → Gi: a obediência aos pais; o conflito de


gerações (pais incultos e ligados à terra natal vs. Filha ambiciosa que quer uma
vida melhor e liberdade), por isso emigra, deixando tudo para trás.
As três idades da Idade adulta → George: o tempo atual, de realização pessoal, profissional e
vida: amorosa (George conseguiu ter sucesso como pintora, o que lhe deu bons
rendimentos/dinheiro e liberdade para ir vivendo os seus amores).

Velhice → Georgina: o que considera «um crime» - o «único sem perdão», pois
o espelho será implacável e dir-lhe-á a verdade: está fisicamente enrugada,
decrépita e vive até à morte na sua «casa mobilada».

Realidade: George com 45 anos a fazer a viagem de comboio até à sua terra natal
em Portugal; George no regresso a Amsterdão.

O diálogo entre
Memória: lembranças do passado, da sua antiga vida, da família (através do
reencontro e diálogo imaginados com Gi); outras lembranças que vão
realidade, desaparecendo, à medida que o comboio se afasta da estação onde entrou.
Lembranças no futuro, prevendo.se velha (Georgina) e refletindo sobre o que terá
memória e acontecido dos 45 até aos cerca de 70 anos.

imaginação: Imaginação: apesar de fisicamente não conversar com, Gi nem com Georgina, da
sua imaginação resulta a verdade de uma realidade – a vida nas suas três grandes
idades: juventude, idade adulta e velhice. É a partir desta realidade que Maria
Judite de Carvalho consegue caracterizar cada uma dessas fases da vida,
totalmente reais e irreversíveis.

As transformações físicas de George, que refletem diferentes estados psicológicos


Metamorfoses da e existenciais, acompanham as várias fases de facetas da sua vida adulta: «Mais
tarde partiu por além terra, por além-mar. Fez loiros os cabelos, de todos os loiros,
figura feminina: um dia ruivos por cansaço de si, mais tarde castanhos, loiros de novo,
esverdeados, nunca escuro, quase pretos, como dantes eram. Teve muitos
amores, grandes e não tanto, definitivos e passageiros, simples amores, casou-
se, divorciou-se, partiu, chegou, voltou a partir e a chegar, quantas vezes?»

Tudo começa com uma crescente insatisfação com a vida pacata, vivida numa
família com poucos recursos e ausência de cultura/de conhecimento do mundo.
Daí surge a sensação de incompreensão e a luta pela autonomia e pela liberdade.

O escape/a evasão pelo desenho, durante a juventude com os pais, como único
meio de libertação.
A complexidade da Durante a idade adulta, George tanta livrar-se de tudo o que a prenda a algum
natureza humana: lugar, o que se nota no facto de gostar de vender os seus livros, estando sempre
pronta a sair ara qualquer outro mundo, sem amarras.

Nesta fase, a complexidade manifesta-se também pelo constante mudar de sítio,


de aspeto físico, de namorados, pelo casamento, divórcio e recomeço de outras
(e novas) formas de viver.

Na velhice, esta complexidade fica demonstrada pelo inevitável reconhecimento


da decrepitude física (o espelho não engana), da vida agora sem grandes
objetivos e do regresso a uma «casa mobilada» (símbolo de estabilidade),
esperando, resignadamente, a morte.

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