MAIRA MORAES DOS SANTOS Rev
MAIRA MORAES DOS SANTOS Rev
MAIRA MORAES DOS SANTOS Rev
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
Jaime Cubero:
São Paulo
2015
MAÍRA MORAES DOS SANTOS
Jaime Cubero:
Orientadora:
Profª Dra. Doris Accioly e Silva
São Paulo
2015
Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial desde trabalho, por qualquer
meio convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a
fonte.
Catalogação na Publicação
Serviço de Biblioteca e Documentação
Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo
Orientadora:
Profª Dra. Doris Accioly e Silva
Banca Examinadora:
Julgamento:_______________________Assinatura____________________
Julgamento:_______________________Assinatura____________________
Julgamento:_______________________Assinatura____________________
Julgamento:_______________________Assinatura____________________
Julgamento:_______________________Assinatura____________________
À
à família Cubero's (imensamente): Parmênides, Maria, Maruja, Eanne e pequena Sofia. Acolheram-
me em suas casas, em suas vidas e compartilharam comigo suas histórias e memórias, não há como
descrever essa gratidão.
minha mãe, Sandra Maria Moraes, minha amiga e companheira com a qual divido todos os meus
anseios e desejos, uma ouvinte atenta às minhas leituras.
meu pai, Marcos Ferreira dos Santos, por sua orientação, compreensão e por ser uma referência, não
só bibliográfica, mas de vida.
meus irmãos: Gibran e Lucas, amados companheiros que com suas brincadeiras alegram meu viver.
Solange Cleide Francisco meu socorro sempre disponível, paciente e cheio de carinho.
às pessoas do Centro de Cultura Social, da Biblioteca Terra Livre, Casa da Lagartixa Preta, Núcleo de
Estudos Libertários Carlos Aldegheri e demais coletivos libertários que abriram espaço para vivenciar
e compartilhar práticas libertárias.
aos participantes e monitores das atividades do Lab_arte da FEUSP que proporcionaram vivências
únicas, onde educação, arte e cultura não possuem fronteiras.
aos inúmeros docentes que contribuíram e contribuem com minha formação e constantes
transformações, nesse caminho infinito da aprendizagem.
E finamente, grata
à enorme paciência das pessoas que conviveram ao meu lado ao longo desse processo do mestrado,
aos alunos, aos colegas de trabalho, todos que acompanharam tanto os momentos de felicidade e
superação, como os momentos de desespero e aflição que esse conhecimento institucionalizado nos
proporciona.
Resumo
SANTOS, Maíra Moraes dos. Jaime Cubero: uma trajetória de práticas libertárias
para a educação e para a vida. 2015. 185 f. Dissertação de Mestrado. Faculdade
de Educação, Universidade de São Paulo. São Paulo, 2015
COLHENDO FRUTOS..........................................................................................................151
CRONOLOGIA.....................................................................................................................155
APÊNDICES.........................................................................................................................165
1. Quadro das participações de Jaime Cubero em eventos.............................165
2. Mitos de origem - narrativas dos começos....................................................169
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................................179
Índice de Imagens
Imagem 11 – Dedicatória.....................................................................................................126
no ofício múltiplo
de sábio e sapateiro
um homem se cria
palmilhando pregos, sonhos,
lutas e sentidos
nascidos da dura dignidade da matéria
no ouvir
acolhe o outro
que então se reconhece.
a palavra em alteridade
é maré de epifanias
1
REVISTA VERVE, 2008, p. 251-252
2
Noção foucaultiana da vida como obra de arte.
3 O roteiro utilizado nas entrevistas, bem como os pontos da conversa com Maria Cubero, seguem no
12
Itinerário de formação: prenúncios da investigação
Toda vez que respondo à pergunta: o que me trouxe até aqui? Estou
respondendo pelo meu destino, estou dialogando com potências que
me formaram como sou.
Marcos Ferreira Santos &
Rogério de Almeida
Somado a esse quadro de indiferença e preguiça que se torna cada dia mais
nítido nas instituições de ensino públicas e privadas (e em diversas outras
instituições e relações de trabalho), o ambiente escolar tem reencenado em sua
estrutura os aspectos da contemporaneidade relatados acima. Isso se evidencia nos
casos, cada vez mais recorrentes e alarmantes de violência de alunos contra
professores e entre eles. Violência não só física, mas implícita em frases como:
“Professor, você não tinha mais o que fazer em casa, porque você veio?”, “Sou eu
quem pago seu salário. Que nota é essa que você me deu?”. O número expressivo
de professores afastados por transtornos psíquicos, reabilitados que não podem
ouvir o barulho do sinal da escola que entram em estado de pânico, são casos
14
frequentes. O apelo da sociedade de consumo e a incompatibilidade salarial da
categoria de professores os direcionam à jornadas exaustivas de trabalho, 12 ou até
14 horas/dia, divididas em mais de uma unidade escolar. Cobranças de ordem
meramente burocráticas totalmente desvinculadas da atividade de ensinar
consomem os horários reservados para o chamado planejamento pedagógico. Tais
circunstâncias constrangem o exercício da docência, embora felizmente, apesar de
todas essas limitações ainda haja alguma resistência. Ainda há quem vença esses
obstáculos e realize trabalhos que resgatam sentidos e torna a aprendizagem um
processo significativo e prazeroso ao docente e ao aprendiz.
Embora atual, nos relatos de Herbert Read, já está expressa a falta de sentido
e a desumanização presentes na década de 1950 resultados de um longo caminho
percorrido na educação formal. Nesse caso, ele indica uma educação artística, com
base libertária, como possível solução para a retomada dos sentidos da existência:
Como Jaime Cubero faleceu em 1998, meu encontro com ele se deu pela
leitura de seus escritos, entrevistas e outros textos que o citavam. Encontro de puro
deleite. Apaixonei-me perdidamente pelas ideias, atitudes e pela forma como elas
eram apresentadas, e com muito carinho e dedicação me debrucei para escrever o
projeto de mestrado. Durante a elaboração do projeto me deparei com um número
expressivo de pessoas do meu círculo de afinidades que conheceram Jaime Cubero,
por meio do Centro de Cultura Social (CCS), e revelavam a importância dele em sua
formação.
Escolhendo sementes
Optei pela escolha de trajetória para apresentar a vida de Jaime Cubero, por
acreditar que todos nós percorremos um trajeto antropológico singular (FERREIRA-
SANTOS & ALMEIDA, 2012, p. 77-78). Uma dinâmica incessante de trocas entre o
objetivo e o subjetivo. A trajetória implica a permanente tensão entre as esferas das
sensibilidades e subjetividades frente ao objetivo e coercitivo impostos pelo mundo
em que vivemos. Se por um lado não podemos escolher previamente o campo
objetivo, podemos por meio do campo das sensibilidades e subjetividades alterar
nossa maneira de mediar essa tensão interna e agir para alterar as condições dadas.
Há, também, nuances no subjetivo pelo objetivo, não se trata de instancias
impermeáveis. Portanto, esse trabalho não é uma mera descrição biográfica dos
fatos ocorridos na vida de Jaime Cubero, mas a tentativa de iluminar os elos e nexos
de sua trajetória, atentando para as escolhas realizadas, a atitude adotada e o
legado formativo em que reside um dos principais ensejos da reflexão e da pesquisa.
2
Noção foucaultiana da vida como obra de arte.
17
A questão da trajetória integra de modo muito forte, as filosofias
existencialistas para as quais não é a essência que determina a existência, mas a
existência que determina a essência. Encontramos em autores como Sartre, Camus
e Simone de Beauvoir um desnudamento do universo coercitivo a partir do qual é
possível o exercício da liberdade. Ainda nessa direção é possível lembrar Spinoza
para quem a liberdade é consciência de necessidades – Somos tanto mais livres
quanto melhor conhecermos o que não nos torna livres.
Capitulando
Mas essa pesquisa precisa ser regada com água direta da fonte, fonte que
transborda nos depoimentos, sem os quais teríamos uma pesquisa murcha, seca,
sem vida. São os depoimentos-água que dão vivacidade à pesquisa e permitem seu
crescimento para florescer as ideias oriundas desse percurso. Os depoimentos
irrigaram todo o resgate da trajetória de Jaime Cubero em Trajetória de Jaime
Cubero, irrigada pelos depoimento (Capítulo III) dividido em temas recorrentes
em seus manuscritos e nos próprios depoimentos.
19
voltamos o olhar para esses princípios na perspectiva deixada por Jaime Cubero –
que se formou a partir daqueles.
21
22
CAPÍTULO I - Adubação Teórico-Metodológica
Cada pesquisa é única. Por mais que possa utilizar métodos compartilhados,
a singularidade de cada pesquisador fará desse método uma apropriação única. A
pesquisa, assim como a obra de arte, exige técnicas, porém é a prática que origina a
técnica, uma vez essa técnica sistematizada, se torna método. Cada criação exige
adaptações da técnica e novas linguagens nascem do entrelaçar de técnicas e
métodos em sua experiência. Nessa pesquisa não é diferente, existem algumas
metodologias que nortearam a sua elaboração, mas foi necessária certa confluência
para atender os anseios da pesquisa e da pesquisadora.
23
libertária na São Paulo do início do século" do Coletivo Cinestesia, com a direção de
Carlos Romani, Humberto Pimentel e Oldimar Cardoso, filmada em 1995, há
também uma entrevista com Jaime Cubero sobre a educação libertária.
Além das entrevistas, alguns textos escritos por Jaime Cubero que já foram
publicados, como "As ideias força do Anarquismo" na apostila do curso livre (que era
ministrado no CCS) intitulados "Anarquismo: Atualidade e Reflexão" (s/d), ou
"Reflexos da Revolução Russa no Brasil", publicado na Revista Libertárias (1997) e
no Boletim do CCS (2007); "A organização específica" (1990); ou o Histórico do CCS,
disponível até hoje na página virtual do Centro de Cultura Social. Outros não foram
escritos por Jaime Cubero, mas transcritos de suas palestras, a exemplo do texto
"Antimilitarismo e Anarquismo" que foi publicado na Revista VERVE do Nu-Sol -
Núcleo de Sociabilidade Libertária do Programa de Estudos Pós-Graduados em
Ciências Sociais, PUC-SP (2002); "Razão e Paixão na Experiência Anarquista",
publicado na revista Libertárias e divulgado pelo portal do Nu-Sol; e "Educação
independente da escola" registro de um seminário que foi publicado pela editora
Achiamé em 1996 ao título de "Educação Libertária: textos de um Seminário"
organizado por Raquel Stela de Sá Siebert.
Após sua morte em maio de 1998, alguns depoimentos foram feitos em sua
homenagem como o texto "A semente e a Estrela (adeus a Jaime Cubero)" de José
Carlos Orsi Morel, ou o pequeno relato da historiadora Margareth Rago (IFCH -
UNICAMP) sobre quem foi Jaime Cubero, ambos bem difundidos na internet.
Muitos também são os materiais e textos que ainda não foram publicados,
como a correspondência entre Jaime Cubero e os estudantes a respeito de vários
temas, a exemplo disso tive acesso a uma carta enviada à Jaqueline em 23 de maio
de 1990 sobre o Amor Livre, em que ele faz um apanhado com base em
informações daquilo que ele leu, participou e viveu do tema, e assim reúne em 5
(cinco) laudas uma belíssima abordagem do tema.
24
Você vê que tem o original. É o que a gente está fazendo com a Christina
[Christina Lopreato] e o Morel [José Carlos O. Morel]. Na verdade a ideia era
fazer uma compilação dos textos dele. Então estávamos transcrevendo, já
tem uma boa parte feita. Transcrevendo e corrigindo, comparando com os
originais no intuito de fazer uma compilação. (PARMÊNIDES apud SANTOS,
Dez/2013, p. 23)
Inclusive quando ele [Jaime Cubero] morreu, o Zeca [José Carlos O. Morel],
eu [Parmênides] e o meu pai [Chico Cuberos] e a Christina foi quem
organizou esse amontoado de coisa do jeito que está. Está tudo
organizadinho aqui. (op. cit., Dez/2013, p. 31)
25
Durante a pesquisa foi possível colher os depoimentos a partir da
metodologia da história oral de: Nilton Melo e Miquelina Veiga, militantes do CCS
que conviveram ativamente com Jaime Cubero entre fim dos anos 80 e os anos 90;
Parmênides Cuberos, sobrinho de Jaime Cubero; e Maria Cubero, companheira de
Jaime.
O uso dos depoimentos oriundos de outras fontes que não tinham por objetivo
a atual pesquisa contribui para uma visão ampliada da repercussão do pensamento-
ação de Jaime Cubero na formação das pessoas que com ele conviveram. Tal
procedimento minimiza questionamentos sobre uma possível manipulação na
mediação das entrevistas realizadas, pois há similitudes entre os dois tipos de
depoimentos.
Como se trata de resgatar a trajetória de alguém que faleceu sem deixar sua
biografia é necessário um resgate por meio da história oral (HOLANDA e MEIHY,
2010) que possa contribuir com os elementos que auxiliem na reconstrução de sua
trajetória, com os relatos sobre suas atitudes, concepções e práticas cotidianas.
Mesmo com acesso a uma possível biografia, não conseguiríamos captar essas
dimensões somente com base em fatos datados e não necessariamente articulados
entre si.
26
planejadas desde o projeto e executadas com o intuito de expor uma faceta histórica
não reconhecida fora da comunidade de destino. Como a pesquisa não se embasou
somente nas narrativas orais, estamos num quadro de história oral híbrida. Todas as
entrevistas foram temáticas, não sendo objetivo realizar a pesquisa por meio de
história de vida (HOLANDA e MEIHY, 2010).
A memória/história das ditas minorias tem sido resgatada pela sedução que
envolve esse resgate, e devemos vigiar até que ponto nós nos colocamos como os
interpretes dessas memórias, como "defensores" daqueles que foram
negligenciados pela "grande" história; e quando a transformamos em História, será
que não estamos nós assumindo esse caráter político e manipulador com que
Halbwachs define a história?
Tal preocupação é necessária, para não crer que "a pesquisa" seja a única
possibilidade de validar essa história, antes o seu inverso, somente por meio dessa
história é que valido a pesquisa. Mas há, sem dúvida, a intenção de disseminar uma
história para dificultar o seu apagamento.
Dos depoimentos colhidos por meio das entrevistas, mesmo sendo essas
temáticas e guiadas por um pequeno roteiro 3 que buscava ancorar a conversa,
transbordavam lembranças e memórias e constituíam uma relação entre
experiência-memória social-oralidade que Doris Accioly e Silva (2005b) denominou
de depoimentos ressonantes, em seu trabalho sobre a Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras de São José do Rio Preto:
3 O roteiro utilizado nas entrevistas, bem como os pontos da conversa com Maria Cubero, seguem no
anexo 1
30
memórias mais involuntárias surgiam carregadas de afetividade, com suas
totalidades emocionais e "charme" afetivo. (SEIXAS, 2009, p. 47)
Jacy Seixas irá afirmar que “a dimensão afetiva e descontínua relegada pela
memória voluntária é a dimensão exilada que parte das ciências humanas tem
buscado precisamente integrar, com o estudo dos mitos, das sensibilidades e
paixões políticas, da imaginação e do imaginário na história” (2009, p. 48).
A sensibilidade criadora referida por Accioly e Silva pode ser o que Seixas
pondera sobre as memórias involuntárias: é este trazer à tona que constitui o
fundamento mesmo da memória, pois o passado que "retorna" de alguma forma não
passou, continua ativo e atual e, portanto, muito mais do que reencontrado, ele é
retomado, recriado, reatualizado (SEIXAS, 2009, p. 48).
31
Uma ambição, uma pretensão está vinculada à memória: a de ser fiel
ao passado; desse ponto de vista, as deficiências procedentes do
esquecimento (...) não devem ser tratadas de imediato como formas
patológicas, como disfunções, mas como o avesso de sombra da
região iluminada da memória, que nos liga ao que passou antes que o
transformássemos em memória. (p. 40)
Ainda como conclusão parcial, Ricoeur nos fornece um aparato com o qual
podemos compreender a memória como fonte fidedigna para pesquisa:
33
(...) para uma investigação existencial, a comunicação é um enigma e
até mesmo um milagre. Por quê? Porque estar junto, enquanto
condição existencial da possibilidade de qualquer estrutura dialógica
do discurso, surge como um modo de ultrapassar ou de superar a
solidão fundamental de cada ser humano. (...) o que é experienciado
por uma pessoa não se pode transferir totalmente como tal e tal
experiência para mais ninguém. (...) E, no entanto, algo se passa de
mim para vocês, algo se transfere de uma esfera de vida para outra.
Este algo não é a experiência enquanto experienciada, mas a sua
significação. Eis o milagre. A experiência experienciada, como vivida,
permanece privada, mas o seu sentido, a sua significação torna-se
pública. (op. cit., p. 27-28)
35
36
CAPÍTULO II - Arando Conceitos
4
Embora como forma de movimento social de massa, o anarquismo tenha chegado ao Brasil por
meio dos imigrantes. Há pesquisas, como a de Pierre Clastres (1979) que indicam a presença de
princípios do anarquismo (como rejeição ao Estado, apoio mútuo, entre outros) em nossa matriz
Guarani. Devemos lembrar também que a Colônia Cecília no Sul do Brasil, foi uma comunidade
anarquista autorizada pela monarquia como experiência de práticas coletivas de convívio e gestão,
destituída pelos republicanos. Houve ainda entre os republicanos federalistas ideias próximas aos
anarquistas e alguns republicanos se tornaram anarquistas, com o Edgar Leuenroth.
37
greve de 19175. Apesar de tantas conquistas e realizações, a maioria da população
brasileira não conhece o seu papel, poucos sabem dessas passagens em nossa
história, o que demanda de todo pesquisador na área ao menos uma breve
apresentação.
5
Para mais informações sobre a Greve Geral de 1917 ver tese de Doutorado da Prof. Christina da
Silva Roquette Lopreato intitulada: O Espírito da Revolta (A Greve Geral Anarquista de 1917)
apresentada ao departamento de História do IFCH da UNICAMP, sob orientação do Prof. Dr. Edgar S.
De Decca em agosto de 1996.
38
e suas ações repressivas contra os anarquistas, e, mais tarde, uma
historiografia de direita ou realizada no espírito da mesma III
Internacional. (p. 115-116)
O que assegura aos libertários que essa convivência seria pacífica é uma fé
de base próxima à rousseauniana 6 de que o homem é bom por natureza, porém
corrompido pelo estabelecimento da propriedade privada, que origina a
desigualdade. Há, entretanto, uma diferença latente e exponencial entre aspectos do
pensamento rousseauniano e o anarquista. Para Rousseau o Estado seria o
responsável por equacionar a desigualdade, prever a liberdade dos homens e
mediar os conflitos. Já os anarquistas estão convictos de que o Estado não é capaz
de realizar tal tarefa, pois é um dos responsáveis pela manutenção da desigualdade
entre os homens, assegurando sua própria existência. O Estado, nessa perspectiva,
não se empenha no fomento à autonomia individual e social, antes ele estabelece
elos de dependência com, e entre, os cidadãos, forçando-os a crer na extrema
necessidade do próprio Estado.
Mas talvez não seja apropriado chamar de fé, o que nasce de uma
constatação empírica, cotidiana e de uma prática histórica. Veremos, no decorrer da
pesquisa, que os fatos ocorridos no cotidiano foram fundamentais para fortalecer a
convicção de militantes anarquistas, como no caso do próprio Jaime Cubero.
6
Vale ressaltar que Rousseau é um autor aceito por uma parte dos anarquistas e totalmente refutado
por outros. Inclusive por sua proposta educacional, que para muitos era totalmente demagógica, uma
vez que Rousseau abriu mão da educação de seus próprios filhos.
39
Além das constatações cotidianas de seus militantes, outra posição, de cunho
científico, reforçou as possibilidades de uma sociedade sem Estado, sem
concentração de poder, que poderia ocorrer com base na solidariedade: foi a
constatação de Kropotkin sobre o apoio mútuo:
Pode parecer óbvio que um grupo que deseja uma nova sociedade e, por
conseguinte, uma nova mentalidade, encontre na educação e na cultura a forma de
desenvolver isso em profundidade e escala. É visível o “sucesso” de seu uso pela
Igreja e pelo Estado como estratégia eficaz de manter o controle sobre os corpos e
mentes domesticados para atender seus interesses. Os anarquistas buscaram na
educação e cultura ao mesmo tempo ferramentas de combate à estrutura existente e
de criação do novo.
O primeiro período era caracterizado por realizar fortes críticas ao ensino que
vigorava, ou seja, o dominado pelo Estado e/ou pela igreja, pois esse ensino só
40
reproduzia as formas de dominação. Período em que foram pautadas propostas
genéricas para modificar a educação. Com a divulgação do programa deu-se inicio
ao segundo período que já apresentava de forma mais clara o combate direto ao
ensino instaurado, com uma opção para substituir o modelo existente, apostando no
poder transformador da educação, desde que sustentada por bases igualmente
transformadoras.
Ousadia maior, para a época, foi propor seu caráter misto. Em um mesmo
espaço, meninos e meninas recebendo o mesmo ensino. A coeducação sexual foi
42
um dos pontos mais inovadores, pois nessa época, as meninas das classes mais
abastadas até podiam estudar, mas em colégios para meninas, nos quais o sexo
oposto não poderia estudar, na maioria das vezes colégios de caráter confessional.
Ainda nesse texto a autora deixa claro o motivo da repressão das instituições
quando um professor dentro de uma estrutura hierarquizada tende a modificar sua
prática educativa, para uma prática anárquica:
Para elucidar sobre o que chamamos de princípios libertários, farei uso das
próprias palavras de Jaime Cubero, extraídas do texto "As Ideias-força do
Anarquismo" (s/d), porém encontradas também no texto "Razão e Paixão na
Experiência Anarquista" (2007):
Michael Parenti (2007) alimenta o debate sobre Cultura, mostrando seu lado
arquitetado que não deve ser observada como um elemento neutro:
A cultura não é uma força abstrata que flutua no espaço e desce sobre
nós, embora dadas as formas aparentemente subliminares em que
nos influencia pode parecer algo oblíquo e incorpóreo. Em resumo,
nós recebemos nossa cultura através de uma estrutura social, de uma
rede de relações sociais que implicam outros grupos primários, tais
como a família, e outras associações comunitárias ou, como é cada
vez mais frequente, através de instituições formais como as escolas,
os meio de informação, as agencias do governo, os tribunais, as
corporações, as igrejas, e o exército. Ligadas por relações comerciais
ou por persuasão aos interesses dos que dominam a sociedade, tais
instituições sociais se apresentam enganosamente como
politicamente neutras, especialmente por parte dos que ocupam
posições de mando dentro delas ou se beneficiam das mesmas. (op.
cit., p.16 – tradução livre Doris Accioly e Silva)
A Ciência deve ser algo vivo; caso contrário, não passa de ciência
escolar miserável (...) A grande arte do professor, tanto de geografia
como de qualquer outra ciência, consiste precisamente em saber
mostrar tudo completamente e de vários e infinitos pontos de vista, a
fim de conservar sempre o espírito estimulado e facilitar
incessantemente novas conquistas. (RECLUS, apud CODELLO, 2007,
p. 196)
Reclus, em uma carta datada de 1881, faz suas críticas ao uso de livros
escolares na formação das crianças. Aponta como esses livros podem cercear o
pensamento e a criatividade da criança. Tais livros carregam uma verdade dada,
irrefutável que se torna um alimento morto, pois se apresenta como algo já findado,
a que nada mais pode ser acrescido. Acredita que o professor possa fazer uso
desses livros para seu estudo comparativo, para levantar as diversas possibilidades
de compreensão que deverão ser transmitidas às crianças como algo vivo.
49
Em todas as tentativas que fizemos para definir o lugar que a arte
ocupa na sociedade, lutamos continuamente contra a ideia de que a
arte é algo não natural, de que o artista é um indivíduo raro e
excêntrico, que tem muito pouco a ver com o homem comum. Mas só
os grandes artistas é que são diferentes, só o gênio é que é excêntrico.
A apreciação da forma, a percepção do ritmo e da harmonia, o instinto
capaz de criar coisas belas e funcionais – essas são as características
normais do ser humano, inatas mais do que adquiridas e que
certamente estão presentes na criança desde os primeiros anos de
vida. Ensinamos arte às crianças – ou talvez nem cheguemos a fazê-lo
– mas não percebemos que as crianças são, de qualquer modo,
artistas. Tão inevitável como o fato de que caminham, cantam, falam e
jogam, elas são também artistas. A arte é apenas um dos métodos que
os homens utilizam para expressar-se – o método que lança mão do
traço expressivo, da cor expressiva ou da forma plástica. (1981, p. 258)
50
capacitar cada aluno a ser o principal mestre de si, abolindo as
avaliações para que não sofressem o opróbrio dos incapacitados ou os
louros da vitória, capazes de desenvolver sentimentos de
superioridade que comprometeriam a ética libertária. (p. 32)
Sua militância no movimento anarquista desde muito jovem ficou ainda mais
forte quando aos 18 anos assumiu o cargo de Secretário Geral do Centro de Cultura
Social e foi sempre reconduzido ao cargo até 1954 quando muda para o Rio de
Janeiro onde morou por 10 anos.
53
O CCS assim como outros centros libertários sempre se propôs e mantém o
desenvolvimento de atividades sociais:
Jaime Cubero passou pelo golpe de 1930, por toda a Era Vargas, pela
Constituinte de 1946, pelo período pós-segunda Guerra Mundial, pelos governos
Juscelino, Jânio Quadros e João Goulart, O golpe e a ditadura militar, a
redemocratização, o desenrolar da constituição de 1988, o plano real,
acompanhando também todas as mudanças no cenário internacional. Para melhor
contextualização dos cenários que cercaram a vida de Jaime Cubero, ao final do
trabalho está disponível uma cronologia com fatos ocorridos dentro e fora da
conjuntura do movimento anarquista.
Por falta de oportunidade para seguir seus estudos, Jaime Cubero só teve 3
anos de ensino formal, concluindo o primário aos 10 anos de idade. Não fez o 1º ano
por falta de vaga e foi matriculado direto no 2º ano primário. Tornou-se um
autodidata que teve importante contribuição na formação de vários estudiosos e
militantes antiautoritários, igualmente nos meios universitários e estudantis de forma
geral, orientando informalmente inúmeras teses sobre a história das lutas sociais no
país e a própria pedagogia libertária.
54
Accioly e Silva (2011) constata a importância de compreendermos a
pedagogia libertária, principalmente por suas experiências que conciliam conceitos e
práticas, separados em uma configuração formal e tradicional de ensino:
Essa paixão pedagógica pode ser observada por meio da trajetória de Jaime
Cubero. No entanto, Jaime Cubero dizia que "o anarquismo tinha que ser
primordialmente vivido e não explicado" (apud MOREL, 1998, p. 1) e ele o viveu
intensamente.
55
Maria Oly Pey, na mesma sintonia que Accioly e Silva (2011), revela motivos
para que os estudiosos da área da educação pesquisem, compreendam e
primordialmente experimentem a proposta anarquista:
Por considerar Jaime Cubero como um militante, que em seu papel educativo
estabeleceu o diálogo e a coerência teórico-prática indispensável à experiência
libertária de ensino, é possível afirmar que ele foi, e ainda o é, um dos motores do
movimento:
56
CAPÍTULO III - Trajetória de Jaime Cubero, irrigada pelos depoimentos
Miquelina Veiga:
E ao mesmo tempo surgia uma dúvida "Será que a gente vai poder ter
um diálogo? Vai haver um diálogo?" E não só houve como em vários
momentos eu já tinha a impressão que o Jaime era um dos mais
jovens ali (risos) essa questão da jovialidade era um traço muito
marcante. (apud SANTOS, out/2013, p. 2)
Nilton Melo:
Em uma entrevista realizada com Jaime Cubero em 1998, ele aponta como os
períodos de repressão e censura podem provocar rupturas no movimento:
Jaime Cubero conclui o texto sobre Leuenroth usando parte de uma metáfora
do próprio Edgar Leuenroth, que pode se aplicar ao seu próprio legado:
Durante a conversa, Nilton Melo conta que dentre as pessoas que participam
atualmente do CCS, cerca de 70% são os "ex-punks" que foram acolhidos no Centro
de Cultura, em especial pelo próprio Jaime Cubero, que era, entre os velhinhos, o
único que tinha mais paciência com eles. Vejamos o que o próprio Cubero diz a
respeito:
59
Só para abrir parênteses aqui eu não considerava os punks uma
instância anarquista. (...) Depois é que evoluíram e formaram o
anarcopunk, aí já passaram a estudar. (apud SILVA, 2012, p. 30-31)
[...]
Houve, porém um caso entre os punks que deixou todos os militantes mais
desconfiados, causando muita discussão dentro do grupo. Mesmo sem perguntar, o
caso do Leonardo Morelli apareceu nas duas entrevistas e o próprio Jaime Cubero
relata o caso em uma entrevista:
60
foi, praticamente, o responsável por arrasar o movimento anarco-
sindicalista no Brasil. Agora é muito mais difícil. Os grupos começam a
perder credibilidade. Um sujeito só fez esse estrago. Por isso que nós
temos que tomar cuidado, tem que ter responsabilidade. (CUBERO
apud SILVA, 2012, p. 30)
Esse foi um dos fatores que levou o movimento a se fechar e agir de forma
mais desconfiada e precavida com as pessoas que não eram muito conhecidas.
Faço questão de destacar esse fato, pois se foi lembrado por todos os entrevistados
não poderia ser ocultado.
Jaime Cubero, Edson Passetti, Paulo Collen e Leonardo Jaime Cubero apresentando o tema “Anarquismo: uma
Morelli no CCS em 12/DEZ/1987 discussão sobre o verdadeiro socialismo”, à direita
Roberto Freire. Foto de Rui Takeguma em Espaço
Cultural Rabo de Arraia / Olinda – PE (20/03/1991)
61
3.2. O Centro de Cultura Social – CCS
O Centro de Cultura Social de São Paulo, mais conhecido como CCS, foi o
espaço de maior atuação de Jaime Cubero e tinha como proposta ser um espaço
aglutinador de pessoas que estivessem interessadas em adquirir conhecimentos,
cultura, debater assuntos variados, não exclusivamente anarquistas, como
Parmênides pontua:
Embora Parmênides relate que "tinha que ouvir o que as pessoas propunham
e dialogar" isso não era tão harmonioso como pode aparentar, muitas pessoas
interrompiam as falas e ofendiam uns aos outros. Nesses momentos Jaime Cubero
também aparecia como um apaziguador, para tentar acalmar os ânimos e retomar
as atividades. Como todo espaço que se mantém aberto ao público em geral, muitos
passam, mas nem todos criam raízes:
[...]
Tudo o que a criatividade num espaço não reprimido possa germinar (op. cit).
Esse era, e ainda é, o objetivo maior de todos os coletivos libertários, possibilitar o
espaço e o encontro necessário para germinar todas as possibilidades da
criatividade humana. Não é um objetivo modesto, mas factível dentro da perspectiva
libertária.
63
Por meio dos depoimentos de Miquelina Veiga e Nilton Melo podemos
perceber que o CCS cumpriu e cumpre os seus objetivos. Foi lá que eles
começaram a interagir dentro do movimento e, aos poucos, foram incorporando em
suas vidas, em suas atitudes, os princípios libertários. Segundo Jaime Cubero (1987)
o CCS, assim como os outros centros, era a porta de entrada e, conforme as
pessoas fossem demonstrando interesse e responsabilidade, poderiam talvez
participar do movimento mais "específico":
64
Entre os membros do CCS para todas as decisões buscava-se um consenso,
por mais trabalhoso e desgastante que fosse. Mas ao chegar a esse consenso
sempre tinha certa gratificação, como nos relata Parmênides Cuberos:
O Centro não tem presidente, tem essa comissão de gestão onde tem
um secretário geral que representa o Centro, porque pela lei tem que
registrar o Centro para que ele tenha uma atividade pública, aberta,
caso contrário ele é clandestino. Há exigência de ter alguém
responsável (...) o secretário que representa o Centro junto às
autoridades, se precisar de alvará, resolver questões burocráticas...
(...) E o Edgard me propõe para secretário do Centro. Eu disse que
não tinha condições, que não era capaz. "Não, você tem. Os outros
ajudam...". E falaram, falaram e o resultado foi que acabei virando
secretário. Fui secretário quase que permanente do Centro porque em
toda a reunião para a escolha do novo secretário eu era sempre
reconduzido, isso até 1954, quando me mudei para o Rio de Janeiro.
Assim foi minha "entrada" no anarquismo. (apud SILVA, 2012, p. 11)
Para Jaime Cubero o CCS foi sua entrada oficial para a militância. O convite
para conhecer o centro ocorreu na ocasião do casamento de sua irmã gêmea Aurora,
com o Liberto, filho de José Lemos, que já tinha contato e vivência com os militantes
anarquistas. Jaime Cubero resolveu fazer um discurso sobre "Amor livre" e isso
chamou a atenção dos militantes presentes, entre eles Edgard Leuenroth, quem
mais apostou em Jaime Cubero como figura que daria continuidade ao movimento.
7
Não poderia deixar de pontuar aqui, que tive contato com essa noção de política, ainda em minha
infância, por meio da participação no Projeto “Cala-boca já morreu!”. Após um encontro em que
queríamos compreender o que era política um dos participantes voltou e disse: - “Eu fiz política! Eu
dei bom dia a uma pessoa que não conhecia”. Creio ser uma forma bem expressiva e simples, como
só as crianças podem formular, para começar compreender o que é esse conceito de política.
66
pelo endurecimento do regime militar, retornando às atividades na primeira chance
de abertura:
Edgard Leuenroth tinha razão, Jaime Cubero foi, em grande parte, a figura
responsável por dar continuidade ao movimento, agindo como fio condutor para as
novas gerações que surgiam no CCS. Como nos revela Nilton Melo sobre a
importância de Jaime Cubero como uma referência, ao chegar no CCS em 1992:
O CCS, entretanto, não era uma exclusividade de São Paulo, ou algo que se
iniciou só em 1933. Espaços semelhantes foram criados em vários locais do Brasil
entre o final do século XIX e início do século XX, como os trabalhos de José Damiro
de Moraes (2009), Angela Maria de Souza Martins (2009), Kátia Rodrigues Paranhos
(2009), Carlos Romani (2006), entre outros, ressaltam. Tais espaços eram sempre
vinculados aos trabalhadores e operários, como reforça Jaime Cubero:
67
Os centros de cultura atuavam, e ainda atuam, como uma alternativa frente a
tantas instituições repressoras da sociedade. Um ponto de resistência onde os
rebeldes são bem vindos. Todos os que não encontram sentido na organização
capitalista ou na presença do Estado, encontram nesses centros de cultura um ninho
acolhedor. Sua forma de atuação, por meio de uma educação e cultura não
institucionalizadas, irá desenvolver uma consciência crítica, que faça dos homens e
das mulheres, seres livres. Livres na atuação das ideias, sem influências estranhas
ou artificiais à natureza de cada indivíduo (CUBERO apud VALVERDE, 2007, p. 405).
68
É nesses pequenos detalhes da prática cotidiana que o espírito libertário é
revelado. A horizontalidade das relações, a ausência de uma hierarquia que separa
a mesa da plateia, um diálogo se instaura. Como Jaime Cubero pontua: não se trata
de uma aceitação inquestionável, mas sim de travar um embate de ideias na busca
de um consenso, ou de uma apuração dos pontos de vista. Isso nem sempre é
tranquilo e harmonioso, há conflito, mas a busca de manter o respeito é
indispensável, pois eram pessoas que na semana seguinte estariam novamente
dividindo o mesmo espaço. Ainda que não só, trata-se de um princípio prático da
convivência.
Essa vivência não poderia ser definida de forma mais significativa do que
como um "exercício da condição humana extremamente rico". É disso que se trata a
experiência vivencial do CCS, ressaltando as condições, onde segundo GUSDORF
(1987), temos a formação de mestres e discípulos. E onde os discípulos ao
percorrerem seu próprio caminho podem se desvencilhar dessa relação com o
mestre e estabelecer a relação de amizade. O discípulo não é subalterno ao mestre,
ele está disposto a aprender e seleciona seu mestre que logo passará a ser amigo.
Com essa prática é possível reforçar a ideia de que a escola é apenas um dos locais
possíveis de educação, longe de ser o único. A educação é muito mais ampla do que
a escola.
69
Aos poucos, por meio das palestras, era despertado nesses jovens recém-
chegados o desejo pelo conhecimento e eles puderam contar com a figura de outra
pessoa muito importante para indicar uma leitura que daria continuidade ou
aprofundaria o assunto da palestra: Antônio Martinez (1915-1998). Segundo os
relatos, Martinez chegava sorrateiramente durante a palestra ou após o seu término,
abordava as pessoas que ele percebia que tinham maior interesse e já deixava com
elas um livro ou cópia de texto.
O Martinez era o pai duro, que dava bronca e falava aquele espanhol,
e dava bronca na gente "Pô! Vocês tem que dar exemplo, lê isso que
vocês precisam" e o Jaime era a mãe bondosa, que afagava, que via
a gente falando besteira e dizia "não, sim, sim... mas olha vai por esse
outro lado..." (Op. Cit., p. 8)
Miquelina Veiga diz que é mais fácil falar do Martinez em comparação com
Jaime Cubero, pois eram contrastes que se complementavam. Quando começava a
palestra o Jaime estava na mesa e o Martinez estava na porta, só que isso era o
visível (apud SANTOS, Op.Cit., p. 10). O invisível é a confiança que um depositava
70
no outro, a amizade e trocas entre esses dois narradores8, um público: Jaime Cubero,
e outro mais reservado: Antonio Martinez.
71
dramaturgia. Jaime Cubero também teve participação, mas nesse espaço de
atuação, seu irmão é quem recebia os holofotes. Jaime Cubero relata o período do
Laboratório de Ensaios e como eles se desvencilhavam da censura em plena
ditadura militar:
Embora oficialmente não fosse uma escola, aquele espaço era de fato grande
aprendizagem. Por meio da arte é possível uma reflexão imensurável e particular a
cada um que assiste ao espetáculo. Cada espectador vai realizar a sua leitura do
espetáculo a partir das suas referências. Parmênides Cubero disse que entre os
anos de 1990 e 2000 o CCS realizou várias leituras dramáticas, peças, recitais que
funcionavam como forma de atrair o público e introduzir leituras importantes aos
recém-chegados ao coletivo.
Inicio com uma citação de Jaime Cubero, que condensa muitos conceitos e
perspectivas norteadores de sua ideologia e prática. Essa citação aparece no texto
"O Anarquismo: Uma Visão da Educação da Criança na Família" de 1995 e se
repete em um texto de 1997, publicado pela Libertárias, intitulado "Razão e Paixão
na Experiência Anarquista":
[...]
[...]
É, portanto, sobre esse poder social que a proposta libertária se guia. Ainda
na ânsia de delimitar a forma cuberiana de compreensão do anarquismo, segue a
citação que considero a mais provocativa, que nos força a refletir sobre a atualidade,
mesmo tendo sido escrita há 20 anos:
75
instâncias da vida social e ninguém considera isso um crime,
somente os anarquistas. (CUBERO, 2005, p. 2 – grifos meus)
[...]
[...]
Na última entrevista cedida por Jaime Cubero ele tentou sintetizar o conceito
de anarquismo e demonstrar que não é uma questão de aguardar a oportunidade
revolucionária para colocar em prática seus princípios, eles devem ser praticados
diariamente:
[...]
Mas você não vai esperar que aconteça isso. Você começa a criar,
aqui e agora, no teu cotidiano, na tua casa, nas rodas de amigos,
práticas de novas formas de relações sociais não autoritárias. Eu acho
que hoje a nossa grande luta é uma luta anti-autoritária, contra o
autoritarismo, a começar por si mesmo. Você tem que ter consciência
do que você é para tentar evitar ser autoritário. (CUBERO apud SILVA,
2012, p. 14 -15)
Jaime Cubero irá defender uma posição sobre a liberdade que é muito
contrária ao jargão "sua liberdade termina onde começa a minha", nessa visão
libertária a liberdade não é limitada pela do outro e sim ampliada pelo exercer dos
outros. É possível perceber a influência dos autores clássicos do anarquismo, além
do citado Bakunin temos também Godwin e Malatesta, árduos defensores da
realização pela vontade, assim como Élisée Reclus e outros. Porém, para Jaime
Cubero, mais importante do que manter esses conceitos na teoria, o anarquista
deveria ser aquele que os coloca em prática, pois se trata de uma questão ética.
Sobre isso Jaime Cubero faz uma ponderação que revela muito de suas próprias
atitudes:
77
O norte do anarquismo repousa em fundamentos puramente éticos e
morais, porque o anarquista sente, simplesmente, prazer em ser digno.
É a atitude ética que ele coloca em face da justiça, da equidade, da
dignidade humana, da elevação e superação do homem pelo homem.
(apud VALVERDE, 2007, p. 402)
Um ponto que a maior parte das pessoas questiona, inclusive entre as que se
consideram "de esquerda" é qual seria a solução para as questões econômicas sem
a presença de um Estado. Segundo Cubero a chave estaria também no campo da
ética:
Isso demonstra, com mais vigor, que o grande "vilão" a ser combatido é o
Estado e o Capital, como diz Cubero: "Ninguém vai pedir licença ao governo para
79
combatê-lo. O anarquismo é, pela sua própria essência, um movimento clandestino."
(apud SILVA, 2012, p.16). E esse combate não necessariamente deve ser um
combate direto, o anarquismo tem a faculdade de se reciclar, é algo que não é
fechado, ele está sempre aberto a novas contribuições, ele evolui com a evolução do
mundo e das técnicas (op. cit., p.18). Identifico o anarquismo como um líquido que é
capaz de penetrar nas porosidades da sociedade, em épocas acaloradas evapora,
mas logo se condensa para na primeira oportunidade se precipitar sobre a superfície
novamente.
Hoje em dia você sem dinheiro não faz nada, não paga a gráfica, a
aparelhagem de uma rádio. A televisão tem um poder de comunicação
enorme. Eu vi isso quando fui no programa do Jô Soares. Foram 22
minutos falando de anarquismo e no dia seguinte parecia que todo
mundo me conhecia, muitas pessoas falaram que me viram. (...) Teve
uma repercussão grande. Fizeram uma pesquisa por amostragem. O
programa do Jô é tarde e é dirigido para um público específico, não é
operário, nem quem tem que trabalhar no dia seguinte que assiste,
são intelectuais, estudantes... A projeção dava que o programa era
assistido por 10 milhões de pessoas, é muita gente. Se nós
tivéssemos o acesso à televisão, você imagina o estrago que a gente
poderia fazer. (CUBERO apud SILVA, 2012, p.19)
Atualmente, a internet tem sido uma grande aliada para que diversos
movimentos sociais possam divulgar seus ideais. Porém seu caráter pulverizador
acaba fazendo com que as pessoas que já conhecem o movimento mantenham o
contato, mas passam de forma efêmera às demais pessoas. O lado positivo das
redes sociais é que pela sua capacidade de espalhar informações, algumas pessoas
que nunca ouviram falar de tal movimento social, podem ver uma publicação
aleatoriamente e se interessar.
80
Particularmente sou muito cética quanto a esse meio de comunicação. Pois
ao mesmo tempo em que tem uma ampliação de público, na internet a sensação
que temos é a de que tudo é efêmero. Não é interessante para os meios de
comunicação colocar em pauta a questão do anarquismo, se em algum momento
tivesse sido, o termo anarquia/anarquismo, pelo menos, já teria sido desvinculado do
conceito do que lhe foi atribuído e incorporado pelo senso comum, de ser bagunça e
desordem. Inclusive por que já dizia Élisée Reclus em seu livro Crescimento da
Liberdade no Mundo: "A Anarquia é a mais alta expressão da ordem". (apud
CUBERO, 1989, p. 74-75)
81
Jaime Cubero ficou claro o caminho com base em alguns contextos históricos que
ele mesmo esclarece:
82
capitalista. Embora admitisse que esse processo necessitasse de vários processos,
entre eles, a sensibilização e a formação a partir da elaboração crítica da
experiência do próprio trabalhador.
[...]
83
O fato é que no Brasil se praticou o anarco-sindicalismo desde as
primeiras organizações de resistência, a ponto de um membro do
secretariado Geral da AIT, em 1987, ao ler os conceitos e moções
aprovados no 1º e 2º Congressos Operários de 1906 e 1913, disse ter
encontrado aqui a forma mais clara e adequada de expressão do
anarco-sindicalismo. (...) Não é nada mais do que a autogestão dentro
do movimento operário. (Op. Cit., p. 51- 52)
Jaime Cubero não ficou só na teoria e nos textos, teve voz ativa quando foi
jornalista no Jornal O Globo. Segue abaixo o seu próprio relato sobre o motivo de
sua demissão:
84
Claro que a turma não ia se humilhar tanto, mesmo assim teve uma
moça que escreveu. (CUBERO apud SILVA, 2012, p. 22 - 23)
Após algumas vezes em que foi abordado, por outros funcionários do jornal O
Globo, para que reconsiderasse e voltasse a trabalhar no jornal, Cubero respondeu
na mesma toada:
Fala para o Dr. Roberto que, eu, Jaime Cubero, só volto a trabalhar
n'O Globo se o Roberto Marinho escrever um documento dizendo que
ele se enganou me demitindo, prometendo nunca mais cometer tal
engano e eu prometo não usar esse documento no Ministério do
Trabalho, mas me reservo o direito de mostrar para todos os
demitidos". (Ibid., op. cit)
85
Imagens 03 – Jaime Cubero no Jornal O Globo – Matéria publicada em 13/MAI/1957
“VIERAM OBSERVAR COMO FUNCIONA “O GLOBO” – Estiveram em visita ao nosso jornal alguns dos responsáveis
pela revista SPV, da Diretoria de Rotas Aérias, especializada em assuntos do Serviço de Proteção ao Vôo (donde o
seu nome, SPV). A organização do Arquivo os impressionou de modo especial tendo sido cumprimentado, por isso, o
chefe daquela seção, nosso companheiro Liberto Lemos Reis. “Vamos tomar o exemplo de O GLOBO em várias das
nossas iniciativas”, disse-nos o secretário geral da revista, Sr. Fernando Pinheiro. *** Na gravura, os visitantes (os três
da direita), Srs. Odair de Oliveira, Florisvaldo de Oliveira Couto e Fernando Pinheiro, recebendo algumas explicações
do nosso companheiro Jaime Cubero, no arquivo, a respeito da organização do fichário de pessoas.
[...]
87
Quando Jaime Cubero (apud SILVA, 2012, p.24) fala sobre os períodos de
repressão, ele tende a afirmar que além da censura declarada, as próprias pessoas
se autocensuram como forma de autodefesa, afastando-se dos movimentos políticos
a fim de se preservarem.
88
Entre tantos, um exemplo internacional foi a fala proferida na exposição
Barcelona Anarquista de outubro de 1992, em que Jaime Cubero falou acerca de
sua concepção do anarcosindicalismo.
Nos apêndices temos um quadro com a relação de parte dos eventos em que
Jaime Cubero foi convidado a participar. Essa relação foi compilada a partir de
cartazes, folhetos, cartas-convites e manuscritos que Jaime Cubero preparava para
suas falas. Portanto, sabemos que não se trata da totalidade dos eventos que teve
sua participação, mas já é uma amostra rica. Os documentos foram organizados por
Christina Lopreato, Parmênides Cuberos e José Carlos O. Morel, após a morte de
Jaime Cubero, e estão guardados na residência de Parmênides Cuberos, que os
confiou a mim para realização dessa pesquisa.
O quadro ajuda a reforçar que Jaime Cubero era solicitado em sua maioria
por seu conhecimento histórico. Dos 42 eventos listados 33% são sobre uma
abordagem histórica; depois temos a recorrência de eventos que abordam o
anarquismo de forma geral, sendo 31%; os que exigem uma fala direcionada às
questões sindicais e aos trabalhadores são 17%; e a educação, como tema direto,
aparece em 14%; os outros 5% são temas específicos, como o voto e a paisagem
urbana.
Mesmo que a educação, como tema direto, corresponda a apenas 14% dos
eventos em que Jaime Cubero foi convidado a participar, percebo na leitura de seus
manuscritos, diversas vezes citados na pesquisa, que ele incluía a educação e o
anarquismo em todas as suas falas, que sempre envolvia a questão do
conhecimento, da formação e dos princípios anarquistas-libertários.
Em uma carta enviada à Jaqueline sobre o "amor livre" é possível notar como
Jaime Cubero era solicitado para realização de pesquisas e o seu pronto
atendimento às demandas:
[...]
89
O tema do amor livre e de organização da família, num contexto
anarquista, têm sido amplamente tratado em artigos e trabalhos
publicados em jornais e revistas libertárias, às vezes de forma
fragmentária no meio de assuntos mais gerais. Uma pesquisa
acadêmica sobre o assunto demandaria muito tempo, considerando
ainda a dificuldade de acesso a fontes primárias de documentação.
Por isso, no âmbito de uma carta, procurarei transmitir alguns
conceitos que possam se constituir numa informação mínima que
talvez possa se traduzir numa ajuda para você. (CUBERO, 1990, p.1)
9
Parmênides Cuberos relata também essa procura ao Jaime Cubero e aos materiais do Centro de
Cultura Social e aponta para a crítica feita sobre o pouco retorno para o movimento anarquista em si,
embora considere toda forma de divulgação válida. No final dos anos 1980 e 1990, com a abertura
política, muitos estudantes, em especial, descobriram o movimento anarquista com a retomada mais
pública das suas atividades e utilizaram os materiais e documentos que durante muitos anos eram
guardados pelos militantes para defender mestrados e teses. Mas somente alguns é que mantiveram
algum contato com o movimento anarquista posteriormente. Alguns não retornaram nem mesmo para
devolver materiais, documentos e livros que acabaram se perdendo. Essa foi a fonte para muitas
críticas da apropriação descompromissada por uma parcela de acadêmicos.
90
Ciências Sociais. Muitas editoras passaram a criar coleções sobre o
Anarquismo. A Contexto criou uma coleção enorme. A uma dada altura,
o Jorge perguntou-me se podia fazer um levantamento exaustivo
sobre o Anarquismo. Foram feitas pesquisas de investigação sobre o
Anarquismo e mesmo teses de doutoramento. O Arquivo do Edgar foi
importantíssimo nesse aspecto. Eu próprio fui convidado para o visitar.
(...) a difusão do anarquismo foi mesmo muito grande. Fomos
convidados para fazer cursos nas Universidades, palestras, etc.
Foram abertos espaços grandes neste campo na Universidade de São
Paulo. O trabalho na universidade para nós foi muito importante.
Havia quem não o considerasse como tal. Temos tido muita adesão a
este campo. Os auditórios têm estado sempre lotados. (CUBERO
apud FERREIRA, Op. Cit., p. 7)
91
forma explicita, era por meio do seu exemplo, criando grupos de estudos, munindo
seus alunos de autonomia. Como ocorre no Nu-Sol - Núcleo de Sociabilidade
Libertária do Programa de Estudos Pós-Graduados em Ciências Sociais da PUC-SP,
e no Lab_arte - Laboratório experimental de arte, educação e cultura da FEUSP,
entre muitos outros que não tive contato. Outra pesquisa poderia ser realizada
investigando o quanto esses (e outros) grupos carregam em sua estrutura e em suas
práticas, os preceitos libertários apreendidos originalmente fora do âmbito
acadêmico.
10
Oração
Minh’alma flutua por sobre o Cosmos...
O mundo é criação do meu Sonho...
Eu sou o Criador de mim mesma...
Através de mim perpassam todas as correntes de Amor, refletidas no Arco-Íris de luz da Grandeza
Espiritual dos Cosmos incriados.
Sou um Centro irradiador de poder sobre mim mesma, um ritmo no hino Cósmico, uma nota perdida
na orquestra infinita da Beleza, na concepção máxima a que pode atingir a Mente Humana.
10
A Plebe (SP), (nova fase), ano I, nº6 (31 dez. 1932) apud PRADO e HARDMAN, 1985, p. 32-34
92
O Amor – o Deus único nos parques silenciosos das minhas Catedrais interiores – canta, dentro de
mim, o poema da Vida Eterna.
Os ídolos não os reconheço.
Porque...
Só para amar foi feita a Vida...
Cada ser é um elo da grande corrente do Amor Universal.
Os erros e os crimes lesa-felicidade humana – não estou disposta a continuá-los com a cumplicidade
do meu Ser.
Não matarás – é o segredo da Esfinge na evolução humana.
Jamais levantarei a pureza dinâmica das minhas mãos para macular o meu Ser no sangue de meu
irmão.
Governo todo o meu mundo interior.
Eu sou a Ética e o Luiz da minha própria evolução. Através do meu ser coam-se todas as luzes e
todas as cores e todos os sons e todas as flâmulas de energia do lampadário ondulante da Vida em
todas as suas estupendas manifestações.
Eu sou um átomo de Luz, um criador de serenidade, um dispersador de Forças no grande concerto
Cósmico. Eu sou um ritmo colorido e flamante, em Arco-Íris, refletido no Oceano do Amor e da
Sabedoria. Eu sou o Artista Absoluto, criador dos meus Sonhos, escultor do meu Pensamento,
burilador da estátua do meu Ser, domador de corcel da minha Vida.
Sou forte, tenho uma vontade energética e perseverante coragem e quero ser um canal por onde
perpassem todos os ritmos da Beleza máxima e da máxima Sabedoria.
Sou invencível porque sou o Amor.
Nada pode ser contra mim.
E ninguém, absolutamente ninguém, me pode prejudicar.
Matei de mim o Medo, o Ódio, a Inveja, a Vingança, o Orgulho, a Vaidade.
Não quero mais despertar a besta-fera adormecida, enjaulada nas ciptas profundas do meu
inconsciente instintivo.
O Amor transborda no lampadário dos Astros ou no lampejo cintilante do olhar materno, divinizado
pela maternidade espiritual.
Saibamos extrair o Amor dos escombros, das ruínas, dos erros e crimes perpetuados por todas as
civilizações de bárbaros.
Não sejamos cúmplices dos carrascos do gênero humano.
Glória à Liberdade!
Não mais sirvamos de capatazes e escravos, lacaios do dominismo ou do servilismo e da covardia do
rebanho social.
A minha pátria é o meu coração.
A minha pátria é minha Razão.
A minha pátria é o Universo.
A minha pátria não tem fronteiras: vai até o coração imerso de todo o gênero humano e considerado
nas unidades individuais.
Minha Religião é a Religião do Amor e da Beleza.
A minha metafísica livre é embalada no “sorriso da dúvida e na música do sonho”. É um poema... Não
tenho Religião, porque minh’alma é profundamente religiosa... da Religião, do Amor, da Beleza, da
Sabedoria. Venham a mim, ó meus irmãos, amigos e inimigos. A todos eu amo com a Sabedoria do
Coração.
Apertemo-nos as mãos no gesto altivo e nobre e grade e forte da Solidariedade Individual – para a
Paz entre os humanos, para novos e mais altos destinos no seio da Harmonia Cósmica.
Glória à Liberdade!
Glória à Sabedoria!
Glória à Beleza!
Glória ao Amor!
Glória à suprema Beleza do Amor no coração dos seres humanos.
Glória a tudo que vive e soluça e canta e sonha na escala magnífica – para além do Tempo e para
além do Espaço...
Glória a todas as estupendas maravilhas do Universo de cada Ser livre é um Centro irradiador de
Força e Beleza, de Amor e Sabedoria.
93
Esse poema de Maria Lacerda de Moura é o retrato da concepção da
cosmologia anarquista em sua vertente mais generosa, onde o eu, o outro e o
mundo formam um totalidade indissociável. Bastante próxima das concepções do
que é o mundo para José Oiticica (2006):
Tais posições expressão uma paixão pela vida que se reflete em grande parte
no vegetarianismo assumido por alguns anarquistas por compaixão com os animais;
na busca da preservação e bom uso dos recursos naturais, questões em voga com o
nome de sustentabilidade, que já estavam presentes nos pensadores anarquistas há
mais de um século. A “turma do tomatinho” que é retratada por Jaime Cubero,
demonstra também as contradições à que eles estavam suscetíveis, assim como
qualquer ser humano:
Esse foi um dos pontos que chamou minha atenção ao ler os textos de Jaime
Cubero, pois há muitas referências, inclusive pelo fato de seu primeiro contato
envolvendo o anarquismo, ter sido através de prerrogativas anticlericais. Essas
referências chegaram até ele por meio de José Lemos, anticlerical ferrenho e
militante anarquista, pai de Liberto Lemos (que se tornou seu cunhado ao casar com
Aurora, sua irmã gêmea):
Quando eu tinha mais ou menos 12 anos fiquei muito doente, até fiz
uma cirurgia. (...) Ele (José Lemos) começou a me visitar e
começamos a conversar. Então ali comecei a deixar a religião (...) Eu
95
tinha muito forte aquela coisa de religião quando era menino, e
com aqueles diálogos, aquela coisa toda, ele acabou mudando minha
cabeça. (CUBERO apud SILVA, 2012, p. 8 – grifos meus)
Mesmo com essa base anticlerical, que chegou a alterar sua concepção
religiosa, Jaime Cubero não se tornou uma pessoa sectária, ou preconceituosa com
as religiões, diferentemente de José Lemos, como veremos adiante. Encontrou
inclusive espaço para falar sobre anarquismo dentro de instituições de base católica,
evidentemente, para uma parcela já influenciada pela teologia da libertação:
96
(...) Aí eu disse: "Não temos palestrante, mas temos o frei Rui Manoel.
Ele pode nos falar da teologia da libertação, de qualquer maneira um
tema interessante para nós conhecermos" (...) As moças perguntavam
como um homem bonito como ele resolvia seu problema sexual e
coisas assim. Rapaz, ele deu voltas e acabou dizendo assim: "Eu sou
favorável ao casamento dos sacerdotes, mas eu vou muito além. Sou
favorável a qualquer opção sexual do sacerdote". (Op. cit., p.35-36)
[...] uma das palestras também bastante marcante que a gente teve
através do Jaime, foi o Plinio Marcos. Ele foi lá falar sobre Blavatsky,
que era uma pesquisa dele naquela ocasião. (...) Foi quando ele
publicou a Blavatsky. (...) E foi muito legal por que além da figura
emblemática que ele é, ele se sentia extremamente ambientado num
lugar como aquele (o CCS). E foi uma das coisas mais legais porque
ele foi falar sobre esoterismo, foi falar sobre uma figura que também
era subversiva na Rússia, e que trazia também para o Plinio Marcos
essa questão de espiritualidade. A gente falava de tudo no CCS na
verdade. (apud SANTOS, Out/2013, p. 19)
Eu sou muito como São Tomé: é ver para crer. Mas ao mesmo tempo
não me recuso a ver se a ocasião se oferece. Tem muito anarquista,
como o pai desse meu cunhado (José Lemos), ele xingava deus
"Deus é isso, deus é aquilo". Mas como você xinga deus se você não
acredita na existência dele? (CUBERO apud SILVA, 2012, p. 38)
97
recordou também uma vez em que José Lemos martelou uma moeda com uma
santinha.
Essa postura que busca reforçar certa raiva e intolerância à figura divina, o
próprio Jaime Cubero questiona: como você xinga deus se você não acredita na
existência dele?. Qual a necessidade de provocar algo em que não se acredita?
Talvez somente para se autoafirmar e tentar converter os devotos, chocando-os com
suas ações. Já ao questionar Parmênides Cuberos sobre como foi a questão
religiosa em sua formação, vemos uma postura mais naturalista e indiferente:
Esse “às vezes eu acredito” de Maria Cubero aparece não como um pecado
entre os ateus, mas demonstra uma abertura aos momentos em que um Deus é
bem-vindo para atender as ânsias transcendentais. O próprio Jaime Cubero pondera
que muitos anarquistas possuíam a sua dimensão espiritual, ou religiosa. A
98
espiritualidade se diferencia da religião por estar presente em múltiplas formas de
expressão humana. Mas os militantes que a possuíam não expunham ao movimento
e muito menos procuravam impor suas visões ao restante do grupo:
[...]
Eu aprendi muito com ele, essa coerência ética. No entanto você vê...
vou citar outro exemplo. Aquele professor que fundou as escolas
modernas, o João Penteado. Ele no final da vida virou espírita. Eu
depois encontrei uma série de anarquistas espíritas (que eu acho que
não é incompatível). Ainda hoje conheço alguns. (CUBERO apud
SILVA, 2012, p. 37)
100
3.7. Outros espaços de atuação
[...]
102
Nós fazíamos mesmo assim as atividades clandestinas na Chácara.
Todo mundo passou a frequentá-la. Fizemos mutirões, construímos
um salão de 120m², nós mesmos. Teve um domingo memorável em
que colocamos 3.300 telhas cobrindo, em 30 pessoas, mais ou menos,
inclusive as crianças carregando telha, uns pondo telhas, outros
fazendo o ripamento. Foi um episódio marcante. (Op, Cit., p.28)
Esse grupo que convivia no sítio é o mesmo grupo que em 1985 reabre o
CCS em São Paulo. Por isso, é comum que pareça que os anarquistas ressurgiram
do nada em 1985, mas não era do nada, eles estavam sempre em contato por meio
do sítio e da loja Calçados Cuberos, como veremos adiante. Para a militância era
muito importante que essa convivência reforçasse seus objetivos e princípios, como
ressalta Nilton Melo, na mesma sintonia do depoimento de Jaime Cubero, a
capacidade de exercer a solidariedade e a autogestão:
Por muito tempo o sítio foi mantido em segredo por uma questão de
segurança, nele eram escondidos documentos, livros e até pessoas, um verdadeiro
refúgio. Mesmo após a redemocratização ele foi mantido com algum sigilo. Nilton
Melo conta que só soube da existência do sítio após uns dois anos de convivência
assídua ao CCS, e só foi por ter sido convidado pelo Antônio Carlos.
É rica a descrição de como era a relação dentro do sítio, vivida pelas três
pessoas que foram entrevistadas. Nilton Melo apontando que no início ele via Jaime
Cubero como o dono do sítio, mesmo depois desconstruindo essa imagem, isso era
forte, porque Jaime Cubero era o responsável direto pelo sítio, quem guardava a
chave e sempre mantinha o espaço limpo, carpido e organizado. Já Miquelina Veiga
recorda os jogos de bocha, como algo que a marcou profundamente, por vivenciar
um momento em que a malandragem é elemento de descontração:
Viajei, com o Jaime, uma vez só pra o sítio. (...) Era um à vontade
extremo. Chegava lá e eles já chegavam e se organizavam lá na
intimidade deles e depois era bater perna e era muito interessante,
assim, a gente vê o Jaime no sítio, vê de fato ele no sítio, já tendo
ouvido muitas histórias sobre o sítio. Então a gente via realmente o "à
vontade" que era estar lá, de conhecer aquilo detalhadamente, de
ajudar também nas tarefas e da gente viver ali. O pessoal ia jogar
bocha, mas era muito engraçado. O jogo é muito engraçado, porque
além da habilidade, tem a malandragem, e a gente ria muito, então se
criava até situações com a malandragem que criava situações de
polêmicas e até gritos, mas que na verdade era puro teatro, era muito
engraçado. Então, por exemplo, assistir aquele jogo foi recuperar
práticas que familiares deles, do grupo de anarquistas que
frequentavam o sítio, e também ver como é que era isso, esse jogo
que pertence à cultura ítalo-hispânica, dos imigrantes, e tomar parte
disso. (apud SANTOS, Out/2013, p. 23)
104
Parmênides Cuberos recorda de sua infância, e de sua irmã Thalia, que foi
em grande parte no sítio, onde aprendiam na prática e na vivência o que era o
anarquismo:
Durante a entrevista com Miquelina Veiga e Nilton Melo, relatei que a minha
orientadora, Doris Accioly e Silva, comentou que Jaime Cubero gostava muito de
laranja lima e que suas cinzas foram despejadas sobre o pé de laranja lima que
existia no sítio, mas ele disse: pena que as formigas fascistas mataram o pé de
laranja lima... vou falar que elas são formigas fascistas. O pé não existe mais,
infelizmente. (apud SANTOS, Out/2013, p. 26)
105
07/1972 – Maria Cubero, Navarro, Thalia, Hélio,
07/1972 – As crianças sempre participando
Lis, Francisco Cuberos com Parmênides, Tales,
dos processos no sítio.
Cid, Ed, Lourdes.
06/03/1973 – Almoço coletivo no sítio. Presentes: Jaime Cubero, Ideal Peres, Maria Cubero,
Maruja, entre outros militantes e familiares.
Nilton Melo também relatou que o sítio existe até hoje, porém tem sido difícil
mantê-lo, poucos são os que se habilitam para realizar a manutenção do espaço e
mesmo os encontros realizados lá são esparsos.
106
outras coisas, a sapataria aqui, também no Brás" (Nilton Melo apud SANTOS,
Out/2013, p. 25)
A loja Calçados Cuberos foi o comércio da família que tinha os irmãos Jaime
Cubero e Francisco Cuberos como sócios. Na loja trabalharam, além dos irmãos,
Maria Jimenez (Maruja), companheira de Francisco Cuberos. Comercializavam
sapatos, inclusive os sapatos que eram fabricados por outro irmão, Antônio Cubero
que possuía uma pequena fábrica. Poderia ser uma loja como outra qualquer, porém,
a loja era um ponto de encontro para os anarquistas. Após o expediente muitas
reuniões eram realizadas na loja, muitos livros, documentos e alguns panfletos do
movimento anarquista eram armazenados ali. Jaime Cubero relata a experiência na
loja de calçados:
(...) eu virei sócio do meu irmão que tinha uma loja de calçados. Vendi
um apartamento que eu tinha no Rio e trabalhei com ele até me
aposentar em 79. A loja era na Av. Celso Garcia (São Paulo). Durante
toda a redentora, época em que o Centro estava fechado, nós
fazíamos todas as reuniões dentro da loja. Reuníamos 30, 40 pessoas
lá. Chegamos a fazer reuniões com o secretário geral da AIT
(Associação Internacional de Trabalhadores), com gente de fora. Era
um ponto de referência. Tinha jornalista que dizia: "Ah, sei. Os
anarquistas que se reúnem numa sapataria lá no Brás”. (apud SILVA,
2012, p. 23)
Odair (funcionário), Maruja, Francisco Cuberos e Jaime Cubero Sacola da loja: Calçados Cuberos – Crediário sem entrada
- 05/12/1968 – Av. Celso Garcia, 725 – Brás FONE: 292-6362 – São
Fonte: acervo pessoal de Parmênides Cuberos Paulo
Em destaque: Jaime Cubero e Maria Cubero s/d Em destaque: Jaime Cubero e Maria Cubero s/d
108
Comemoração da Formatura de James (sobrinho) s/d Jaime Cubero e Maria Cubero indo para o sítio s/d
109
Imagem 08 – Jaime Cubero e Francisco Cuberos no sítio década de 1990
De acordo com um relato de Jaime Cubero, no entanto, ele diz não ter sido
logo no início bem aceita pela família a união dos primos:
Após o casamento, Maria e Jaime Cubero moraram por pouco tempo na casa
de uns espanhóis, depois foram morar no terreno da fábrica de sapatos do seu
irmão Antônio, depois no Rio de Janeiro, ao retornar para São Paulo, moraram com
Chico e Maruja, mas depois conseguiram ir morar em um apartamento e, por último,
na casa onde Parmênides mora hoje.
Segundo a Maria, Jaime Cubero falava bem, mas não era muito bonito, diz
que o que ele mais gostava de ler era filosofia e que sempre gostou de cinema, e ela
foi muito com ele ao cinema durante o namoro, depois ele continuou indo, mas ela
não, por que ela preferia ficar em casa.
Ao falar sobre as visitas que o Jaime Cubero recebia em casa, Maria diz que
elas davam um pouco de trabalho. Lembrou-se de uma vez que ela retornou de uma
viagem ao sul do Brasil que tinha feito com Maruja e Chico e quando chegou a casa
tinha um monte de moleques na sua casa, uns até dormiram em sua cama. Isso não
a agradou, mas era bem característico do Jaime Cubero abrir sua casa.
Maria considera como seus maiores amigos, sua própria família, mas nesse
momento percebemos que já era difícil para ela diferenciar o tempo presente do
passado. Entre os amigos próximos citou o Tragtenberg, o Zeca (Morel), o Edgar
Leuenroth e Mario Santos. Maria Cubero nos disse que Tragtenberg esteve presente
111
desde o seu casamento, mas Parmênides e Maruja acreditam que eles se
conheceram depois. Comentaram que o José Carlos Morel conheceu o Jaime
Cubero, por meio do Marcelo Lima que fazia filosofia na USP, segundo eles, foi
assim que o Zeca se aproximou e nunca mais se afastou: "é muito próximo à família".
Quem foi um cara que foi muito próximo do Centro de Cultura e foi
bem amigo do meu tio Jaime, foi o Tragtenberg. Até eu me lembro
bem dele. Como eu era muito bagunceiro, quando ele ia ao sitio ele
falou "Jaime você deveria ter dado o nome desse menino de Heráclito
não de Parmênides. Porque Heráclito era do movimento e o
Parmênides era do ser imutável e tal." Ele falou "Você deveria ter
dado o nome dele de Heráclito". (SANTOS, Dez/2013, p. 22)
11
É importante ressaltar que Maurício Tragtenberg foi próximo do marxismo heterodoxo o que em
alguns pontos de vista se distanciam das posições políticas de Jaime Cubero, mas há sem dúvidas,
mais elementos que os aproximam do que os afastam.
112
brinca dizendo: namorava um pouquinho e ela diz: Bastante! Todos nós rimos e
percebemos como aqueles momentos eram importantes para ela.
Perguntamos então à Maria se Jaime Cubero era amoroso com ela. E ela
afirma: ele era muito, muito amoroso, não tinha nada do que reclamar. Nesse
momento Maria olha para Sofia e diz "Mi amor", após um breve silêncio, Maruja
comenta que é uma pena que ele (Jaime Cubero) não a conheceu. Maria diz que
realmente ela (Sofia) ia ser um show na mão dele.
Ao falar em trabalho, Maruja disse que logo que eles retornaram do Rio de
Janeiro, Jaime Cubero começou a vender livros da Enciclopédia Britânica. Mas
como vendedor ele era um fracasso, porém ótimo organizador, então veio trabalhar
na loja Calçados Cuberos, auxiliando na parte mais administrativa, diz que Thalia,
sua filha, herdou essa característica do tio.
Todo o encontro teve a participação ativa da Sofia, ora com choro, ora com
risadas, comendo sua saborosa papinha de beterraba com frango, azeite, rúcula e
mandioquinha. E logo foi possível perceber o cansaço da Maria, muito tempo sendo
solicitada a lembrar de algo. Durante toda a conversa Parmênides mostrava as
fotografias, perguntando quem eram as pessoas das fotos, quando foi, em qual lugar,
etc. Optamos então por não estender a entrevista-encontro-conversa. Gostaria muito
de ter realizado mais encontros com a Maria, mas para o mestrado não foi possível.
114
Maria Cubero com Sofia e Maruja Maria Cubero com Sofia
Parmênides Cuberos, Maria Cubero, Maíra Moraes dos Maíra Moraes dos Santos com Maria Cubero
Santos, Maruja com Sofia no colo.
115
3 - Nossa vontade se apoia sobre o esforço que é conduzido por
companheiras e companheiros, juntos, a fim de modificar
profundamente nosso comportamento para por em prática, relações
igualitárias e fraternais no sentido da emancipação tanto da mulher
como do homem. (apud CUBERO, 1990, p. 2 -3)
É importante ressaltar nesta postura uma dimensão não sectária, o que era
muito prezado por Jaime Cubero, na busca por romper com qualquer
predeterminação imposta pela sociedade. Quando entrevistei Miquelina Veiga, ela
relatou como era a relação de Jaime Cubero com Maria e vemos que ele praticava
esses princípios dentro da sua relação, na sua intimidade:
Essa questão de ser a única mulher também isso faz quanto tempo,
de 86 para cá? (...) quase 30 anos, então, as questões do feminismo e
da diversidade, ainda não estavam colocadas como estão hoje, então,
uma das coisas que eu guardo assim, em relação ao Jaime, é essa
visão do relacionamento homem e mulher, como uma das coisas mais
positivas que eu pude ver, e mesmo as histórias que o Jaime trazia
em relação ao relacionamento com o feminino, era para mim muita
novidade, por que em termos de história de vida assim, dentro de uma
família patriarcal, em que as mulheres eram para ser vistas e não
ouvidas, e mesmo depois, já na juventude, eu não..., é difícil traduzir,
mas a sensação que eu tinha em relação à questão do gênero, que o
Jaime trazia era muito diferente, e até o fato dele ser de uma geração
116
bem anterior, ficava assim um choque, era muito interessante de ver
que havia outras possibilidades além da dominação masculina
sobre a mulher, em termos assim, dominação não só física, mas
até racional, (...) nesse ponto é uma coisa muito marcante.
Agora por outro lado, também tinha uma coisa assim, como eu era a
única mulher, tinha uma coisa muito reverente também, um respeito
exagerado (...) e eu fui descobrindo em relação a mim mesma, nessa
questão da militância também, respeito demais é ruim, a gente quer
naquele contexto, a gente quer ser tratada da mesma forma... (apud
SANTOS, 2013, p. 4-5 – grifo meu)
Nesse trecho, assim como em outros, Jaime Cubero reforça que a liberdade
está fortemente atrelada às responsabilidades que assumimos com nossas escolhas,
117
nas escolhas amorosas não seria diferente. A base dessa definição de "amor livre"
se repete no texto "Razão e Paixão na Experiência Anarquista", de forma mais
resumida e complementar:
É possível encontrar esse debate sobre o amor livre nos textos de outros
militantes, como podemos observar no texto de Heliodoro Salgado publicado no livro
organizado por Edgar Leuenroth (1963):
Jaime Cubero não aponta para uma mudança na atitude somente da relação
de um casal, mas para uma mudança nas relações familiares como um todo,
visando que o que se projeta para a sociedade deve se iniciar dentro de casa:
118
Na verdade quando eu nasci (em 1969) os três trabalhavam juntos e
moravam pertinho um do outro. Eu fui adotado, mais ou menos, não
adotado, mas eu fui não só filho do meu pai e da minha mãe, mas
também da minha tia e do meu tio Jaime. Sempre com uma
convivência, tive dois pais e duas mães. (apud SANTOS, Dez/2013, p.
1)
(...) isso sempre foi uma coisa que eu achei bonito da parte dele. O
meu tio morreu em 98, mas desde 96-97 a saúde dele começou a
debilitar de uma forma abrupta. Não abrupta, mas começou a decair.
E ele começou a prepará-la para viver sem ele. Porque sabia que ia
morrer antes dela. Isso foi uma coisa muito bonita que ele fez. Aí ele a
preparava, até coisa simples, por exemplo, o meu tio sempre cuidou
de coisas simples como pagar contas em banco, movimentar conta
em banco e mexer com a aposentadoria e tudo. Eu lembro que ele a
preparou: "Não, você vai começar a ir porque você precisa... Eu
preciso te preparar porque eu não estarei aqui daqui um tempo."
(apud SANTOS, Dez/2013, p. 11-12)
Fato que pode ser relevante somente de acordo com certo juízo de valor mas
que se mostra coerente com os valores defendidos pelo próprio Cubero, é que Maria
Cubero foi sua única mulher, por toda sua vida.
120
Segundo Parmênides Cuberos sua tia teve pouca participação ativa dentro do
movimento anarquista. Mas como ele mesmo adverte, depende do que
consideramos participar. Como Miquelina Veiga pontua, a Maria Cubero era uma
interlocutora e uma referência para o Jaime Cubero, acompanhando-o e apoiando-o
em toda a sua trajetória.
Edgard Leuenroth foi uma grande referência em vários aspectos não somente
intelectual e de militância, mas de postura, coerência e dedicação aos seus
princípios. Outra pessoa de grande importância para Jaime Cubero foi o filósofo
Mário Ferreira dos Santos12:
12
Mario Ferreira dos Santos escreveu uma extensa obra. Entre os que são considerados mais
importantes por Jaime Cubero estão os livros que compunham sua coleção sobre grandes temas
sociais, formada por nove volumes que tratam de economia, filosofia e história da cultura e a análise
de temas sociais. (BORGES, 1996, p. 170)
121
minha vida (olha que eu conheci reitores de universidades, escritores,
muita gente), nunca vi uma cultura e uma capacidade tão grande
como a do Mário para expor idéias de um modo tão profundo. Ele
falava como se estivesse lendo um texto super elaborado, tanto que
eu tenho um livro dele em que aproveitou as palestras que dava na
casa dele. (...) O Mário Santos, dentro da minha formação, foi
fundamental, foi meu grande guru. Assistia às palestras dele e ficava
até de madrugada lendo seus livros. (CUBERO apud SILVA, 2012,
p.12)
Às vezes, ouvia o Mário Ferreira falar por três, quatro horas, voltava
para casa e pegava um livro para ler. Não estava cansado, estava
motivado. (CUBERO apud VALVERDE, 2007, p. 408)
[...]
[...]
[...]
Tirei uma nota abaixo da dos companheiros que havia ajudado. Isso
122
foi um detalhe engraçado que não esqueço até hoje. Mesmo assim,
ficou o exemplo edificante de professor.
[...]
123
dele havia sido feito por suas tias e irmã, com saco de farinha tingido. O professor
propôs que a sala que conseguisse que todos fossem com o uniforme poderia jogar
futebol no horário da aula. Jaime Cubero, querendo colaborar, e jogar bola também,
teve o apoio da família e um exemplo no professor:
Jaime Cubero relata também que quando começou a trabalhar ainda era
124
muito novo, por volta dos 10 anos, e quando a fiscalização ia à fábrica, ele, assim
como as outras crianças, era obrigado a se esconder no forro do galpão, pois já não
era permitido o trabalho infantil.
Mesmo tendo ficado órfão de pai na infância, Jaime Cubero teve nele um
grande modelo na prática da solidariedade. Mesmo não sendo categorizada como
uma educação libertária, seu pai já realizava um ensino livre e em prol de um
coletivo:
Quando conhecemos um pouco mais das ações dos irmãos de Jaime Cubero,
vemos que não eram exclusividade dele os princípios da solidariedade e apoio
mútuo, embora somente ele e o Francisco Cuberos se auto declarassem anarquistas.
Antonio, o irmão de Jaime Cubero, era dono de uma pequena fábrica de sapatos,
que eram vendidos na loja Calçados Cuberos e, em seu leito de morte o Antonio
chamou o filho e explicou que a fábrica não seria dele, e sim distribuída a todos os
funcionários da fábrica. Quando o filho questionou o motivo, o pai disse que era para
que os filhos dos operários também pudessem se formar em medicina, como ele
125
pode. Parmênides contou isso para que compreendesse que não se tratava só de
Jaime Cubero, mas que toda a família tinha essa coerência e prática no seu
cotidiano.
O tio Jaime foi uma pessoa que procurou realmente conciliar os ideais
teóricos com a prática do dia a dia, acho que isso é muito importante.
Ele teve uma profunda influência para as pessoas de fora, assim,
imagina para a família (...) Eu e minha irmã, as pessoas mais
próximas dele fomos grandes felizardos de termos um tio como nós
tivemos. (...) Uma figura extremamente bondosa (...) Mas acho que
fundamentalmente o principal legado dele era conciliar todo o
instrumental teórico, ou seja, as atitudes para o dia a dia. E as
pessoas que estivessem em volta dele. Isso realmente foi o mais
brilhante. O legado mais brilhante da vida dele. Educação libertária e
tudo. Realmente fez isso com grande prazer, foi um grande legado pra
mim e com certeza para a Thalia também. (CUBEROS apud SANTOS,
Dez/2013, p. 1)
Imagem 11 – Dedicatória
"Jaime,
[...]
O meu tio sempre teve um negócio também, não era que ele era só
bonzinho. Na verdade eu sofri um castigo dele que eu fiquei muito
sentido. Um castigo merecido. O meu tio sempre dava um
brinquedinho. E eu ficava durante o dia com a minha tia quando eu
era pequeno, porque eles iam para a loja de manhã e eu estudava de
manhã e ficava de tarde com a minha tia. Era tudo pertinho. Era tudo
aqui no Brás. Coisa de duas quadras. E eu ficava com a minha tia
Maria. Meu tio uma vez me deu uma bola, e eu para fazer pirraça para
a minha tia, eu peguei uma faca na cozinha e furei. No mesmo dia.
Pirraça, coisa de criança. Minha tia ligou para o meu tio e ele falou
sério "Eu nunca mais te darei um brinquedo na vida." E nunca mais
ele me deu. Furei a bola e a minha tia ficou chateada, acho que ficou
chorando. Acho que no próprio dia ele foi lá em casa e falou "Olha, eu
nunca mais lhe darei... Que te sirva de lição, eu nunca mais te darei
um brinquedo na vida." Pedagogia de falar não, não é? (SANTOS,
Dez/2013, p. 5)
Essa “pedagogia de falar não” entendo muito mais como uma pedagogia da
responsabilidade. Dizer não e depois recuar seria um estímulo à mentira, ou
demonstrar que ele poderia fazer novamente, que depois de um tempo tudo voltaria
ao normal. Pode ter sido um castigo por conta de um brinquedo, mas se tornou uma
lição de que o que prometemos e afirmamos deve ser sempre cumprido. Nilton Melo,
também relatou que sua lembrança mais significativa foi uma bronca dele,
justamente cobrando mais responsabilidade:
Para mim, foi uma bronca que ele me deu, que ele apontou umas
falhas quando já tava no Centro de Cultura, já tinha passado um
pouquinho a época de punk e já tava no Centro de Cultura como
129
membro e com algumas responsabilidades que não foram cumpridas
e ele fez o favor de apontá-las e falou "Pô! Tem que fazer, fazer direito,
tem que participar..." então na verdade, o que é mesmo afável é o que
mais me lembro, mas valeu, não que eu tenha aprendido, mas (risos)
que ainda continuo falhando muito aqui dentro... (risos) mas pelo
menos ninguém pode falar que ninguém me falou que era para ter
mais responsabilidade, cumprir os horários, nesse sentido, mas
mesmo assim, não houve a desistência (SANTOS, Out/2013, p.9).
(...) Jaime foi fora de série para a gente, quando não tinha movimento
na loja nós falávamos muito sobre relacionamentos com os filhos,
sobre a família; para mim o Jaime foi mais que um irmão, tínhamos
muita confiança para falar, para conversar as coisas. Isso influenciou
muito na educação de meus filhos; o Jaime pegava o Parmênides com
três anos e ensinou ele a ler com uma cartilha, com três anos o
Parmênides já aprendeu a ler. (Maria Martinez Jimenez apud
AVELINO, 2004, p. 118)
Parmênides Cuberos relata que seu tio Jaime Cubero participava ativamente
no acompanhamento escolar, indo a várias das reuniões de pais, até mais que seus
próprios pais. Quando Parmênides já era adolescente, por volta de 1985, foi parar
na diretoria da escola junto com um grupo (no colégio São Judas) e o diretor queria
que eles entregassem a pessoa que tinha feito alguma bagunça, que ele nem
131
lembra mais o real motivo. Mas quando foi coagido a entregar um colega, chamou o
diretor de reacionário, disse que aquilo parecia o DOPS, enfim, utilizou um repertório
apreendido no universo familiar, que foi mal recebido pela escola e quem foi
interceder por ele junto ao diretor foi seu tio Jaime Cubero. Redigiu inicialmente uma
carta e depois compareceu pessoalmente também.
Nosso erro é presumir que essa atividade infantil, cuja existência seria
impossível negar, é apenas uma tentativa ingênua e desajeitada de
imitar a atividade adulta. Em toda a atividade infantil há sempre um
elemento de imitação, mas o que a criança deseja não é imitar, e sim
comunicar alguma coisa utilizando uma linguagem comum. O impulso
sempre presente em todos os trabalhos infantis é uma necessidade
subjetiva interna, não um reflexo semelhante ao do macaco, um
“macaquear” como dizemos, do comportamento adulto. (1981, p. 258-
259)
132
Ainda no texto de Jaime Cubero, ele diz das contradições que as crianças
criadas nesse ambiente anarquista libertário encontram ao entrar na escola oficial, e
as trocas de aprendizagem que elas propiciaram a ele:
Parmênides nos revelou o “método” que Jaime Cubero utilizava para ensiná-
los (a ele e sua irmã Thalia). Dava-lhes uma caderneta em que ele passava
diariamente pequenas lições para que os sobrinhos fizessem, houve ao menos
umas cinco cadernetas para cada um, mas Parmênides tem guardado apenas um
exemplar de 1975, de quando ele tinha seis anos de idade:
“Parmênides
Note bem!
Este livrinho será o roteiro que conterá as
instruções diárias para as lições.
Faça sempre só o que for anotado cada dia –
Titio”
133
Imagem 14 – Caderneta – prova livre
“6 de março de 1975
Amigo, boa tarde.
Hoje é dia da prova livre.
Faça o que quizer, no caderno que quizer.
A nota terá mais valor.
Um abração do titio.”
“7 de março de 1975
Olá amigo,
Muito bem! Gostei muito da prova livre.
Hoje faça números no caderno de linguagem.
Pode fazer como quizer. Fica a seu critério.
Um abração do titio.”
Fonte: acervo pessoal de Parmênides Cuberos
Mário Ferreira dos Santos, que era formado em Direito - a família tinha
tradição na área - e que foi autodidata em Filosofia, dizia que o ato
humano para ser verdadeiramente humano tem que ser livre. Num
livro dele, intitulado Filosofia e História da Cultura, havia uma análise
do que ele chamou de "considerações em torno do ato humano".
Primeiro, o sujeito tem que ter vontade de executar o ato. Segundo,
ter conhecimento da finalidade do ato. Por último, liberdade para a
execução do ato. Senão, não é ato humano. Assim, se passa com o
conhecimento. Com o ato de conhecer. É preciso liberdade para
conhecer, para além do que o Estado e as autoridades impõem.
(CUBERO apud VALVERDE, 2007, 403).
135
romper com os marcos estreitos da escola, buscando integrar a vida social nas
atividades e preocupações de crianças, adolescentes e adultos. Uma das formas
para chegar a essa integração é por meio da arte, arte como criação poética, que
teve uma repercussão mais ampla:
Essas são concepções que vão se repetir em vários textos de Jaime Cubero.
Com essa abordagem, reduzir educação à escola é realmente um erro, pois a
intenção libertária é que a sociedade inteira se torne um espaço de aprendizado,
como na realidade ela é. Toda a sociedade é um espaço de captação de referências,
informações, de suscitar questionamentos, de acordo com os ideais que nela estão
inseridos. Não é só na escola que aprendemos a competição e os valores que estão
impostos: a família, o trabalho, os relacionamentos interpessoais, estão todos
pautados numa conduta autoritária, de posse e de consumo. Por isso, em uma
sociedade ácrata, os ideais e as práticas seriam diferentes e todos os espaços e
instâncias estariam baseados numa perspectiva libertária, sendo necessária
somente uma introdução inicial de estudo (alfabetização) para que os demais
conhecimentos fossem conquistados pela liberdade e vontade de cada pessoa:
138
iam para um quartinho fazer as leituras, cada um lia uma parte. Depois de um tempo
resolveram agregar mais alguns rapazes e moças e formaram o "Centro Juvenil de
Estudos Sociais":
(…) este Centro Juvenil de Estudos Sociais, já com ideias críticas bem
libertárias, anarquistas. Porque, por exemplo, o pai do meu cunhado
(José Lemos) chegou a construir no fundo do quintal uma cobertura
para um dos maiores militantes do Brasil, o Florentino de Carvalho (...)
fundar uma escola dentro daquelas escolas racionalistas que os
anarquistas faziam em qualquer canto. Eles tinham já um certo
envolvimento com o anarquismo... Quando nos reunimos juntamos
mais ou menos 18 pessoas entre moças e rapazes. (CUBERO apud
SILVA, 2012, p. 8-10)
Jaime Cubero aponta como um dos requisitos para ser um professor libertário
a capacidade de transmitir de forma simples e acessível o conhecimento, e ir
progredindo a complexidade junto com o desenvolvimento do educando. Já a grande
139
falha do ensino atual é, para ele, o “aprendizado” voltado para a memória mecânica,
o decorar informações e não compreender conceitos, num ensino voltado para a
finalidade limitada dos exames, das provas (CUBERO, 1992, p. 30).
Para mim, professor não é o que passa matéria, como se diz. Isso
qualquer um pode fazer, desde que habilitado pelo diploma. Professor
é aquele que consegue motivar, despertar o interesse do aluno pela
matéria, com um envolvimento prático, com muita simpatia.
[...]
Às vezes, ouvia o Mário Ferreira falar por três, quatro horas, voltava
para casa e pegava um livro para ler. Não estava cansado, estava
motivado. Há muitos professores dando aula por contingência, a maior
parte deles se desenvolve na profissão, mesmo não gostando dela.
Então, a profissão de professor, que é maravilhosa, é encarada como
uma parte da maldição geral do trabalho. Gostaria mesmo de ter sido
professor, um professor libertário. (CUBERO apud VALVERDE, 2007,
p. 408)
140
nesse ambiente o Jaime propiciava isso. Essa integração mesmo
entre as nossas potencialidades. E então, eu pessoalmente, como eu
já disse, a questão afetiva é marcante, o sentido de enxergar ali uma
pessoa que realmente aproximava. Como é que a gente explica isso?
Como é que a gente adjetiva isso? Liderança? Não, é pouco. Era
assim, um ser humano ímpar, e que fazia com que a gente se sentisse
humana.
142
CAPÍTULO IV - Florescendo Ideias
Jaime Cubero traz em sua prática essa ligação. São experiências vividas ou
incorporadas de narrativas orais ou escritas, memorizadas e novamente transmitidas
por sua narrativa, deixando em seu discurso sua marca, sua interpretação e
possibilitando a cada ouvinte ou leitor a sua própria interpretação, incorporação,
reflexão, que serão memorizadas de forma igualmente singular. Essa ligação
experiência-memória-narração não ocorre de forma linear ou cíclica, mas é antes
uma imbricação.
143
consumo que se consome em imagens sem vida e propaga uma educação de
caráter mercantil baseada apenas em informação:
Não seria nesse mesmo tom que Miquelina Veiga retrata a importância de
Jaime Cubero, como alguém importante para a formação da pessoa Miquelina? Não
se trata de dogmatizar, mas de formar, dar forma, com toda a habilidade de artesão,
um artesão-narrador-educador.
144
seu entorno, quando assume a fala, assume o centro da sala de aula,
assume seu papel no seio do coletivo. Estarão todos à procura
silenciosa de alternativas no comportamento, na atitude, na forma de
organizar o conhecimento, no jeito de administrar os conflitos, nos
silêncios e hesitações, nas provocações e reflexões daquele educador.
Seu mais alto ensinamento é ele próprio e sua construção peremptória,
transitória, frágil e frágua. Esta é a condição do didáskalos (o mestre)
em sua própria didaskalia. Por isso, podemos dizer do ato educativo
como a construção artesã de uma obra de arte - ou mais,
rigorosamente, arte em obra, sempre em relação. Disso não se pode
concluir uma "inflação do ego", com toda a arrogância dos narcisismos
magistrais, mas a responsabilidade e o desafio de tentar a coerência
entre aquilo que se "professa" no discurso com as atitudes e a forma
de ser. Tentar sair da fácil e ilusória esquizofrenia reinante no
magistério - dizer uma coisa e fazer outra completamente diferente.
Daí nossas patologias. Esta concepção artesanal de educação, pois
que é uma arte feita com as mãos (Quíron), no espaço da intimidade e
no tempo construído do manejo, tentativa e erro, sem os arroubos
pirotécnicos do espetáculo (no mau sentido do termo). Mas, na
contemplação ativa fabril e operária de quem tece, entretece, constrói,
amarra, cinge... (FERREIRA-SANTOS, 2010, p. 87).
Durante a leitura dos textos sobre a filosofia trágica, de Clément Rosset (2010
e 1989) e Rogério de Almeida (2010a, 2010b e 2010c) pude encontrar algumas
semelhanças entre a visão de Jaime Cubero a respeito das atitudes libertárias e a
146
aceitação trágica da condição humana e de sua ação como educador, como aquele
que propicia a capacidade de abrir caminhos-escolhas.
Michel Maffesoli (2003) traz uma perspectiva do trágico que corrobora com a
abordagem de Nietzsche e reforça a constatação de uma vida vivida sob forma de
avidez (p. 23). O trágico obriga a pensar se ainda que nada que façamos traga
algum resultado futuro, se ainda assim o faríamos. Se sim, passamos a viver com
intensidade todo e qualquer momento de vida. Arte de viver fundada já não mais na
busca da liberdade absoluta, mas nas pequenas liberdades intersticiais, relativas,
empíricas, e vividas no dia-a-dia (op. cit.).
13
De acordo com o Vocabulário de Friedrich Nietzche desenvolvido por Patrick Wotling (2011), o
amor fati é uma retomada da fórmula do estoicismo romano, sendo literalmente “amor ao destino”,
expressão pela qual designa o assentimento, o sim, como atitude geral para com a realidade.
Tratando-se de pensar uma relação afetiva e não gnoseológica com o destino: não a resignação em
face a fatalidade inelutável, mas, muito pelo contrário, a aceitação alegre, e mesmo o fato de sentir a
necessidade como uma forma de beleza.(p. 14)
147
Jaime Cubero escolheu o anarquismo como sua forma de vida no mundo, tomou
posse de seu destino e o amou. Viveu a liberdade possível e apresentando aos
demais essa possibilidade, essa escolha.
Essas dimensões afloradas em Jaime Cubero podem soar como algo utópico.
Mesmo após relatar na pesquisa que não se trata de uma teoria vazia, mas sim,
uma crítica prática, uma reivindicação atuante, incorporadas no pensamento-ação
cotidiano desse militante. Para desvencilhá-la do sentido pejorativo que a palavra
utopia carregou e ainda carrega no meio científico-acadêmico resgato um trabalho
magnífico de Maurício Tragtenberg.
148
Maurício Tragtenberg (2011) faz um resgate das utopias desde a Renascença,
dialogando com diversos pensadores – Bacon, Saint-Simon, Thomas More,
Campanella, Rousseau, Fourier, Proudhon, Bakunin, Buchez, entre outros –
revelando que a utopia sempre serviu ao propósito de motivar as pessoas à sua
busca, colocando-as em movimento, em ação. Nesse aspecto o anarquismo é, sem
dúvidas, uma proposta utópica. Concordando com Mannheim, afirma que o
desaparecimento da utopia leva à estagnação do homem que passa a ser coisa:
Tragtenberg resgata nesse texto o conteúdo crítico das utopias, que ao serem
propostas estão negando a sociedade atual. Por isso, e não só, é válido resgatar tais
universos utópicos, que preenchiam o olhar de horizonte de Jaime Cubero. Sempre
disposto a despertar do estado de “coisa” as pessoas que com ele se encontravam,
convidando-as à ação, convidando-as à fazer escolhas, e à vivê-las intensamente
todos os dias. Essa ação interna, essa escolha, se torna convicção e compromisso e
pautará suas atitudes e relações. Se isso soa utópico, pois bem, esse é um de seus
objetivos.
149
150
COLHENDO FRUTOS
no ofício múltiplo
de sábio e sapateiro
um homem se cria
palmilhando pregos, sonhos,
lutas e sentidos
nascidos da dura dignidade da matéria
no ouvir
acolhe o outro
que então se reconhece.
a palavra em alteridade
é maré de epifanias
Saber que não era fruto somente de sua própria trajetória, mas de uma longa
jornada legada de geração em geração, de mestre para discípulos que se tornam
mestres.
152
Apesar de não ter participado diretamente dessa experiência - por não ser
militante e só ter tido contato presencial recentemente com o movimento, a partir da
própria pesquisa - o comprometimento de passar adiante ensinamentos vivenciais
adquiridos nos espaços e leituras libertárias vai se tornando parte integrante do eu-
pessoa-pesquisadora que aqui deposita sua semente.
153
154
CRONOLOGIA
CRONOLOGIA
TRAJETÓRIA
ANO CONTEXTO HISTÓRICO CONTEXTO ANARQUISTA
JAIME CUBERO
155
Reúne-se o Terceiro Congresso Maria Lacerda de Moura participa
do Partido Comunista do Brasil. em Guararema (São Paulo) da
Chang Kai-Chek conquista experiência de uma comunidade
1928
Pequim e unifica o país; agrícola libertária; Organiza-se em
Elaborado o I Plano Quinquenal São Paulo o Bloco Operário
da URSS. Camponês.
156
Fábio Luz publica Dioramas
(ensaios literários RJ); Interrompe-
se a publicação da Enciclopédia
Anarquista, iniciada por Sebastien
Faure; A CGT portuguesa, anarco-
Na China os comunistas se sindicalista, desencadeia uma
rebelam e iniciam uma retirada greve geral revolucionária em 18 de
1934 em direção ao norte, episódio que janeiro. A repressão que se seguiu,
ficou conhecido como "A Grande destruiu o sindicalismo
Marcha". revolucionário e instituiu o
sindicalismo corporativista fascista;
Diego Abad Santillán parte para a
Espanha onde teria um papel
importante no contexto
revolucionário.
157
Morte de Oreste Ristori na
Espanha, combatendo nas brigadas
internacionais contra as tropas
fascistas de Franco; Realizam-se
vários atentados em Portugal contra
É implantada no Brasil a ditadura
objetivos ligados aos fascistas
de Getúlio Vargas, adotando uma
espanhóis e alguns militantes
constituição de tipo fascista,
anarquistas e comunistas executam
passando a desencadear a
um atentado contra o ditador
sistemática repressão contra o
1937 Salazar, que consegue escapar
movimento operário e
com vida. Militantes operários,
particularmente sobre os
incluindo anarquistas e comunistas
anarquistas; "Jornada Sangrenta"
são deportados para o campo de
contra os militantes anarquistas
concentração do Tarrafal, em Cabo
na Espanha.
Verde; É morto por estalinistas em
Espanha o militante anarquista
italiano Camilo Berneri; É criada em
Portugal a Federação Anarquista da
Região Portuguesa (FARP).
158
As tropas alemãs invadem a
Iugoslávia e a Grécia. Hitler
rompe o pacto e invade a URSS.
1941
Os Japoneses bombardearam
Pearl Harbour e os EUA entram
na guerra.
O Tribunal de Nuremberg
condena líderes nazistas. A
1946 França reconhece a
independência do Vietnã do
Norte.
A Alemanha é dividida. Os
comunistas, liderados por Mao
Tse-tung proclamam a República
1949 Popular da China. É criada a
OTAN. Aparece o primeiro
numero de Socialismo ou
Barbárie.
159
Morre Stalin. Malencov o
1953
substitui.
No XX Congresso do PC, em
Moscou, o secretário-geral
Kruchov denuncia os crimes
cometidos por Stalin. Em Cuba
começa um movimento
1956
guerrilheiro contra Batista.
Revolução na Hungria contra o
domínio da burocracia estatal. A
URSS invade o país e reprime
violentamente o movimento.
160
Revolução Cultural na China,
radicalização ideológica que
desencadeia expurgos e prisões,
1966 com milhões de mortes. A França
se retira da OTAN. Fim do grupo
e da revista Socialismo ou
Barbárie.
161
Reagan é eleito presidente dos
EUA. Greves lideradas pelo
recém-criado sindicato
1980 Solidariedade abalam a Polônia.
Morre o marechal Tito, que
governava a Iugoslávia desde
1945.
Gorbatchov é designado
presidente da URSS e inicia o
Reabertura do CCS-
1985 processo de degelo, que fica
SP.
conhecido como Glasnost
(transparência).
162
Fim da URSS e dos regimes
“comunistas” da Europa. Fim do
pacto de Varsóvia. Restauradas a
Rússia e quatorze outras
republicas independentes. Guerra
Civil na antiga Iugoslávia. A ONU
1991
intervém. Derrubado o Muro de
Berlim. Reunificação das
Alemanhas. Tratado de
Maastricht estabelece um plano
progressivo de integração da
Europa.
Movimentos separatistas de
minorias étnicas e religiosas
eclodem por toda a Europa do
Leste. A China se abre para a
1992 economia de mercado. A Bósnia-
Herzegovina, uma das cinco
nações formas em lugar da antiga
Iugoslávia mergulha em
sangrenta guerra civil.
Morrem em São Paulo três amigos de toda uma vida, que colaboraram, cada um a sua
maneira, para o pensamento-ação libertário:
1998 Em 20/05 – Jaime Cubero
Em 29/10 – Antônio Martinez.
Em 17/11 – Maurício Tragtenberg
163
164
APÊNDICES
Faculdade de
Palestra/
Ciências e Letras - 18/11/87 O Anarquismo no Brasil
Anarquismo
Bragança Paulista
Sociedade de
Movimentos Sociais e a O Movimento Operário e a Palestra/
Estudos Históricos 21/04/88
Luta pela Cidadania Luta pela Cidadania Sindical
SP/SP
Mesa: Prioridades no
ensino de 2º grau:
Ensino do 2 grau: Faculdade de 10- Debatedor/
educação para o trabalho
perspectivas Educação - USP 12/05/88 Educação
ou educação com o
trabalho?
Casa de Cultura do
Mesa: Sindicalismo: ontem Debatedor/
Semana do 1o de Maio Trabalhador A. 04/05/89
e hoje Sindical
Mazaroppi - SP
Mesa: As utopias
As Idéias Libertárias na Debatedor/
ECA - USP 18/05/89 libertárias e seu percurso
Revolução Francesa Anarquismo
na história
Mesa: Sociabilidade e
IV Semana de Ciências Debatedor/
PUC/SP 19/10/89 poder: resistência ou
Sociais da PUC/SP Anarquismo
alienação
Palestra/
ECA - USP 28/10/89 Voto livre / Voto obrigatório
Outros
Anarcosindicalismo: Palestra/
CCS-SP 09/12/89 Anarco-sindicalismo
história e atualidade Sindical
14
Compilação inicial realizada por Christina Lopreato, Parmênides Cuberos & José Carlos O. Morel.
Os (*) são referência supostas, mas que não estão registradas dessa forma.
165
FCL - UNESP - Palestra/
16/03/90 Anarquismo
Araraquara Anarquismo
Socialismo: utopia em UNIMEP - Mesa: Democracia e Debatedor/
08/05/90
crise? Piracicaba socialismo Anarquismo
O Movimento Anarquista
III Semana de Geografia Palestra/
UNIP - São Paulo 06/11/90 no Brasil nas primeiras
e História Histórico
décadas do século
Anarquismo: uma Espaço Cultural
História do Anarquismo no Palestra/
discussão sobre o Rabo de Arraia - 20/03/91
Mundo e no Brasil Histórico
verdadeiro socialismo Olinda-PE
Palestra/
Maio Negro - COB-AIT UFPR 09/05/91 Anarquismo no Brasil
Histórico
Palestra/
Semana Libertária UERJ 22/08/91 Anarquia e Antimilitarismo
Anarquismo
Kãba Casa de
Seminário Sobre 27- Seminário sobre Seminário/
Cultura - Fortaleza-
Anarquismo 29/09/91 anarquismo Anarquismo
CE
Escola Sociologia e
Acabou o socialismo: viva Palestra/
Política de São 30/11/91
o socialismo! Anarquismo
Paulo
X Enefil - Encontro
Debatedor/
Nacional de Estudantes USP 16/07/92 A Nova Desordem Mundial
Histórico
da Filosofia da USP
Os libertários e a
FFC - UNESP - Palestra/
educação: memória e 13/08/92 As Universidades Livres
Marília Educação
história
166
I Festival de Arte e
Educação independente Palestra/
Cultura sem Fronteiras - UFSC 12/07/94
de escola Educação
Educação Libertária
Presença italiana no Centro Universitário Os Italianos no Brasil e o Debatedor/
26/10/94
sindicalismo brasileiro Maria Antonia Movimento Operário Histórico
UFU - Universidade
Evento inaugural do Razão e paixão na Palestra/
Federal de 01/12/94
NEPHISPO experiência anarquista Anarquismo
Uberlândia
I Jornada Internacional
O anarquismo: uma visão
sobre Infância e Palestra/
USP 24/10/95 da educação da criança
Violência Doméstica / Educação
na família
Proteção e Prevenção
60 Anos da Revolução Tesão - A casa do 30/08/(1 Debatedor/
Mesa Redonda
Espanhola soma 996*) Histórico
Palestra/
1º de Maio Santos 01/05/97 1º de Maio (*)
Sindical
80 Anos da Greve Geral Museu da Imigração Autogestão e Ação Direta Palestra/
19/07/97
de 1917 - SP na Greve Geral de 1917 Histórico
São Paulo, memórias em São Paulo, memórias em Documentário/
TV Cultura 01/11/97
pedaços pedaços Histórico
11ª Moitará - Separações
Sociedade
atlânticas: a herança das
Brasileira de 29/11/97 Vivências Palestra/ Histórico
imigrações espanhola e
Psicologia Analítica
italiana no Brasil
Palestra/
Conversações Libertárias Nu-Sol PUC/SP 24/03/98 Anarquismo e Liberdade
Anarquismo
167
168
2 - Mitos de origem - narrativas dos começos
169
Antonio Martinez (1915-1998) e Jaime Cubero (1927-1998) - Nildo Avelino:
Para o anarquista, o exemplo é a melhor das propagandas, e a vida
anárquica a melhor obra. Como se o caminho trilhado através dos
preceitos fosse longo e árduo em comparação ao breve percurso dos
exemplos. E talvez tenham sido os anarco-terroristas quem mais
tenham enfatizado a conduta enérgica, exemplar e resoluta, contra os
embates meramente discursivos, e afirmado no estampido de uma
explosão o meio de fazer ouvir surdos. Fizeram de seus corpos um
suporte para sua propaganda, modelaram seus gestos e estilizaram
suas vidas de maneira a perdurarem no tempo. Rejeitaram a
separação entre discurso e existência anarquista e imortalizaram-se
na obra de suas próprias vidas. Por isso, nada entenderam esses que
confundem estética da existência com o quietismo da vida burguesa e
confortável: o que há de mais incômodo, e perigoso, do que engajar a
própria vida num estilo singular? O que é mais arruinador do que
passar disso que os gregos chamavam de vida inautêntica, porque
irrefletida, para uma vida autêntica e refletida? É certamente mais fácil
deixar-se absorver inteiramente na militância política, na preparação
revolucionária. Mas são raros, muito raros, os que, ao preparar a
revolução, revolucionam a si mesmos.
[...]
[...]
171
Agendáramos um encontro na prefeitura e outro no Centro de Cultura
Social.
172
memória deslizava mais viva e plena de sentido para nós do que o
arquivo da experiência pedagógica.
Na academia...
Por ter conhecido Cubero juntei mais indícios para considerar que há
muitos tipos de anarquismos porque há muitos tipos de anarquistas. O
anarquismo dele nunca me decepcionou. Ou talvez a integridade dele
como ser humano, independentemente de ser ou dizer-se anarquista,
é que aderia rigorosamente à nossa utopia de libertário. O que vale é
que Jaime Cubero nos fez melhores em nossas realizações
independentes, na afirmação de nossas diferenças anônimas, na força
de buscar a autosustentação fora do instituído.
174
Da primeira ilação extraio o caráter humano, ético e moral da sua
trajetória biológica e social. Nesta dimensão, a anarquia para Jaime
Cubero, antes de mais nada, traduzia-se em relações sociais e
relações interpessoais intensas e extensas em quaisquer espaço-
tempo da sua vida quotidiana. Quem frequentou a sua casa e quem
teve oportunidade de conviver com Jaime Cubero e a sua
companheira Maria, como foi o meu caso, compreende o significado
do que acabo de dizer. Todavia, esse comportamento comunicacional,
afetivo, solidário e livre estendia-se nos momentos de convívio com
companheiras e companheiros que emergiam em correlação estreita
com o espaço-tempo das reuniões e palestras realizadas no Centro de
Cultural Social, em São Paulo, ou em cursos de formação ou
colóquios sobre o anarquismo que aconteceram no Brasil e em outros
países.
E como ele fez isso? De várias maneiras, todas elas com uma
particularidade: todas elas maneiras não reativas. Na impossibilidade
de falar de várias delas, todas as que tive a alegria de participar,
destaco a sua abertura do "Seminário de Educação Libertária"
promovido pelo NAT, em 1994. Jaime abriu sua fala evocando a
admiração que temos pela arte do bonsai. A beleza das pequenas
árvores, algumas centenárias, resulta da arte de inibir seu crescimento
atingindo a forma de uma árvore adulta. Felizmente não se tem notícia
da aplicação das técnicas do bonsai em seres humanos. Lembrou que,
todavia, se uma arte da diminuição física não foi empreendida, nossa
sociedade produz em profusão, e delas se mostra orgulhosa, técnicas
eficazes na miniaturização emocional, social, intelectual e criativa
do homem. A partir daí deu seguimento ao seu tema “educação
independente de escola” sublinhando que, da perspectiva libertária,
não há formação que não seja autoformação e que é esse o ponto em
que educação e liberdade coincidem. E o caminho da liberdade,
acrescentou, é o da prática da própria liberdade. Não mais libertar,
mas liberar-se.
São dez anos sem ouvir a sua voz, sem ver seu rosto amável, sem ver
os movimentos do seu corpo frágil e leve, sempre um corpo de menino.
Mas não são dez anos sem rir com ele. Nos encontros com os que o
conheceram, nos divertimos muito com a graça de suas palavras.
Suas frases nos chegam sempre vívidas e frescas e somos tomados
da alegria marota que sempre trazia consigo e acompanha os que o
amam e com ele aprenderam os mais generosos, alegres e
contundentes sentidos da anarquia. (verve 14/2008 p. 265-267 –
grifos meus)
Raquel Stela de Sá Siebert, Maria Oly Pey, Jaime Cubero e Guilherme Carlos Corrêa -1996
177
178
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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182
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LUENGO, Josefa Martín, MONTERO, Encarnación Garrido, PEY, Maria Oly &
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Editorial Anthropos, 2003.
ROCKER, Rudolf. Tolstói, Profeta de uma Nova Era. In: COÊLHO, Plínio Augusto
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ROMANI, Carlos. Da biblioteca à Escola Moderna. Breve história da ciência e da
educação libertária na América do Sul. In: EDUCAÇÃO LIBERTÁRIA. São Paulo:
Editora Imaginário, nº1, p. 87-100, 3º quadrimestre de 2006.
SANTOS, Maíra Moraes. Entrevista realizada com Miquelina Veiga e Nilton Melo.
São Paulo, no dia 14 de Outubro de 2013. (transcrição, manuscrito, 26 páginas)
SANTOS, Myrian Sepúlveda dos. Memória Coletiva & Teoria Social. São Paulo:
Annablume, 2009.
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SILVA, Rodrigo Rosa. Entrevistas Jaime Cubero. Imprensa Marginal, s/d.
Disponível em: <http://anarcopunk.org/biblioteca/?p=108>. Acesso em 07/02/2012.
188
ANEXOS - ROTEIROS
Ocupação atual:
Formação escolar:
189
190