462-Texto Do Artigo-1739-1-10-20200318

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 9

Educação Antirracista no Ensino da Biblioteconomia: percepção

discente
Erinaldo Dias Valério Resumo
Professor da Universidade Federal de Apresenta um estudo sobre a importância do ensino sobre as relações raciais
Goiás (UFG). Doutor em Ciência da brasileira na formação de bibliotecários (as). Afirma que as discussões sobre
Informação (PPGCI/UFRJ). raça e racismo relacionadas à população negra, tem sido aos poucos inseridas
nos currículos em Biblioteconomia. Articula como objetivo, a partir da perceção
discente, analisar como o ensino das relações raciais pode contribuir para uma
erinaldodiasufc@yahoo.com.br formação que promova à igualdade racial. Realiza pesquisa de cunho
bibliográfico, exploratória e estudo de caso. Utiliza como instrumento de coleta
de dados, o questionário aplicado a 15 discentes. Argumenta, a partir dos
Arthur Ferreira Campos resultados, que os (as) discentes acreditam que a biblioteconomia necessita de
estratégias de uma agenda antirracista no meio acadêmico e na socieddade em
Doutorando e Mestre em Ciência da geral. Finaliza apontando a necessidade de uma discussão transversal que
Informação, pela Universidade Federal possa alcançar diferentes disciplinas na formação em Biblioteconomia.
da Paraíba (UFPB). Bacharel em

ARTIGO
Palavras-chave: Educação antirracista. Ensino de biblioteconomia. Relações
Biblioteconomia, pela Universidade étnico-raciais.
Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

arthurfcampos94@gmail.com Anti-racist education in the teaching of library science: a


discent perception

Abstract
It presents a study on the importance of teaching about Brazilian race relations
in the curriculum of librarians. It discusses about race and racism related to the
black population have gradually been included in curriculum of librarianship.
Articulates as an objective, from the student's perception, to analyze how the
teaching of racial relations can contribute to a formation that promotes racial
equality. Performs bibliographic, exploratory research and case study. It uses a
questionnaire applied to 15 students as a data collection instrument. It argues,
based on the results, that students believe that librarianship needs strategies for
Este trabalho está licenciado com uma an anti-racist agenda in the academic environment and in society in general. It
Licença Creative Commons - Atribuição- concludes by pointing out the need for a cross-cutting discussion that can reach
NãoComercial-CompartilhaIgual 3.0 Brasil. different disciplines in the curriculum in Library Science.

Keywords: Anti-racist education. Teaching of library science. Ethnic-racial


relations.

v. 5, n. esp., p. 118-126, 2019.


folha de rosto em Biblioteconomia e Ciência da Informação

1 Introdução
Os debates referentes à educação antirracista no Brasil não são novos, o tema vem sendo discutido desde a emergência e
expansão do movimento negro brasileiro. Vivemos numa sociedade não-linear, contemplando uma abrangência cultural, social
e moral, tornando as discussões raciais um escopo de problemática empíricas e científicas.

Compreendemos que no âmbito da Biblioteconomia, discutir sobre as relações raciais, com foco na população negra,1 subsidia
a formação de bibliotecários (as) capazes de atuar no combate ao racismo, preconceito e discriminação racial, sistematizando
informações em prol da redução das desigualdades raciais.

Portanto, a inserção dos estudos sobre as relações raciais na grade de cursos de graduação pode fomentar um pensamento
crítico no (a) discente. Propomos aqui uma discussão para a educação antirracista no ensino da Biblioteconomia, partindo do
seguinte questionamento: como os (as) discentes de Biblioteconomia da Universidade Federal de Goiás (UFG) refletem sobre
as questões raciais para uma educação antirracista no contexto da área? Neste sentido, abordamos neste estudo o objetivo
de discutir, a partir da percepção dos (as) discentes do curso de Biblioteconomia da UFG, como a inserção da temática das
relações raciais pode contribuir para uma formação acadêmica que promova a igualdade racial.

Trabalhamos com uma abordagem qualitativa delineada a partir da pesquisa bibliográfica e da investigação exploratória,
alicerçada ao estudo de caso com discentes que cursaram a disciplina ‘Cultura Afro-brasileira: mediações da informação
étnico-racial’, ministrada no curso de Biblioteconomia da Faculdade de Informação e Comunicação (FIC) da UFG. Utilizamos
um questionário como instrumento de coleta de dados.

A disciplina se propõe a discutir sobre os produtos culturais étnico-raciais como suporte de informação, procurando entender
a dinâmica das relações étnico-raciais e os processos de mediação da informação para uma educação antirracista, focando
na população negra. Os temas e conceitos são discutidos fazendo relação com a atuação e o fazer do (a) bibliotecário (a).

2 O papel social da Biblioteconomia e a população negra


A Biblioteconomia possui seus pressupostos em técnicas milenares de armazenamento de documentos, informação em
suportes de argila, surgimento e confecção de livros e, especificamente, na história dos livros e das bibliotecas. Ter acesso à
informação e conhecimento tanto na antiguidade quanto nos dias de hoje é um mecanismo de poder (FOUCAULT, 1992),
antes custodiado em mosteiros ou sob a guarda de reinados. Naquele tempo, a informação era monopolizada e disponibilizada
para uma pouca parcela de sujeitos que, possuindo um título ‘nobre’, teriam acesso a ela.

Observamos, hoje, que essa realidade foi modificada, porém em partes. Evaristo (2009) indica que existe uma invisibilização
do (a) negro (a) na literatura brasileira, o que, no campo prático da Biblioteconomia, mostra um monopólio para assuntos a
serem disponibilizados em acervos de unidades de informação. Nesse contexto, é importante incentivar o acesso a literatura
afro-brasileira para a valorização da cultura negra (BRANDÃO, 2016) e, na conjectura do ensino da Biblioteconomia e do seu
papel social, essa prática de incentivo se torna implícita.

A necessidade em sistematizar o conhecimento, organizá-lo, estruturá-lo e hierarquizá-lo tem indícios em épocas remotas,
antes de Cristo, com o exemplo da Biblioteca de Assurbanipal, rei da Assíria datando de VIII e VII a.C. e a clássica Biblioteca
de Alexandria, no século III a.C. (LEMOS; 1998; ORTEGA, 2004). A Biblioteconomia surge a partir das práticas bibliográficas
e das práticas da documentação (ORTEGA, 2004) e no Brasil, seu ensino relaciona-se a uma iniciativa de influência francesa
e posteriormente norte-americana, consolidando o estabelecimento do currículo mínimo em 1962 (MUELLER, 1985).

Mueller (1985) indica que a história do ensino profissional de Biblioteconomia no Brasil passou por períodos de ‘influência’ e
‘fases’. De 1879 a 1929, sofre influência tradicionalista francesa tendo a Biblioteca Nacional como líder institucional desse
ensino, ligando-se as práticas bibliográficas; de 1929 a 1962, foi fundado um curso em São Paulo com influência norte-
1
É importante frisar que toda vez que usarmos o termo “relações raciais” estaremos focando especificamente na população negra, evitando
repetições durante todo o texto.
119
v. 5, n. esp., p. 118-126, 2019.
Educação Antirracista no Ensino da Biblioteconomia: percepção discente

americana, com práticas ligadas a automação, comportamento de usuários, sistemas de informação e tecnologias; no ano de
1962, o currículo mínimo foi estabelecido, ocasionando a uniformidade dos cursos.

Já na década de 1970, os cursos de Biblioteconomia se fortalecem e emergem pelo Brasil e os conteúdos presentes no
currículo mínimo começam a serem modificados conforme o avanço tecnológico e o surgimento de cursos em nível de pós-
graduação. Em 1982, é aprovado um novo currículo mínimo, reformulando os programas de ensino (MUELLER, 1985).

O primeiro curso de Biblioteconomia no Brasil surge em 1911 sob a responsabilidade da Biblioteca Nacional no Rio de Janeiro,
com influência francesa. Nesse tempo, sendo regulado pela Lei nº 2.356/1911, o curso tinha um ano de duração e apenas
quatro disciplinas, as quais eram: Bibliografia, Paleografia e Diplomática, Iconografia e Numismática. Seu início data do ano
de 1915 sendo extinto em 1922. Em 1931, o curso volta a atividade com dois anos de duração, influência americana e ainda
com quatro disciplinas: Bibliografia, Paleografia e Diplomática (primeiro ano) e História Literária, Iconografia e Cartografia
(segundo ano) (MUELLER, 1985). Esse início foi marcado por disciplinas técnicas, com aplicabilidades diretas na gestão do
acervo da Biblioteca Nacional.

Hoje, os cursos de Biblioteconomia duram cerca de quatro a cinco anos e formam em Licenciatura ou Bacharelado, avançando
seus estudos para além das técnicas diretas a gestão dos acervos, isto é, com disciplinas que trabalham perspectivas sociais
ao tipo de sujeito que utilizará os recursos informacionais que a unidade de informação oferece. Nesse contexto, os Projetos
Políticos Pedagógicos (PPC) regulamentam as disciplinas que serão abordadas na grade curricular para os (as) discentes do
curso.

A profissão do (a) bibliotecário (a) e a regulamentação do seu exercício são “reconhecido[s] através da Lei Federal nº.
4.084/62, e seu papel tem sido fundamental no desenvolvimento de redes, sistemas e serviços de informação em diferentes
ramos econômicos do país” (CAMPOS; FONTES; ARAÚJO, 2015, p. 112, acréscimo nosso). Desse modo, é importante propor
discussões nas matrizes curriculares com disciplinas voltadas às relações raciais, à informação étnico-racial, às temáticas
voltadas a cultura, ao social e a incentivos para a inserção de todo tipo de literatura nos acervos das unidades de informação,
promovendo a igualdade e expondo o papel social do (a) bibliotecário (a).

No ambiente acadêmico, por iniciativas individuais e em alguns casos, coletivas, docentes discutem essas temáticas em
disciplinas e projetos para ensino, pesquisa e extensão, o que contribui para a formação antirracista.

Observamos que “o curso de Biblioteconomia, busca capacitar o futuro profissional auxiliando-o a compreender o valor da
informação e a reconhecer a importância política, social, econômica e cultural da informação” (SILVA; VALÉRIO; SILVA, 2010,
p. 288). Concordamos com Valério e Silva (2017) na abordagem de que a educação antirracista, visando a democracia
brasileira, parte da necessidade de instruir discentes, docentes, pesquisadores (as) e profissionais para a pluralidade racial.

Destacamos as iniciativas do Movimento Negro para o ‘combate’ ao preconceito racial na sociedade, ao passo que essas
ações “oportunizaram que fossem criados instrumentos normativos para a inclusão da História e Cultura Africana e Afro-
brasileira em sala de aula” (SILVA; PIZARRO; SALDANHA, 2017, p. 8). No contexto da Biblioteconomia e da Ciência da
Informação, os Projetos Pedagógicos de Curso (PPC’s), consoante as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das
Relações Étnico-raciais (DCNs), podem contribuir para discussões com a temática racial (SILVA; PIZARRO; SALDANHA,
2017).

Valério e Campos (2019) indicam que os estudos sobre as relações raciais nas grades curriculares dos cursos de
Biblioteconomia incrementam a formação do (a) bibliotecário (a) tendo a prerrogativa de uma sociedade menos desigual
socialmente. O (A) bibliotecário (a), sendo um mediador de informação, pode corroborar com a educação antirracista em
ambientes informacionais analógicos / tradicionais como as próprias bibliotecas e outros tipos de unidades de informação,
como também em abientes informacionais digitais ou híbridos, propondo a divulgação de temas que refletem as relações
raciais em bibliotecas digitais ou virtuais, repositórios, blogs, redes sociais, entre outros. À exemplo disso, com o auxílio da
informação e tecnologia, esse (a) gestor (a) pode adquirir, em sua unidade informacional, materiais de autores (as) negros
(as) que trabaham ou não com as temáticas raciais e divulgá-los em redes sociais da unidade, atraindo usuários e promovendo
direta e indiretamente a educação antirracista.

120
v. 5, n. esp., p. 118-126, 2019.
folha de rosto em Biblioteconomia e Ciência da Informação

Mas para isso, o (a) profissional deve conhecer e possuir competência informacional para promover o antirracismo. Esse
processo pode acontecer mediante a leitura e senso crítico ou mediante a apresentação de uma educação antirracista por um
(a) docente.

Desse modo, este artigo, é um relato da disciplina de “Cultura afro-brasileira: mediações da informação étnico-racial” ofertada
para o curso de Biblioteconomia da UFG, propõe identificar a percepção dos (as) discentes quanto à temática racial -
população negra, no que abarca iniciativas antirracistas.

Os resultados da pesquisa de Silva (2016) visam compreender a inserção da História e Cultura Africana e Afro-brasileira na
formação do (a) bibliotecário (a), mediante a percepção docente, identificando a necessidade de prática nos estudos que
competem as relações raciais – população negra. Diante disso, observamos que nesse recorte temporal, existem instrumentos
de propagação de estudos dessa natureza, bem como análises que solidificam o ensino antirracista para a formação do (a)
bibliotecário (a).

4 Procedimentos Metodológicos
Abordamos a pesquisa bibliográfica para subsidiar o estudo, ao passo que buscamos soluções (LIMA; MIOTO, 2007)
relacionadas ao fomento das discussões sobre a população negra no ensino em Biblioteconomia, e a investigação exploratória
abarca a fundamentação de conhecimento (MORESI, 2003) para uma educação antirracista, visto que observamos que, no
campo biblioteconômico, essas discussões agregam considerável potencial de contextualização. Por meio da abordagem
qualitativa, trazemos reflexões pontuais sobre a importância da temática para a formação dos (as) estudantes.

Como técnica de pesquisa extensiva, utilizamos o questionário como instrumento de coleta de dados (MARCONI; LAKATOS,
2003). Em estudo de caso, esse aparato utiliza 15 questionários aplicados aos (às) discentes que estavam cursando a
disciplina “Cultura afro-brasileira: mediações da informação étnico-racial” no período 2017.2 (primeira vez que a disciplina foi
ministrada). Para tabular os dados, ilustramos as porcentagens em gráficos utilizando como softwares o Excel (pacote Office).

5 Análise e Discussão dos Dados


Nesta etapa, com a proposta de uma educação antirracista no ensino da Biblioteconomia, a disciplina “Cultura afro-brasileira:
mediações da informação étnico-racial” dialogou com os (as) discentes sobre a temática racial, no contexto científico; as
experiências de abordagens das relações étnico-raciais na formação de profissionais da informação; discutiu a produção de
conhecimento sobre os (as) negros (as) na Ciência no Brasil; apresentou as principais ações do movimento negro organizado
e a luta contra o racismo e informou sobre a influência da cultura africana no processo de colonização do Brasil, nos aspectos
econômicos, sociais e culturais.

Ressaltamos que os questionamentos dessa disciplina procuram contribuir com a formação de bibliotecários (as), visando à
conscientização e dinamização do uso do material bibliográfico, com vistas à implantação da Lei 10639/03.

Ilustramos, nas Figuras 1-3, os gráficos resultantes da análise com os (as) discentes, de acordo com o que foi discutido na
seção metodológica. O questionário consta com perguntas, tanto objetivas como discursivas, divididas em seções sobre
‘Dados de caracterização’ e ‘Informações relativas ao tema da cultura afro-brasileira e africana na Biblioteconomia e na
Biblioteca’. Em estrutura de organização, o gráfico da Figura 1 contempla parte dos ‘Dados de caracterização’ e os gráficos
das Figuras 2 e 3 contemplam as ‘Informações relativas ao tema da cultura afro-brasileira e africana na Biblioteconomia e na
Biblioteca’.

Em seguimento, no âmbito dos ‘Dados de caracterização’, constatamos que 60% dos respondentes, tem entre 21 e 30 anos
de idade; 33% tem entre 17 e 20 anos e 7% estão entre 51 e 60 anos de idade. É notável que a maioria dos (as) discentes
são compostos por jovens, paralelo a uma parcela pequena de pessoas com mais de 50 anos.

121
v. 5, n. esp., p. 118-126, 2019.
Educação Antirracista no Ensino da Biblioteconomia: percepção discente

Já referente às informações de gênero, constatamos que 60% dos respondentes contemplam a identidade de Mulher (cis) e
40% possuem identidade Homem (cis). Esses dados vão ao encontro da realidade vista em sala de aula, nos cursos de
biblioteconomia no Brasil, em que majoriamente a presença das mulheres tem sido maior que a dos homens.

Na Figura 1, temos o gráfico que representa a cor/raça segundo os critérios do IBGE.

Figura 1 - Raça/Cor (IBGE)

Fonte: dados de pesquisa (2019).

De acordo com a Figura 1, constatamos que 47% dos respondentes são brancos, 33% são pretos (as) e 20% são pardos (as).
Assim como sugere o movimento negro, a soma de pretos (as) e pardos (as) caracteriza o grupo da população negra. Desse
modo, por meio da soma, constata-se que 53% dos (as) discentes que cursavam essa disciplina eram pessoas negras.

A Figura 2 representa as ‘Informações relativas ao tema da cultura afro-brasileira e africana na Biblioteconomia e na


Biblioteca’. Para responder à pergunta “Já foram trabalhadas, no curso, ações referentes à cultura afro-brasileira e africana?”.

Figura 2 - Trabalho no curso referentes a cultura afro-brasileira

Fonte: Dados de pesquisa (2019).

Como consta na Figura 2, dos (as) respondentes, 53% disseram que ‘Sim’ e 47% disseram que ‘Não’. Vale aqui destacar que
embora a maioria dos (as) discentes tenham respondido que sim, o curso só oferta a disciplina específica de acordo com o
PPC, e tem inserido o tema na ementa da disciplina de Fundamentos de Biblioteconomia. Ações como palestras, oficinas,
minicursos, entre outras atividades, não foram relatadas.

Na Figura 3, representando as ‘Informações relativas ao tema da cultura afro-brasileira e africana na Biblioteconomia e na


Biblioteca’, identificamos com a pergunta “A trajetória do negro é estudada, como conteúdo, nas várias disciplinas que
possibilitam tratar do assunto no Curso?”.

Figura 3 - Trajetória do negro estudada como conteúdo

122
v. 5, n. esp., p. 118-126, 2019.
folha de rosto em Biblioteconomia e Ciência da Informação

Fonte: dados de pesquisa (2019).

Em relação ao estudo da trajetória do (a) negro (a) como conteúdo nas disciplinas da graduação, a Figura 3 aponta que 73%
dos respondentes consideram que a trajetória do negro “Não” é estudada como conteúdo e 27% dos respondentes consideram
que “Sim”. É um número baixo, porém com potencial de mudança devido as discussões da temática em disciplinas específicas
e as ações pessoais de docentes que procuram estabelecer uma nova percepção sobre as relações raciais e o fazer do (a)
bibliotecário (a).

Por fim, é relevante ressaltar que 73% dos respondentes presenciaram atitudes racistas na Universidade, o que é um número
considerado alto e preocupante. Devido a isso, fundamentamos que o tema das relações raciais deve ser disseminado no
âmbito da Biblioteconomia e de outros cursos, para que os (as) discentes se munem de informações étnico-raciais para
contestar de maneira consciente a inexistência de uma democracia racial e conheçam os caminhos para combater o racismo.

5.1 Projetos desenvolvidos na disciplina

Esta seção apresenta alguns projetos que foram desenvolvidos pelos (as) dicentes durante a disciplina. É importante frisar
que todos eles estão articulados de forma direta com a prática e o fazer profissional do (a) bibliotecário (a).

 Contação de Histórias Afro-Brasileiras na Creche da Universidade Federal Goiás - proporcionou nas crianças o
interesse em histórias e contos da cultura africana, através de contação de história;

 Projeto de ação e observação na Escola Municipal Marcos Antônio Dias Batista: um estudo sobre as relações raciais
– descontruiu e refletiu sobre a ideia do mito da igualdade racial, por meio da discussão fílmica no ambiente escolar.

 Análise de acervo da Biblioteca Libris: recorte racial e infantil - analisou o acervo da biblioteca modelo Laboratório do
Livro, Leitura Literatura e Biblioteca (LIBRIS), localizada na Faculdade de Informação e Comunicação (FIC) da UFG,
à respeito da existência de obras literárias infantis na coleção da mesma que retratem a discussão racial com a
temática para crianças e que possuam em seu conteúdo personagens negros(as), à disposição do público que faz
uso da unidade.

 Professores(as) negros(as) da Faculdade de Letras da UFG - identificou os/as professores/as negros/as lotados/as
na Faculdade de Letras da UFG. Divulgou na Biblioteca da Faculdade de Letras, por meio de cartazes, quem são,
quantos são e quais as suas funções e capacitações, bem como, suas obras acadêmicas e científicas, com o intuito
de dar visibilidade as/aos professoras(os) negras(os);

 Mulher Negra Brasileira - realizou uma exposição intitulada Mulher Negra Brasileira, na Biblioteca Central da
Universidade Federal de Goiás. A exposição foi iniciada e finalizada na biblioteca central da UFG, depois disso, ela
foi levada para uma biblioteca escolar de uma escola pública do estado e foi exposta no dia 20 de novembro, dia em
que se comemora o Dia da Consciência Negra. Além disso, a exposição foi fixada no corredor da FIC, e contemplou
alunos(as), professores(as) e técnicos(as) dos cursos de jornalismo, publicidade e propaganda, jornalismo,
biblioteconomia e relações públicas, e interessados(as) que passavam pelo local. Além disso, a exposição foi utilizada

123
v. 5, n. esp., p. 118-126, 2019.
Educação Antirracista no Ensino da Biblioteconomia: percepção discente

como instrumento de ação cultural em um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) 2 aplicado em uma biblioteca
escolar de uma instituição pública do estado de Goiás, como pode ser observado nas figuras 4 a 7.

Foram expostas 22 biografias dessas mulheres, a saber: Lélia Gonzalez, Esperança Garcia, Elizethe Cardoso,
Clementina de Jesus, Ivete Sacramento, Fátima Oliveira, Mãe Aninha, Marta Cezaria de Oliveira, Maria Rita Ferreira,
Maria Firmina, Tia Ciata, Mãe Menininha dos Gantois, Dona Zica, Auta de Souza, Chiquinha Gonzaga, Chica
Machado, Rurany Ester Silva, Thereza Santos, Ana das Carrancas, Antonieta de Barros, Dulce Pereira e a Carolina
Maria de Jesus.

Figura 4 – Exposição “Mulher negra brasileira” Figura 5 – Exposição “Mulher negra brasileira”

Fonte: Silva (2017). Fonte: Silva (2019).

Figura 4 – Exposição “Mulher negra brasileira” Figura 4 – Exposição “Mulher negra brasileira”

Fonte: Silva (2019). Fonte: Silva (2019).

Conforme Silva (2017), a objetivo da exposição foi apresentar um olhar critico sobre a contribuição da mulher negra na
construção da sociedade brasileira, tirando da invisibilidade as ações desenvolvidas por elas contra o racismo brasileiro. Além
disso, tinha a intenção também de descontruir a imagem estereotipada da mulher negra.

Uma exposição como essa, evidencia a necessidade de questionamentos acerca da importãnca da mulher negra na sociedade
brasileira e o papel pegadógico da escola e da biblioteca na luta contra a discriminação racial tanto em sala de aula quanto
na sociedade. Pois, acreditamos que o ambiente escolar pode ser um grande aliado na luta contra o racismo.

6 Considerações Finais
Consideramos relevantes os estudos que compreendem e analisam a formação antirracista na Biblioteconomia para uma
sociedade igualitária para todas as populações. O ensino sobre as relações raciais na formação dos (as) futuros (as)
bibliotecários (as) oportuniza a visibilidade e a representatividade da população negra, ainda em constante luta contra o
racismo.

A formação antirracista viabiliza o acesso e uso da informação por todos (as), dando visibilidade a grupos historicamente
discriminados descontruindo preconceitos. Dessa forma, o (a) bibliotecário (a) antirracista utiliza esse conhecimento para que

2
SILVA, Quedma Ramos da. Biblioteca escolar na luta antirracismo: reflexões sobre a aplicaçãoda Lei 10.639/2003. 2017. 90 f. Trabalho
de Conclusão de Curso (BAcharelado em Biblioteconomia) – Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2017.

124
v. 5, n. esp., p. 118-126, 2019.
folha de rosto em Biblioteconomia e Ciência da Informação

em sua unidade de informação possa classificar, catalogar e organizar materiais bibliográficos que promovam à igualdade
racial; atender as necessidades informacionais de diferentes perfis de sujeitos; desenvolver atividades culturais inclusivas,
entre outras.

O objetivo deste artigo é atingido conforme seu percurso metodológico. Delineado com os dados obtidos com os (as) alunos
(as) que cusraram a disciplina “Cultura afro-brasileira: mediações da informação étnico-racial”, na Universidade Federal de
Goiás, inferimos que esse tipo de discussão deve ser incentivado porque tivemos um quantitativo de apenas 27% de sujeitos
que se interessam por estudos sobre a trajetória do (a) negro (a), porém 73% dos sujeitos já sofreram racismo na referida
Instituição. Isso nos faz perceber a necessidade da representatividade do (a) negro (a) intencionando a educação antirracista
na UFG.

Salientamos a criação de variados projetos que evidenciam a visibilidade da população negra em consequência dessa
disciplina supracitada. Foram desenvolvidos também, trabalhos de conclusão de curso apontando a necessidade de mais
disciplinas com discussões que focassem as relações racias. As possibilidades de pesquisa decorrentes deste estudo indicam
um parâmetro social necessário à luta contra o racismo, oportunizando discussões que responsabilizem os cursos de
biblioteconomia na formação de profissionais concientes sobre as relações raciais brasileiras para o enfrentamento do
problema racial que afeta as unidades de informação e a sociedade em geral.

Referências
BRANDÃO, Isaura de França. A importância da literatura afro-brasileira para a valorização da cultura negra. In: ENCONTRO NACIONAL
DE LITERATURA INFANTO-JUVENIL, 6., 2016, Campina Grande. Anais [...]. Campina Grande: Editora Realize, 2016. p.1-13. Disponível
em: http://www.editorarealize.com.br/revistas/enlije/trabalhos/TRABALHO_EV063_MD1_SA7_ID305_25072016212548.pdf Acesso em: 23
dez. 2019.

CAMPOS, Arthur Ferreira; FONTES, Melissa Gabriely; ARAÚJO, Claudyaline da Silva. Tendências temáticas dos graduandos em
Biblioteconomia: um estudo a partir dos trabalhos de conclusão de curso da UFRN. Revista Brasileira de Educação em Ciência da
Informação, v. 2, n. 2, p. 108-123, 2015. Disponível em: http://abecin.org.br/portalderevistas/index.php/rebecin/article/view/33 Acesso em:
02 out. 2019.

EVARISTO, Conceição. Literatura negra: uma poética de nossa afro-brasilidade. Scripta, v. 13, n. 25, p. 17-31, 2009. Disponível em:
http://periodicos.pucminas.br/index.php/scripta/article/view/4365 Acesso em: 02 out. 2019.

FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. La Piqueta, 1992.

LEMOS, Antônio Agenor Briquet de. Bibliotecas. In: CAMPELLO, Bernadete Santos, CALDEIRA, Paulo da Terra, MACEDO, Vera Amália
Amarante. (Orgs.). Formas e expressões do conhecimento: introdução às fontes de informação. Belo Horizonte: Escola de
Biblioteconomia da UFMG, 1998. 414 p. p. 347-366.

LIMA, Telma Cristiane Saso de; MIOTO, Regina Célia Tamaso. Procedimentos metodológicos na construção do conhecimento científico: a
pesquisa bibliográfica. Revista Katálysis, v. 10, 2007. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rk/v10nspe/a0410spe Acesso em: 11 jun.
2019.

MARCONI, Marina de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Fundamentos da Metodologia Científica. 5° ed. São Paulo: Editora Atlas, 2003.

MORESI, Eduardo. (Org.). Metodologia da pesquisa. Brasília: Universidade Católica de Brasília, 2003. Disponível em:
http://http://www.unisc.br/portal/upload/com_arquivo/metodologia_da_pesquisa.pdf Acesso em: 11 jun. 2019.

MUELLER, Suzana Pinheiro Machado. O ensino de biblioteconomia no Brasil. Ciência da Informação, v. 14, n. 1, p. 3-15, 1985. Disponível
em: http://revista.ibict.br/ciinf/article/view/222/222 Acesso em: 11 jun. 2019.

ORTEGA, Cristina Dotta. Relações históricas entre biblioteconomia, documentação e ciência da informação. DataGramaZero-Revista de
Ciência da Informação, v. 5, n. 5, 2004. Disponível em: http://bsf.org.br/wp-content/uploads/2017/05/ORTEGA-RELA%C3%87%C3%95ES-
HIST%C3%93RICAS-ENTRE-BIBLIOTECONOMIA-DOCUMENTA%C3%87%C3%83O-E-CI%C3%8ANCIA-DA-
INFORMA%C3%87%C3%83O.pdf Acesso em: 02 out. 2019.

125
v. 5, n. esp., p. 118-126, 2019.
Educação Antirracista no Ensino da Biblioteconomia: percepção discente

SILVA, Franciéle Carneiro Garcês da. A Inserção da Temática Africana e Afro-Brasileira no Ensino de Biblioteconomia da
Universidade do Estado de Santa Catarina. 2016. Monografia (Bacharel em Biblioteconomia) – Centro de Ciências Humanas e da
Educação, Universidade do Estado de Santa Catarina, Florianópolis, 2016.

SILVA, Franciéle Carneiro Garcês da; PIZARRO, Daniella Câmara; SALDANHA, Gustavo Silva. As temáticas africana e afro-brasileira em
Biblioteconomia e Ciência da Informação. Tendências da Pesquisa Brasileira em Ciência da Informação, v. 10, n. 2, 2017. Disponível
em: http://enancib.marilia.unesp.br/index.php/xviiienancib/ENANCIB/paper/view/362 Acesso em: 15 jun. 2019.

SILVA, Kyara Vasques; VALÉRIO, Eerinaldo Dias; SILVA, Joselina da. Um olhar da Biblioteconomia sobre os movimentos sociais negros no
Nordeste. Administração Pública e Gestão Social, v. 2, n. 3, p. 286-297, 2010. Disponível em:
https://periodicos.ufv.br/ojs/apgs/article/view/4030 Acesso em: 07 jun. 2019.

SILVA, Quedma Ramos da. Biblioteca escolar na luta antirracismo: reflexões sobre a aplicaçãoda Lei 10.639/2003. 2017. 90 f. Trabalho
de Conclusão de Curso (BAcharelado em Biblioteconomia) – Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2017.

VALÉRIO, Erinaldo Dias; CAMPOS, Arthur Ferreira. Competência informacional para uma formação bibliotecária antirracista. Revista ACB,
v. 24, n. 2, p. 321-332, 2019. Disponível em: https://revista.acbsc.org.br/racb/article/view/1612/pdf Acesso em: 07 jun. 2019.

VALÉRIO, Erinaldo Dias; SILVA, Dávila Maria Feitosa da. Discutindo as relações raciais: os trabalhos de conclusão de curso em
Biblioteconomia da Universidade Federal do Cariri–UFCA. Revista Brasileira de Educação em Ciência da Informação, v. 4, p. 132-145,
2017. Disponível em: http://abecin.org.br/portalderevistas/index.php/rebecin/article/view/84 Acesso em: 07 jun. 2019.

Artigo submetido em: 01/12/2019


Aceito em: 31/12/2019

Centro de Ciências Sociais Aplicadas


Mestrado Profissional em Biblioteconomia

Este periódico é uma publicação do Programa de Pós-Graduação em Biblioteconomia da Universidade


Federal do Cariri em formato digital e periodicidade semestral.

126
v. 5, n. esp., p. 118-126, 2019.

Você também pode gostar