Tese Finalizada

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 251

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL

FACULDADE DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

SILVIA SEGOVIA ARAUJO FREIRE

O SILÊNCIO E O SOFRIMENTO/ADOECIMENTO PSÍQUICO DOCENTE SOB A


ANÁLISE DA PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL: das condições às emoções

CAMPO GRANDE - MS
2023
SILVIA SEGOVIA ARAUJO FREIRE

O SILÊNCIO E O SOFRIMENTO/ADOECIMENTO PSÍQUICO DOCENTE SOB A


ANÁLISE DA PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL: das condições às emoções

Relatório de defesa de Tese apresentado ao Programa


de Pós-Graduação em Educação da Universidade
Federal de Mato Grosso do Sul – Faculdade de
Educação como requisito parcial à obtenção do título
de Doutor.

Área de Concentração: Educação

Linha de Pesquisa: Processos formativos, práticas


educativas, diferenças.
Grupo de Estudo GEPPE – Grupo de Estudo e
Pesquisa em Psicologia e Educação.

Orientadora: Professora Doutora Sônia da Cunha Urt

CAMPO GRANDE - MS
2023
Freire, Silvia Segovia Araujo Freire. 2023.
O silêncio e o sofrimento/adoecimento psíquico docente sob a
análise da psicologia histórico-social: das condições às emoções/Silvia
Segovia Araujo Freire. – Campo Grande, 2023.
250fl.
Trabalho de Tese (Pós-Graduação em Educação) – Universidade
Federal de Mato Grosso do Sul – Campus Campo Grande, 2023.

Orientadora: Professora Doutora Sônia da Cunha Urt

1. Palavras-chave: 1.2 Sofrimento/Adoecimento Psíquico; 1.3


Psicologia Histórico-cultural; 1.4 Professores de Escola Pública. I. Freire, Silvia
Segovia Araujo. II. Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. – Campus de
Campo Grande. III. O silêncio e o sofrimento/adoecimento psíquico docente sob a
análise da psicologia histórico-social: das condições às emoções.
CDD (XX) XXX XXX
SILVIA SEGOVIA ARAUJO FREIRE

O SILÊNCIO E O SOFRIMENTO/ADOECIMENTO PSÍQUICO DOCENTE


SOB A ANÁLISE DA PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL: das condições
às emoções

Trabalho Acadêmico apresentado ao


Programa de Pós- Graduação em Educação
da Universidade Federal de Mato Grosso
do Sul – Campus de Campo Grande como
requisito parcial para obtenção do título de
doutor em Educação.

Campo Grande, MS, ______ de _______________ de 2022

BANCA EXAMINADORA

______________________________
Prof.ª Dr.ª Sônia da Cunha Urt
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul - UFMS
Orientadora

_______________________________
Prof.ª Dr.ª Marilda Gonçalves Dias Facci
Universidade Estadual de Maringá – UEM
Membro Titular

______________________________
Prof.ª Dr.ª Flavines Rebolo
Universidade Católica Dom Bosco – UCDB
Membro Titular

______________________________
Prof.ª Dr.ª Celia Beatriz Piatti
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul - UFMS
Membro Titular

________________________________
Prof.ª Dr.ª Josiane Peres Gonçalves
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul – UFMS
Membro Titular
______________________________
Prof.ª Dr.ª Maria Aparecida Lima dos Santos
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul – UFMS
Membro Suplente
Dedico esta Tese à minha família, pelo
apoio incondicional, e a todos os professores
que fazem da educação uma arte de transformar vidas!
AGRADECIMENTOS

A Deus a quem, de forma carinhosa, refiro-me sempre como “O Cara lá de cima”, em quem
acredito e a quem confio meus sonhos, desejos, angústias, tristezas e toda a minha vida.

À minha família, meus pais, minha sogra, meus irmãos, cunhadas (os), sobrinhos (as) que
sempre me apoiaram incondicionalmente e me ajudaram de todas maneiras para realizações dos
meus sonhos, em especial ao meu esposo Maurício que sempre compreendeu minhas ausências
e de todas as formas esteve junto a mim, e ao meu filho Juliano, para quem busco sempre fazer
e ser melhor, razão da minha vida.

Aos meus colegas de trabalho pelo apoio e compreensão frente as minhas falhas e ausências, e
que se fizeram presentes durante toda a minha caminhada até a finalização do meu trabalho.

As ASSS, que de colegas de trabalho que se tornaram amigas para vida!

Ao Ertz Clarck Melindre amigo que a graduação e a vida me presentearam.

À Professora Doutora Sônia da Cunha Urt, leonina, sinônimo de intensidade, apaixonada pela
docência que me recebeu com paciência e me encaminhou para a concretização desta Tese,
mesmo diante das minhas dificuldades, e que me proporcionou grandes e valiosos aprendizados.

Ao GEPPE e aos colegas de grupo que me proporcionaram longas e intensas noites de estudo
e me recepcionaram desde o início da forma mais acolhedora possível.

Agradeço a banca examinadora que em muito contribuiu com o meu trabalho, a Professora Dra.
Marilda Gonçalves Dias Facci, Professora Dra. Flavines Rebolo, Professora Dra. Celia Beatriz
Piatti e a Professora Dra. Josiane Peres Gonçalves.

À Professora Doutora Regina Baruki-Fonseca, por quem tenho imenso carinho e admiração,
que sempre esteve presente nas minhas caminhadas e conquistas acadêmicas e que, com sua
humildade e sabedoria, sempre me incentivou a acreditar em mim mesma.

À Adaline, companheira de estudo, orientação, apresentação de trabalhos e eventos, que me fez


perceber a força de vontade do ser humano quando, em seu trabalho de turno noturno, em plena
pandemia, discutíamos nossos artigos, em meio a sinais sonoros de monitores cardíacos e
respiratórios.

À Ariane e à Jussimara que, de colegas de grupos de estudo, transformaram-se em amigas para


a vida toda e que proporcionaram boas e leves risadas durante nossos encontros de estudo, assim
como Valquíria que nunca hesitou em colaborar com seus conhecimentos tecnológicos e
atenção.

À Secretária Adjunta Maria do Carmo Provenzano, que não hesitou em colaborar de todas as
maneiras necessárias para a realização desta pesquisa.

A todos os professores que, de forma carinhosa, dedicaram um pouquinho do seu valioso tempo
para participar e contribuir para a consumação desta Tese.
RESUMO
Na realização de sua atividade o ser humano envolve seus desejos, expectativas, sentimentos e
suas emoções, e a forma como os organiza e os controla contribui diretamente para sua atuação
frente as diferentes situações do ambiente de trabalho. A partir dessa compreensão, esta
pesquisa teve como objetivo principal analisar as causas do sofrimento/adoecimento psíquico
dos professores da rede municipal de educação do município de Corumbá – Mato Grosso do
Sul sob o olhar da Psicologia Histórico-Cultural (PHC). A escolha por essa abordagem teórica
ocorreu por possibilitar entender os fenômenos como o sofrimento/adoecimento psíquico e sua
amplitude a partir das questões que abarcam a atividade do ser humano e suas dimensões
constituídas concreta e historicamente. Trata-se de uma pesquisa qualitativa que utilizou como
procedimentos metodológicos a aplicação dos seguintes instrumentos: um questionário com
cinco itens de investigação e duas escalas, o Questionário de estresse nos Professores: Ensino
Básico e Secundário (QSPEBS) e o Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20), aplicados em um
mesmo formulário para os professores por meio da plataforma online. Para os gestores, foi
aplicado um questionário que teve como objetivo investigar a existência de ação, projeto ou
programa de enfrentamento e a concepção do sofrimento/adoecimento psíquico docente com a
finalidade de complementação aos discursos dos professores. O questionário foi aplicado aos
professores que se encontravam em sala de aula, e no total de 984 questionários aplicados,
atingimos 118 (12%) respostas, e em relação aos gestores, de 251 participantes, alcançamos 26
respostas (10,35%). Ao todo, entre professores e gestores participantes, obtivemos 144
respostas. Devido a pandemia os instrumentos foram aplicados por meio de plataforma online
organizados no Google Forms. As informações coletadas foram organizadas em tabelas e as
respostas apresentadas por frequência. Para o processo de análise e discussão, consideramos as
quatro primeiras respostas com maiores frequências de cada tabela. Os resultados revelaram
semelhanças e disparidades nas respostas dos professores e gestores, mas apontaram que as
relações interpessoais, as condições de trabalho, situações inesperadas como a pandemia,
disponibilização e formação para o uso de recursos tecnológicos, a falta de ambiente saudável
e de uma escuta qualificada e a ausência de ações, projetos, programas para instrumentalizar os
professores a administrar ou minimizar o sofrimento/adoecimento psíquico são aspectos
considerados importantes para os professores e gestores. Os gestores identificaram a ausência
ou a precarização de ação, projetos ou programas para prevenção do sofrimento/adoecimento
psíquico docente. Tanto os professores quanto os gestores que participaram da pesquisa
apontam que assuntos pertinentes à saúde mental, atendimento psicológico, coletivo ou
individual, ambientes de trabalho saudáveis, mais e melhores formações e aspectos relativos às
condições de trabalho são temas importantes para futuros projetos que visem o enfrentamento
ao sofrimento/adoecimento psíquico docente. Foi evidenciado nessa pesquisa que as condições
sociais consequentes da materialidade da sociedade capitalista resultam na desvalorização e
falta de prestigio do trabalho docente, nas condições inadequadas e sobrecarga de trabalho, e,
portanto, propiciam o comprometimento das relações interpessoais e o silenciamento das
emoções dos professores oportunizando o sofrimento/adoecimento psíquico.

Palavras-chave: Sofrimento/Adoecimento Psíquico; Psicologia Histórico-Cultural;


Professores de Escola Pública.
ABSTRACT

In carrying out their activity, human beings involve their desires, expectations, feelings and
emotions, and the way in which they organize and control them will directly contribute to their
performance in the face of different situations in the work environment. Based on this
understanding, this research had as its main objective to analyze the causes of suffering/psychic
illness of teachers from the municipal education network in the municipality of Corumbá - Mato
Grosso do Sul from the perspective of Historical-Cultural Psychology (PHC) The choice for
this The theoretical approach made it possible to understand phenomena such as psychic
suffering/illness and its scope based on questions that encompass human activity and its
concrete and historically constituted dimensions. This is qualitative research that used the
following instruments as methodological procedures: a questionnaire with five research items
and two scales, the Stress Questionnaire for Teachers: Basic and Secondary Education
(QSPEBS) and the Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20), applied in the same form to
teachers through the online platform. For the managers, a questionnaire was applied with the
objective of investigating the existence of action, project or coping program and the conception
of the teaching psychic suffering/illness with the purpose of complementing the teachers'
speeches. The questionnaire was applied to the teachers who were in the classroom, and in the
total of 984 questionnaires applied, we reached 118 (12%) answers, and in relation to the
managers, out of 251 participants, we reached 26 answers (10.35%). In all, among participating
teachers and administrators, we obtained 144 responses. Due to the pandemic, the instruments
were applied through an online platform organized in Google Forms. The collected information
was organized in tables and the answers presented by frequency. For the analysis and discussion
process, we considered the first four responses with the highest frequencies in each table. The
results revealed similarities and disparities in the responses of teachers and managers, but
pointed out that interpersonal relationships, working conditions, unexpected situations such as
the pandemic, availability and training for the use of technological resources, the lack of a
healthy environment and listening qualified and the absence of actions, projects, programs to
equip teachers to manage or minimize psychological suffering/illness are aspects considered
important for teachers and administrators. Managers identified the absence or precariousness
of action, projects or programs to prevent teacher suffering/psychic illness. Both teachers and
managers who participated in the survey point out that issues related to mental health,
psychological care, collective or individual, healthy work environments, more and better
training and aspects related to working conditions are important topics for future projects aimed
at coping with the teaching psychological suffering/illness. It was evidenced in this research
that the social conditions resulting from the materiality of capitalist society result in the
devaluation and lack of prestige of teaching work, in inadequate conditions and work overload,
and therefore lead to the compromise of interpersonal relationships and the silencing of
teachers' emotions, providing opportunities for psychic suffering/illness.

Keywords: Suffering/Psychic Illness; Historical-Cultural Psychology; Public School Teachers.


LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Localização de Corumbá em Mato Grosso do Sul 98

Figura 2 – Valores - Profissional de Educação 20 horas 102


LISTA DE TABELAS

Tabela 01 – Trabalhos encontrados com o descritor sofrimento psíquico dezembro


de 2020 .................................................................................................. 55
Tabela 02 - Instrumentos/Procedimentos para coleta de dados/Teoria/Método –
Descritor Sofrimento Psíquico .............................................................. 56
Tabela 03 - Trabalhos encontrados com o descritor Adoecimento Psíquico descrito
nos resumos em janeiro de 2022............................................................. 56
Tabela 04 - Instrumentos/Procedimentos para coleta de dados/Teoria/Método –
Descritor Adoecimento Psíquico........................................................... 57
Tabela 05 - Relação dos artigos nos bancos de dados SCIELO e BIREME sobre
adoecimento psíquico relacionado ao trabalho
docente................................................................................................... 58
Tabela 06 - Relação dos artigos nos bancos de dados SCIELO e BIREME sob o
aporte da THC e Adoecimento
Docente.................................................................................................. 59
Tabela 07 – Relação de teses e dissertações no Banco de teses e dissertações da
CAPES com o descritor -adoecimento psíquico- relacionado ao
trabalho docente à luz da PHC............................................................... 60
Tabela 08 - Identificação: sexo, idade e estado civil................................................ 99
Tabela 09 - Graduação e ano de conclusão............................................................... 99
Tabela 10 - Pós-Graduação e ano de conclusão........................................................ 100
Tabela 11 - Sensação em relação ao seu trabalho..................................................... 105
Tabela 12 - Repostas das condições que mais e menos agradam os professores...... 107
Tabela 13 - Atividades realizadas no trabalho consideradas prazerosas e
consideradas menos prazerosas............................................................. 111
Tabela 14 - Gosta do trabalho? Motivos que justifiquem gostar do trabalho........... 115
Tabela 15 - Se pudesse, mudaria de profissão? Caso sua resposta for sim, para qual
profissão? Por que?................................................................................ 116
Tabela 16 - Possui problema de saúde? Caso tenha respondido Sim, qual.............. 120
Tabela 17 - Seu problema de saúde é anterior ou posterior ao início da sua atividade
profissional?.......................................................................................... 122
Tabela 18 - hipótese sobre o adoecimento e situações que pode manifestar a doença 124
Tabela 19 - Solicitação de afastamento do trabalho por razões de saúde nos últimos
12 meses. Se sim, por quanto tempo ficou afastado?............................ 129
Tabela 20 - Toma ou tomou algum medicamento nos últimos 12 meses? Caso sim,
qual medicamento?................................................................................ 130
Tabela 21 - Efeitos positivos e Efeitos negativos do medicamento.......................... 132
Tabela 22 - Você considera que os problemas de saúde enfrentados causam
prejuízo na sua atividade profissional? Considerações sobre os
prejuízos na atividade devido aos problemas de saúde......................... 135
Tabela 23 - Considera que a atividade docente pode ter provocado seu problema
de saúde? Se sim, como o trabalho pode ter causado seu problema de
saúde...................................................................................................... 136
Tabela 24 - A pandemia prejudicou sua saúde?....................................................... 138
Tabela 25 - Você teve dificuldade de exercer seu trabalho em tempo de pandemia?
Caso sim, qual?...................................................................................... 141
Tabela 26 - Foram disponibilizados os recursos tecnológicos para o desempenho
das atividades docente? Caso sim, quais?............................................. 144
Tabela 27 - Foi ofertada formação para a utilização? Caso tenha respondido Sim,
fale sobre essas formações..................................................................... 146
Tabela 28 - A pandemia prejudicou a qualidade do seu trabalho? Caso tenha
respondido Sim, de que forma? Exemplifique....................................... 148
Tabela 29 - Relate alguma experiência ou projeto de enfrentamento que você
conhece ou participou para situações emergenciais de adoecimento?... 150
Tabela 30 - Quais medidas/ações de enfrentamento poderiam ser realizadas para
minimizar o Sofrimento/adoecimento psíquico do(a) professor(a)?
Descreva neste espaço............................................................................ 153
Tabela 31 - Informações que considere importantes acrescentar.............................. 155
Tabela 32 - Respostas da Escala – SRQ-20............................................................... 159
Tabela 33 - O nível de estresse que sente geralmente no exercício da sua atividade
profissional............................................................................................. 163
Tabela 34 - Fontes potencialmente geradoras de estresse – Quesito ALUNOS....... 165
Tabela 35 - Fontes potencialmente geradoras de estresse – Quesito CARREIRA... 168
Tabela 36 - Fontes potencialmente geradoras de estresse – Quesito
ORGANIZAÇÃO/CONDIÇÕES DE TRABALHO.............................. 172
Tabela 37 - Identificação: sexo, idade e estado civil................................................. 176
Tabela 38 - Graduação e ano de conclusão............................................................... 176
Tabela 39 - Pós-Graduação e ano de conclusão........................................................ 177
Tabela 40 - Vínculo empregatício/ Cargo que ocupa/ Função que desempenha...... 177
Tabela 41 - Existe algum Programa, Ação, Projeto para prevenção do adoecimento
docente no município de Corumbá MS? Se sim, Qual?........................ 178
Tabela 42 - Caso Não, por quê?............................................................................... 179
Tabela 43 - Em relação a escola que coordena, existe alguma Ação, Projeto,
Programa para prevenir o adoecimento docente? Caso afirmativo,
como?..................................................................................................... 181
Tabela 44- Na sua opinião, quais temáticas e períodos seriam necessários em
Programas para prevenção do sofrimento/adoecimento docente?......... 182
Tabela 45- Atualmente tem conhecimento das principais causas de afastamento
para tratamento de saúde dos docentes? Se sim, fale sobre elas............. 186
Tabela 46 - Foram disponibilizados recursos tecnológicos para o desempenho das
atividades docentes? Se sim, quais?....................................................... 188
Tabela 47 - E quanto à qualidade dessa disponibilidade, fale sobre ela................... 188
Tabela 48 - E houve formação para os docentes utilizarem os recursos
tecnológicos? Se sim, qual?................................................................... 189
Tabela 49 - Quais ações considera importante para contribuir com o Trabalho
Docente caso persista o trabalho remoto?.............................................. 193
Tabela 50 - Quais ações considera importantes para contribuir com Saúde Psíquica
do Docente, evitando o seu adoecimento, caso persista o trabalho
remoto?.................................................................................................. 194
Tabela 51- Houve afastamento de docentes por problemas de ordem psíquica no
período de pandemia? Se sim, saberia descrever quais?....................... 197
Tabela 52- Causas de afastamento no período de 01/01/2020 até 31/12/2021
CID 10- F.............................................................................................. 198
Tabela 53- Informações que considere importantes acrescentar.............................. 200
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABRASME – Associação Brasileira de Saúde Mental


CAPS – Centro de Atenção Psicossocial
CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CEBES – Centro Brasileiro de Estudos em Saúde
CEMEI – Centro de Educação Municipal de Ensino Integral
CEP – Comitê de Ética em Pesquisa
CID – Classificação Internacional de Doenças
COVID – Corona Vírus Disease
MLA – Movimento da Luta antimanicomial
MTSM – Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental
MS – Mato Grosso do Sul
NAPS – Núcleo de Apoio Psicossocial
NASF – Núcleo de Assistência à Saúde da Família
PHC – Psicologia Histórico-cultural
PMC – Prefeitura Municipal de Corumbá
PNASH/Psiquiatria - Programa Nacional de Avaliação dos Serviços Hospitalares
QSPEBS - Questionário de estresse nos Professores: Ensino Básico e Secundário
RAPS – Rede de Atenção Psicossocial
SENAD – Secretaria Nacional sobre Drogas
SISNAD – Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre drogas
SRQ-20 - Self-Reporting Questionnaire
SRTs – Serviços de Residências Terapêuticas
SUS – Sistema Único de Saúde
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.................................................................................................................... 20

1.0 SAÚDE E SOFRIMENTO/ADOECIMENTO: Da forma de se pensar o cuidado à


compreensão do sofrimento/adoecimento psíquico à luz da Psicologia Histórico-
cultural................................................................................................................................... 25
1.1 A importância da reforma psiquiátrica para o cuidado da pessoa com sofrimento
mental................................................................................................................................... 26
1.2 Conceito de saúde e doença: normal e patológico na saúde mental - algumas reflexões 32
1.3 Sofrimento /adoecimento psíquico na concepção da Psicologia Histórico-Cultural........ 38
1.4 Levantamento de dados a partir de um único descritor em períodos e banco de dados
distintos: em busca do aporte da Psicologia Histórico-cultural para análise do
sofrimento/adoecimento psíquico docente............................................................................. 53
2.0 DOCÊNCIA E SUAS MANIFESTAÇÕES PSÍQUICAS....................................... 65
2.1 O sujeito professor e sua constituição: trajetória profissional e pessoal......................... 66
2.2 Sofrimento psíquico/adoecimento: quando as emoções são silenciadas......................... 74
2.3 Quando o docente se cala, o corpo e mente adoece........................................................ 80
2.4 Docência e o trabalho remoto: percepções e consequências da pandemia na educação. 86
3.0 SOFRIMENTO PSÍQUICO E ATIVIDADE DOCENTE: como o professor percebe
o sofrimento/adoecimento psíquico ....................................................................................... 92

3.1 Pressupostos teóricos..................................................................................................... 93


3.2 Percurso metodológico.................................................................................................. 96
3.3 Contexto e sujeitos da pesquisa.................................................................................... 98
3.4 Dos questionários dos professores: resultados e análises........................................... 99
3.4.1 identificação dos participantes da pesquisa ................................................................ 99
3.4.2 Percepção do trabalho docente.................................................................................... 105
3.4.3 Visão sobre o trabalho docente................................................................................... 114
3.4.4 A visão sobre o adoecimento do docente.................................................................... 119
3.4.5 Trabalho remoto e adoecimento docente.................................................................... 137
3.4.6 Percepção docente sobre o enfrentamento ao adoecimento....................................... 150
3.5 Das escalas dos professores: resultados e análises................................................ 158
3.5.1 Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20) ................................................................... 158
3.5.2 Questionário de estresse nos Professores: Ensino Básico e Secundário (QSPEBS). 162
3.6 Dos questionários dos gestores: resultados e análises............................................. 175
3.6.1 identificação dos participantes da pesquisa. ................................................................ 176
3.6.2 Projetos realizados para prevenir o adoecimento docente............................................ 178
3.6.3 Processo de trabalho docente em tempo de pandemia ................................................. 188
3.7 Docentes x Gestores: percepções sobre o sofrimento/adoecimento psíquico................ 202
CONSIDERAÇÕES POSSÍVEIS ...................................................................................... 210
REFERÊNCIAS .................................................................................................................. 215
APÊNDICE........................................................................................................................... 234
Apêndice A – TCLE Termo de Consentimento Livre Esclarecido....................................... 234
Apêndice B – Solicitação e autorização para coleta de dados da secretaria municipal de
educação de Corumbá MS...................................................................................................... 235
Apêndice C - Questionário aplicado para coleta de dados dos professores........................... 236
Apêndice D – Questionário aplicado para coleta de dados dos gestores................................ 239
ANEXO ................................................................................................................................ 241
Anexo A – Aprovação do projeto de pesquisa pelo colegiado dos cursos de mestrado e
doutorado em educação.......................................................................................................... 241
Anexo B - Aprovação e autorização da pesquisa - comitê de ética....................................... 242
Anexo C - Resposta e disponibilização à solicitação de informações da superintendência
de recursos humanos.............................................................................................................. 249
Anexo D - Escala Self-Reporting Questionnaire – SRQ-20.................................................. 250
Anexo E - Questionário de estresse nos Professores: Ensino Básico e Secundário
(QSPEBS)............................................................................................................................... 251
APRESENTAÇÃO

Este trabalho teve como objeto de estudo investigar a concepção dos profissionais de
educação do município de Corumbá MS sobre do sofrimento/adoecimento psíquico docente e
como percebem essa situação em si e/ou no outro. Para fundamentação teórica optou-se pela
Psicologia Histórica Cultural (PHC) por perceber o ser humano como ser atuante e
transformador de sua sociedade por meio de sua atividade considerando seu conhecimento
cultural e científico.
O interesse pelo tema surge após anos de exercício profissional em saúde mental,
atendimento em serviço substitutivo – Centro de atenção psicossocial (CAPS) e a paixão pela
docência. Me formei em Psicologia pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campus
do Pantanal, e desde a minha formação me dediquei a saúde pública, mais especificamente as
políticas de saúde mental e a prática no serviço público. Durante os meus contínuos processos
de aprendizado como profissional sempre me interessei também pela docência, praticando
sempre que possível a função docente, tanto em instituição pública quanto privada, pois para
mim, a saúde mental e docência são duas paixões, que ao meu ver, se relacionam, se misturam
e se completam. Sou mestre em Saúde, pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul,
Campus de Campo Grande, pelo Programa de Pós-Graduação em Saúde e Desenvolvimento da
Região Centro-Oeste no ano de 2012.
Inicialmente tive a vontade de estudar a prevalência de doenças sexualmente
transmissíveis em dependentes químicos, público atendido no centro de atenção psicossocial
álcool e outras drogas (CAPS ad), onde trabalhei por muitos anos. Em contrativas verbais com
o orientador, estudamos primeiramente em puérperas, por ser o público alvo de suas pesquisas,
para futuramente então, estudar na população da qual eu tinha interesse. Porém, com o passar
do tempo, a dedicação ao serviço público e as experiências cada vez mais frequente no ensino
superior concomitante ao anseio de exercer a docência, me fizeram ver no doutorado a
possibilidade de estudar algo que contribuísse tanto para o meu aprendizado e formação, quanto
a união da saúde mental e docência de fato. Foi uma mudança radical, mas que com o passar
do tempo, me possibilitou perceber e estudar realmente algo que faria sentido para minha
atuação.
Nesse sentido, após longos e permanentes anos da luta antimanicomial é nítido o
preconceito histórico gerado acerca das pessoas que se diferem, seja de forma quantitativa ou
qualitativamente das “normas” de uma sociedade que preconiza exclusivamente, por interesse,
o sujeito produtivo como caminho para o enriquecimento.
Nesse modelo de enquadramento não se descarta a educação, que por sua vez, está
sendo cada vez mais pautada em indicadores e metas a serem cumpridos. Contudo, importante
ressaltar que em todo esse processo existe o fator humano, que desempenha sua atividade em
busca do cumprimento desses resultados. Me refiro ao professor, profissional que tem
desempenhado suas atividades tentando satisfazer as suas próprias necessidades e ao mesmo
tempo, às exigências de uma sociedade que se necessário, aliena, causa sofrimento e o
adoecimento para atender aos seus interesses. Eis aqui, mais uma vez, a saúde mental e à
educação interligadas em um emaranhado de interesses, desejos, motivos e conflitos.
A partir do momento que consegui apreender um pouco da teoria da PHC, sobre
Vigotski1 e suas obras, e estudos e atividades desenvolvidas no grupo de estudo e pesquisa
GEPPE/UFMS, percebi que muitas indagações que existiam quanto ao
sofrimento/adoecimento, formas de lidar com diferentes situações da vida, desenvolvimento
qualitativo do ser humano, percepção, formas de trabalho e suas consequências, foram sendo
compreendidas, e reafirmando a ideia que sempre temos algo a aprender, que o aprendizado
nunca é acabado, mas sempre ampliado. Poder aprender e se apropriar de melhores
conhecimentos que possam contribuir com a minha prática e me preparar para a vida acadêmica
me motivou a seguir com o desafio do doutorado.
A teoria de Vigotski proporcionou a expansão dos meus questionamentos quanto aos
processos de trabalho e do sofrimento/adoecimento como possível consequência desse
percurso. Nessa perspectiva, a educação é o meio pelo qual o sujeito pode ter melhores e
maiores possibilidades de se desenvolver, de as suas relações se expandirem, e mais, maior
probabilidade do desenvolvimento qualitativo de suas funções psicológicas superiores, e assim,
ser um ser criativo e consciente no desempenho de suas inúmeras atividades ao longo da vida,
inclusive no ambiente de trabalho. Logo, essa pesquisa se justifica pela relevância social em
compreender o processo de trabalho do professor e as possíveis causas de
sofrimento/adoecimento que acometem inúmeros trabalhadores da educação que são
integrantes ativo no processo de desenvolvimento do ser humano, além de pensar possíveis
formas de prevenção e enfrentamento para essas consequências.
Ao aprender que as relações humanas podem influenciar o desenvolvimento do ser
humano ou mesmo, podem ocasionar o sofrimento/adoecimento, foi possível a compreensão
desse fenômeno e refletir sobre possibilidades de propiciar melhores condições e propor novas

1
Nas referências ao psicólogo soviético, a grafia do seu nome é registrada de diversas formas, como Vigotski,
Vigotsky, Vygotsky. Neste trabalho, usamos Vigotski, para preservar a grafia usada pela maioria dos autores
consultados.
formas de prevenção e/ou enfrentamento às diferentes adversidades vividas por esses
profissionais.
20

INTRODUÇÃO

Ao longo dos anos, a atividade – (trabalho) - desempenhada pelo ser humano para sua
sobrevivência vem sofrendo incontáveis mudanças visando acompanhar o desenvolvimento
tecnológico, social e econômico da sociedade.
A atividade é uma ação que possui transformações constantes e compõem aspectos
psicológicos, corporais e materiais. Leontiev (2021) explica que a atividade é uma unidade da
vida mediada pelo reflexo psíquico, cuja função se baseia em orientar o ser humano no mundo
externo. Em outras palavras, a atividade não é uma reação ou um conjunto de reações, mas um
sistema que tem estrutura, transições e transformações internas e desenvolvimento próprio.
É evidente que a atividade de cada pessoa, individualmente, depende de seu lugar na
sociedade, das condições que lhe cabem, de como isso se organiza em circunstâncias
individuais únicas (LEONTIEV, 2021, p. 104).
Assim, o trabalho é considerado de aspecto fundamental na vida do ser humano,
proporciona a construção de sua identidade e o possibilita satisfazer suas necessidades, porém,
o mesmo pode provocar o sofrimento/adoecimento físico e psíquico:
Os profissionais professores também acompanharam transformações no trabalho
educativo, principalmente nas últimas duas décadas. A erosão dos salários, a falta de
estrutura material e humana nas escolas, a descontinuidade de anos letivos devido a
frequentes greves, a crescente violência nas comunidades, entre outros,
simultaneamente produtos e produtores da desvalorização profissional e do
decorrente sofrimento no trabalho (MOREIRA; RODRIGUES, 2018, p. 237).

Nesse caminho, Martinez (2002) aponta os reflexos que essas novas formas de
produção e de relações sociais têm sobre o mundo do trabalho: incremento da produtividade
pelo aumento do ritmo de trabalho; diminuição das pausas para descanso e aumento da carga
de responsabilidade dos trabalhadores; flexibilização de horários com diminuição da jornada
de trabalho e/ou exigência de horas-extras; medo da demissão e insegurança quanto ao futuro,
gerando competitividade; e a tendência de controle dos riscos ocupacionais mais agressivos,
com persistência de exposições a riscos em baixas dosagens, arriscando a vida em ambientes
insalubres. Esse processo tem produzido mudanças no perfil de morbimortalidade dos
trabalhadores, produzindo efeitos físicos, psicológicos e comportamentais.
Nesse cenário, Codo (2006, p. 54) afirma que o possível enquadramento da doença
mental como “doença profissional” arranca a discussão e o diagnóstico do foro privado e o
remete a uma instância pública, necessariamente política.
A exposição dos trabalhadores a riscos físicos, químicos, ergonômicos, psicossociais
e/ou biológicos advindos da execução do trabalho pode contribuir para o desenvolvimento de
doenças e agravos ocupacionais. Apesar de representar um operador fundamental na construção
21

do ser humano, o trabalho - tanto no que se refere ao desenvolvimento das capacidades humanas
quanto à garantia das condições materiais de sobrevivência - tem sido, ao longo dos tempos,
provocador de sofrimento, adoecimento e morte (Conselho Nacional de Secretários de
Saúde/CONASS, 2011).
Ademais, o ano de 2020 foi marcado por um fenômeno que atingiu mundialmente as
pessoas e todos os contextos dos quais estavam inseridos (MEDEIROS; AZEVEDO, 2022), a
pandemia do COVID -19, infecção causada pelo vírus Sars-CoV-2.
Diante da necessidade de criar estratégias para contenção da contaminação por
COVID-19, os professores se depararam com uma nova forma de trabalho criada de imediato em
resposta a indispensabilidade do processo ensino aprendizagem, o trabalho remoto.
Ocorre que emerge o fenômeno ‘aula remota’, termo que merece uma reflexão à parte,
pois, em substituição à educação presencial, ainda que temporária e com
consequências inimagináveis, põe em questão suas diferenças com a educação à
distância. A aula remota é um terreno sobre o qual docentes do ensino fundamental
tinham pouco domínio, vendo-se inesperadamente obrigados a repensar seus
processos de trabalho por ambiente virtual e por plataformas de videoconferência que,
até então, estavam restritas ao ensino superior (SOUZA, et. al., 2021. p. 5).

Infinitas foram as sensações, sentimentos e consequências do trabalho remoto para os


professores, mas a gratidão e a empatia surgem como possíveis aliadas para o desempenho da
atividade docente em tempos de pandemia como forma de prevenção e/ou enfrentamento ao
sofrimento/adoecimento docente:
Sobre as implicações do trabalho remoto e da pandemia na saúde mental dos(as)
docentes, é importante destacar os relatos frequentes de sintomas associados a
transtornos mentais como ansiedade, depressão e estresse. Contudo, entre os fatores
que têm auxiliado nas dificuldades, o reconhecimento, por parte das escolas, das
famílias, estudantes e da sociedade como um todo, aparece como um importante
balizador para continuar exercendo sua profissão (COELHO et. al., 2021, p. 29).

Diante o exposto, são consideradas as seguintes questões problema: Qual a


compreensão dos profissionais de educação do município de Corumbá MS sobre saúde psíquica
e adoecimento? Percebem essa situação em si ou no Outro? Quais as consequências frente às
adversidades no processo de trabalho?
Nesse caminho, a Tese aqui defendida é que: As condições sociais consequentes da
materialidade da sociedade capitalista resultam na desvalorização e falta de prestigio do
trabalho docente, nas condições inadequadas e sobrecarga de trabalho, e, portanto, propiciam o
comprometimento das relações interpessoais e o silenciamento das emoções dos professores
oportunizando o sofrimento/adoecimento psíquico.
Nessa perspectiva, o objetivo geral foi analisar as causas do sofrimento/adoecimento
psíquico dos professores da Rede Municipal de Ensino Corumbá (MS), sobre sob o olhar da
Psicologia Histórico-Cultural. No que tange aos gestores, o interesse foi investigar a existência
22

de ações, programas e/ou projetos que visem o cuidado e a percepção sobre a saúde psíquica
dos docentes. E os objetivos específicos foram:
a) Inventariar os afastamentos de docentes – aposentadorias por doença – e
no caso doença psíquica.
b) Mapear a existência de ações ao bem estar e/ou adoecimento do professor
no município de Corumbá MS;
c) Traçar o perfil sociodemográfico dos professores da rede municipal de
ensino de Corumbá MS;
Como procedimentos adotados os seguintes instrumentos utilizados para a coleta de
dados dos professores:
01 questionário, com cinco itens de investigação: dados de identificação (sexo, idade,
estado civil, formação, ano e instituição, Pós-Graduação, ano e instituição); questões sobre o
trabalho docente; questões sobre adoecimento; questões sobre trabalho docente na pandemia;
questões sobre ações para o enfrentamento docente (Apêndice C)
02 escalas: Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20) (Apêndice D), e o Questionário de
estresse nos Professores: Ensino Básico e Secundário (QSPEBS) (Apêndice E).
Os três instrumentos para coleta dos dados foram organizados em um único documento
e aplicado por meio da plataforma google forms.
Em relação aos gestores, foi aplicado o questionário online (Apêndice D) que
objetivou coletar as informações sobre a existência de algum programa, projeto ou ação para
prevenção e a concepção sobre o sofrimento/adoecimento docente. As informações foram
coletadas a partir das seguintes questões: dados de identificação; Questões sobre Projetos
realizados para prevenir o adoecimento docente e Questões sobre o processo de Trabalho
Docente em tempo de pandemia, o questionário foi aplicado por meio da plataforma google
forms.
Inicialmente, foi proposto que a coleta de dados ocorreria com aplicação presencial
dos instrumentos pela própria pesquisadora. Porém, devido às restrições impostas pela
pandemia da COVID-19, essa opção teve de ser revogada. Em reunião com a Secretária Adjunta
de Educação, optou-se pelo envio dos instrumentos por meio do aplicativo WhatsApp, devido
à probabilidade de alcançar maiores índices de participação do que por outros meios virtuais
por existir um grupo de WhatsApp de cada escola. Os instrumentos foram enviados três vezes
para cada grupo de professores de cada escola, incluindo as escolas urbanas, rurais e das águas,
com uma mensagem introdutória da pesquisadora, esclarecendo o objetivo e a importância da
participação. Também foi ressaltada a valiosa participação dos Profissionais de Educação
durante as reuniões (online) da Secretaria Municipal de Educação e gestores de cada instituição
23

escolar durante o período em que esteve disponível para preenchimento, de maio a agosto de
2021. Ao final, de 984 professores que estão em sala de aula, recebemos 118 (12%) respostas.
Em relação aos gestores, o mesmo processo foi realizado, e de 251 participantes, recebemos 26
(10,35%) respostas. Na soma de participantes, entre professores e gestores, obtivemos 144
respostas.
Os dados coletados por meio dos questionários foram organizados em tabelas para
melhor compreensão do processo de análise. As respostas foram reunidas por frequência; dada
à importância de cada resposta, todas foram descritas, para melhor entendimento. Para o
processo de análise e discussão, levou-se em conta as quatro primeiras respostas de cada tabela,
por estarem organizadas de acordo com o número de frequência. Algumas respostas
dissertativas foram inseridas junto às análises, com o intuito de enriquecer os dados e o
conhecimento.
O presente texto foi organizado em três seções, e no início de cada uma delas citamos
um filme relacionado ao tema, como também, ao término, inserimos uma poesia que pudesse
contribuir com as reflexões. A escolha pelos filmes e poesias se deram com intuito de propiciar
a leveza e a fruição durante a leitura e aprendizado, pois tratam de aportes culturais criados
historicamente pelo ser humano, como também outras formas de artes, o teatro, a música,
filosofia, a pintura e muitos outros, que favorecem e enriquecem o desenvolvimento humano e
a aprendizagem, além de contribuir para saúde psíquica.
Na seção 1, denominado Saúde e sofrimento/adoecimento2: Da forma de se pensar
o cuidado à compreensão do sofrimento/adoecimento psíquico à luz da Psicologia
Histórico-cultural, apresenta-se a importância da reforma psiquiátrica brasileira para o
cuidado da pessoa com sofrimento psíquico, a discussão do conceito do normal e patológico e
a concepção do sofrimento/adoecimento psíquico sob o olhar da Psicologia Histórico-Cultural.
No encerramento do capítulo, está exposto um levantamento de dados em bancos de dados
distintos, a respeito do aporte da Psicologia Histórico-Cultural, para a análise do
sofrimento/adoecimento psíquico docente.
Ao fazer o resgaste da história da reforma psiquiátrica e o cuidado da pessoa com
sofrimento psíquico, estabelecemos diálogos com autores como Paulo Amarante, Franca
Basaglia e Michel Foucault por constituírem parte do processo histórico.
A seção 2, Docência e suas manifestações psíquicas, por sua vez, aborda a
constituição e a formação do professor, buscando compreender a sua trajetória profissional e

2
Entendemos que nem todo mundo que sofre adoece, por isso, usaremos no decorrer do trabalho os termos
sofrimento/adoecimento psíquicos dessa maneira, não como sinônimo, mas como forma de indicar que pode
ocorrer tanto um fenômeno quanto o outro no trabalhador.
24

pessoal. Além disso, este capítulo exibe a compreensão do sofrimento/adoecimento psíquico, a


partir do silenciamento das emoções no fazer pedagógico, quando o docente se silencia e o
corpo e a mente reagem, adoecem. Por fim, vale ressaltar que esta parte da tese trata também,
especificamente, da nova e inesperada forma de trabalho, o ensino remoto, que atingiu
diretamente as condições e a saúde dos profissionais de educação.
Alguns estudiosos mais influentes sobre o tema desta seção foram utilizados como
base, entre eles Antonio Manuel Seixas Sampaio da Nóvoa (1989, 2003, 2009).
A seção 3, Sofrimento psíquico e atividade docente: como os professores
percebem o sofrimento/adoecimento, apresenta os resultados coletados reunidos em tabelas
e as análises e discussões, organizados da seguinte maneira: Dos questionários dos
professores: resultados e análises: identificação dos participantes da pesquisa; e os eixos
divididos de acordo com as questões: Percepção do trabalho docente; Visão sobre o trabalho
docente; Visão sobre o adoecimento do docente; Trabalho remoto e adoecimento docente;
Percepção docente sobre o enfrentamento ao adoecimento. Das escalas dos professores:
resultados e análises: Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20) e Questionário de estresse nos
Professores: Ensino Básico e Secundário (QSPEBS).
Em relação aos gestores, os dados foram organizados na seguinte ordem: Dos
questionários dos gestores: resultados e análises: identificação dos participantes da pesquisa:
Sujeito; Questões sobre projetos realizados para prevenir o adoecimento docente; Questões
sobre o processo de trabalho docente em tempo de pandemia.
O item 3.6 Docentes x gestores: percepções sobre o sofrimento/adoecimento
psíquico, discorre sobre a comunicação, as semelhanças nas análises das respostas dos
participantes, professores e gestores nas questões similares respondidas pelos dois grupos.
E, finalmente, o tópico 5 que esboça possíveis considerações extraídas das análises e
discussões dos resultados de todo o material analisado.
25

1.0 SAÚDE E SOFRIMENTO/ADOECIMENTO3: Da forma de se pensar o cuidado à


compreensão do sofrimento/adoecimento psíquico à luz da Psicologia Histórico-cultural

“O hospício é construído para controlar e reprimir os


trabalhadores que perderam a capacidade de
responder aos interesses capitalistas de produção”
(Franco Basaglia)

O filme Nise: o coração da loucura, baseado em fatos reais, foi lançado em 2015, sob
a direção de Roberto Berliner. Contou com a participação da atriz Glória Pires no papel
principal e de Fabrício Boliveira, Fernando Eiras, Perfeito Fortuna, Roberta
Rodrigues, Augusto Madeira, Simone Mazzer, Zé Carlos Machado, Tadeu Aguiar, entre
outros. O filme retrata a ruptura do sistema manicomial existente nos anos 1950. Relata a luta
enfrentada pela psiquiatra Nise da Silveira, que se recusava a utilizar as técnicas da lobotomia
e do eletrochoque em pacientes considerados perigosos e com quadros psiquiátricos
compreendidos como crônicos e irreversíveis. Ela procurou, na individualidade e na
potencialidade de cada um, o bem-estar e o desenvolvimento de suas habilidades, e considerou
as emoções como parte fundamental do tratamento. Assim, o filme permite uma análise de
como a sociedade percebe a pessoa com sofrimento mental, esclarece a maneira de como essa
mesma sociedade exclui essas pessoas, e contribuiu para compreensão de diferentes formas de
entender a pessoa com sofrimento mental.
A partir da referência desse filme, endereçamos temas que iniciam esta tese, para a
compreensão do sofrimento/adoecimento psíquico e a compreensão de que, mesmo diante de
algumas limitações, o ser humano é capaz de criar, produzir, trabalhar, etc. Retratando a
história da psiquiatra, Nise da Silveira realizou de forma humanizada o tratamento de pessoas
com sofrimento psíquico e provou que o ser humano pode viver em sociedade mesmo tendo
as suas diferenças. A conhecida “loucura” nos possibilita inúmeras interpretações, mas, não
impede nenhum ser humano de expressar suas dores, seus sofrimentos e sentimentos, mas
também, o que há de mais puro e singular.
O Brasil passou por diferentes etapas na reestruturação da assistência em saúde
mental. Houve períodos com marcantes avanços, outros nem tanto. Porém, todos trouxeram
peculiar contribuição para a ressignificação no cuidado da pessoa com sofrimento mental.

3
Esses termos sofrimento/adoecimento psíquicos não são aqui utilizados como sinônimos, mas como forma de
indicar que pode ocorrer tanto um fenômeno quanto o outro.
26

Os anos 1980 e 1990, por exemplo, compreenderam períodos significativos para a


reforma psiquiátrica. Foram marcados por movimentos de trabalhadores, usuários dos serviços
e familiares e pelo surgimento de novas políticas públicas (HIRDES, 2009).
Desde então, o Brasil passou por constantes mudanças e substituições no modelo
de cuidados da pessoa com sofrimento mental. Além disso, ocorreu a ampliação da discussão
sobre o normal e o patológico e o quanto o estigma pode engessar o desenvolvimento do ser
humano e excluí-lo da sociedade e de suas relações. Apesar de os debates sobre o que é o
normal e o patológico inserirem inúmeras concepções, o tema usualmente pouco compreende
o sujeito em sua totalidade, limitando-o ao sintoma e não à causa do seu sofrimento.
O filme mencionado permite ampliar a compreensão sobre a importância da
reforma psiquiátrica brasileira e sua contribuição para o cuidado da pessoa com sofrimento
mental, além de discutir sobre os conceitos de normal e patológico e refletir o quanto a
estigmatização pode limitar o ser humano a desenvolver suas habilidades, suas relações e
reprimir suas emoções desencadeando o sofrimento/adoecimento humano.

1.1 A importância da reforma psiquiátrica para o cuidado da pessoa com sofrimento


mental.4

Esse subtítulo aborda a importância da história da reforma psiquiátrica brasileira para


o cuidado da pessoa com sofrimento mental, e propõe uma reflexão quanto a dificuldade da
sociedade em perceber as diferenças em relação ao sofrimento/adoecimento psíquico humano
e de como a sociedade percebe a pessoa com sofrimento mental de forma estigmatizada
causando o medo e a insegurança em verbalizar o próprio sofrimento ocasionando na piora dos
sintomas. Trata-se de uma história carregada de preconceito e estigmatização que desencadeia
nas pessoas o medo de assumir suas fragilidades e suas dores, devido a constante
discriminação, levando-os a silenciar seus sentimentos, angustias, e suas emoções.
No Brasil, temos uma das mais importantes e perspicazes críticas ao alienismo ou
mesmo à sua versão contemporânea, a psiquiatria. Aliás, trata-se de uma crítica não apenas ao
alienismo, mas ao modelo de ciência positivista que o autorizou e o legitimou (AMARANTE,
2007, p. 37).
O início da Reforma Psiquiátrica no Brasil foi contemporâneo com a eclosão do
‘movimento sanitário’ dos anos 1970, em favor da mudança dos modelos de atenção e gestão
nas práticas de saúde, defesa da saúde coletiva, equidade na oferta dos serviços e protagonismo
dos trabalhadores e usuários dos serviços de saúde nos movimentos de gestão e produção de

4
Paulo Amarante, Franca Basaglia e Michel Foucault foram citados nesse item por serem referência para essa
discussão.
27

tecnologias de cuidado (BRASIL, 2005). Esses movimentos retrataram a necessidade de


mudança na maneira que os serviços públicos atendiam a população de modo geral.
A reforma psiquiátrica brasileira é processo social complexo caracterizado por uma
ruptura aos fundamentos epistemológicos do saber psiquiátrico, pela produção de
saberes e fazeres, que se concretizam na criação de novas instituições e modalidades
de cuidado e atenção ao sofrimento psíquico e que buscam construir um novo lugar
social para a loucura. Este processo situa-se, no caso brasileiro, no contexto histórico
e político do renascimento dos movimentos sociais e da redemocratização do país,
na segunda metade dos anos 70 (YASUI, 2006, p. 21-22).

A reforma psiquiátrica brasileira é um dos dois movimentos sociais que


transformaram a saúde pública do país. Advinda após a reforma sanitária, passou por inúmeras
transformações e eventos até se consolidar por meio da Lei 10.216/2001, resultando na
desinstitucionalização de inúmeras pessoas.
Diante da necessidade de se reformular o modo de cuidar das pessoas se buscou a
partir da desinstitucionalização uma nova maneira de propor um acompanhamento digno, e
porque não, pensarmos também na forma de identificar esse movimento. Podemos substituir o
termo Reforma Psiquiátrica pelo termo Reforma da Saúde Mental, ou Reforma dos Serviços
de Saúde Mental. Primeiro porque não devemos direcionar a mudança do modelo a
especialidade médica da psiquiatria, como muitas pessoas o fazem, e segundo porque ajuda na
compreensão de que foi uma reforma no modelo de cuidado, na forma de como as pessoas com
sofrimento mental eram e ainda são percebidas e de como estavam sendo cuidados.
De acordo com Rotelli (1990), desinstitucionalização significa desarticulação do
núcleo do cuidado da instituição para a comunidade, distrito ou território. Trata-se de um
momento de expressivas transformações, como a ruptura do modelo clínico e a reconstrução
da possibilidade; o deslocamento, com destaque na cura, para a descoberta de saúde; as
transformações das relações de poder entre a instituição e os sujeitos; menos investimentos em
recursos materiais e mais em recursos humanos; e a substituição dos serviços com modelos
estáveis para os modelos dinâmicos.
Goulart (2019) descreve que a desinstitucionalização deve progredir junto ao que é
produzido pelos indivíduos durante o percurso, e nesse decorrer precisam saber lidar com as
dificuldades, obstáculos que venham a surgir no encontro entre muitas particularidades
individuais e sociais.
No entanto, avançar nesse caminho implica desenvolver referenciais teóricos por
meio dos quais essas singularidades possam se tornar inteligíveis, para além de
qualquer romantização do processo de desinstitucionalização (GOULART, 2019, p.
35).

Os primeiros movimentos em relação ao cuidado com a pessoa com sofrimento


mental partiram de denúncias feitas por acadêmicos e profissionais recém-formados, por volta
28

dos anos 1970, que patenteavam maus tratos, violência e exclusão social nas instituições
consideradas ‘responsáveis pelos cuidados’. Essas denúncias repercutiram para o início da
reforma psiquiátrica. Durante décadas, milhares de pessoas foram institucionalizadas à força,
sem um diagnóstico sequer que justificasse a sua permanência em hospitais psiquiátricos.
Arbex (2013) retrata a crueldade ocorrida em um dos maiores hospitais psiquiátricos
do Brasil, o Colônia, na cidade de Barbacena, em Minas Gerais. Milhares de pessoas, sem
qualquer possibilidade de defesa, foram submetidas a inúmeras atrocidades. A jornalista
resgata a tragédia brasileira que resultou em pelo menos 60 mil mortos, torturas e humilhações.
A partir de denúncias e da atuação de movimentos sociais e políticos, a reforma foi
compreendida como um conjunto de mudanças das práticas, saberes, valores culturais e sociais
no cotidiano da vida das instituições, dos serviços e das relações interpessoais. O movimento
da reforma psiquiátrica avança, marcado por impasses, tensões, conflitos e desafios (BRASIL,
2005).
Dentre as ações, registram-se a constituição do Movimento dos Trabalhadores em
Saúde Mental (MTSM) e a realização de diferentes atividades, como o V Congresso Brasileiro
em Psiquiatria em Camboriú (SC) e o I Simpósio Sobre Políticas Grupos e Instituições, no Rio
de Janeiro, que contou com o envolvimento de personalidades internacionais, que já vinham
exigindo mudanças no cuidado da pessoa com sofrimento mental em outros países, tais como
Franca Basaglia, Robert Castel, Felix Guattari, Ronald Laing, Donald Cooper, Howard Becker
e Thomas Szasz. Alguns desses convidados colaboraram substancialmente para o movimento
da reforma psiquiátrica brasileira, como Franco Basaglia, que retornou ao Brasil por mais duas
vezes (AMARANTE; NUNES, 2018).
As ações do MTSM foram especialmente relevantes, por terem encaminhado as
denúncias sobre os manicômios, a mercantilização da loucura e a preeminência de uma rede
privada de assistência. O Movimento concorreu para a construção coletiva de uma crítica ao
chamado saber psiquiátrico e ao modelo hospitalocêntrico na assistência às pessoas com
sofrimento mental (BRASIL, 2005).
Após o MTSM ser transformado em Movimento da Luta Antimanicomial (MLA),
passou a organizar eventos próprios, aproximou-se da Associação Brasileira de Saúde Mental
(Abrasme) e estabeleceu o dia 18 de maio como o Dia Nacional da Luta Antimanicomial,
ampliando as ações para atividades políticas, culturais, científicas e sociais, para comemorar e
reivindicar, cada vez mais, melhorias para a saúde mental. Devido aos resultados positivos
dessas ações, passou-se a comemorar maio como o mês da Luta Antimanicomial, abrangendo
29

ações cada vez maiores e melhores em todas as localidades do país (AMARANTE; NUNES,
2018).
O MLA protagonizou mudanças radicais na maneira de cuidar as pessoas com
sofrimento mental. Não foi apenas uma reforma no modelo dos serviços, mas de transformação
na maneira de pensar e de agir, propiciando o empoderamento dos usuários, familiares,
trabalhadores e de toda a sociedade civil. A atuação expandiu as estratégias de cuidado,
abandonando-se o uso exclusivo de medicamento, exclusão e o acompanhamento
psicoterápico insuficiente. Ao contrário, incluíram-se a cultura, as atividades coletivas, a arte
e as tecnologias como formas de tratamento.
Um fato marcante na desinstitucionalização, de acordo com Amarante e Nunes
(2018), foram os princípios do Sistema Único de Saúde (SUS) incluídos na Constituição de
1988, o que possibilitou novas perspectivas, autonomia e desenvolvimento das políticas
municipais. Goulart (2019) reforça a ideia de que a articulação da reforma psiquiátrica com os
princípios e diretriz do SUS foram primordiais, pois a saúde é vista como direito do cidadão e
dever do Estado, com base nos princípios da integralidade, equidade e universalidade.
No final dos anos 1980, surgiram os novos serviços e práticas, inovando as estruturas,
o funcionamento, as ações e as estratégias que preconizavam a inclusão e a desmitificação da
loucura. Os primeiros serviços, em especial os criados em Santos/SP, viabilizaram a
confirmação da eficácia dos dispositivos substitutivos criados para o cuidado das pessoas com
sofrimento mental, favorecendo a desinstitucionalização (AMARANTE; NUNES, 2018).
Em 1989, deu entrada no Congresso Nacional o Projeto de Lei do deputado Paulo
Delgado (PT/MG), com a proposta da regulamentação dos direitos da pessoa com transtornos
mentais e a extinção progressiva dos manicômios no país. Foi o início das lutas do movimento
da Reforma Psiquiátrica nos campos legislativo e normativo (BRASIL, 2005). A Lei foi
sancionada em 06 de abril de 2001, no mesmo ano em que foi realizada a III Conferência
Nacional de Saúde Mental, o que esboçou um panorama favorável e esperançoso para o campo
da saúde mental (AMARANTE; NUNES, 2018).
Os anos 1990 foram marcados pelo compromisso firmado pelo Brasil na assinatura
da Declaração de Caracas e pela realização da II Conferência Nacional de Saúde Mental,
quando passaram a entrar em vigor as primeiras normas federais regulamentando a
implantação de serviços de atenção diária, baseadas nas experiências dos primeiros CAPS,
NAPS e Hospitais-dia, e as primeiras normas para fiscalização e classificação dos hospitais
psiquiátricos (BRASIL, 2005).
30

Com a Lei 10.216/2001, os serviços substitutivos foram sendo criados e implantados


por todo o Brasil. Novas Leis e Portarias surgiram, para colaborar com o modelo de
substituição. A Portaria MS/GM nº336/2002 definiu a modalidades de centros de atenção
psicossocial, modelo de base comunitária, afirmando a cidadania da pessoa com transtorno
mental. A Lei 11.343/2006 instituiu o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas
(SISNAD), requerendo as políticas de redução de danos e as ações de prevenção como base
comunitária no cuidado das pessoas usuárias de substâncias psicoativas (GUIMARÃES;
ROSA, 2019).
O período de 1990 a 2015 foi determinante para a constituição e a ampliação das
Políticas Públicas para saúde mental no país. A Coordenação de Saúde Mental, Álcool e outras
Drogas foi dirigida por mentores ativos da reforma psiquiátrica. Foi ampliada a sua
participação no Ministério da Justiça, por meio da Secretaria Nacional de Políticas Públicas
sobre Drogas (SENAD). A partir de 2003, os problemas pertinentes ao consumo de substâncias
psicoativas passaram a ser reconhecidos como questões de saúde pública (GUIMARÃES;
ROSA, 2019).
Durante esse período, incrementou-se a criação de serviços substitutivos, por meio de
Portarias e Leis que asseguraram o direito da pessoa com sofrimento mental, entre eles os
Serviços de Residenciais Terapêuticos (SRTs) regulamentados pela Portaria 106/2000 e
1.220/2000, que se caracterizam por residências para pessoas egressas de internações de longa
permanência em hospitais psiquiátricos, quando não possuem suporte familiar e social que
viabilizem a sua inclusão social. O programa de Volta Para Casa, Lei 10.708/2003, instituiu
o auxílio-reabilitação psicossocial para pacientes acometidos de transtornos mentais egressos
de internações. O Programa Nacional de Avaliação dos Serviços Hospitalares psiquiátricos
iniciou um trabalho de avaliação regular dos hospitais psiquiátricos (PNASH/Psiquiatria). Foi
instituído em 2002, por normatização do Ministério da Saúde, que impulsionou a política de
desinstitucionalização. Em 2008, outro serviço valioso para a constituição da rede foi o Núcleo
de Apoio à Saúde da Família (NASF), com a finalidade de favorecer o apoio matricial às
equipes de Saúde da Família (AMARANTE; NUNES, 2018; BRASIL, 2005).
Em 2011, foi instituída a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), com a Portaria
GM/MS nº 3.088/2011, que abrangeu uma variedade no conjunto de serviços e ações, para
oferecer atenção psicossocial nas diferentes esferas de cuidado e suas complexidades, desde a
atenção primária, secundária e hospitalar, até outros serviços substitutivos com maior
articulação (AMARANTE; NUNES, 2018; GOULART, 2019).
31

Apesar de a desinstitucionalização ter diminuído os leitos psiquiátricos, de 80 mil,


nos anos 1970, para 25.988, em 2014, com a consequente redução dos gastos hospitalares, de
75,24%, em 2002, para 20,61%, em 2013, viabilizando maior investimento nos serviços de
atenção psicossocial, de 24,76% para 79,39%, no mesmo período (AMARANTE; NUNES,
2018), e o aumento de pessoas beneficiadas com a implantação dos serviços substitutivos,
algumas ações atualmente ameaçam, objetivamente, os avanços da reforma psiquiátrica.
A partir de 2015, o Ministério da Saúde passou a realizar modificações com objetivos
contrários aos princípios do SUS e da Reforma Psiquiátrica. Os interesses corporativos que
não estão engajados com o avanço da reforma psiquiátrica sofreram mudanças significativas,
em dezembro de 2017. Após 25 anos, resgatam o modelo manicomial como prioridade para o
cuidado da pessoa com sofrimento mental, com seus resultados já conhecidos como ineficazes,
caminhando para o desmonte da reforma psiquiátrica e suas melhorias (AMARANTE;
NUNES, 2018; GOULART, 2019). Guimarães e Rosa (2019) denunciam um retrocesso de
toda reforma psiquiátrica:
A análise de leis e documentos ministeriais identifica tendência de
remanicomilização do cuidado em saúde mental no Brasil no período de 2010-2019,
quando seus princípios foram ameaçados pelo Decreto 7.179/2019 que institui o
Plano Integrado de Enfrentamento ao crack e outras Drogas e, em 2017, negados pela
Portaria 3.588, e reafirmados, em 2019, pela Nota Técnica 11/2019 que gerou
significativas mudanças na Política Nacional de Saúde Mental, fortalecendo a lógica
de mercado e reversão dos direitos garantidos constitucionalmente , desconsiderando
o processo construído ao longo de décadas no contexto da reforma psiquiátrica
brasileira. (GUMIARÃES; ROSA, 2019, p. 111).

Embora as constantes lutas da reforma psiquiátrica tenham trilhado caminhos intensos


e difíceis, nos anos de 2017 a 2022, o governo apresentou verdadeiras intenções para o
desmonte de um dos momentos mais marcantes da história da saúde pública brasileira, a
desinstitucionalização, que proporcionou transformações no campo da saúde mental e de toda
sociedade, abriu caminhos para a inclusão, respeito ao sujeito e sua individualidade,
protagonizou lutas coletivas, propiciou a reflexão sobre o saber médico e a discussão sobre o
normal e o patológico.
Todo esse movimento partiu do desafio de ir além das mudanças estruturais dos
serviços, foi também de garantir as transformações no modelo de cuidado, reintegrando o ser
humano de forma consciente e participativa em seu próprio tratamento.
A Reforma Psiquiátrica buscou politizar a questão da saúde mental, especialmente,
na luta contra as instituições psiquiátricas; produziu reflexões críticas que provocam
uma ruptura epistemológica; criou experiências e estratégias de cuidado contra
hegemônicas; conquistou mudanças em normas legais e buscou produzir efeitos no
campo sociocultural (YASUI, 2006, p. 26).

Apesar dos últimos acontecimentos, a esperança de dias melhores se renova, pois, no


início do mês de março de 2023, o então Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva
32

nomeou a Professora Doutora Sônia Barros ao cargo de Diretora do Departamento de Saúde


Mental da Secretaria de Atenção Especializada à Saúde do Ministério da Saúde, o que
caracterizou uma conquista coletiva dos movimentos sociais em defesa a luta antimanicomial.
Diante da necessidade da permanente luta em busca do respeito às pessoas com
sofrimento psíquico e a compreensão das diferenças, o próximo tópico discorre sobre o normal
e o patológico, conceitos utilizados para justificar a supressão e a indiferença das políticas
excludentes, nas medidas de retrocessos da reforma psiquiátrica e nas relações da sociedade.
A compreensão dos conceitos normal e patológico aviva a possibilidade de discussões
acerca das diferenças dos sujeitos, de como cada ser humano é único e como se deve permiti-
lo a expressar suas emoções sem o medo da estigmatização, do que é o normal, o aceito e o
que é patológico, que não se encaixa nos padrões da sociedade.

1.2 Conceito de saúde e doença: o normal e o patológico na saúde mental – algumas


reflexões
A forma de como as pessoas com sofrimento mental foram tratadas por longos anos
emerge lembranças dolorosas e vexatórias da história da saúde pública brasileira. Não
diferente, gera o medo nas pessoas de assumirem suas “fragilidades” por terem receio de se
verem rotuladas e discriminadas, pois ainda nos dias de hoje impera a necessidade de
diagnosticar e classificar como normal ou patológico o ser humano que sofre.
Durante a Idade Média, por muito tempo, as pessoas com sofrimento mental foram
rotuladas como possuídas por forças sobrenaturais e julgadas de acordo com ideias religiosas.
Foucault5 (1975) relata:
Afirmou-se, até demais que o louco era considerado até o advento de uma medicina
positiva como um “possuído”. E todas as histórias da psiquiatria até então quiseram
mostrar no louco da Idade média e do Renascimento um doente ignorado, preso no
interior da rede rigorosa de significações religiosas e mágicas. Assim, teria sido
necessário esperar a objetividade de um olhar medico sereno e finalmente cientifico
para descobrir a deterioração da natureza lá onde se decifram apenas perversões
sobrenaturais. Interpretação que repousa num erro de fato: que os loucos eram
considerados possuídos; num preconceito inexato: que as pessoas definidas como
possuídas eram doentes mentais; finalmente, num erro de raciocínio: deduz-se que
os possuídos na verdade loucos, os loucos eram tratados realmente como possuídos.
De fato, o complexo problema da possessão não revela diretamente de uma história
da loucura, mas de uma história das ideias religiosas (FOUCAULT, 1975, p. 75).

O emprego dos termos ‘normal’ e ‘patológico’ justificou, por muito tempo, a inclusão
ou a exclusão do sujeito na sociedade, pouco se fazendo para a compreensão real e total do

5
Michel Foucault foi citado por fazer parte do processo histórico.
33

fenômeno em sua vida. Alguns autores como Silva et al. (2010) chamam a atenção para a
particularidade da discussão sobre esses conceitos:
A delimitação entre o que pode ser considerado normal e o que deve ser tido como
“patológico” é uma questão que gera constantes discussões conceituais. No terreno
da psicopatologia, essa discussão ainda é mais relevante, já que sua demarcação é
muito mais flutuante e suas fronteiras pouco rígidas (SILVA, et al., 2010, p. 195).

Para a apreensão dos conceitos normal e patológico, é preciso entender como a ciência
propôs-se a investigar os fenômenos psíquicos ao longo da história e as diferentes formas de
defini-los. Pesquisadoras como Silveira e Nascimento (2015) descrevem como a divisão do
que é normal contribuiu para o surgimento do patológico:
Ao que nos parece a separação entre a normalidade e a anormalidade foi o que
possibilitou a construção do espaço para o patológico, mais comumente denominado
loucura, significação esta que se insere ao longo dos tempos de diferentes maneiras
na sociedade, e que carrega consigo aspectos inerentes ao contexto histórico e sócio-
cultural de cada época (SILVEIRA; NASCIMENTO, 2015, p. 2).

A loucura tem sido alvo de intensas e extensas formas de a sociedade compreendê-la


e interpretá-la, desde estigmas e preconceitos do cotidiano até a utilização lírica/artística do
fenômeno. Peças teatrais, literatura, estabelecimentos reservados aos ditos ‘loucos’ e da
loucura como fonte de cultura foram algumas das maneiras pelas quais a sociedade tem se
relacionado com a insanidade. Contudo, foi no século XVII que o olhar para a loucura passou
do ‘entretenimento’ à exclusão. O significado da loucura como algo divino e nobre, que
antecedeu a sua exclusão, é analisado por Del’Omo e Cervi (2017) como algo que ne sempre
foi negativo.
De acordo com Glende e Kraut, na Grécia antiga, ela chegou a ser considerada até
mesmo um privilégio. Note-se que filósofos, como Sócrates e Platão, destacaram o
aspecto místico da loucura referindo a existência de uma loucura tida como divina,
fazendo uso da palavra manikê para designar tanto o “divino” como “delirante”.
Nesse aspecto, homens privilegiados poderiam acessar as verdades divinas
(DEL’OMO; CERVI, 2017, p. 199).

No século XVII, confirmou-se a loucura como algo inadmissível, intolerável, cabendo


a exclusão social das pessoas consideradas irracionais ou que, de alguma forma, incomodavam
a sociedade ou qualquer outra pessoa que pudesse impor seu confinamento. Nem todas as
inúmeras pessoas que tiveram o isolamento social imposto por outrem padeciam,
necessariamente, de algum tipo de sofrimento mental.
Nesse cenário, surgiram as instituições responsáveis pelo ‘tratamento’, ou mesmo o
trancamento de quem pudesse gerar desconforto, não se comportar conforme as normas
sociais, ou não ser aceito, entre outros motivos.
Foucault (1975) narra a criação dos locais para a internação dessas pessoas que
incomodavam a sociedade não somente como um lugar para internar os loucos, mas sim, todos
34

que de alguma maneira incomodava, os que eram diferentes dos outros, pelo menos os que não
atendiam os critérios considerados corretos.
Criam-se (e isto em toda Europa) estabelecimentos para internação que não são
simplesmente destinados a receber os loucos, mas toda uma série de indivíduos
bastante diferentes uns dos outros, pelo menos segundo nossos critérios de
percepção: encerram-se os inválidos pobres, os velhos na miséria, os mendigos, os
desempregados opiniáticos, os portadores de doenças venéreas, libertinos de toda
espécie, pessoas a quem a família ou o poder real querem evitar um castigo público,
pais de família dissipadores, eclesiásticos em infração, em resumo todos aqueles que,
em relação à ordem da razão, da moral e da sociedade, dão mostras de “alteração”
(FOUCAULT, 1975, p. 78).

O autor expõe que as casas, os hospitais e as demais instituições para manter as


pessoas com sofrimento mental não tinham qualquer disposição para tratá-las, porque elas não
deviam ou não podiam mais fazer parte da sociedade (FOUCAULT, 1975).
No Brasil não foi diferente, várias instituições existiram, e ainda existem, e mais,
locais que muitos insistem em sustentar, mesmo diante todas as comprovações de insuficiência
e maus tratos.
Arbex (2013) comenta sobre a forma de exclusão em um dos maiores hospitais
psiquiátricos do país, e de como era quando as pessoas chegavam ao Colônia, sendo anuladas
como se nunca tivessem existidos. Seus cabelos, suas roupas, suas identidades, tudo eram
arrancando-lhes.
Perderam o nome, foram rebatizadas pelos funcionários, começaram e terminaram
ali. Cerca de 70% não tinham diagnostico de doença mental. Eram epiléticos,
alcoolistas, homossexuais, prostitutas, gente que se rebelava, gente que se tornara
incomoda para alguém com mais poder. Eram meninas grávidas, violentadas por seus
patrões, eram esposas confinadas para que o marido pudesse morar com a amante,
eram as filhas de fazendeiros as quais perderam a virgindade antes do casamento.
Eram homens e mulheres que haviam extraviado seus documentos. Alguns eram
apenas tímidos. Pelo menos trinta e três eram crianças (ARBEX, 2013, p. 14).

A loucura passou ser objeto do saber médico a partir do século XVIII, criaram-se
diferentes formas de tratá-la ou contê-la, para minimizar os chamados ‘riscos’ que as pessoas
poderiam causar na sociedade. Entre os diversos tratamentos, persistiram o eletrochoque, o uso
excessivo de medicamentos, as contenções e algumas práticas consideradas desumanas.
Ainda sobre a forma de se ver a doença, no caso, o sofrimento mental, segundo
Foucault (1975), mesmo após algumas mudanças nos locais de confinamento, que passaram a
manter apenas os chamados insanos, constatavam-se, nos registros dos médicos dos séculos
XVII e XVIII e nas práticas no século XIX, a continuidade dos maus tratos e a necessidade de
provar a cura da loucura por meio de readaptação:
Estes tratamentos não eram nem psicológicos nem físicos: eram ambos ao mesmo
tempo – a distinção cartesiana da extensão e do pensamento não tendo afetado a
unidade das práticas médicas; submetia-se o doente à ducha ou ao banho para
refrescar seus espíritos ou suas fibras: era-lhe injetado sangue fresco para renovar
sua circulação perturbada; provocava-se provocar nele impressões vivas para
modificar o curso da sua imaginação.
35

Ora, estas técnicas que a fisiologia da época justificava foram retomadas por Pinel e
seus sucessores num contexto puramente repressivo e moral. A ducha não refrescava
mais, punia; não se deve mais aplicá-la quando o doente está “excitado”, mas quando
cometeu um erro; em pleno século XIX ainda Leuret submeterá seus doentes a uma
ducha gelada na cabeça e empreendera neste momento, com eles, um diálogo durante
o qual forçá-los-á a confessar que sua crença é apenas delírio (FOUCAULT, 1975,
p. 82-83).

A loucura, assim, passou a ser vista cada vez mais como propriedade de atuação
médica, com a causa identificada fisiologicamente. Conforme Del’Omo e Cervi (2017), a
sociedade compreende o sofrimento como objeto do ato da ciência médica. Por isso, tem
recebido o estereótipo de ‘doença mental’, com diferentes terminologias: loucura, alienação,
doença mental, transtorno mental, sofrimento psíquico, que têm sido utilizadas em diferentes
momentos da história.
Basaglia6 (2015) aponta que o tema saúde/doença é tão amplo e geral, que possibilita
uma reflexão que, mesmo centrada na doença mental e a assistência psiquiátrica, parte de uma
questão mais ampla, que envolve os próprios fundamentos culturais das ciências médicas.
Resende, Pontes e Calazans (2015) elaboram uma crítica ao projeto da psiquiatria que,
mesmo criando manuais diagnósticos e expandindo o uso de farmacológicos, ainda não
alcançou o seu objetivo de ser uma ciência médica. Destacam a existência dos poucos
transtornos que têm legitimado uma causa fisiológica, restringindo a aplicação apenas a casos
de demência e de deficiência mental e às psicoses orgânicas e sintomáticas.
Araújo e Neto (2014) delineiam a visão da psiquiatria sobre o sofrimento psíquico
como uma tradução da psicopatologia, que segue o modelo médico estabelecido desde os
tempos hipocráticos, nos quais os diagnósticos não se baseavam na ciência, mas sim na
percepção.
A observação, descrição e categorização de enfermidades que compartilham sinais e
sintomas permite a formulação de diagnósticos que, por sua vez, auxiliam na
identificação da causa de uma determinada patologia, na previsão de sua evolução e
no planejamento terapêutico (ARAÚJO; NETO, 2014, p. 67).

A partir dessa visão, os autores esclarecem os critérios para a formulação diagnóstica,


e de como a medicina se prende aos diagnósticos com base características dos comportamentos
indesejados, ou incômodos.
Para a análise do comportamento, a formulação de um diagnóstico passa pela
compreensão dos comportamentos que são tidos como inadequados e isso requer a
análise das contingências que os instalaram e que os mantêm. Nesse sentido o uso de
classificações categoriais é limitante pois a topografia de um comportamento não é
suficiente para a compreensão da sua função para um determinado indivíduo. A
análise funcional do comportamento é imprescindível para o planejamento da
intervenção clínica (ARAÚJO; NETO, 2014, p .67).

6
Franca Basaglia foi citado por fazer parte do processo histórico
36

Foucault (1975) frisa que, antes do século XIX, a loucura era experienciada de
diferentes formas, com diferentes atitudes médicas em relação às doenças tidas como curáveis.
Sem dúvida, desde a medicina grega, uma certa parte no domínio da loucura já estava
ocupada pelas noções de patologias e as práticas que a ela se relacionam. Sempre
houve, no Ocidente, curas médicas da loucura e os hospitais da Idade Média
comportavam, na sua maior parte, como o Hôtel-Dieu de Paris, leitos reservados aos
loucos (frequentemente leitos fechados, espécies de jaulas para manter os furiosos).
Mas isto era somente um setor restrito, limitado às formas da loucura que se julgavam
curáveis (frenesis, episódios de violência, ou acessos “melancólicos”). De todos os
lados, a loucura tinha uma grande extensão, mas sem suporte médico (FOUCAULT,
1975, p. 77).

Braatz e Kraemer (2011) aludem ao limite entre o normal e o patológico, que é


confuso para os indivíduos quando considerados ‘simultaneamente’, ou seja, com base em
determinadas regras, pois o que se define como doença, em um determinado caso, em outra
situação pode não ser.
Nessa perspectiva, Canguilhem (2009), ao observar a doença tanto por meio dos
sintomas quanto pelos mecanismos funcionais que afetam a totalidade do organismo vivo,
pode levar à apreensão da diferença qualitativa entre a saúde e a doença. A implicação de
patologia ainda é continuamente equivocada, por levar em conta uma simples variação
quantitativa dos fenômenos fisiológicos, o que indicaria a sua normalidade. Isso torna esse
método limitado e deficiente, apesar de não desconsiderar os aspectos bioquímicos.
Apesar de reconhecer que o valor eventual de certos erros bioquímicos inatos provém
de uma relação entre organismo e o meio, assim como o valor de sintoma de certos
lapsos ou atos falhos provém, segundo Freud, da relação com uma determinada
situação, abstemo-nos de definir o normal e o patológico simplesmente por sua
relação com o fenômeno da adaptação. Durante o último quarto de século, esse
conceito tem recebido uma tal extensão — às vezes descabida — em psicologia e em
sociologia que, mesmo em biologia, só pode ser utilizado do ponto de vista mais
crítico possível. A definição psicossocial do normal a partir do adaptado implica uma
concepção da sociedade que o identifica subrepticiamente e abusivamente com o
meio, isto é, com um sistema de determinismos, apesar de essa sociedade ser um
sistema de pressões que, antes de qualquer relação entre o indivíduo e ela, já contém
normas coletivas para a apreciação da qualidade dessas relações (CANGUILHEM,
2006, p. 129).

O autor expõe como a sociedade, de forma incisiva, determina o comportamento do


sujeito, para que se enquadre nos parâmetros tidos como normais e aceitos socialmente.
Ressalta que, ao discordar dessas categorizações, o sujeito torna-se ‘anarquista’. Além disso,
destaca os estados de saúde e doença e as relações entre eles, e que a cura não constitui o estado
de saúde anterior, mas novas maneiras de viver, diferentes das precedentes. O normal e o
patológico estão interligados com o modo de vida do sujeito e todas as condições oferecidas a
ele pelo seu meio social, cultural e físico (CANGUILHEM, 2009).
Foucault (1975) explica que a insistência em explicar a saúde e a doença psicológica
se dificulta pela aplicação maciça de conceitos destinados à medicina somática. E ainda, que
37

para além das patologias mental e orgânica, existe uma patologia geral e abstrata que as
domina, que as confere os métodos e à maneira de postulados.
Gostaríamos de mostrar que a raiz da patologia mental não deve ser procurada em
uma “metapatologia” qualquer, mas numa certa relação, historicamente situada, entre o homem
e o homem louco e o homem verdadeiro (FOUCAULT, 1975, p. 8).
Os motivos que podem ou não causar modificações no comportamento do sujeito não
obedecem a uma regra exata, única. Podem acontecer em um mesmo meio, de formas
diferentes ou não, podem atingir um único sujeito de um grupo ou mais. As relações dizem
muito
A interpretação e percepção de cada sujeito é única, e de forma particular se
desenvolve. Nessa perspectiva, Delari (2017) explica como cada um sente a seu modo de
acordo com seus significados. Toda dor é sentida de modo corporal, por não haver outro meio
de senti-la. “A distinção fica por ser debatida mais quanto à origem do sofrimento em seus
aspectos físicos “mudos” ou na materialidade das relações humanas mediadas na construção
de significação” (DELARI, 2017, p. 5).
Os vínculos do sujeito com o mundo envolvem suas relações e suas atividades, que
ocorrem em uma determinada família, classe social e época, em que constroem suas estruturas
motivacionais e emocionais. A quantidade e a qualidade desses vínculos, assim como o
conteúdo das relações objetivas e sociais, fazem parte de apropriações disponíveis ao sujeito e
do desenvolvimento da sua personalidade. Os significados sociais e o sentido pessoal unem-se
ou se alienam, causando o adoecimento (MARTINS, 2004).
Silveira e Nascimento (2015) realçam a singularidade de uma definição em relação ao
normal e ao patológico, e da relação com o contexto histórico do ser humano, e também, de
seus aspectos subjetivos, que contribuem significativamente na construção da psique.
Essa foi, é, e ainda será uma empreitada que segue com a trajetória das sociedades,
vale observar que cada época pode fazê-lo a seu modo, e de acordo com a sua perspectiva
vigente (SILVEIRA; NASCIMENTO, 2015, p. 2).
As discussões sobre o normal e o patológico tendem a continuar por algum tempo.
Por longos anos, o tema vem sendo apreciado sob diferentes perspectivas, envolvendo diversas
particularidades históricas e interpretações, interesses e sujeitos.
Para essa discussão, a compreensão singular do ser humano é crucial. Apesar de ser
objeto de análise a tentativa de entender e explicar o sofrimento/adoecimento, é preciso buscar
apreender as motivações, as relações, a intensidade, o contexto histórico e toda a
particularidade do ser humano. Anular a existência humana em função do seu sofrimento é
38

apagar a sua história, é desconsiderar seus motivos e razões pessoais, é negar-lhe a


possibilidade de se reinventar, e não lhe apresentar outra alternativa de sobrevivência ou
mesmo de entender o seu próprio sofrimento/adoecimento.
Assim, no próximo tópico discorreremos sobre o sofrimento/adoecimento psíquico a
partir da Psicologia Histórico-Cultural, aporte teórico metodológico que subsidia as discussões
e as análises dos dados desta pesquisa. Importante ressaltar que os subtítulos anteriores
contribuirão para a discussão do conceito do sofrimento/adoecimento, pois resgatar sobre os
meios de tratamento anterior a reforma psiquiátrica e a necessidade de definir o que é normal
e patológico estão ligados diretamente a definição do conceito sofrimento/adoecimento, pois
o sofrimento e a dor também podem ser silenciados pelo ser humano por medo dos julgamentos
que podem surgir diante suas angustias.

1.3 Sofrimento/adoecimento psíquico na concepção da Psicologia Histórico-Cultural

Os estudos de Vigotski sobre o desenvolvimento humano e suas particularidades


contribuíram para o entendimento do momento em que o ser humano, durante a sua infância,
passa a se perceber e absorver conteúdos externos e a somá-los aos conteúdos internos, para o
seu desenvolvimento e sobrevivência.
A PHC enfatiza a qualidade das relações interpessoais, o tempo, no sentido de
historicidade, e as mediações como fatores relevantes no desenvolvimento psicológico
humano, entende o psiquismo humano, mas sem se restringir ao amadurecimento biológico,
pois, nos constituímos por meio de nossas relações com os outros seres humanos, com a
cultura, com as experiencias e educação.
Nessa perspectiva, as relações que estabelecemos com os outros e com o mundo e as
aprendizagens decorrentes dessas relações são internalizadas no complexo
movimento da dialética de tal modo que não produzem conexões lineares entre
experiências ou eventos ocorridos em um determinado tempo/espaço, mas um
amálgama dinâmico, complexo, contraditório e de insterconstituição entre os
diversos significados e sentidos que atribuímos às coisas ao longo da vida
(CICARELLO JUNIOR; CAMARGO, 2019, p. 91-92).

O ser humano precisa dos conteúdos históricos e culturais para o seu


desenvolvimento. A apropriação desses conteúdos propicia a evolução diferentemente do
animal. Essa historicidade colabora para o desenvolvimento qualitativo do ser humano e o
instrumentaliza para lidar com as diferentes situações que ocorrem em torno de suas relações
interpessoais.
Compreender o percurso histórico da humanidade, ou seja, o percurso do
desenvolvimento filogenético, contribui para esclarecer o percurso do
desenvolvimento ontogenético das funções psíquicas superiores. Assim, sua
constituição em ser social envolve a transição da história natural dos animais à
história social dos homens, marcada pelo trabalho social, pelo emprego dos
39

instrumentos e pelo desenvolvimento da linguagem (LINHARES; FACCI, 2021, p.


32-33).

A apropriação da cultura vai além das primeiras relações que a criança tem na
infância. Trata-se da apropriação por meio das relações que produzem e medeiam os conteúdos
sistematizados e elaborados. A realização da atividade (trabalho) e o uso de instrumentos e da
linguagem só são possíveis porque a apropriação do conteúdo organizado é resultado do acesso
à educação:
Considerando então que a humanidade não “nasce” nas pessoas a partir delas
mesmas, mas resulta da humanidade objetivada e disponibilizada às suas
internalizações, a Psicologia Histórico-cultural e a pedagogia histórico-crítica não
são indiferentes à análise das condições objetivas que, em uma sociedade de classes,
reservam para diferentes indivíduos condições desiguais de humanização. Mais do
que não serem indiferentes, essas teorias evidenciam a necessidade de superação da
ordem econômica fundada na propriedade privada dos meios de produção, isto é, da
posse privada dos produtos do trabalho humano, no que se inclui o produto do
trabalho intelectual. Afirmam, ainda, a educação escolar como processo privilegiado
para, no âmbito da transmissão dos conhecimentos, opor-se as referidas
desigualdades. É a serviço do desenvolvimento equânime dos indivíduos que a
educação escolar desponta como um processo ao qual compete oportunizar a
apropriação do conhecimento historicamente sistematizado – o enriquecimento do
universo das significações -, tendo em vista a elevação para além das significações
mais imediatas e aparentes disponibilizadas pelas dimensões meramente empíricas
dos fenômenos (MARTINS, 2015a, p. 272).

Cicarello Junior e Camargo (2019) reforçam a importância da apropriação dos


elementos culturais, pois à medida que o ser humano se apropria dos elementos da cultura, as
funções elementares ascendem as funções superiores, por meio da internalização, que ocorre a
partir das experiencias humanas que podem ser transformadas pela aprendizagem, que é
marcado pelo momento interpsicológico para o intrapsicológico.
Partindo para a sociogênese, a noção de tempo que se faz presente e necessária para
compreender esse plano genético é a de um momento ou movimento de transição de fora para
dentro, denominado internalização (CICARELLO JUNIOR; CAMARGO, 2019, p. 95).
Compreender o sofrimento/adoecimento psíquico com base em uma perspectiva
teórica que envolva o ser humano em sua totalidade e que possibilite perceber as
transformações do seu psiquismo e os movimentos de suas relações com o meio permite
entender as mudanças e as constâncias do seu desenvolvimento. No momento em que essas
transformações deixam de existir ou se limitam às relações alienantes/superficiais, e as suas
aptidões e habilidades ficam prejudicadas, pode ocorrer uma dor intensa, que colabora para a
manifestação do sofrimento/adoecimento psíquico.
A partir desse entendimento, é que adotamos a Psicologia Histórico Cultural como
fundamentação teórica para a compreensão do sofrimento/adoecimento psíquico, pois aspectos
importantes da teoria como a linguagem, percepção, emoção, funções psicológicas superiores
40

essenciais para o desenvolvimento humano, aspectos que influenciam diretamente na ação do


ser humano e são fundamentais para a compreensão de como a inexistência, o desenvolvimento
desigual, ou a repressão dessas funções podem ocasionar o sofrimento/adoecimento do
trabalhador.
O conjunto das relações que o ser humano vivencia ao longo do processo de
desenvolvimento resulta em sua maturação, que pode conferir-lhe saltos valorativos e cruciais
para sua vivência e sobrevivência com tudo e todos em seu meio.
Em suma, a teoria histórico-cultural, em consonância com o aporte filosófico
materialista dialético, postula o psiquismo humano como unidade material e ideal
construída filo e ontologicamente por meio da atividade, isto é, nos modos e meios
pelos quais o homem se relaciona com a realidade, tendo em vista produzir as
condições de sua sobrevivência e de seus descentes (MARTINS, 2015a, p. 30).

É por meio da atividade consigo e com o meio, com a realidade, que o ser humano
une as funções elementares ao conhecimento e as transformações existentes no decorrer do seu
desenvolvimento às funções psicológicas superiores:
A atividade do sujeito - externa e interna- é mediada e regulada pelo reflexo psíquico
da realidade. Aquilo que no mundo objetivo aparece para o sujeito como motivos,
objetivos e condições de sua atividade deve ser, de alguma forma, por ele percebido,
apresentado, compreendido, retido e reproduzido em sua memória; isso vale também
para o processo de atividade em relação a si mesmo, a seus estados, características,
peculiaridades. Do ponto de vista histórico e genético, isso significou o
reconhecimento da existência de um psiquismo pré-consciente dos animais e o
surgimento no ser humano de uma forma qualitativamente nova, a consciência
(LEONTIEV, 2021, p. 145-146).

Na perspectiva da Psicologia Histórico-Cultural, os processos psíquicos não são


frutos das capacidades inatas transmitidas biologicamente, mas como: “aspectos da atividade
que se formam durante toda a vida” (ZEIGARNIK, 1981, p. 26-27).
Apesar de não encontrar uma enunciação clara e explícita por parte de Vigotski e seus
companheiros sobre sofrimento e adoecimento, é possível abstrair uma cognição do que seja
saúde, sofrimento e adoecimento a partir dos pressupostos da Psicologia Histórico-cultural
(QUEIROZ, 2021).
A discussão sobre o sofrimento e o adoecimento se faz importante porque esses
conceitos podem guiar a compreensão das particularidades do fenômeno aqui
discutido. Pode, por exemplo, ser comum, quando se refere ao sofrimento, o fato de
que todo sofrimento é ruim ou deveria ser evitado ou ainda ser banido da vida do
indivíduo. No entanto, isso não é possível em relação ao sofrimento (MARINO-
FILHO, 2020, p. 79).

Para o estudo sobre o sofrimento/adoecimento psíquico a partir da Psicologia


Histórico-Cultural, fundamentamo-nos em como Vigotski se propôs a compreender o
desenvolvimento humano e as funções psicológicas superiores, considerando a linguagem
como produto da cultura e suporte essencial. Ressaltamos a linguagem várias nessa tese como
aspecto crucial por defendermos que o silenciamento das emoções ocorre devido ao ser
41

humano não se expressar, não extravasar suas angustias, medos, conflitos, entre outros
sentimentos que lhe causam desconforto.
Resgatamos em Vigotski e Luria (1966) a concepção de como o desenvolvimento
qualitativo é importante para o ser humano e como pode administrar situações que exijam de
si a organização e elaboração de suas emoções.
Vigotski e Luria (1996) esclarecem que, ao estudar o “homem cultural adulto”, deve-
se, além da evolução do comportamento do animal e do homem primitivo, estudar também o
desenvolvimento do comportamento da criança.
Existe, profundamente enraizado na consciência geral, um conceito incorreto, que é
a ideia de que a criança difere do adulto somente quantitativamente. Não precisamos
mais do que encolher o adulto, torná-lo mais fraco, diminuir suas habilidades e fazê-
lo um pouco menos inteligente e teremos uma criança.
Esse conceito da criança como um pequeno adulto é muito difundido. São poucas as
pessoas que consideram a ideia de que a criança nem sempre é simplesmente uma
réplica em miniatura do adulto e que, sob muitos aspectos, a criança difere
radicalmente do adulto – que a criança é uma criatura singular, completamente
diferente (VIGOTSKI; LURIA, 1996, p. 152).

A teoria de que a criança se diferenciava do adulto apenas em aspectos quantitativos


perpetuou por longos períodos. A maneira como a sociedade percebia os infantes podia ser
observada em diferentes contextos.
[...] em qualquer galeria de pintura pode-se ver dezenas de madonas com bebês ao
colo, os quais, pelas proporções do corpo, mostram acentuada semelhança com
adultos. Todos esses meninos-Jesus, pequenos cavaleiros e duques trajados como
adultos nas galerias de retratos de castelos alemães são, de fato, adultos anões; não
serão eles, prova do fato de que durante séculos, a humanidade considerou a criança
um pequeno adulto? Durante séculos, as pessoas subestimaram o fato de que a
criança, por sua aparência física e suas características psicológicas, é um tipo muito
especial de criatura, que difere qualitativamente do adulto e cujas leis de vida e
atividade devem, sem dúvida alguma, ser estudadas com atenção especial
(VIGOTSKI; LURIA, 1996, p. 153).

Vigotski e Luria (1996) defendem que a criança difere do adulto por meio do
pensamento, da maneira como percebe o mundo, da lógica baseada em princípios qualitativos
diferentes caracterizados por grande especificidade, como também, a estrutura e as funções de
seu corpo em relação às do organismo do adulto. A criança possui aspectos hereditários que
compõem o seu desenvolvimento e podem aparecer mais ou menos em determinados
momentos. Mas, é a partir da relação com o meio que ocorre um salto qualitativo e não só
quantitativo nesse processo: “Logo, o desenvolvimento contém sempre, numa unidade,
aspectos hereditários e do meio” (VIGOTSKI, 2018, p. 72).
A existência do corpo físico é necessária para o desenvolvimento das funções
psicológicas superiores. Mesmo defendendo que a cultura se sobrepõe ao elemento biológico,
Vigotski não abandonou o estudo sobre as questões biológicas e sua relação com o fator
cultural. Seus estudos trataram da relação de unidade, que abrange dialeticamente a
42

historicidade e o meio social, determinantes para a apropriação da cultura. Os aspectos inatos


e instintivos existem e permanecem no sujeito, porém as transformações de natureza
qualitativa e humana ocorrem à medida que o sujeito se relaciona com a sociedade. Essa visão
é dialética. O autor não separa o aspecto biológico do cultural, mas entende o primeiro como
base para o desenvolvimento verdadeiramente humano.
Partindo das observações e constatações sobre o desenvolvimento humano, a
Psicologia Histórico-Cultural contraria as demais teorias que descrevem o desenvolvimento
psicológico humano com base apenas em aspectos orgânicos e cronológicos:
Nesse sentido Vygotsky e seus discípulos, ao invés da maturação orgânica, se
debruçaram mais sobre a dimensão da historicidade e da atividade para compreender
e explicar o movimento de constituição da personalidade numa perspectiva dialética,
vislumbrando o desenvolvimento humano como síntese de múltiplas determinações
(CICARELLO JUNIOR; CAMARGO, 2019, p. 84).

Os pesquisadores explicam que as condições apresentadas durante esse processo


contribuem para o desenvolvimento de funções mais elaboradas, e são essas funções que fazem
com que o ser humano se expresse quando algo não o faz bem. Esse comportamento, ou ação
do ser humano só é possível diante as transformações reais e qualitativas.
Assim como para o Materialismo Histórico Dialético, para a Psicologia Histórico-
cultural (PHC) a questão do tempo não se resume à quantidade de tempo que dura
uma fase de transformação. A PHC, voltada à compreensão e explicação do
desenvolvimento psicológico humano, engloba especialmente o processo e o que é
necessário para superar o nível atual do desenvolvimento e avançar para outros
possíveis. Ou seja, a questão é menos a duração e mais as condições que subsidiam
a superação de um determinado momento ou estado para outro mais complexo ou
elaborado (CICARELLO JUNIOR; CAMARGO, 2019, p. 91).

Em relação ao estudo do sofrimento psíquico, Vigotski (1983) ressalta o quanto os


estudos psicológicos iniciais se baseavam em uma concepção puramente quantitativa do
desenvolvimento infantil. Tratava-se de um método complicado, pois determinava o grau de
insuficiência do intelecto, com a medição de proporções e tamanho, visando a responder a um
único esquema de mais ou menos, de cálculo e de medida, ao invés de experimentar, observar,
analisar, diferenciar e generalizar, descrever e definir qualitativamente. Silva (2012) aponta
que:
É importante ressaltar que o interesse nas patologias do desenvolvimento foi
manifestado por Vigotski desde o início da sua trajetória científica. Dedicou-se ainda
ao estudo do papel da linguagem no desenvolvimento humano através de casos
clínicos envolvendo patologias da linguagem, no caso, a afasia, bem como as
demências e as doenças de Parkinson e de Pick. De forma geral, enfatizou nesses
estudos as características peculiares do desenvolvimento e da desintegração,
relacionadas com a idade em que ocorrem, argumentando contra as hipóteses
localizacionais em áreas cerebrais (SILVA, 2012, p. 76).

Zeigarnik (1981) teme o uso de testes quantitativos que medem as capacidades


cognitivas. Assegura que estes testes apontam apenas o nível de desenvolvimento atual do ser
43

humano, deixando “ocultas suas possibilidades potenciais”. E ainda descreve, que as análises
quantitativas são permitidas quanto já se realizou uma análise qualitativa das circunstâncias.
Nesse sentido, Zeigarnik (1981) afirma que: “antes de iniciar a medição, deve ficar
determinado o que é que se mede” (ZEIGARNIK, 1981, p. 27). Ademais, a autora ressalta a
importância de conhecer as dificuldades que os doentes apresentam em suas dificuldades, além
de ser necessário reconhecer onde seus erros e dificuldades esbarram. Assim, “[...] é
precisamente a análise dos erros cometidos pelos doentes ao executar tarefas experimentais o
que nos proporciona significativo material para a valoração de uma determinada alteração na
atividade psíquica dos doentes” (ZEIGARNIK, 1981, p. 28).
Silva e Tuleski (2015) assinalam o quanto as queixas relacionadas ao sofrimento
mental, em seus diferentes níveis de complexidade, ainda são tratadas sob o viés biológico e
farmacológico. Essa perspectiva sofreu críticas de Vigotski:
A saúde mental foi relegada ao cuidado da psiquiatria sob o viés fisiológico, com
estudos iniciais de Zeigarnik no campo da Patopsicologia Experimental ainda sem
muitas perspectivas, pois estavam no caminho contrário à separação imposta entre a
psiquiatria e a psicologia (SILVA; TULESKI, 2015, p. 210).

Dagher (2019) comenta sobre as análises de Vigotski quanto às concepções anteriores


à Psicologia Histórico-cultural, sobre o sofrimento psíquico e de como as teorias biologizantes
desconsideravam a subjetividade, e de como o autor buscou considerar o movimento histórico
e cultural da sociedade e de como esta produz a subjetividade do ser humano.
As explicações do comportamento humano, sua relação com a saúde/doença mental
unicamente pelo viés de cunho biológico ou de fatores intrapsíquicos, naturalizantes e
individualistas, foi uma das críticas de Vigotski à Psicologia e Psiquiatria da época (DAGHER,
2019, p. 30).
Como vimos, o termo patológico, ao longo da história, propiciou o surgimento de
outras nomenclaturas carregadas de preconceitos e limitações quanto ao cuidado da pessoa
com sofrimento/adoecimento psíquico, a especialidade da psiquiatria.
Almeida (2018) elucida que optou pelo termo sofrimento psíquico, tomando como
base a Psicologia Histórico-Cultural, devido os demais termos como “doença mental”,
“transtorno mental” ou “síndrome psiquiátrica” terem significados carregados de racionalidade
psiquiátrica e também, porque o campo da saúde mental e atenção psicossocial brasileira ter
adotado esse termo por criticar os demais.
Pautamo-nos na definição de Almeida (2018) por entender que o ser humano é um
conjunto de aspectos elementares que se direcionam a elementos superiores a partir das
relações interpessoais, aprendizagem e mediações durante todo o seu processo de
desenvolvimento. Além disso, as demais definições ou explicações do termo
44

sofrimento/adoecimento psíquico veem repletas de estigmas que limitam ou impossibilitam o


ser humano de se expressar. E é a partir desse entendimento que também diferenciamos o
sofrimento do adoecimento.
O sofrimento ele afeta a qualidade das ações, da atividade do ser humano devido a
dor experienciada, mas não o impede de exercê-la, já o adoecimento o impossibilita e
compromete o seu percurso, seu trabalho, suas relações, sua vida, resultado muitas vezes do
silenciamento de sua dor. Assim, o ser humano não consegue planejar suas ações e não controla
seus comportamentos.
De acordo com Silva (2014), pelo fato de Vigotski estudar sobre o desenvolvimento
humano, o seu trabalho pode se relacionar com o campo da psicologia clínica, levando ao
entendimento do sofrimento psíquico. Também declara que Vigotski é citado por outros
autores como um pensador analítico e sintético, que mostrou coerência com o próprio método
e o modo de pensar a Psicologia que ele havia criado, como na análise que realiza acerca da
crise no campo psicológico.
De acordo com a Psicologia Histórico-Cultural, a formação do psiquismo humano
ocorre por meio da filogênese e ontogênese, ambas definidas social e historicamente conforme
as transformações na sociedade e a participação do sujeito por meio de suas atividades. Ou
seja, da transformação das funções psicológicas elementares para as funções psicológicas
superiores, por meio da apropriação dos conhecimentos sistematizados e do desenvolvimento
da consciência. Quanto mais possibilidades materiais que a sociedade oferece ao ser humano,
ao psiquismo, mais ele se desenvolve, mais capacidades e habilidades terá para se relacionar
com as diferentes situações impostas pela sociedade.
A transformação das funções psicológicas elementares em funções psicológicas
superiores é complexa. Resulta na humanização do sujeito, o que o leva ao desenvolvimento
de sua consciência. Vigotski (2001) esclarece que o pensamento humano só é possível devido
a apropriação da linguagem, e que esse processo só ocorre por meio das relações do sujeito
com o meio que permite a apropriação da cultura.
Nesse sentido, Tuleski (2019) explica que Vigostki verificou que a esquizofrenia é o
resultado de uma fragmentação progressiva da unidade complexa das funções psíquicas. Esse
processo se dá quando as funções superiores sofrem rupturas durante a mediação de funções
como a percepção, memória, atenção, que contrapõem as funções elementares que são
imediatas. Esse processo ocorre no período de transição da infância para adolescência. A
criança possui funções básicas que vão sendo aperfeiçoadas e se tornando mais complexas por
meio da mediação cultural e qualitativa, quando esse processo sofre uma ruptura, não ocorre
45

de forma qualitativa e mediado culturalmente, as funções elementares não se desenvolvem em


superiores. Trata se de um curso dialético: normal x patológico.
Em relação ao psiquismo, Martins (2015a) sustenta que o salto qualitativo para o
desenvolvimento humano é a significação dos objetos pela humanidade. Explica que o sujeito
lê e identifica o significado dos signos. Para que isso aconteça, o signo precisou ser
criado/desenvolvido/elaborado por um outro humano, que também o aprendeu. Essa é a
dinâmica da apropriação para a objetivação, ou seja, quando o sujeito se apropria de um
universo simbólico e, por isso, consegue objetivá-lo e transpor ao outro.
A criança não relaciona espontaneamente uma dada palavra a um determinado grupo
concreto e transfere o seu significado de um objeto para outro, ampliando o círculo
de objetos abrangidos pelo complexo. Ela apenas segue o discurso dos adultos,
assimilando os significados concretos das palavras já estabelecidos e dados a ela em
forma pronta. Em termos mais simples, a criança não cria a sua linguagem, mas
assimila a linguagem pronta dos adultos que a rodeiam. Isto diz tudo. E compreende
também o fato de que a criança não cria por si mesma complexos correspondentes ao
significado da palavra, mas os encontra prontos, classificados com o auxílio de
palavras e denominações comuns. Graças a isto, os seus complexos coincidem com
os conceitos dos adultos e surge o pseudoconceito - o conceito-complexo
(VIGOTSKI, 2000 [1929], p. 196).

Para Vigotski (2001), a linguagem é produzida historicamente pela humanidade.


Quando uma criança é criada sem contato com a linguagem e com a cultura, não terá condições
de pensar tal qual um ser humano.
Martins (2015a) explica que, quando a criança usa uma palavra, não há garantia de
que ela saiba o significado implicado. É a mediação de signos que transforma as funções
psíquicas, pois quanto maior for a relação da criança com o objeto, maior é o impulso para o
desenvolvimento.
Silva e Tuleski (2015) acrescentam que o desenvolvimento psíquico é resultado da
educação e apropriação da experiencia humana acumulada, os instrumentos e signos por meio
da mediação social, e baseadas em Zeigarnik (1981 [1976]) explicitam que em casos
patológicos, o biológico reage diferente na pessoa doente do que na saudável, desenvolvendo
condições que alteram a atividade mental humana.
Para a Patopsicologia Experimental, deve ser mantida a importância das apropriações
sociais nesse desenvolvimento, voltando-se à relação dialética entre organismo e
meio social no estudo e intervenção das alterações patológicas ao longo do
desenvolvimento ontogenético do sujeito adoecido (SILVA; TULESKI, 2015, p.
211).

Vigotski (1983) aclara que a criança não relaciona, compreende ou entende o


significado de uma palavra espontaneamente, ela faz uso da palavra a partir das relações
criadas pelos adultos que a cercam.
Toda forma superior de comportamento aparece em cena duas vezes durante seu
desenvolvimento: primeiro, como forma coletiva do mesmo, como forma
interpsicológica, um procedimento externo de comportamento. Não nos damos conta
46

desse fato porque sua cotidianidade nos cega. O exemplo mais claro disto é a
linguagem. No princípio, é um meio de vínculo entre a criança e aqueles que a
rodeiam, mas, no momento em que a criança começa a falar para si, pode se
considerar como a transposição da forma coletiva de comportamento, para a prática
do comportamento individual (VIGOTSKI, 1996 [1930], p. 112).

Martins (2015a) assinala que esse movimento ocorre em dois momentos: o primeiro,
de forma interpessoal para interpsíquico; depois que ocorre a internalização, torna-se
intrapsíquico, e retorna para o interpsíquico. À medida que o psiquismo se desenvolve, novos
sistemas vão surgindo, partindo do pensamento concreto para o abstrato – quanto mais pobre
de concretude é a palavra, mais rica é a abstração, e vice-versa.
[...] não se trata de que as alterações se dêem exclusivamente no seio das funções,
mas de que existem alterações nas conexões e na infinita diversidade de formas de
estas se manifestarem; que em uma determinada fase de desenvolvimento aparecem
novas sínteses, novas funções cruciais, novas formas de conexões, e que devemos
nos interessar pelos sistemas e pela finalidade dos sistemas (VIGOTSKI, 1996
[1930], p. 135).

Retomamos Vigotski (1996 [1930]) que explica que a doença, mas especificamente a
esquizofrenia, ocorre devido a desintegração da consciência: “o estudo dos sistemas e de suas
funções é muito instrutivo não apenas no caso do desenvolvimento e da construção do
psiquismo, mas também no caso de sua desintegração” (VIGOTSKI, 1996 [1930], p. 128).
Assim, percebemos que, mesmo que haja a pré-disposição genética, os fatores externos e
sociais contribuem diretamente para o surgimento do sofrimento psíquico.
Com base nesse entendimento, reportamo-nos a Martins (2021)7 que, durante uma
explanação, explicou que como resultado da humanização por meio da apropriação da cultura,
o ser humano consegue se controlar e ‘guardar’ o que há de mais primitivo dentro de si, assim,
consegue controlar suas emoções. Caso não consiga, significa que sua constituição foi
comprometida, o que pode resultar em comportamentos inadequados e até mesmo em atos de
barbáries (informação verbal). Desse resultado, constata-se que houve um desenvolvimento do
psiquismo sem qualidade, empobrecido de oportunidades, de educação, limitando o
desenvolvimento de suas funções psicológicas superiores, ou seja, há poucas ou nenhuma
oportunidade, experiências, relações e acesso ao conhecimento científico e sistematizado. A
consequência é, comumente, a falta de desenvolvimento e de controle de sua consciência e de
suas emoções.
Silva (2014) sublinha que o fato de Vigotski ter trabalhado desde os anos 1920 com
a debilidade mental infantil e tê-la considerado um tipo especial de desenvolvimento e não

7
Fala da Professora Doutora Lígia Márcia Martins no curso Vigotski: fundamentos e práticas de ensino e artes
realizado dia 20/05/2021 pela EGOV: Escola de Governo do Estado de Mato Grosso do Sul. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=haJUsEh8gUk. Acesso em 31 de mai de 2021.
47

uma diferença do estado normal permite-nos comparar os transtornos mentais a partir da ideia
da patologia como um ‘desenvolvimento’ desigual, com base na qualidade do desenvolvimento
normal.
Silva e Tuleski (2015) veiculam, a partir da Psicologia Histórico-Cultural, a
concepção dos transtornos mentais atrelada às determinações históricas e sociais. Vigotski
(1929/2000) considera que todos os seres humanos têm medos, angústias e delírios, entre
outras sensações. Contudo, o que difere uns dos outros é a intensidade, a hierarquia dada a
cada sensação, a cada sentimento e o quanto acreditam ou não nos delírios.
Martins (2015a) aponta que, diante da necessidade de superar a psicologia como uma
ciência multifacetada, Vigotski formulou a psicologia geral, com base no materialismo
histórico-dialético, por abarcar a natureza, o pensamento e a história. Centralizou seus estudos
no desenvolvimento do psiquismo, que ocorre por meio da cultura historicamente organizada,
da educação e do trabalho humano. Daí, o que se vê como normal ou patológico está de acordo
com o momento histórico do sujeito, a economia, a cultura, a qualidade do seu
desenvolvimento e os interesses da sociedade. O filme de Charles Chaplin (1989 – 1977)
“Tempos Modernos”, lançado em 05 de fevereiro de 1936, nos Estados Unidos, exemplifica
perfeitamente as relações do sujeito que adoece devido às exigências incessantes de uma
sociedade pautada no capitalismo. O personagem principal é visto quase como uma máquina,
até o momento em que é internado, após ser capturado e preso em uma camisa de força.
De acordo com Silva e Tuleski (2015), o adoecimento psíquico é constituído histórica
e socialmente, e com base nas relações. Esse percurso pode ser favorável a um
desenvolvimento saudável ou não.
Se o ser humano se humaniza no interior das relações sociais por meio de sua
atividade vital e metabólica com a natureza – o trabalho –, quando esta forma de
atividade se encontra alienada e precarizada, as possibilidades para o
desenvolvimento pleno da personalidade humana encontram-se obstaculizadas
(SILVA; TULESKI, 2015, p. 209).

Nesse caminho, é importante entender como se constitui a personalidade, estrutura de


extrema relevância para o ser humano, pois, o controle e a condução das emoções dependerão
diretamente dessa estrutura. A personalidade, para Psicologia Histórico-Cultural, é a
objetivação da individualidade do sujeito. A personalidade, portanto, é contínua e evolui
conforme as transformações da atividade que produz e suas relações essenciais com o meio.
Assim, trata-se de um aspecto importante para a compreensão do ser humano e de tudo que a
influência, seja de forma positiva ou negativa, e de como conduzirá as situações que lhe causam
desconforto, incomodo ou sofrimento/adoecimento. Sob esse viés, Silva (2017) afirma que:
É a forma peculiar pela qual cada ser humano se apropria das objetivações sociais
que configura sua personalidade, e exatamente neste momento histórico, em que
48

estas subjetividades estão empobrecidas, que a lógica do capital coloca na


personalidade dos/ os professores/os toda a exigência para o bom êxito da educação
(SOUZA, 2017, p. 171).

Quanto à personalidade, Martins (2004) salienta as relações do sujeito desde o seu


nascimento. A autora trata que como a atividade e sua consciência são propulsoras do seu
desenvolvimento, e adverte sobre a relevância da atividade do ser humano na sua constituição.
Ainda, a estudiosa aponta que a personalidade representa um sistema fechado sobre si mesmo,
que desde o nascimento direciona as estruturas psicológicas humanas, sendo interpelada com
algo existente dentro do ser humano e que se atualiza de acordo com as condições de existência.
A atividade humana, que por sua natureza é consciente, determina nas diversas
formas de sua manifestação a formação de capacidades, motivos, finalidades,
sentidos sentimentos etc., enfim engendra um conjunto de processos pelos quais o
indivíduo adquire existência psicológica. O estudo desses processos psíquicos nos
leva necessariamente ao plano da pessoa, do homem como indivíduo social real: que
faz, pensa e sente, e é neste plano que nos deparamos com a personalidade
(MARTINS, 2004, p. 84).

As relações e as atividades, de acordo com Silva e Tuleski (2015), influenciam


diretamente na constituição da personalidade, que ambas e mais o vínculo das atividades, a
objetivação das relações com a sociedade auxiliam na apropriação da cultura e na forma do ser
humano ser. Ou seja, é durante a apropriação do mundo dos objetos e fenômenos criados pela
humanidade , por meio da socialização, da atividade humana que as necessidades irão surgir,
os motivos e interesses, que constituem a personalidade do ser humano.
Martins (2004) distingue que a realização do sujeito se efetiva por meio de toda a
história que constrói. O ponto de partida são as suas condições biológicas, que evoluem
socialmente, dadas as condições históricas que, por sua vez, determinam como se desenvolve
o psiquismo humano. Durante esse percurso, todas as relações contribuem para a constituição
da personalidade do sujeito. Se o sujeito estiver sob relações sociais de dominação, e se a
apropriação e a objetivação forem alienadas ou alienantes, haverá prejuízo no desenvolvimento
de sua consciência.
Assim, as relações sociais, a apropriação da cultura e a atividade do sujeito são
elementos essenciais para a formação da personalidade e o desenvolvimento da consciência
humana, e influenciam diretamente na maneira do ser humano ser e sentir, e de como lidar com
as emoções e administrá-las. A partir do momento em que esses subsídios se tornam restritos,
ou mesmo ausentes, compromete-se o desenvolvimento do psiquismo, tendo, como resposta,
o sofrimento psíquico, pois não haverá condições de organização de todo sentimento se não
haver habilidades qualitativas para organizá-los e gerenciá-los.
Esper (2019) elucida que, para a Patopsicologia Experimental, o ser humano adoecido
é abordado com foco em sua personalidade, em suas vivências e necessidades e não apenas em
49

seu organismo doente, seus sintomas e quadros clínicos. A autora salienta ainda, que sob a
perspectiva do materialismo histórico-dialético, os transtornos mentais precisam ser
percebidos com base nas relações sociais humanas, pois são produtos delas.
A qualidade no desenvolvimento da personalidade do sujeito é de extrema
importância, assim poderá se observar, compreender e organizar suas ações, mantendo a
consciência de todos os seus atos e consequências, e de como se comportará diante de situações
adversas, mas principalmente elaborar e organizar suas emoções.
A doença, ao modificar a atividade psíquica do homem, conduz a distintas formas
patológicas de personalidade. Nas publicações psiquiátricas pode-se encontrar
descrições extraordinárias por sua vivacidade e veracidade sobre as alterações da
personalidade, que são características para distintas doenças e estados. Contudo, a
análise destas alterações realiza-se fundamentalmente nas condições da psicologia
cotidiana ou na já superada [psicologia] empírica. Por este motivo, uma das metas
de maior perspectiva consiste na investigação das alterações de personalidade a
partir do ponto de vista da atual psicologia materialista. Estes estudos são necessários
não apenas para a prática psiquiátrica, mas também são úteis para resolver problemas
teóricos da psicologia da personalidade (ZEIGARNIK, 1981, p. 20).

A atividade consciente colabora para o desenvolvimento do sujeito, para a sua


compreensão psíquica entre as suas ações e fins. Suas ideias precisam estar conservadas no
exercício da atividade. É indispensável ter consciência interna e externamente durante a sua
realização de se relacionar internamente (objetivos, desejos, consciência) e externamente (em
relação com outros, com o meio) (MARTINS, 2004).
Nessa relação do trabalho consciente e motivado, o sujeito preserva a sua
personalidade. Martins (2004) comenta que, a partir do momento em que o sentido e o
significado da atividade se separam, ocorre uma alteração na estrutura interna da consciência,
resultando na alienação: “os motivos geradores de sentido são aqueles motivos que ao
impulsionarem a atividade lhe conferem sentido pessoal” (MARTINS, 2004, p. 91).
Conforme Almeida (2018), o sofrimento psíquico surge diante de determinadas
relações e suas experiencias. Trata-se de como o ser humano se organiza, vive, sente e produz,
e o que torna significativo a ele diante todas a essas circunstancias.
Assim, o sofrimento psíquico emerge como possibilidade a qualquer indivíduo,
inserido nessas relações, quando se torna uma obstrução a seus modos de andar a
vida. Ou seja, em nosso entendimento, as várias formas de manifestação do
sofrimento psíquico não são exclusividade de um grupo de pessoas predispostas por
características biológicas ou psíquicas, senão produzidas no movimento da vida e
determinadas socialmente (ALMEIDA, 2018, p. 64).

Delari (2017) também contribui com a observação de como as diferentes relações são
possíveis propulsoras do sofrimento e de como as inúmeras situações que vivemos podem
gerar a dor. Delari (2017) ressalta que essas relações podem ser com outras pessoas ou conosco
50

mesmo, e entende o “sofrimento psíquico” como estado e/ou situações da vida humana que
sente dores originadas das relações sociais mediadas por processos simbólicos.
Nestes dois planos que se relacionam e se complementam justo por não serem
idênticos, mas antitéticos, qualitativamente distintos. Poderíamos dizer sofrimentos
afetivos, mas seria artificial tentar conferir “autonomia” do afeto com relação à
cognição e vice versa. Não podemos sentir qualquer emoção sem que nada pensemos
sobre ela. Nem pensarmos seja no que for sem qualquer emoção sentir ao fazê-lo
(DELARI, 2017, p. 8).

Marino-Filho (2020) explica que todo ser vivo é ativo para manter sua vida, sendo
essa uma condição básica do ser vivo. Por exemplo, em qualquer atividade animal existem
determinadas formas de objetivar a atividade. São sistemas de orientação, execução e controle
da atividade vital e, com base em Vigotski (1986), descreve:
O que para o animal viabiliza esse sistema é a sinalização que ativa as relações
sensíveis com o meio. Possibilitar a análise das informações e ativar os meios de
orientação, de execução e de controle para a atividade são algumas das funções da
sensibilidade. Para os homens, além dessa condição biológica, o que organiza esse
sistema é a transformação da sinalização em significação, isto é, os homens criam
novos sinais ao transformar a natureza e estes sinais passam a ser meios para a
manutenção da sua vida em comunidade com outros homens (MARINO-FILHO,
2020, p. 76).

Assim, quando a atividade exercida pelo sujeito não atende às suas necessidades, o
resultado do seu trabalho prejudica a formação da sua personalidade. Ao deixar de ter
autonomia para manifestar a sua individualidade, em função da negação de suas próprias
aspirações, passa a realizar a atividade sem atribuir-lhe sentido:
O trabalho como atividade humana, como atividade vital, é realizado pelo consumo
da própria força física e intelectual. O homem usa a si mesmo como meio, como
instrumento para realização da sua atividade. Nesse sentido, a atividade vital como
uso e consumo da própria força é, para o homem, uma condição. A manutenção da
sua vida não é possível sem que ele se submeta à atividade, sem que ele suporte o
esforço para a sua manutenção. Destacam-se, por isso, alguns dos sentidos da palavra
sofrimento como sustentar, submeter-se, tolerar, uma dada condição imposta por
outra força que não a do indivíduo sujeitado (MARINO-FILHO, 2020, p. 80).

Pessoa e Leonardo (2020) expressam que a atividade sem sentido não proporciona o
desenvolvimento dos sujeitos envolvidos em uma relação, e quando a desenvolvem apenas
para alcançar os indicadores estabelecidos não proporcionam a formação humana possível por
meio da mediação. Essa forma de trabalho nada mais é que a simples troca, ação desprovida
de motivação.
Caso o docente preocupe-se apenas com o cumprir metas e transmitir conteúdos,
perde-se de vista o caráter de humanização dos sujeitos pela Educação. Pode-se
afirmar que o professor está inserido em um sistema de venda de sua força de trabalho
e, no caso da atividade de ensino, reflete em muitos casos a elaboração de ações sem
fornecer sentido ao aluno e à sua realidade, tampouco a si mesmo (PESSOA;
LEONARDO, 2020, p. 12).
51

Nesse cenário, surge a alienação como resultado da falta de motivação, mesmo


havendo a consciência durante a execução da atividade, o ser humano deixa de se ver como
responsável pela ação transformadora, e passa a ser apenas o executor. Segundo Martins
(2004), a alienação é uma questão de grau na vida do sujeito, podendo ser maior ou menor. É
percebida quando sua compreensão for além da particularidade, quando alcançar a sua
condição humano-genérica.
A partir da Psicologia Histórico-cultural, as funções psíquicas são entendidas não
como funções inatas, mas sim como produto das atividades desenvolvidas ao longo
da vida, o que faz com que as alterações psíquicas sejam compreendidas e
investigadas como resultantes das alterações da atividade. Desse modo, é possível a
análise qualitativa das distintas formas de desintegração do psiquismo, a descoberta
dos mecanismos da atividade alterada e as possiblidades para sua reabilitação
(SILVA; TULESKI, 2015, p. 212).

As autoras prosseguem o raciocínio: “nesta perspectiva, encontra-se um novo lugar


social para as pessoas em sofrimento mental, pensando no sujeito que sofre a partir de sua
vivência de sofrimento, em condições concretas de vida” (SILVA; TULESKI, 2015, p. 214).
Zeigarnik (1981 [1976]) percebe as mudanças da atividade psíquica, tanto cognitiva
quanto a motivada emocionalmente, não como um resultado direto da doença mental, mas
como um percurso complexo que envolve formação e desenvolvimento. Essa percepção pode
estar ligada ao método genético, sugerido por Vigotski, por meio da investigação do ser
humano adoecido e as informações com base no experimento psicológico.
Como elucidamos no início do trabalho, o sofrimento se difere do adoecimento,
contudo os escrevemos dessa maneira sofrimento/adoecimento entendendo que pode ocorrer
um ou outro fenômeno no trabalhador, ou mesmo os dois.
Apoiada em Marino-Filho (2020), afirmamos que o sofrimento pode ocorrer como
uma forma de desfrutar de algo como condição para criação e a humanização para si, e como
conteúdo de transformação também para outros, mas quando o ser humano passa a
desempenhar sua atividade de forma alienada, seu sofrimento não frui mais para si, e sim para
os que o dominam, e essa condição gera um sentimento negativo, pois não é mais o
protagonista na sua atividade e no processo de transformação, não tem mais autonomia, e luta
para manter sua integridade psicológica e biológica.
Quanto ao adoecimento psicológico, a partir das reflexões de Leontiev (1978),
Marino-Filho (2020) assinala que a desconexão entre sentido e significado que orienta a
execução e controle das ações, e essa condição o leva a criar um processo criativo e fantasioso
dessa própria condição, e caso isso persista pode ocorrer o adoecimento crônico ou a
continuidade do sofrimento, resultando em prejuízos no funcionamento psicológico e/ou
biológico. E esses prejuízos apontados pelo autor, geram contrassensos das ações do ser
52

humano com a realidade, e esse fenômeno pode ser percebido a partir da criação de outros
sentidos pessoais com interpretações fantasiosas criadas para suportar o insuportável.
Nesse caso, como mau funcionamento, o adoecimento psicológico se manifesta
como a perda da coerência das ações dos indivíduos com a sua realidade. Isso
significa que o indivíduo passou a criar outros sentidos pessoais para as suas ações,
baseado em uma interpretação fantasiosa da realidade como alternativa para uma
realidade insuportável. Os problemas para o sistema psicológico se concretizam
como frustração das próprias ações na realidade concreta, já que o sentido na
orientação das ações se relaciona a uma realidade mal interpretada, diferente ou
inexistente na realidade concreta (MARINO-FILHO, 2020, p. 83).

Nesses termos, entendemos que o desenvolvimento das funções psicológicas


superiores e a formação da personalidade possibilitam ao ser humano a aquisição da
autonomia, a satisfação e o prazer das suas ações, mesmo diante do sofrimento, desde que gere
uma motivação, uma fruição para o sujeito realizar sua atividade buscando satisfazer as suas
necessidades e desempenhá-las de forma consciente. Contudo, a partir do momento em que a
sua atividade passa a gerar uma atitude negativa, impedindo a manutenção da sua consciência,
alienando o ser humano e ‘obrigando-o’ a realizar as suas atividades sem qualquer condição,
surge o adoecimento.
Ressaltamos que apesar de todo ser humano sofrer, não significa obrigatoriamente que
irá adoecer. O sofrimento psíquico/físico intenso pode gerar o adoecimento psíquico e/ou físico
quando escapar do ‘controle’, e ainda assim manter sua consciência, resultando na repressão
de sua dor, de suas emoções.
Diante do exposto, podemos apresentar duas explicações para o
sofrimento/adoecimento psíquico pautado na Psicologia Histórico-Cultural. Primeiro, a
privação da apropriação de conteúdos, de instrumentos, de signos, de relações saudáveis
consigo e com outros, de conceitos criados e modificados histórica e culturalmente podem
prejudicar o desenvolvimento ou desintegrar a unidade complexa das funções psicológicas
superiores, que se desenvolvem por meio do pensamento e linguagem. Segundo, a partir do
comprometimento no desenvolvimento das funções psicológicas superiores, a estrutura
humana, personalidade também sofre prejuízos, e diante essa consequência, o ser humano tem
dificuldade em expressar seus sentimentos, elaborar e organizar suas ideias, e
consequentemente não consegue expressar suas emoções, as reprime a ponto de gerar uma dor
interna intensa desencadeando o sofrimento/adoecimento. A complexa e importante qualidade,
a mediação, a educação, a oferta de oportunidades no desenvolvimento das funções
psicológicas superiores do ser humano, serão fundamentais para propiciá-lo a ter o controle de
suas emoções e comportamentos diante as diferentes adversidades da vida humana.
53

Neste capítulo, recordamos a importância da reforma psiquiátrica brasileira para


entendermos e introduzirmos uma reflexão sobre o preconceito enraizado cultural e
historicamente em relação ao ser humano que não se enquadra nos parâmetros descritos como
‘normais’ pela sociedade. Vimos como a discussão do normal e do patológico denunciam a
exclusão e os rótulos existentes na sociedade capitalista e suas relações, o que muitas vezes
direciona o ser humano a silenciar a sua dor em função do medo que sente sobre o que podem
pensar a respeito de si e de suas fragilidades. Também, com base na Psicologia Histórico-
Cultural, constatamos que o sofrimento psíquico surge não apenas das privações nas
experiências e apropriação da cultura, mas também nas possibilidades limitadas de
aprendizagem, na não abstração do pensamento e da linguagem, na alienação como resultado
da desintegração do sentido e significado da atividade, das relações em suas diferentes formas,
seja com o meio ou consigo mesmo e, ainda, de poucos ou nenhum estímulo das funções
psicológicas superiores, por meio da restrição ao acesso ao conhecimento sistematizado, e
ainda, por saber conduzir suas emoções. Também observamos como é importante respeitar as
diferenças e entender que o sujeito, apesar de algumas limitações, pode cultivar funções
significativas para a vida.
O sentido pessoal e o significado social, em relação a atividade do ser humano, são
fatores essenciais para o trabalhador desenvolver seu trabalho de forma consciente e particular
mesmo pertencendo a coletividade. São conceitos criados e estudados procurando entender a
importância da subjetividade e objetividade do ser humano no processo de trabalho. O sentido
é entendido como algo humano no ser humano, subjetivo, é pessoal e está ligado diretamente
a consciência humana. A emoção, motivação e o desejo são o que gera prazer. Já o significado
é o aspecto objetivo da atividade, é social e construído historicamente, por meio de atividades
sociais coletivas, ao contrário do sentido: é estável. Ou seja, a união dos conceitos no
desempenho da ação do ser humano é fundamental para a conservação da sua saúde psíquica,
colabora para a existência e permanência dos motivos, desejos, da consciência.
A partir da compreensão do sofrimento/adoecimento psíquico a partir da Psicologia
Histórico-Cultural, foi realizado um levantamento para identificar pesquisas que utilizam dessa
perspectiva para fundamentar suas análises.

1.4 Levantamento de dados a partir de um único descritor em períodos e banco de dados


distintos: em busca do aporte da Psicologia Histórico-Cultural para análise do
sofrimento/adoecimento psíquico docente.
54

A complexidade e a dimensão do âmbito educacional possibilitam a criação e a


intensificação de pesquisas com o potencial de contribuir para o desenvolvimento humano.
Essas produções auxiliam na formação, atualização e atuação de outros profissionais, sejam
eles professores, gestores e até mesmo os próprios pesquisadores, que se utilizam do
conhecimento de outros para instruir-se, aperfeiçoar-se e internalizar novos aprendizados, com
aprimoramento constante.
Vigotski e Luria (1996) sublinham a relevância da ciência em indagar a respeito dos
modos pelos quais a mente primitiva da criança se transforma, passo a passo, na mente de um
homem adulto cultural. O desenvolvimento não é apenas um amadurecimento, mas um
‘reequipamento’, tomado como a maior causa das mudanças observadas na criança, à medida
que se torna um adulto cultural (VIGOTSKI; LURIA, 1996).
Nesse tópico apresentaremos três pesquisas realizadas em períodos e com descritores
diferentes que trataram sobre o sofrimento e adoecimento psíquico docente. Analisamos os
resumos dos trabalhos para verificar quais foram os instrumentos e/ou procedimentos
utilizados para coleta de dados e quais descreviam a abordagem teórica metodológica que
fundamentaram suas análises. O primeiro levantamento foi realizado em dezembro de 2020
quando iniciamos a pesquisa do doutoramento, e foi com um único descritor, sofrimento
psíquico, no Catálogo de Teses e Dissertações da CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior). O segundo, também no banco da CAPES, em janeiro de 2022,
com a pesquisa já em andamento, também com um descritor único, dessa vez: adoecimento
psíquico. Por esse motivo se justifica a diferença no período dos levantamentos. Esclarecemos
também que a mudança no descritor sofrimento psíquico para adoecimento psíquico no
segundo levantamento ocorreu propositalmente como objetivo de possibilitar o achado de
novos trabalhos, o que foi constatado de acordo com os resultados. O filtro para ambos foi em
termos da Grande Área de Conhecimento Ciências Humanas. Para os demais afunilamentos
da pesquisa, o filtro Educação. O período das produções não foi restrito, devido à finalidade
de localizar o maior número possível de produções.
Contudo, com o objetivo de ampliar as buscas realizamos um terceiro levantamento
como forma de complementar os dados, e esse, também foi realizado em janeiro de 2022, e foi
efetuado nos bancos de dados Scielo (Scientific Electronic Library Online) e Bireme (Centro
Latino-Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde), no qual utilizamos o
descritor único adoecimento psíquico. Como filtros gerais, incluímos na pesquisa somente
títulos em português, publicações de artigos inteiros e citáveis e sem limitação de período de
publicação. Uma vez regatados todos os títulos, selecionamos somente aqueles que
55

contivessem, em seu título ou resumo, o descritor Docente ou termos similares (professores,


docência). Por último, realizamos a busca novamente no banco de dados da CAPES, mas desta
vez expandimos os filtros também para Psicologia.
Por ser a Psicologia Histórico-Cultural o aporte teórico metodológico que
fundamentou a Tese apresentada, e por entendermos que favorece a compreensão da relação
entre desenvolvimento e aprendizado, se tratando de uma união que leva o ser humano a se
constituir humano, estabelecer relações e permanecer em processo contínuo de
desenvolvimento, os levamentos buscaram identificar os trabalhos que a utilizaram também
como fundamentação.
Compreendendo a educação uma área de significado ímpar para a constituição do
sujeito, as pesquisas nesse campo conduzem a uma melhor compreensão do ser humano, como
alguns autores que discorrem sobre a especificidade das pesquisas na educação. Segundo
Cedro e Nascimento (2017):
A pesquisa educacional assume muitas formas distintas e reveste-se de algumas
características especificas. Essa situação acontece pelo fato de que pesquisar em
Educação significa investigar questões relacionadas aos seres humanos em seu
próprio processo de humanização. Isso faz com que a pesquisa educacional
compreenda uma diversidade de questionamentos de variadas conotações que tem
em comum a relação com o desenvolvimento humano, das comunidades e da
sociedade (CEDRO; NASCIMENTO, 2017, p. 13).

Com menção ao primeiro levantamento de dezembro de 2020 com o descritor


sofrimento psíquico, encontramos 116 produções, das quais apenas 35 apresentaram o
descritor sofrimento psíquico no resumo (Tabela 01). Dentre elas, 10 dissertações e 06 teses.
Outros 10 trabalhos, divididos em 09 dissertações e 01 Tese abordaram sobre o sofrimento
psíquico de crianças e adolescentes; sobre o sofrimento psíquico discente foram 03 produções,
02 dissertações e 01 Tese, e 02 dissertações e 02 Teses, somando 04 trabalhos se referiram a
outros públicos.

Tabela 01: Trabalhos encontrados com o descritor Sofrimento Psíquico descrito nos resumos em
dezembro de 2020
Tipo Sofrimento Sofrimento Sofrimento psíquico Sofrimento Psíquico
Psíquico docente Psíquico crianças e outros
discente adolescentes
Dissertações 10 2 9 2
Teses 6 1 1 2
Total 18 3 10 4
Fonte: Freire, 2023.

Por ser o sofrimento/adoecimento psíquico docente o nosso objeto de estudo, as


análises foram realizadas apenas nas produções que trataram especificamente sobre esse tema.
Verificamos que as 10 dissertações e as 06 teses apresentaram os instrumentos e/ou
56

procedimentos para coleta de dados; quanto a teoria ou método de análise, 03 dissertações


especificaram a Psicodinâmica, sendo 01 destas junto a teoria Sociologia Clínica, 01 baseada
na Pedagogia Histórico-Crítica e 01 que descreveu o Materialismo Histórico-dialético.
Referente às teses, 02 especificaram a teoria Psicanálise e 01 Psicodinâmica do Trabalho e
Psicossociologia. Outras 05 dissertações e 03 teses não especificaram a teoria e/ou
eventualmente citaram alguns estudiosos que embasaram as análises.

Tabela 02 – Instrumentos/Procedimentos para coleta de dados/Teoria/Método – Descritor Sofrimento


Psíquico
DISSERTAÇÃO
Instrumentos/procedimentos Teoria/Método
1 pesquisa bibliográfica/pesquisa de campo por meio a uma entrevista X
semiestruturada.
2 Realizados encontros coletivos Psicodinâmica do Trabalho
3 Entrevistas semiestruturadas Sociologia Clínica e com
contribuições da Psicodinâmica
do Trabalho
4 Questionário/entrevistas semiestruturadas análise de documentos Psicodinâmica do Trabalho
5 Grupo de estudos Pedagogia Histórico-Crítica
6 Entrevistas/análise documental de jornais do CEPERS-Sindicato. X
7 Observação do objeto Materialismo Histórico-dialético
8 Levantamento das licenças médicas / questionário e a entrevista. X
9 Levantamento de produções do tipo estado do conhecimento X
10 Pesquisa bibliográfica e empírica/ entrevistas X
TESE
Instrumentos/procedimentos Teoria/Método
1 narrativas orais e escritas, por meio de coletas online X
2 entrevistas Psicanálise
3 Grupo de conversação; a análise, Psicanálise
4 entrevistas semiestruturadas X
5 realizadas entrevistas semiestruturadas X
6 Análise de documentos/entrevistas semiestruturadas Psicodinâmica do
Trabalho e Psicossociologia
Fonte: Freire, 2023

No que tange ao levantamento de janeiro de 2022, com o descritor adoecimento


psíquico, foram encontrados 122 trabalhos, sendo que 33 trataram de forma particular do
adoecimento docente, e sendo 23 dissertações e 10 teses, outros três trabalhos trataram sobre
outros tipos de adoecimento (duas 02 dissertações e uma tese) (Tabela 03).

Tabela 03: Trabalhos encontrados com o descritor Adoecimento Psíquico descrito nos resumos em
janeiro de 2022.
Tipo Adoecimento Adoecimento Adoecimento psíquico Adoecimento
Psíquico docente Psíquico crianças e Psíquico outros
discente adolescentes
Dissertações 23 0 0 2
Teses 10 0 0 1
Total 33 0 0 3
Fonte: Freire, 2023
57

Dos 33 trabalhos analisados com o descritor adoecimento psíquico, a


identificação dos instrumentos/procedimentos para coleta foi verificada em 23
dissertações e nas 10 Teses. A teoria ou método de análise foi descrita em 05 dissertações,
sendo 04 o Materialismo Histórico-dialético e 01 a Teoria Social Cognitivo. Sobre as
Teses, 03 fundamentaram as análises no Materialismo Histórico-dialético, 01 na
Perspectiva Histórico-Cultural e na Clínica da Atividade, a Análise arqueogenealógica dos
discursos foi a base de 01; outras 18 dissertações e 05 teses não especificaram a teoria,
e/ou ocasionalmente citaram pesquisadores que colaboraram com as análises.

Tabela 04 – Instrumentos/Procedimentos para coleta de dados/Teoria/Método – Descritor


Adoecimento Psíquico
DISSERTAÇÃO
Instrumentos/procedimentos Teoria/Método
1 Revisão bibliográfica sobre a temática a ser abordada, contando Materialismo Histórico-dialético
com análise de dissertações, artigos e textos/ registros médicos
2 levantamentos bibliográfico e pesquisa empírica, com os Materialismo Histórico-dialético
recursos instrumentais do questionário e a entrevista semiestruturada
3 Análise documental das licenças saúde X
4 Análise documental/ pesquisa bibliográfica X
5 Entrevista semiestruturada Materialismo Histórico-dialético
6 Levantamento e análise das políticas públicas X
7 Pesquisa bibliográfica e documental X
8 Pesquisa bibliográfica e documental X
9 Revisão Sistemática da Literatura (RSL) Teoria Social Cognitiva
10 Levantamentos bibliográficos e estatísticos X
11 Entrevistas semiestruturadas X
12 Pesquisa documental X
13 Pesquisa documental X
14 Aplicação do Maslach Burnout Inventory (MBI)/ entrevistas X
semiestruturadas
15 Pesquisa de campo X
16 estudo exploratório algumas categorias orientaram as análises. Materialismo Histórico-dialético
17 Pesquisas bibliográficas e webgráficas X
18 Pesquisa documental - Registro de Perícia X
19 Pesquisa exploratória/ questionário socioeconômico/ o CESQT-PE/ X
o questionário de estressores
20 Pesquisa bibliográfica/análise documental/entrevista X
semiestruturada e o questionário “Medical Outcomes Study 36 Short-
Form Helth Survey (SF–36)”
21 Pesquisa bibliográfica/ Revisão de literatura X
22 Pesquisa qualitativa/exploratória X
23 Entrevista/ Escala de Bem-Estar Docente (EBED) X
TESE
Instrumentos/procedimentos Teoria/Método
1 Entrevistas semiestruturadas e notas de campo X
2 Pesquisa bibliográfica/pesquisa de campo Materialismo Histórico-dialético
3 Análise do discurso X
4 Entrevistas semiestruturadas Materialismo Histórico-dialético
5 Estudo de Caso X
6 Entrevistas de confrontação Perspectiva Histórico-Cultural e
na Clínica da Atividade
7 Pesquisa documental/entrevista/questionário Materialismo Histórico-dialético
8 Narrativas X
58

9 Análise de discurso Análise arqueogenealógica dos


discursos
10 Questionário X
Fonte: Freire, 2023

Sobre o terceiro levantamento, na plataforma Scielo 173 títulos foram encontrados.


Após aplicados os filtros e desconsiderados todos os títulos que não se relacionassem à
educação, ensino, escola ou processos de formação, organizamos as produções por temas. Na
primeira organização, localizamos 57 abordando processos educativos e práticas políticas
pedagógicas; 18 trouxeram em seu escopo a função ou atividade do psicólogo escolar ou
psicologia da Educação; 29 sobre processos e discussões sobre inclusão, educação especial ou
educação para pessoas com deficiências diversas; e 25 sobre a atividade ou a formação docente.
No banco de dados da Bireme, com o descritor Histórico-cultural, listamos 200
títulos em português de artigos inteiros e citáveis. Depois de aplicarmos os demais filtros e
desconsiderarmos os que estavam repetidos e que não se relacionavam com a educação ou
ensino, chegamos a 15 títulos que tratavam de inclusão, educação especial ou educação para
pessoas com deficiências diversas; 31 sobre processos educativos ou políticas educacionais,
cinco sobre atuação do psicólogo ou psicologia da educação ou psicologia escolar; 12
relacionados à docência ou aos processos formativos docentes (Tabela 06), mas apenas o
trabalho de Mota e Silva (2020) está relacionado ao trabalho docente sob aporte da THC.

Tabela 05. Relação dos artigos nos bancos de dados SCIELO e BIREME sobre adoecimento psíquico
relacionado ao trabalho docente
ANO AUTORES TÍTULO PERIÓDICO

1 2011 Marques, SVD; Martins, GB; Saúde, trabalho e subjetividade: Cadernos EBAPE
Sobrinho, OC. absenteísmo-doença de trabalhadores
em uma universidade pública

2 2012 Giannini, SPP; Latorre, Distúrbio de voz e estresse no trabalho Cad. saúde pública
MRDO; Ferreira, LP. docente: um estudo caso-controle

3 2014 Bernardo, MH. Produtivismo e precariedade subjetiva Psicol. soc.


na universidade pública: o desgaste (online)
mental dos docentes

4 2016 Coelho, RN; Ramalho, GM; A saúde do trabalhador no âmbito Rev. psicol.
Brito, ES; Miranda, BB; Silva, universitário: uma parceria de êxito na (Fortaleza, Online)
TIO; Pereira Filho, FAA. UFC

5 2017 Silva, VA; Coimbra, AKS; Saúde dos professores do ensino Vínculo
Yokomiso, CT. fundamental da rede pública e a
construção dos espaços psíquicos
compartilhados

6 2018 Ferreira-Costa, RQ; Pedro- Níveis de ansiedade e depressão: o - Estud. psicol.


Silva, N. mundo da prática docente e o (Natal)
adoecimento psíquico
59

7 2018 Siqueira, BC; Boarini, ML. A saúde do professor no cotidiano Psicol. Educ.
escolar: uma pesquisa histórica (Online)

8 2019 Vivian, C; Trindade, LL; Estratégias de defesa contra o Cad. psicol. soc.
Rezer, R; Vendruscolo, C; sofrimento no trabalho de docentes da trab
Rodrigues Junior, SA. pós-graduação stricto sensu

9 2020. Mota, CA; Silva, AKL. A atividade de trabalho e o Estud. psicol.


adoecimento psíquico em (Natal)
trabalhadores de uma instituição
federal de ensino

10 2021 Prata-Ferreira, PA; Vasques- Conflitos do professor universitário: o Psicologia em


Menezes, I. que sabemos sobre isso? Estudo

11 2021 Souza, KR; Simões-Barbosa, Trabalho docente, desigualdades de Cien Saude Colet
RH; Rodrigues, AMS; Felix, gênero e saúde em universidade
EG; Gomes, L; Santos, MBM. pública

12 2022 Figueiredo, SL; Silva, EF. Desafios do Fazer Docente nas Salas Psicologia: Ciência
de Recursos Multifuncionais (SRM) e Profissão
Fonte: Freire, 2023

Ainda nessa terceira pesquisa, conduzimos uma nova procura a partir do descritor
Histórico-Cultural. Utilizamos, novamente, os mesmos filtros de busca e os mesmos
processos de seleção que se referem ao docente sob o aporte da teoria/Psicologia Histórico-
cultural.
Em seguida, após a fusão da pesquisa nos dois bancos de dados, aplicando-se o
afunilamento para pesquisas envolvendo docente e retirando-se os títulos que estavam
repetidos, identificamos 30 artigos relacionados à atividade ou à formação docente, sendo que
apenas 01 fez menção ao adoecimento ou sofrimento do professor de maneira geral, incluindo
o adoecimento psíquico.

Tabela 06. Relação dos artigos nos bancos de dados SCIELO e BIREME sob o aporte da THC e
Adoecimento Docente
ANO AUTORES TÍTULO PERIÓDICO

1 2018 Facci, Professor readaptado: a precarização do trabalho Psicologia Escolar e


MGD; docente e o adoecimento Educacional
Urt, SC;
Barros, ATF
Fonte: Freire, 2023

Quanto ao levantamento com o descritor adoecimento psíquico- relacionado ao


trabalho docente à luz da PHC no banco da CAPES com os filtros expandidos também para
psicologia, obtivemos sete trabalhos envolvendo Docente, adoecimento psíquico e THC, sendo
cinco dissertações e duas teses. Ressaltamos que, desses achados, apenas duas dissertações têm
o adoecimento psíquico docente como tema central (FERNANDES 2019; SANTOS, 2014).
60

Os demais constam, em seu título, adoecimento ou termo análogo e referem-se ao adoecimento


psíquico no trabalho.

Tabela 07. Relação de teses e dissertações no Banco de teses e dissertações da CAPES com o descritor -
adoecimento psíquico- relacionado ao trabalho docente à luz da PHC
ANO AUTORES TÍTULO TIPO PROGRAMA E
UNIVERSIDADE
1 2014 SANTOS, Contribuições da Psicologia Dissertação Psicologia
DIEGO Histórico-cultural para a
AUGUSTO compreensão do adoecimento Universidade Estadual
DOS e sofrimento psíquico de De Maringá
professores'
2 2019 FERNANDES, O adoecimento psíquico Dissertação Psicologia
LETICIA (in)visível docente: uma
BRITO DA perspectiva da Psicologia Universidade Federal
MOTA. Histórico-cultural De Mato Grosso Do Sul
Fonte: Freire, 2023

A escolha dos descritores para as pesquisas científicas é fundamental. Caso eles não
estejam de acordo com a nomenclatura das bases de dados, o trabalho pode não ser encontrado,
e por isso nem será citado. Além de a informação ficar perdida, gera prejuízo também para a
revista em que foi publicado, pois quanto mais citada, mais valorizada será a revista. E há
perda para o autor, pois um maior número de citações acrescenta relevância ao valor da
pesquisa e de seus resultados. Ademais, é frequente a dificuldade vinculada à busca, ou seja,
quais palavras devem ser inseridas no campo de pesquisa. O descritor confere maior
especificidade à busca realizada (BRANDAU; MONTEIRO; BRAILE, 2005; POMPEI,
2010).
Esse dado, apesar de a priori ser frustrante, remete-nos à duas proposições: a
importância da construção e remodelamento da pesquisa durante o seu processo, uma vez que,
mesmo em uma pesquisa teórica, é necessário atentar às possibilidades de procura, à utilização
de termos similares, à ampliação da base de dados e à leitura mais aprofundada dessas
produções. Por outro lado, esse achado revela ainda a carência de estudos acadêmicos que
tratam diretamente do sofrimento/adoecimento psíquico em meio educacional com o aporte da
PHC, o que nos sugere a urgência e a acuidade das nossas investigações.
Reportamo-nos a Rebolo et al. (2020) em uma pesquisa no mesmo banco de dados,
utilizando os descritores ‘saúde dos professores’ e ‘adoecimento dos professores’. Concluíram
que as referências mais utilizadas foram Psicodinâmicas do Trabalho, Análise Ergonômica do
Trabalho e Ergonomia da Atividade, Teoria das Representações Sociais, Psicologia Histórico-
cultural e mal-estar docente.
61

Facci, Leonardo e Silva (2010) observaram, em uma análise dos textos publicados
sobre a formação do professor nos Anais das Reuniões Anuais da ANPEd, no período de 2002
a 2006, que a Psicologia Histórico-cultural e a Pedagogia Histórico-Crítica raramente foram
adotadas como fundamentação teórica.
Inferimos que as abordagens teóricas abraçadas nas pesquisas encontradas nesse
levantamento correspondem ao método de conhecimento dos pesquisadores, pois só é possível
transmitir informações e propiciar a transformação por meio da propriedade do conhecimento.
Urt (2005) expõe que a produção científica é uma forma de transmissão e divulgação
daquilo que vem sendo investigado em determinada área de conhecimento e em dado momento
histórico, o que nos reporta às prováveis preferências de abordagens teórico-metodológicas
das pesquisas, que necessitam de maiores aprofundamentos.
Seguindo a mesma lógica, Martins (2005) declara que a pesquisa epistemológica e
científica advinda da apreciação de produções acadêmicas nos permite minimizar meras
reproduções do conhecimento e avançar cientificamente com novas propostas de compreensão
da realidade, identificando lacunas, aspectos ainda por explorar ou modos diferentes de tratar
temas de pesquisa.
As pesquisas no âmbito da educação podem contribuir para melhorar o processo de
constituição do ser humano, do seu desenvolvimento e da sua apropriação das experiências
culturais. Ademais, possibilita aprender sobre o desenvolvimento da personalidade, entendida
como aspecto metodológico central, como a expressão autêntica e genuína dos componentes
social e cultural, da história da personalidade.
O interesse em abordar a questão do método nas pesquisas educacionais já expressa
a existência de certo grau de insatisfação com o estado atual das mesmas, significa
uma procura por novas respostas a partir de novas hipóteses, um olhar mais
aprofundado sobre a aplicação na prática dos princípios e construtos da teoria
histórico-cultural. Aceitar o papel que o estado de insatisfação e insuficiência traz
para o desenvolvimento, permite compreender a importância da necessidade de
pensar no método nas pesquisas educacionais (MENDONÇA; PENITENTE;
MILLER, 2017, p. 41).

Como vimos neste levantamento, a busca por trabalhos a partir de um único descritor
pode, inicialmente, frustrar o pesquisador, devido ao número de estudos encontrados, em
contraste com o quantitativo esperado. Por outro lado, ocorre a identificação da prevalência do
método ou abordagens teórico-metodológicas mais utilizadas sobre o tema. Em suma, toda
pesquisa efetuada com qualidade é geradora de conhecimento e contribui para o interesse e
aprendizado de novos pesquisadores.
A pesquisa é um conjunto de operações ou atividades que objetivam desvendar novos
conhecimentos em vários domínios, principalmente no âmbito científico, que abarca um
62

processo sistemático de busca e análise e que procura investigar e/ou compreender uma
realidade, um contexto ou um problema (GIL, 1999; CERVO; BERVIAN, 2002;
DAMASCENO et al., 2014).
Castro (2020) assevera que, independentemente do método, a pesquisa se transforma
em um estudo descritivo e identifica pontos importantes para a compreensão de um fenômeno,
no caso deste texto, o sofrimento psíquico docente.
Em acordo com o método materialista dialético e metodologia de revisão
bibliográfica, uma análise realizada pode ser classificada como um estudo descritivo
que se processou a partir de uma abordagem quantitativa e de análise de conteúdo, a
fim de identificar categorias e subcategorias que se relacionam aos estudos que fazem
referência ao adoecimento docente e levando em conta a criticidade do material
coletado, promovida pela observação da realidade com uso do materialismo
histórico-dialético ou não (CASTRO, 2020, p. 64).

Com base no levantamento e análise realizados, entendemos que toda pesquisa


favorece o desenvolvimento, o aprendizado e a aquisição de novos conhecimentos
sistematizados e empíricos. O conhecimento vai se aprimorando, à medida que se publicam
novas mediações de conteúdo, exemplos e domínio do método e metodologia adotados.
As pesquisas científicas possibilitam compartilhar o conhecimento. Colaboram para
o processo de transformação e asseguram a importância da educação para o desenvolvimento
humano e de toda sociedade.
Neste capítulo expusemos as manifestações psíquicas do sujeito professor, sua
constituição e formação pessoal, o sofrimento a partir do silenciamento de suas emoções, o
adoecimento e a atividade durante o período da pandemia, além da forma de obter acesso às
pesquisas sobre o sofrimento e o adoecimento psíquico e as abordagens utilizadas para análises
das informações. Foi significativo aprender e entender o quanto a profissão docente é
motivadora de transformação, com uma função literalmente de divisor de águas. Ao mesmo
tempo, contudo, enfrenta situações de desvalorização e de más interpretações quanto à sua
função. Em tempo, finalizamos esse capítulo convidando o leitor a refletir o conteúdo exposto
o relacionando a poesia de Rosilene Rocha que retrata a passos largos de maneira real a
depreciação e o desrespeito do professor, mas que mesmo diante de uma sociedade alienante
que insiste em silenciá-lo, o professor não desiste, persiste e resiste por acreditar no poder de
transformação da educação.
Iniciamos esse capítulo pontuando considerações do filme “Nise da Silveira: o
coração da loucura” que propõe uma reflexão ampla sobre as formas e locais de tratamento
que antecederam os modelos substitutivos. Ainda, contribui para a discussão do normal e
patológico e as possibilidades de superação e valorização das habilidades e o que há de mais
singular de cada ser humano. E finalizamos esse capítulo com a poesia INSONIA de Fernando
63

Pessoa, que descreve a dor de um ser humano que sofre com as noites que o engole em meio
aos numerosos e dolorosos pensamentos, descreve a dor sufocada e a turbulência de
sentimentos, do silêncio de dentro e de fora, da esperança em descansar em um sono profundo
ainda não experenciado, e que de certa forma retrata alienação da humanidade que tudo
esquece, que cria seu próprio mundo na tentativa de sobreviver.
No próximo capítulo, discorremos sobre o sujeito professor e suas manifestações
psíquicas, personagem principal da nossa pesquisa. Buscamos descrever sua formação social,
o desempenho da atividade docente e tecemos considerações a respeito do sofrimento psíquico
docente.
INSÔNIA
Não durmo, nem espero dormir.
Nem na morte espero dormir.
Espera-me uma insônia da largura dos astros,
E um bocejo inútil do comprimento do mundo.
Não durmo; não posso ler quando acordo de noite,
Não posso escrever quando acordo de noite,
Não posso pensar quando acordo de noite
Meu Deus, nem posso sonhar quando acordo de noite!
Ah, o ópio de ser outra pessoa qualquer!
Não durmo, jazo, cadáver acordado, sentindo,
E o meu sentimento é um pensamento vazio.
Passam por mim, transtornadas, coisas que me sucederam
Todas aquelas de que me arrependo e me culpo ;
Passam por mim, transtornadas, coisas que me não sucederam
Todas aquelas de que me arrependo e me culpo;
Passam por mim, transtornadas, coisas que não são nada,
E até dessas me arrependo, me culpo, e não durmo.
Não tenho força para ter energia para acender um cigarro.
Fito a parede fronteira do quarto como se fosse o universo.
Lá fora há o silêncio dessa coisa toda.
Um grande silêncio apavorante noutra ocasião qualquer,
Noutra ocasião qualquer em que eu pudesse sentir.
Estou escrevendo versos realmente simpáticos
Versos a dizer que não tenho nada que dizer,
Versos a teimar em dizer isso,
Versos, versos, versos, versos, versos...
Tantos versos...
E a verdade toda, e a vida toda fora deles e de mim!
Tenho sono, não durmo, sinto e não sei em que sentir.
Sou uma sensação sem pessoa correspondente,
Uma abstração de autoconsciência sem de quê,
Salvo o necessário para sentir consciência,
Salvo, sei lá salvo o quê...
Não durmo. Não durmo. Não durmo.
Que grande sono em toda a cabeça e em cima dos olhos e na alma!
Que grande sono em tudo exceto no poder dormir!
Ó madrugada, tardas tanto... Vem...
64

Vem, inutilmente,
Trazer-me outro dia igual a este, a ser seguido por outra noite igual a esta...
Vem trazer-me a alegria dessa esperança triste,
Porque sempre és alegre, e sempre trazes esperança,
Segundo a velha literatura das sensações.
Vem, traz a esperança, vem, traz a esperança.
O meu cansaço entra pelo colchão dentro.
Doem-me as costas de não estar deitado de lado.
Se estivesse deitado de lado doíam-me as costas de estar deitado de lado.
Vem, madrugada, chega!
Que horas são? Não sei.
Não tenho energia para estender uma mão para o relógio,
Não tenho energia para nada, para mais nada...
Só para estes versos, escritos no dia seguinte.
Sim, escritos no dia seguinte.
Todos os versos são sempre escritos no dia seguinte.
Noite absoluta, sossego absoluto, lá fora.
Paz em toda a Natureza.
A Humanidade repousa e esquece as suas amarguras.
Exatamente.
A Humanidade esquece as suas alegrias e amarguras.
Costuma dizer-se isto.
A Humanidade esquece, sim, a Humanidade esquece,
Mas mesmo acordada a Humanidade esquece.
Exatamente. Mas não durmo.
Fernando Pessoa (1888 - 1935)
Poesias de Álvaro de Campos. Fernando Pessoa. Lisboa: Ática, 1944 (imp. 1993).
Online disponível em: http://www.jornaldepoesia.jor.br/facam28.html.
65

2.0 DOCÊNCIA E SUAS MANISFESTAÇÕES PSÍQUICAS

Certa vez, um rapaz esquizofrênico, que já estava em


situação razoável [...] tinha dúvidas: “Eu vou me
curar?”. Eu lhe perguntei o que ele chamava de cura e
ele me respondeu que estar curado seria voltar ao
trabalho. Ele era escriturário. Eu lhe disse: “Nem
sonhando! Eu quero que você seja muito mais do que
um escriturário”. (Nise da Silveira)

O filme Mucize, lançado em 01 de janeiro de 2015, na Alemanha, com direção de


Mahsun Kırmızıgül, produção de Murat Tokat e roteiro de Mahsun Kırmızıgül, conta a história
de Mahir, um professor enviado por sua família para o interior da Turquia, nos anos 1960, para
ajudar os moradores de uma pequena vila a construir uma escola e fazer ressuscitar a esperança
do povoado. Além do poder de transformação da educação, o enredo inclui discussões acerca
da tradição, valores e cultura de um povo.
Com base nesse filme, iniciamos o presente capítulo em busca da compreensão da
constituição do professor, sua função e contribuição para sociedade, mesmo em tempos de
calamidade pública, e suas manifestações psíquicas. A citação dessa obra cinematográfica é
apropriada para introduzir os subtítulos a seguir, de como o professor pode ser protagonista na
vida de seus alunos, da importância de sua formação, da singularidade na condução de suas
emoções, e das inúmeras possibilidades a partir de uma atividade consciente, prazerosa e
motivada.
O filme nos permite relacionar a ação do professor com base em uma mediação de
conteúdos de qualidades ao importante papel da educação. Nesse sentido, citamos Piatti (2018)
que descreve a função da educação como transmissora e assimiladora da cultura produzida
historicamente.
As aquisições e as apropriações da criança não são inerentes, elas estão postas no
mundo. Tem-se acesso aos fenômenos do mundo pela mediação. A mediação é o processo de
intervenção de um elemento em uma relação. Tal relação não é direta, mas mediada por tudo
que foi concebido na cultura; o fator dessa mediação são os instrumentos e os signos (PIATTI,
2018, p. 112).
São os instrumentos e signos que permitem o professor mediar conteúdos que
possibilitarão o aprendizado que pode resultar na transformação do ser humano. Os
instrumentos são elementos utilizados pelo ser humano que gera a transformação na natureza,
está entre o ser humano e o objeto da sua atividade. Quanto aos signos, trata se de elementos
simbólicos, instrumentos psicológicos que foram sendo criados e transformados ao longo da
66

história, que podemos atribuir significados, cooperam com as atividades psicológicas do ser
humano, são esses elementos que permitem o ser humano a compartilhar e gerar os
conhecimentos.
Ser professor requer reconhecer, entre tantas outras, duas funções essenciais na
execução de sua atividade. A primeira é a responsabilidade de contribuir para a formação de
outro ser humano; a segunda é ser elemento participativo. É na realização da sua atividade que
o ser humano se percebe e percebe o mundo e atende às suas necessidades físicas e psíquicas.
E é pelo processo de trabalho, para o qual já não bastam as propriedades orgânicas
naturais ou primárias, que novos atributos se desenvolvem no homem, e
especialmente, um psiquismo complexo que comportará uma relação consciente com
a natureza. E como o próprio homem é parte insistentemente da natureza, uma
relação consciente para consigo próprio (MARTINS, 2014, p. 99).

Nesse caminho, os subtítulos a seguir apresentam a importância da formação


profissional e pessoal do professor, o desenvolvimento psíquico e as emoções como
propulsoras ou não do sofrimento/adoecimento psíquico, as adversidades frente à pandemia e
a maneira que professores e alunos se viram diante de um modelo de trabalho pouco utilizado,
o remoto.

2.1 O sujeito professor e sua constituição: trajetória profissional e pessoal


O campo da educação sempre foi objeto de pesquisas sobre diferentes temas, tais
como formação de professores, planos curriculares, políticas públicas educacionais e práticas
educativas. Mais recentemente, tem crescido o interesse pelo sujeito professor e o sofrimento
psíquico docente. Com o intuito de elucidar este último tópico, primeiramente discorremos
sobre a constituição do sujeito professor.
Fundamentados na Psicologia Histórico-cultural, assumimos a importância da
educação escolar para a formação e o desenvolvimento do psiquismo. A formação do sujeito
não diz respeito somente a tornar-se profissional, mas a constituir-se como pessoa (Eu), o que
favorece uma formação reflexiva com maior autonomia, independência, criatividade,
inspiração e mais crítica, considerando a subjetividade humana:
De acordo com a Psicologia Histórico-cultural, o ensino tem um papel central em
todo o sistema de organização da vida da criança, determinando seu desenvolvimento
psíquico, pois constitui uma via, um meio sistematizado e organizado de transmissão
da experiencia social, daí a importância de se ter um professor que, estando
humanizado, possa humanizar seu aluno (FACCI; LEONARDO; SILVA, 2010, p.
225).

A necessidade de formar seres humanos imbuídos principalmente dos seus interesses


e sentidos pessoais e sociais próprios, priorizando a sua subjetividade, incita-nos a resgatar as
concepções de Vigotski (2004) referentes à escola para o trabalho. O autor procurou esclarecer
67

quais os tipos de escola e o objetivo de cada uma no decorrer do desenvolvimento histórico e


dentro das possibilidades psicológicas. Essa organização permite entender a formação do ser
humano, e a partir do modelo experenciado a forma como realiza seu trabalho.
Vigotski (2004) analisou os tipos de educação para o trabalho e incrementou o
conhecimento sobre a importância da educação escolar na formação do ser humano e do
trabalhador. Dentre as concepções, o primeiro tipo é a escola profissionalizante ou escola de
ofício, cujo objetivo é preparar o aluno para um determinado trabalho. Não há diferenças entre
esse tipo e qualquer outro, pelo fato de que toda pedagogia tem, como finalidade, preparar para
a atividade futura. A segunda forma é entendida não como objeto de ensino, mas como novo
método. O exemplo dado pelo o autor é a forma como a criança é orientada a pregar o prego
na madeira, para que seja da melhor maneira possível, além de mais limpa. Apenas ensina-lhe
uma melhor maneira de assimilar. E a terceira e última possibilidade da escola não introduz o
trabalho como objeto de ensino, ou meio de aprendizagem, mas como matéria educativa. Esta
última concepção serve como base ao nosso sistema de educação e é a que necessita de uma
fundamentação psicológica, diferentemente das outras.
Assim, é essencial compreender o papel da educação e do professor no
desenvolvimento do ser humano, pois sua prática interfere diretamente no desenvolvimento
das funções psicológicas superiores, como apontam Facci, Leonardo e Silva (2010):
A prática docente implica em criar possibilidades de que o aluno se aproprie dos
instrumentos psicológicos necessários para desenvolver os processos psicológicos
superiores. Por meio da internalizarão dos instrumentos dados culturalmente, via
mediação educativa, o homem passa a ter acesso a produções culturais cada vez mais
amplas e diversificadas (FACCI; LEONARDO; SILVA, 2010, p. 225-226).

Martins (2015b) enfatiza que em pesquisas atuais, tem sido referenciado sobre a
importância da subjetividade do professor, considerando o papel de sua expressão tanto a sua
formação quanto a execução de sua atividade:
Afirmam-se novos pressupostos para a formação de professores autônomo e no
incentivo às estratégias de autoformação, nos quais grande ênfase é concedida ao
desenvolvimento pessoal. As características pessoais, as vivências, profissionais, as
histórias de vida, a construção da identidade etc. com maior frequência tornam-se
objetos da investigação educacional, que aponta a impropriedade de se estudar o
ensino sem se levar em conta a subjetividade do professor (MARTINS, 2015b, p. 7).

A estudiosa ressalta que não se deve romantizar a personificação do professor e se


deixar embarcar nas ideias mascaradas pela ideologia do capital, o que ocasiona um
esvaziamento do trabalho educacional. A personalidade do professor deve ser respeitada e
discutida em sua formação, mas é imprescindível o cuidado para fazer a mediação do conteúdo
aprendido historicamente e sistematizado, para que o professor e o aluno intervenham na
realidade.
68

Sob essa perspectiva, Vital e Urt (2018) ponderam sobre a constituição docente e as
relações existentes, pois, sua constituição está relacionada tanto com a ação educativa quanto
com as pessoas que fazem parte desse processo, e sua atividade pode ser caracterizada como
uma ação mediadora, entre o ser humano e o conhecimento. Pelo fato de esta constituição ser
pensada no contexto da educação integral, o sujeito só pode ser concebido como um sujeito
também integral (VITAL; URT, 2018, p. 1-2).
Assim, vemos que os estudos sobre o sujeito professor merecem atenção singular
quando se pensa na contribuição da atividade docente para o desenvolvimento humano durante
a educação escolar e consequentemente para toda a sociedade. Contudo, nem sempre o
professor foi visto como ser atuante, participativo e independente.
Nóvoa 8 (1989) narra que, por longos séculos, o ensino coube às congregações
religiosas, com destaque para os jesuítas. A responsabilidade do ensino inicial era exclusiva
de mestres laicos que, por meio de acordos com as famílias, contratos com os municípios, ou
lugares notáveis, exerciam a atividade docente como secundária ou acessória. A educação
subordinava-se à igreja:
A diversidade de situações e de práticas educativas, bem como a heterogeneidade
dos estatutos dos professores e dos mestres, encontram um único denominador
comum na subordinação e na obediência a Igreja: até ao século XVIII a educação é
sobretudo uma empresa religiosa. As ordens religiosas da atividade docente vão
acompanhar os professores ao longo de toda a sua história socioprofissional.
“Agentes da Igreja”, os professores transformar-se-ão durante o século XVIII em
“funcionários do Estado”, sem que grande parte das motivações originais da sua
profissão tenham sido substituídas por outros valores (NÓVOA, 1989, p. 436).

Com o passar dos anos e as reformas de governos, a profissão docente foi se


distanciando das influências religiosas e ocupando melhores espaços. Os professores
buscavam a segurança como profissionais. Passaram a receber subsídios para ocupar o cargo
por meio de documentos que foram se transformando, a passos lentos, mas com resultados
valiosos para os sujeitos:
Durante longos anos imputou-se a génese da profissão docente à ação dos sistemas
estatais de ensino; hoje em dia, sabemos que no início do século XVIII havia já uma
diversidade de grupos que encaravam o ensino como ocupação principal, exercendo-
a por vezes a tempo inteiro. A intervenção do Estado vai provocar uma
homogeneização, bem como uma unificação e uma hierarquização à escala nacional,
de todos estes grupos: é o enquadramento estatal que institui os professores como
corpo profissional, e não uma concepção corporativa do ofício. A partir do final do
século XVIII não é permitido ensinar sem uma licença ou autorização do Estado, a
qual é concedida na sequência de um exame que pode ser requerido pelos indivíduos
que preencham um certo número de condições (habilitações, idade, comportamento
moral, etc.). Este documento constitui um verdadeiro suporte legal ao exercício da
atividade docente, na medida em que contribui para a delimitação do campo
profissional do ensino e para a atribuição ao professorado do direito exclusivo de
intervenção nesta área. A criação desta licença (ou autorização) é um momento

8
António Manuel Seixas Sampaio da Nóvoa foi citado neste trabalho por contribuir com a historização da pessoa
do professor, devido aos seus inúmeros trabalhos sobre a constituição e formação docente.
69

decisivo do processo de profissionalização da atividade docente, uma vez que facilita


a definição de um perfil de competências técnicas, que servirá de base ao
recrutamento dos professores e ao delinear de uma carreira docente. Este documento
funciona, também, como uma espécie de "aval" do Estado aos grupos docentes, que
adquirem por esta via uma legitimação oficial da sua atividade. As dinâmicas de
afirmação profissional e de reconhecimento social dos professores apoiam-se
fortemente na consistência deste título, que ilustra o apoio do Estado ao
desenvolvimento da profissão docente (e vice-versa) (NÓVOA, 2003, p. 17).

Apesar de a história da profissão docente ser hipnotizadora, devido aos seus


acontecimentos e relevância, não nos prenderemos aos marcos históricos temporais, pois
acreditamos que esse tema é digno de uma maior discussão. Daremos, assim, continuidade à
compreensão da constituição do sujeito professor.
A partir da regularização do exercício da profissão, o professor se percebeu como
agente atuante, político e de grande relevância social, agente propulsor de transformação. A
educação passou a ser vista como proposta de erradicação da pobreza, violência, analfabetismo
e desigualdade social.
É inegável a singularidade da regularização da profissão, mas em que momento não
incluímos o sujeito professor como protagonista integral de sua constituição?! Essa indagação
pode ser refletida com Labaree (1992) apud Nóvoa (2009. p. 15): “[...] os discursos sobre a
profissionalização dos professores tendem a melhorar o estatuto e o prestígio dos especialistas
(formadores de professores, investigadores, etc.) mais do que a promover a condição e o
estatuto dos próprios professores”.
Moretttini e Urt (2005) assinalam que os professores são pessoas reais e trabalhadoras
que pertencem a um grupo social, vivenciam várias experiências, que trazem consigo uma
condição social e histórica e só serão compreendidos a partir das relações que constituem com
o mundo.
Nesse sentido, para apropriarem-se do conteúdo das atividades com as quais entram
em contato em suas relações sociais, eles passam por um processo de “formação”
que não pode ser entendido numa relação simples de sobreposição, de armazenagem
de conhecimentos, de acumulação de experiências, mas como um processo dialético
entre a apropriação/objetivação (MORETTINI; URT, 2005, p. 129).

Nóvoa (2009) aponta três medidas que, apesar de não esgotarem todas as questões,
podem, ao menos, responder algumas indagações e redirecionar o entendimento sobre o sujeito
professor:
• Primeira medida - É preciso passar a formação de professores para
dentro da profissão - O autor enfatiza a necessidade de os professores
ocuparem os lugares principais na formação dos seus colegas. Como
exemplo, cita a formação em medicina, em que médicos ensinam futuros
médicos.
70

• Segunda medida – É necessário promover novos modos de organização


da profissão - Apesar dos discursos sobre autonomia direcionados ao
professor, a realidade é contrária, pois tendem a ter suas ações controladas
e dependentes. É preciso um campo profissional autônomo, assim como
arquitetos, médicos, engenheiros, que se comunicam com outros
profissionais e estudantes e mantêm relações de integração.
• Terceira medida - Importante reforçar a dimensão pessoal e a
presença pública dos professores – O autor refere-se à liberdade de
escolha quanto às inúmeras formações, que deveriam ser opções, mas que
são colocadas como obrigação, e sobre a necessidade da visibilidade
pública do sujeito professor, de exercer a comunicação com o público.
Aguiar (2009) define o ‘ser professor’ e como o sujeito pode ser despercebido ou
incompreendido em sua profissionalidade, e ainda, como a expressão ‘ser professor’ pode
sugerir uma ambivalência que pode ser compreendida a partir do verbo “ser professor” ou do
substantivo “o ser professor”:
Pensamos que essa suposta ambivalência sugere ao mesmo tempo indissociabilidade
e interdependência – de como “o ser” se forma, constitui-se professor ao longo de
sua história, ou seja, em um determinado contexto temporal e espacial. Foi com essa
intenção que usamos essa expressão para poder realçar a complexidade da
profissionalidade docente, suas possibilidades, entraves, contradições e
potencialidades (AGUIAR, 2009, p. 2171).

A definição ambígua da autora remete-nos a Nóvoa, e a quanto a sociedade não


percebe as particularidades do sujeito professor, ou seja, não há uma percepção apurada para
a sua subjetividade. Também, indaga sobre a formação do ser-professor de um modo geral e
sua complexidade, pois, além de pensar quais foram as possibilidades ofertadas ou furtadas,
até mesmo as conquistadas, se incorporam realmente o modo de “ser” professor (AGUIAR,
2009).
Nóvoa (2009) também questiona as constantes formações e as poucas ou nenhuma
consideração das experiências pessoais e profissionais, pois, vários programas de formação
permanecem se apresentando serem inúteis. Ademais, ressalta a necessidade de recusar o
consumo excessivo de cursos, seminários e ações que caracterizam o atual “mercado da
formação” que alimenta um sentimento de “desatualização” dos professores.
A única saída possível é o investimento na construção de redes de trabalho coletivo
que sejam o suporte de práticas de formação baseadas na partilha e no diálogo profissional
(NÓVOA, 2009, p. 23).
71

É necessário, assim, preparar os professores para saberem lidar com a sociedade atual,
com as dessemelhantes situações do dia a dia que venham a surgir. Martins (2015b) garante
que o professor pode desempenhar a sua função com sucesso, desde que consiga dirigir as
diversas situações do cotidiano e que sua formação objetive a sua capacidade de acompanhar
as intensas e inúmeras mudanças da sociedade contemporânea:
Portanto, o êxito do profissional assenta-se em sua capacidade para manejar situações
concretas do cotidiano e resolver problemas práticos mediante a integração
“inteligente e criativa” do conhecimento e da técnica.
A capacidade de analisar situações significa, nessa perspectiva, possibilitar
permanentemente a elaboração de ações adequadas em relação aos contextos e às
próprias possibilidades existentes, o que, em última instância, representa preparar os
professores para as aceleradas mudanças sociais características do mundo atual
(MARTINS, 2015b, p. 11).

A retirada do sujeito professor do profissional não permite a execução da atividade


consciente, com o real sentido social do seu trabalho. É crucial formar seres humanos com
seriedade, criadores, que propiciem integração entre as técnicas e os seus conhecimentos. É
imperativo formar professores protagonistas, não mais coadjuvantes.
Seguindo a mesma lógica, Vital e Urt (2017) descrevem a constituição do professor
por meio de sua atividade, e de como o trabalho realizado por esse profissional é um elemento
importante no desenvolvimento de sua própria constituição, uma vez que o processo social do
trabalho e as condições históricas e o seu modo de vida, são modificados e vão sendo firmados
pela humanidade.
Dessa maneira, o professor vai se apropriando dos bens da cultura, participando do
trabalho, da produção e das diversas formas de atividade social, formando assim as
aptidões especificamente humanas, a constituição docente é, portanto, sempre um
processo educativo, mesmo quando essa educação realiza-se de maneira informal,
sem relação consciente (VITAL; URT, 2017, p. 153).

Nóvoa (2009) nos convida a delinear novos caminhos para a profissão professor.
Relata que, no início do século XXI, esse sujeito volta a adquirir uma ampla relevância pública.
De fato, o professor desempenha um papel de protagonismo ímpar na educação escolar, pois
concorre para o desenvolvimento e a emancipação humana, além da apropriação das
significações criadas historicamente, por meio da cultura:
A Educação Escolar, por meio da atividade, permite que se reproduzam as funções
sociais dos instrumentos e conhecimentos humanos com a finalidade de
transformação da realidade e de si mesmo. É preciso garantir que todos tenham
acesso a esses bens, pois caso contrário, são reduzidas as possibilidades de
desenvolvimento e de humanização (PESSOA; LEONARDO, 2020, p. 5).

Martins (2105b) enfatiza a notoriedade na mudança da formação inicial do professor


e lista alguns critérios importantes a serem seguidos, como não se basear apenas em critérios
intelectuais, mas também nos de personalidade, principalmente nas abordagens descritivas,
72

focadas na ação do professor, naquilo que ‘é’ e ‘faz’, relacionando a formação à atividade
prática e real.
Então, não há como separar o sujeito (Eu) do professor (profissional) – o sujeito tem
a sua forma única de ser, o seu todo. O sujeito é o que faz, faz o que é, torna-se o sujeito
professor.
Pessoa e Leonardo (2020) acentuam que a percepção da relação entre significado e
sentido da atividade humana é categórica para a educação, pois é a partir das ações sociais e
pessoais sobre a educação escolar que há ou não uma disposição para que os conhecimentos
sejam minuciosamente aplicados em sala de aula:
Dessa forma, se os significados sociais são partilhados e trabalhados na escola, o
modo como o professor vivencia seu papel e elabora suas ações de ensino incide
diretamente na maneira como os alunos podem ou não se apropriar dos
conhecimentos escolares. A atividade docente se constitui a partir desses significados
sociais sobre sua profissão e ainda sobre o sentido pessoal que atribui a seu papel,
direcionando como as ações de ensino serão desenvolvidas (PESSOA; LEONARDO,
2020, p. 3).

Zanelato, Couto e Urt (2021) salientam as implicações da atividade docente e a


relação com os alunos durante o seu trabalho, e o quanto essa ação pode contribuir com o seu
próprio desenvolvimento e também de seus alunos. Por esse motivo, a formação tem papel
peculiar e a partir de determinações sociais é decisiva na atividade do professor.
Trabalho esse que pode criar condições de apropriação de conhecimentos que
impulsionem o desenvolvimento psíquico dos estudantes adolescentes. Essa
dinâmica, por sua vez, possibilita em ambos o desenvolvimento de uma visão mais
ampla e crítica da realidade e de si próprios (ZANELATO; COUTO; URT, 2021, p.
3).

Segundo Pessoa e Leonardo (2020), é preciso organizar as formações tendo em mente


as significações individuais, apropriadas pelos sujeitos. Somente dessa maneira o sujeito (Eu)
poderá exercer sua atividade como professor (profissional), tendo o seu sentido próprio.
No processo de apropriação desses significados, são atribuídos sentidos pessoais
pelo sujeito, pois uma vez apropriados os significados sociais, é possível que o sujeito
imprima suas marcas nestas significações, formando para si sentidos pessoais a partir
de suas vivências. O sentido pessoal é aquilo que o sujeito tem como base para suas
relações com o mundo, com seus pares e consigo mesmo (PESSOA; LEONARDO,
2020, p. 4).

Do mesmo modo, Vital e Urt (2017) registram a compreensão do trabalho sob o viés
da Psicologia Histórico-cultural e os motivos pessoais em sua realização. E que, o significado
do trabalho do professor é formado pelo seu objetivo de ensinar, e tem consciência das
condições reais e objetivas do processo ensino-aprendizagem, e como meta deseja que o aluno
se aproprie do conhecimento. E quanto ao motivo subjetivo, salientam que é necessário
perceber o que o motiva exercer tal atividade, qual é o seu motivo pessoal.
73

Diante das constatações sobre a constituição do sujeito professor, não nos restam
dúvidas sobre a imprescindibilidade de uma formação que viabilize o seu pleno
aprimoramento. As apropriações do conhecimento e da cultura são permanentes, constantes.
O sujeito não deixa de aprender enquanto estiver vivo e for atuante: relaciona-se e subjetiva-
se.
Uma formação que consista em assegurar os conteúdos externos (conteúdos
formativos) e internos (pessoais, particulares) do ser humano impulsiona-o a dominar seu
conhecimento e tão logo a sua atividade, os seus objetivos. Esse mecanismo pode favorecer
um desempenho profissional menos desgastante em face das adversidades da carreira. Pode
ser um modo de prevenir o adoecimento.
Vigotski (2004) visualizou, na psicologia pedagógica, uma maneira de educar com o
propósito de promover o desenvolvimento e não somente de ensinar conteúdos de forma
superficial, nada reflexiva e sem caráter científico, como nas demais psicologias. Sobre essa
obra, a psicologia pedagógica, torna se importante ressaltar que a obra foi elaborada em um
período que houve um olhar peculiar, mais centrado no aluno, contudo, tomamos o cuidado de
aprecia-la e utiliza-la na elaboração dessa Tese por conter conteúdos relevantes quanto aos
vários aspectos que envolvem processo ensino-aprendizagem.
Vital e Urt (2017) asseguram que a Psicologia Histórico-Cultural percebe, no trabalho
do professor, uma mediação pedagógica que reúne, além de elementos referentes à função da
escola, o entendimento da relação entre aprendizagem e desenvolvimento, evidenciando que o
papel da aprendizagem é precedente ao desenvolvimento humano:
A concepção vigotskiana estabelece ao professor uma nova relação com os processos
de educação e de ensino e, consequentemente, um novo olhar sobre sua
responsabilidade e papel no desenvolvimento das qualidades humanas, visto que
educação e ensino transforma-se em possibilidades universais do desenvolvimento
humano (VITAL; URT, 2017, p. 155).

Facci, Leonardo e Silva (2010) destacam a importância de repensar a formação do


professor, e acreditam que, enquanto durar a prevalência das tendencias não-críticas como base
na formação do professor, será difícil ocorrer uma mudança no panorama observado nas
escolas. Além disso, lembram das condições objetivas importantes para melhorar a qualidade
do ensino, entre elas, condições de trabalho, maior investimento em educação, escolas mais
estruturadas, entre outras.
Não diferentemente, Soares e Martins (2017) comentam sobre a formação
empobrecida e suas consequências, pois uma formação superficial quanto ao valor da
transmissão dos conhecimentos científicos, filosóficos, artísticos mais desenvolvidos, além da
74

real particularidade do trabalho pedagógico, contribui para a ausência de sentido do mesmo, e


atinge tanto o professor quanto o aluno.
Como complemento à formação e à atuação do professor, destacamos o pensamento
de Moretti e Moura (2010, p. 347): “analisar o processo de formação docente a partir de uma
perspectiva histórico-cultural passa por compreender a atividade docente como trabalho em
sua dimensão ontológica”.
Desse modo, uma formação que considere as questões objetivas, subjetivas e com
profundo entendimento dos valores imprescindíveis para transmissão do conhecimento
cientifico, oportuna a formação de profissionais além de conscientes, críticos, e que formarão
também alunos auspiciosos, encorajados e conscientes do poder do conhecimento.
O professor reflexivo é visto como quem criticamente analisa e interpreta sua prática,
torna-se investigador de sua ação, não apenas absorvendo conhecimento, mas produzindo
novos conhecimentos (PIATTI, 2006).
Com essa proposta, explanamos, neste tópico, o formar para ser (Eu) e fazer
profissional (Professor), para uma formação docente crítica que substancie a realização da
atividade consciente e humanizada, respeitando suas particularidades. A proposta de
compreender o desenvolvimento das funções psicológicas superiores e a importância da
educação escolar como parte fundamental de toda formação do ser humano faculta-nos a
possibilidade de explorar as discussões sobre a constituição do sujeito professor e, ao mesmo
tempo, de analisar as possíveis causas de adoecimento desse profissional, a partir da PHC.

2.2 Sofrimento e adoecimento psíquico: quando as emoções são silenciadas

Às vezes nós não sabemos dar nome ao que sentimos.


Sendo assim, dói dobrado, pois o sentimento só pode
receber algum comando, controle, quando submetido
às regras de nossa inteligência. (Pe. Fábio de Melo)

A partir dessa reflexão, iniciamos o tópico sobre o desenvolvimento das funções


psicológicas superiores e o controle das emoções. O desenvolvimento do ser humano precisa
de condições que o propicie alcançar o mais elevado nível de consciência para se permitir
conhecer a si e ao outro, e esse processo deve ocorrer desde o seu nascimento e enquanto durar
sua vida.
Se desejamos estudar a psicologia do homem cultural adulto, devemos ter em mente
que ela se desenvolveu como resultado de uma evolução complexa que combinou
pelo menos três trajetórias: a da evolução biológica desde os animais até o ser
humano, a da evolução histórico-cultural, que resultou na transformação gradual do
homem primitivo no homem cultural moderno, e a do desenvolvimento individual de
uma personalidade específica (ontogênese), com o que um pequeno recém-nascido
75

atravessa inúmeros estágios, tornando-se um escolar e a seguir um homem adulto


cultural (VIGOTSKI; LURIA, 1996, p. 151).

Vigotski e Luria (1996) anunciam que as novas formas ‘adultas’ culturais do


comportamento substituem gradativamente as formas primitivas da infância. No tocante ao
processo de desenvolvimento:
No processo de desenvolvimento, a criança não só cresce, não só amadurece, mas,
ao mesmo tempo – e isso é a coisa mais fundamental que se pode observar em nossa
análise da evolução da mente infantil -, a criança adquire inúmeras novas habilidades,
inúmeras formas de comportamento. No processo de desenvolvimento, a criança não
só amadurece, mas também se torna reequipada. É exatamente esse “reequipamento”
que causa o maior desenvolvimento e mudança que observamos na criança à medida
que se transforma num adulto cultural. É isso que constitui a diferença mais
pronunciada entre o desenvolvimento dos seres humanos e o dos animais
(VIGOTSKI; LURIA, 1996, p. 177).

É imperativo comentar sobre o desenvolvimento da linguagem, fator que mereceu


grande atenção na teoria de Vigotski para a constituição do sujeito e o desenvolvimento das
funções psicológicas superiores. Assim, discorremos sobre o modo como o autor vincula a fala
à ação prática, elementos conectados para satisfazer as nossas necessidades e agir como
eficientes aliados na prevenção do adoecimento:
Descobrimos que o início do desenvolvimento do pensamento e da palavra, período
pré-histórico na existência do pensamento e da linguagem, não revela nenhuma
relação e dependência definidas entre as raízes genéticas do pensamento e da palavra.
Deste modo, verifica-se que essas relações, incógnitas para nós, não são uma
grandeza primordial e dada antecipadamente, premissa, fundamento ou ponto de
partida de todo um ulterior desenvolvimento, mas surgem e se constituem
unicamente no processo do desenvolvimento histórico da consciência humana,
sendo, elas próprias, um produto e não uma premissa da formação do homem
(VIGOSKI, 2001, p. 395).

Para Vigotski (2001), a linguagem do antropoide, em termos fonéticos, possui


semelhanças com a do homem, mas não inclui subsídios intelectuais. No estágio inicial do
desenvolvimento infantil, há um estágio pré-intelectual no processo de formação da linguagem
e um estágio pré-linguagem no desenvolvimento do pensamento. O autor complementa: “O
pensamento e a palavra não estão ligados entre si por um vínculo primário. Este surge,
modifica-se e amplia-se no processo do próprio desenvolvimento do pensamento e da palavra”
(VIGOTSKI, 2001, p. 396). Em se tratando das diferenças entre os antropoides e o homem,
Vigotski e Luria (1996) destacam a utilização dos instrumentos, o pensamento e a fala:
Exatamente a ausência de sequer os começos da fala no sentido mais amplo da
palavra – a falta de capacidade para produzir um signo, ou introduzir alguns meios
psicológicos auxiliares que por toda parte marcam o comportamento do homem e a
cultura do homem – é o que traça a linha divisória entre o macaco e o ser humano
mais primitivo (VIGOTSKI; LURIA, 1996, p. 86)

Assim, o pensamento e a linguagem são resultados do desenvolvimento humano na


sua forma mais elaborada, pois o significado da palavra constitui um traço indispensável à sua
76

existência. A partir da existência do significado da palavra, há o pensamento, portanto, há um


discurso intelectual, “[...] é um fenômeno do pensamento discursivo ou da palavra consciente,
é a unidade da palavra com o pensamento” (VIGOTSKI, 2001, p. 398). Os significados
desenvolvem-se e não mais se mantêm estáveis, como desenhado por outras teorias.
Segundo Vigotski (1991), a linguagem desempenha um papel específico na realização
da atividade prática e no alcance do objetivo. Exerce uma função psicológica complexa,
dirigida para a solução de problemas. Quanto mais complexa a ação, mais importante é a fala.
O desenvolvimento intelectual ocorre quando a fala e a atividade prática se encontram, se
voltam para mesma direção.
Ou seja, se percebemos a linguagem como caminho para elaborarmos os meios de
atender às nossas necessidades por meio de nossas práticas, é ela própria que nos possibilita
verbalizar e extravasar nossas emoções. Se utilizamos a linguagem para compreender a
realidade, por ela também conseguimos nos expressar. Quando não o fazemos, acumulamos
conteúdos e enclausuramos nossas emoções, o que pode resultar em sofrimento/adoecimento
psíquico.
A teoria das emoções ou sentimentos é um capítulo estudado por diversas correntes
teóricas. No entanto, sobre esse aspecto do comportamento humano pouco foi revelado, por
ser o mais difícil de descrever, classificar e relacionar. A velha psicologia exteriorizou
significativas concepções sobre a natureza das reações emocionais. Os primeiros a considerar
esses aspectos foram Lange e James, cada qual com seu ponto de vista. O primeiro enfatizou
as amplas mudanças corporais que acompanham os sentimentos; o segundo, por sua vez,
enfatizou as mudanças vasomotoras que os acompanham. Contudo, ambos chegaram à
conclusão de que as emoções transcorrem em ordem inteiramente diversa daquela que se
imaginava. Outros autores, como Descartes e Espinoza, estabeleceram teorias acerca das
paixões. Até mesmo naturalistas como Charles Darwin, ao estudar a origem das espécies,
escreveu sobre a expressão das emoções nos homens e nos animais (VIGOTSKI, 2004; LEITE,
SILVA; TULESKI, 2013).
A Psicologia Histórico-cultural, de forma contrária a esta visão dualista/mecanicista,
discute a emoção, assim como as demais funções superiores – embora o tema da
emoção não seja abordado de forma direta como as demais funções – como sendo
características humanas formadas a partir do desenvolvimento histórico e social. Esta
teoria não desconsidera a base fisiológica do comportamento humano, mas entende
que esta adquire novas estruturas com o desenvolvimento e a aprendizagem, os quais
são dependentes das relações sociais, isto é, do contexto histórico-social dos
indivíduos (LEITE; SILVA; TULESKI, 2013, p. 39).

Apesar de Vigotski pouco ter se aprofundado no tema das emoções, devido ao seu
estado de saúde, em A Teoria das emoções considera os fatores biológicos e culturais no
77

desenvolvimento emocional de forma dialética, ou seja, analisa o ser humano em sua


totalidade, diferentemente das demais teorias, que adotam um caráter a-histórico.
(MACHADO; FACCI; BARROCO, 2011; SILVA, 2011).
Para Silva (2012), Vigotski disserta que não existe emoção que, por natureza, seja
inferior ou superior, portanto, não há razão para dividir o campo extenso da emoção em duas
partes. A única diferença está na complexidade que toda emoção pode adquirir em função do
desenvolvimento histórico e social da psique. Como apontam Leite, Silva e Tuleski (2013):
Com base em tais pressupostos é possível afirmar que as emoções, assim como a
memória, a percepção, a atenção e demais funções superiores, possuem uma raiz
biológica que sofre alterações e define a passagem do desenvolvimento filogenético
para o ontogenético, ou seja, as reações puramente fisiológicas, decorrentes de
comportamentos inatos gerados por estímulos que são captados por órgãos dos
sentidos, sofrem alterações em um processo contínuo que leva a aquisição de
características diferenciadas de acordo com a ordem social e o momento histórico
vivenciado pelo indivíduo (LEITE; SILVA; TULESKI, 2013, p. 41).

De acordo com Vigotski (1896-1934/2004), a psicologia comum e o senso comum


distinguem três momentos no sentimento, sendo o primeiro a partir da percepção de algum
evento, objeto, o segundo trata do resultado da percepção do primeiro, pode ser alegria,
tristeza, medo, e assim por diante, e o terceiro, é por meio de comportamentos em função ao
primeiro momento, podendo ser, tremores, lágrimas, sudorese, entre outros.
O primeiro A – é a percepção de algum objeto ou acontecimento ou noção dele (o
encontro com um bandido, a lembrança da morte de uma pessoa querida, etc.); B –
um sentimento provocado por essa percepção (medo, tristeza); C- expressões
corporais desse sentimento (tremor, lágrimas). O pleno processo do fluxo da emoção
era concebido na seguinte ordem: ABC (VIGOTSKI, 1896-1934/2004, p. 128).

Assim, o desenvolvimento da palavra é constante, da mesma forma que o controle e


a educação das emoções. A maneira como desenvolvemos nossa fala e controlamos nossas
emoções interfere diretamente em nosso modo de ser, logo, nas nossas relações. Vigotski
(2001) especifica como a palavra e seus significados se transformam:
O significado da palavra é inconstante. Modifica-se no processo do desenvolvimento
da criança. Modifica-se também sob diferentes modos de funcionamento do
pensamento. É antes uma formação dinâmica que estática. O estabelecimento da
mutabilidade dos significados só se tornou possível quando foi definida corretamente
a natureza do próprio significado. Esta se revela antes de tudo na generalização, que
está contida como momento central, fundamental, em qualquer palavra, tendo em
vista que qualquer palavra já é uma generalização. Contudo, uma vez que o
significado da palavra pode modificar-se em sua natureza interior, modifica-se
também a relação do pensamento com a palavra (VIGOTSKI, 2001, p. 408)

Da mesma forma, o autor descreve como podemos educar as emoções. Parte da


primeira regra que deve consistir na organização da vida e do comportamento da criança - de
maneira que ela se descubra de maneira minuciosa com os estímulos entre quais deve haver
transferência de sentimento, e também aprender a organizar o meio - dessa forma, a educação
78

dos sentimentos sempre será uma reeducação dos próprios sentimentos, ou seja, será uma
modificação no sentido da reação emocional inata (VIGOTSKI, 2004).
Gottman e De Claire (1997) sublinham que cuidar das emoções é um aspecto
fundamental para o desenvolvimento, pois, de acordo com a ciência, as emoções tem papel
importante em nossas vidas. Além disso, os estudiosos constataram que a percepção emocional
e a capacidade em lidar com os sentimentos, mais até que o QI, estabelecem e influenciam os
resultados, como o sucesso e a felicidade de uma pessoa em todos os setores da vida, inclusive
nas relações familiares (GOTTMAN; DE CLAIRE, 1997, p. 20).
Vigotski foi além, pois percebeu na arte, a capacidade de sistematizar um campo
particular do psiquismo humano, mas especificamente o campo do sentimento. Por meio da
arte, o ser humano é capaz de refletir diversas formas de cultura que vão se estabelecendo nas
relações históricas e sociais por ele vivenciadas. Nessa relação dialética, ao mesmo tempo
transmite as culturas de uma determinada época, como também é criada por ele. O contato e o
conhecimento das artes é um dos fatores essenciais na constituição da emoção como função
superior (SILVA, 2011; LEITE; SILVA; TULESKI, 2013).
Para Vigotski, as emoções são funções psicológicas superiores, portanto, culturalizadas
e passíveis de desenvolvimento, transformação ou novas aparições. Além disso, a concepção
vigotskiana de emoção coloca esse processo psicológico em estreita relação com outros do
psiquismo humano (MACHADO; FACCI; BARROCO, 2011; SILVA, 2011).
A fala e o pensamento favorecem ao ser humano o enriquecimento das suas relações,
das suas aspirações, além da sua humanização. A restrição ou a privação dessas experiências
essenciais para o desenvolvimento o desumanizam, levam-no a desintegrar o seu psiquismo.
Portanto, quando o ser humano se abstém de se expressar, de ansiar por seus objetivos, deixa
de se relacionar, de se transformar, sofre e adoece.
É a linguagem que proporciona o desenvolvimento de instrumentos internos, ou seja,
instrumentos de qualidades equivalentes aos instrumentos externos. Propicia que o indivíduo
atue na realidade circundante e organize a atividade psíquica (VIGOTSKI, 2018; SANTOS;
LEÃO, 2014).
A fala nem sempre está ligada ao pensamento. Por vezes, pode ser uma reação
emocional demonstrada por meio de gritos, movimentos, expressões e fortes emoções, cujo
objetivo é aliviar a tensão. Essas reações em nada ajudam as pessoas na solução de funções
complexas. Esse processo também ocorre quando o sujeito não possui suas funções
psicológicas superiores desenvolvidas com propriedade, o que pode desencadear
79

comportamentos inadequados, que venham a comprometer a sua interação social (VIGOTSKI;


LURIA, 1996; MARTINS, 2015a).
A Psicologia Histórico-Cultural pondera sobre as interações sociais, a utilização de
instrumentos e as oportunidades como maneiras de contribuir para a constituição do sujeito.
Porém, questionamo-nos: em que momento o sujeito se priva de verbalizar ou de expressar
suas emoções e as guarda para si, resultando no seu adoecimento psíquico? E se a linguagem
é o aspecto fundamental do desenvolvimento humano e as transformações colaboram para o
controle das emoções, como entender a dificuldade do sujeito em falar sobre o que o
aflige/provoca amargura? O que o impede de se expressar? Esses questionamentos fazem parte
da nossa compreensão sobre a importância da linguagem e o pensamento para o
desenvolvimento do sujeito e as diferentes formas de se relacionar.
Diferentes são as abordagens teóricas que estudam a dificuldade de expressar as
emoções e as inúmeras consequências que o acúmulo de sofrimento pode acarretar ao sujeito.
Alguns estudiosos definem o fenômeno que caracteriza a dificuldade em expressar os
sentimentos como Alexitimia.
Alexithymia é uma palavra com raízes gregas: a partícula a tem um sentido de
negação, de ‘falta ou ausência’; lex, significa ‘palavra’; e thymos é ‘emoção ou sentimento’.
Literalmente, alexitimia pode ser traduzida como ‘sem palavras para sentimento’ (FREIRE,
2010). Esses comportamentos foram descritos na literatura especializada já há algum tempo.
Outros estudiosos enunciaram distintas formas de caracterizar a ausência ou a dificuldade de
expressar os sentimentos, as emoções. Os estudos foram sendo ampliados para se adequarem
às observações que apontavam não se tratar de uma característica exclusiva de pacientes
psicossomáticos, mas também com outras patologias, como transtornos psíquicos, quadros de
depressão e até mesmo dependência de álcool e drogas, em que aparece como uma
predisposição. Mas todos são unânimes em ressaltar que coube a Sifneos (1972, 1973) a
criação da palavra e do conceito de alexitimia (FREIRE, 2010; CARNEIRO; YOSHIDA,
2009; YOSHIDA, 2007).
Embora no Brasil o termo Alexitimia ainda seja pouco conhecido e estudado, diversos
países buscam a compreensão e a criação de instrumentos para entender e explicar a origem
do fenômeno. Várias são as propostas para a classificação. Há os que defendem a causa de
origem fisiológica, outros neurológica. Alguns identificam patologias de ordem psiquiátricas;
outros entendem ser resultados de experiências traumáticas com o meio (FREIRE, 2010;
YOSHIDA, 2007).
80

Freire (2010) distingue as características da linguagem no fenômeno da alexitimia, e


o apresenta como um constructo que circunda três componentes. Primeiro é a dificuldade de
utilizar a linguagem apropriada para expressar e descrever sentimentos e distingui-los de
sensações corporais; segundo, há uma capacidade de fantasiar e imaginar empobrecida, e o
terceiro e o ultimo, um estilo cognitivo prático, com base no concreto e direcionado, conhecido
como pensamento operacional.
A partir da exposição de Freire (2010), remetemo-nos às funções psicológicas
superiores e às relações de Vigotski: se desenvolvidas de forma insatisfatória, o sujeito pode
ter dificuldade de expressar as suas emoções:
Devemos considerar as emoções como um sistema de reações prévias, que comunicam
ao organismo o futuro imediato do seu comportamento e organizam as formas desse
comportamento. Daí abre-se ao pedagogo nas emoções um meio sumamente rico de
educação dessas ou daquelas reações. Nenhuma forma de comportamento é tão forte
quanto aquela ligada a uma emoção (VIGOTSKI, 2004, p. 143).

Leão (2020) exemplifica a relação da emoção para e na realização da atividade por


ser motivada por aspectos materiais, sociais e emocionais. Trata se dá objetivação do motivo
que leva o ser humano a realizar sua atividade. Os motivos emocionais podem ser considerados
os estimuladores, mas não são os determinantes da atividade, embora sejam os
regulamentadores da dinâmica da personalidade, podem continuar velados para o próprio ser
humano, tanto na consciência, quanto na sua afetividade imediata.
Isto se dá porque os aspectos sensoriais dos objetos motivadores são percebidos, e
nesta representação apreende-se qual é o conjunto de características do objeto que
impulsiona a atividade ou a impede, mas não se alcança a representação consciente
do objeto que motiva a mesma atividade. Este permanece diluído nas sensações
primárias – odor, sabor, forma, sensação tátil etc. – e são refletidas como vivências
da vontade ou tendência para um fim, mas sem serem elaboradas pelo pensamento
racional (LEÃO, 2020, p. 385-386).

E assim, compreendemos que, mesmo diante dos motivos que estimulam a atividade,
as emoções podem ser instigadoras, mas não responsáveis pela execução da atividade, pois
podem estar ocultas, seja de forma consciente, quando reprimidas, ou mesmo inconscientes
por estarem envolvidas nas sensações elementares.
Por esse caminho, fulcrados na Psicologia Histórico-cultural, advogamos o papel do
pensamento e da linguagem como relevantes aliados da consciência humana, na condição no
controle das emoções para a prevenção do sofrimento/adoecimento docente.

2.3 Quando o docente se cala, o corpo e a mente adoecem

O que é o homem? Para Hegel é o sujeito lógico. Para


Pavlov é a soma, organismo. Para nós é a
personalidade social = o conjunto de relações sociais,
81

encarnado no indivíduo (funções psicológicas,


construídas pela estrutura social) (VGOTSKI, 1929,
p. 33).

Para a Psicologia Histórico-Cultural, com base no materialismo histórico-dialético, o


sofrimento/adoecimento psíquico é tomado como constituído histórica e socialmente, uma vez
que, contrário às teorias naturalistas e biologistas sobre a emoção, considera que o caráter
histórico e as relações sociais são fatores fundamentais na constituição das emoções, além dos
outros comportamentos que se formam na relação do ser humano com a cultura em que está
inserido (LEITE; SILVA; TULESKI, 2013).
Leão et al. (2006) defendem que o ser humano se constitui humano por suas
atividades. No trabalho social se encontra a maior exigência para a construção de instrumentos
práticos e psicológicos que lhe autorizam operar no meio em que vive e adaptá-los conforme
as suas necessidades e os seus motivos.
Antepondo-se à lógica pós-moderna, acentua-se assim o fato de que, apesar de
indispensável ao processo, apenas a prefiguração não realiza o trabalho, é preciso
objetivá-lo, o que significa inserir o trabalho na materialidade. Somente a ação
material do sujeito sobre a matéria natural, transformando-a, é a que realiza o
trabalho, implicando sempre um movimento indissociável em dois planos: no plano
subjetivo – pois a prefiguração ocorre no plano do sujeito – e no plano objetivo – que
resulta na transformação material da natureza (SOARES, 2017, p. 166-167).

Vital e Urt (2019) estabelecem a relação entre a atividade do ser humano e a sua
constituição, por ser o ser humano um resultado da sua vida em sociedade e da apropriação da
cultura que advém de um processo histórico-cultural, resultado do conhecimento, valores e de
comportamentos que são produzidos pelo seu grupo que o leva a humanizar-se.
Nesse contexto, Zanelato e Urt (2021) evidenciam o desenvolvimento psíquico do ser
humano por meio das transformações, também como resultado da sua atividade que modifica
a natureza gerando as mudanças em seu desenvolvimento psíquico. Trata-se de um processo
dinâmico, em que a consciência, a partir de determinantes da realidade concreta, se desenvolve
e reestrutura seus sistemas complexos, ampliando as condições do sujeito de compreensão da
realidade e de si próprio (ZANELA; URT, 2021, p. 2).
Para Soares e Martins (2017) a junção entre saúde e educação e de como as relações
sociais podem contribuir para o adoecimento está relacionada com o trabalho. Isso se deve
também porque podemos considera-lo o precursor da humanidade, e assim, deve ser a
categoria principal na análise do eixo saúde-doença:
Isto porque quando pretendemos compreender a saúde de um modo geral, a educação
como um meio possível de promoção de saúde e analisamos o atual quadro de
sofrimento de professores e alunos dentro do contexto da educação escolar, estamos,
via de regra, diante de produtos das relações sociais que, como sabemos, refletem as
relações sociais de produção de um dado tempo histórico (SOARES; MARTINS,
2017, p. 53).
82

Quando a prática docente ocorre sem o sentido pessoal, não tem significação social,
por isso vai se transformando em uma prática alienada. Corresponde a uma ação sem
consciência, independentemente do contexto histórico social (SANTOS; URT; VITAL, 2017;
MARTINS, 2004). A partir do momento em que as necessidades não são as do sujeito, sua
atividade se dá sem autonomia, restando, apenas, a busca pela sobrevivência.
Marino Filho (2020) descreve que a partir do momento que o ser humano se orienta
de maneira coesa com o meio e com os objetos que satisfazem suas necessidades, movimenta-
se por meio de sentidos com valor afetivo, emocional e cognitivo positivos para sua existência.
Entretanto, se por algum motivo, razão, o ser humano não tem os meios, não entende as suas
necessidades, não as satisfaz de maneira lógica, dá-se início, portanto, a um processo de
frustrações na execução de suas atividades e do controle de todo o conjunto.

O contínuo esforço sem sucesso para a solução das dificuldades para a execução da
atividade leva ao sofrimento e, por consequência, pode levar ao adoecimento. Esse
processo existe em todos os seres humanos, independentemente da idade ou
atividade/ocupação. O sofrimento e o adoecimento podem ser encontrados em
crianças, jovens, adultos ou idosos. O sofrimento e o adoecimento psicológico
resultam das condições de produção da vida em sociedade e não podem, por isso, ser
atribuídos, exclusivamente, a condições biológicas a priori (MARINO-FILHO, 2020,
p. 77).

Quando as relações sociais existem por meio da mediação entre a atividade e seus
objetivos, com sentido pessoal e social, as particularidades da consciência, junto aos fatores
intrínsecos e extrínsecos do sujeito, contribuem para a constituição da sua personalidade.
Contudo, quando há a perda do sentido e do significado no desempenho da atividade, surge a
alienação. (MARTINS, 2004; FACCI, 2019):
O desenvolvimento da personalidade, na perspectiva da Psicologia Histórico-
cultural, abarca o natural, o histórico no ser humano, e é um conceito social. A
personalidade não é inata, ela surge como resultado do desenvolvimento cultural, e
o sofrimento do professor provoca alterações na estruturação da sua personalidade e
na forma como realiza o seu trabalho, decorrente das relações estabelecidas na
sociedade (FACCI, 2019, p. 134).

Dagher (2019) ressalta a importância de considerar o sujeito e a forma como realiza


seu trabalho e todas as demais relações da sociedade em que se insere, e de como o sofrimento
psíquico deve ser analisado considerando o contexto em que vive e o sentido dado a sua vida,
nas relações e trabalho, e também, de como interpreta os significados sociais da cultura.
Compreendemos que nenhum sintoma deve ser visto isoladamente, mas em um contexto
maior, ou seja, a partir da relação sujeito-sociedade (DAGHER, 2019, p. 95-96). Marino-Filho
(2020) considera que o sofrimento e o adoecimento não são exclusividades do sujeito professor
ou de qualquer outro ser humano. Ocorrem com todo ser humano singular, inserido em uma
sociedade, de toda outra classe trabalhadora.
83

Essas mesmas condições podem ser encontradas em diferentes atividades laborais,


porque fazem parte da lógica de organização da atividade produtiva nesta sociedade. As
condições de trabalho tanto interferem no desenvolvimento da personalidade quanto podem
potencializar e criar processos de adoecimento (MARINO-FILHO, 2020, p. 77).
No mesmo caminho, Vital, Freire e Urt (2020) analisam as condições e as relações do
sujeito na sociedade, pois podem contribuir para o sofrimento/adoecimento psíquico, e ainda,
não pode ser designado apenas as condições biológicas do sujeito-professor.
O adoecimento não é exclusividade docente, é humano, e pode ser causado por
situações particulares de uma classe trabalhadora (o professorado) e das
configurações e formas de existência desta atividade social. Por causa da lógica de
organização da atividade produtiva nesta sociedade, as condições adoecedoras
podem ser encontradas em diversas atividades de trabalho (VITAL; FREIRE; URT,
2020, p. 1167-1168).

A forma como a sociedade organiza o seu sistema econômico direciona a maneira


como trata os seus trabalhadores, pois dessa relação depende a produção. Neta, Cardoso e
Nunes (2020) apontam que o capitalismo, sistema econômico predominante em nossa
sociedade, sofreu transformações durante as últimas décadas que impactaram expressivamente
o mundo do trabalho. Além disso, os autores pontuam que o sistema econômico em questão
também vivenciou inúmeras crises, nas tentativas de organização nos padrões de
funcionamento, gerando vários percalços, entre eles, o adoecimento do trabalhador.
[...] a realidade política, econômica e social na qual os docentes estão submetidos,
desencadeia processos de mal-estar/adoecimento docente e, consequentemente,
resultam no afastamento de suas funções, desdobramento da lógica expansionista do
capital (NETA; CARDOSO; NUNES, 2020, p. 137).

A noção de adoecimento mental, segundo Oliveira e Santos (2021), implica um estado


de luta do sujeito contra as forças que o estão empurrando em direção ao sofrimento mental. E
esse sofrimento é formado pelo sofrimento organizado por meio dos sintomas de insatisfação,
estresse e ansiedade (OLIVEIRA; SANTOS, 2021).
O processo do adoecimento mental não representa a mesma coisa para todos os
indivíduos. Isto dependerá da forma como cada sujeito vive ou frequenta os
ambientes, sejam ocupacionais ou não. Entende-se por adoecimento mental quando
o indivíduo não consegue manter equilíbrio emocional e estabilidade entre as
atividades que costumava realizar.
A origem do adoecimento mental pode estar no encontro entre a trajetória individual
e uma dada forma de organização do trabalho. A vida pessoal e o trabalho quando
são impedidos ou que estão em processo de similaridade, possivelmente contribuem
para o desencadeamento de doenças mentais (OLIVEIRA; SANTOS, 2021, p. 3-4).

Dias (2021) ressalta que o psiquismo humano está em contínuo processo de


desenvolvimento, se direcionando aos processos psíquicos superiores. Deste modo, ao ocorrer
algo nos processos superiores, os processos biológicos são afetados, causando o adoecimento.
É possível supor que os processos psíquicos superiores são afetados, quando do
enfrentamento das exigências contraditórias da atividade docente, tipicamente
humana, e que também sejam requeridos para a construção de respostas saudáveis,
84

de superação das contradições. Uma vez que a linguagem humana, compreende


várias formas de expressão – a doença parece estar ‘falando’, sendo a voz do docente,
e teremos que ‘escutá-la’ para compreendê-la (DIAS, 2021, p. 66).

No tocante ao trabalho docente, o processo de alienação está presente em sua


atividade. O professor, cuja função social é ensinar, a partir do momento em que não mais
realiza essa função, não encontra o motivo que impulsiona a sua atividade (FACCI, 2019).
Facci, Leonardo e Alves (2020a), baseadas em Tumolo e Fontana (2008), avaliam que
o professor vive no proletariado, em condições de trabalho inadequadas, com salários baixos,
desqualificação e desvalorização da profissão e falta de autonomia no desempenho de sua
função. Já Lapo e Bueno (2003) discorrem sobre como o mal-estar docente acarreta em uma
série de complicações que não dizem respeito somente ao professor, mas também aos alunos
e a toda a sociedade.
O adoecimento dos professores, portanto, é resultado de um processo complexo que,
embora pertencente ao âmbito do subjetivo, está altamente relacionado às especificidades
dessa atividade laboral e ao contexto social e organizacional onde esse trabalho é realizado.
Assim, tanto a saúde quanto o adoecimento dos professores podem ser considerados
estados resultantes de múltiplas variáveis, interdependentes e inter-relacionadas,
relacionadas às condições sociais (de vida e de trabalho) e institucionais, onde o
trabalho é realizado, e, também, às características pessoais/individuais de cada
professor (REBOLO et al., 2020, p. 215).

O professor percebe a quantidade de mudanças ligadas à sua função e o quanto vêm


transformando a sua profissão. Não nos resta dúvidas de como a organização e as exigências
da sociedade tem interferindo desde a graduação até as outras diferentes possibilidades de
formação, além do mais, as interferências quanto a forma de desenvolver o seu trabalho.
Atualmente, com a crescente complexidade das tarefas exigidas ao professor, a
quantidade de recursos que se exigem dele se tornou tão infinitamente diversa e se
complicou tanto que, se um professor desejar ser um pedagogo cientificamente
formado, vai ter de aprender muito. Antes se desejava apenas que conhecesse sua
matéria e o programa e que soubesse dar alguns gritos na sala de aula ante um caso
difícil. Hoje a pedagogia se transformou em uma arte verdadeira e complexa, com
uma base científica. Portanto, exige-se do professor um elevado conhecimento da
matéria e da técnica de seu trabalho. Além disso, o próprio método de ensino exige
do professor a mesma atividade e o mesmo coletivismo [espírito de grupo] que deve
impregnar a alma da escola (VIGOTSKI, 2003, p. 300).

Cantarelli, Facci e Campos (2017) explicitam que o adoecimento é um reflexo, na


subjetividade do sujeito, da forma como a atual organização da base material incide sobre a
ideação e sobre as condições de sua objetivação.
As determinações e condições de trabalho arranjadas pela sociedade em relação ao
trabalho do professor levam-no a descaracterizar sua principal função de educador e de sujeito.
O acossamento vivido em seu cotidiano faz com que o docente se cale, provocando o seu
adoecimento.
85

As patologias que acometem os professores estão principalmente vinculadas às


condições de trabalho e às relações interpessoais estabelecidas no ambiente escolar que,
geralmente, são consideradas muito insatisfatórias pela maioria dos professores (REBOLO et
al., 2020).
Cantarelli, Facci e Campos (2017) relatam que, entre os professores permeia uma
desconfiança quanto ao grau de sofrimento e adoecimento que afastam o professor de sua
atividade fim: o ensino, o processo de transmissão e apropriação dos conhecimentos
científicos.
Esse afastamento limita a transformação do conhecimento, da natureza e do próprio
ser humano. Se pela educação temos a possibilidade de modificar o mundo que nos cerca, o
adoecimento e a perda da motivação pelo trabalho do professor redundam em prejuízos
incalculáveis.
Os homens, para poderem existir, devem transformar a natureza, sem a qual a sua
existência e a reprodução da sociedade seria impossível. Portanto, na medida em que
a ação sobre a natureza é sua condição de existência – tanto física quanto psíquica –
ressalta fundamental nesse processo a categoria trabalho e, nela, os elementos da
ideia inicial e da ação orientada pela ideia (CANTARELLI; FACCI; CAMPOS,
2017, p. 21).

A dialética do trabalho se revela no processo por meio do qual o ser humano, ao


mesmo tempo em que transforma a natureza, transforma as suas funções psicológicas
(CANTARELLI; FACCI; CAMPOS, 2017, p. 22).
Dessa maneira, o trabalho docente encerra a magnitude do desenvolvimento humano,
a possibilidade de modificar tudo em volta do ser. Indo além, se Vigotski percebeu que a arte
pode propiciar o mais alto grau de evolução da espécie, do desenvolvimento do psiquismo, a
arte de educar é um espetáculo da natureza humana para a compreensão da história e da
evolução humana.
É na escola, nas trocas entre alunos e professores, que o sujeito se humaniza e se
transforma qualitativamente. É esse processo que difere a relação entre professor e aluno das
demais relações. Não se trata de uma mera convivência, mas de uma conexão extraordinária e
necessária para o desenvolvimento do ser humano.
O professor deve viver na coletividade escolar como parte inseparável. Os
relacionamentos entre professor e aluno podem alcançar vigor, limpeza e elevação
incomparáveis (VIGOTSKI, 2003).
Diante do exposto, o que pensar quando essa relação é interrompida e prejudicada?
Quando algo desconhecido surge, em meio do nada, gerando prejuízos e perdas imensuráveis?
Quando a organização do trabalho se torna ainda mais fatigante? Esses questionamentos
direcionaram essas reflexões devido à pandemia, quando em março de 2020, a pandemia
86

causada pela SARS-CoV-2 – COVID-19 chegou ao Brasil e desestabilizou o mundo e todas


as formas de relação, organizações de trabalho, originando dor, sofrimentos, perdas e
incertezas.

2.4 Docência e o trabalho remoto: percepções e consequências da pandemia na educação

A música O dia em que a Terra parou, uma composição de Raul Seixas e Claudio
Roberto Andrade de Azeredo, lançada em 1977, tornou-se tão contemporânea quanto qualquer
outra melodia do século XXI. Foi o dia em que todas as pessoas do planeta inteiro resolveram
que ninguém ia sair de casa, como que fosse combinado. Naquele dia ninguém saiu de casa,
ninguém (SEIXAS, 1977). O compositor e cantor não imaginava que, após 43 anos, sua arte
seria o retrato exato de um fenômeno desconhecido e temido pelo mundo – a pandemia da
COVID-19.
Em 30 de janeiro de 2020, a OMS – Organização Mundial de Saúde declarou que o
surto do novo coronavírus constituiu uma Emergência de Saúde Pública de Importância
Internacional (ESPII) – o mais alto nível de alerta da Organização, conforme previsto no
Regulamento Sanitário Internacional. Essa decisão objetivou aperfeiçoar a coordenação, a
cooperação e a solidariedade global para cessar a proliferação do vírus. O termo ‘pandemia’
se refere à distribuição geográfica de uma doença, e não à sua gravidade. (OMS, 2020).
A COVID-19 é uma doença infecciosa causada pelo novo coronavírus (SARS-CoV-
2) e tem, como principais sintomas, febre, cansaço e tosse seca. Alguns pacientes podem
apresentar dores, congestão nasal, dor de cabeça, conjuntivite, dor de garganta, diarreia, perda
de paladar e/ou olfato, erupção cutânea ou descoloração dos dedos das mãos ou dos pés. Esses
sintomas geralmente são leves e começam gradualmente (OMS, 2020). A situação atípica
instaurada pela doença infecciosa causada pela SARS-CoV-2, causou medo, dor e desespero
para sociedade, inclusive aos profissionais de educação.
Além de o número de óbitos no Brasil decorrentes da COVID-19 ter atingido o
número de 700.556 mil9, a sociedade perpassou o agravamento de outras crises que já estavam
em curso, a exemplo das crises econômicas e sociais. Essas características evidenciam a
complexidade do sistema capitalista e sua forma de explorar a força de trabalho e a geração de
mais valia para sustentar o ritmo da acumulação de capital, expondo fraturas produzidas por
esse sistema que já existiam antes, como no caso das desigualdades educacionais, e colaboram
para a efetivação de um cenário mais perverso para os professores e para todos os outros

9
Dados do site: https://covid.saude.gov.br/. Painel Coronavírus Atualizado em: 04/04/2023 16:26
87

trabalhadores (MARQUES; ASSIS; GOMIDE, 2020; NETO; PIRES, 2020; ZANDAVALLI;


SILVA, 2020; SOUZA, et al., 2021).
Nesse território de veias abertas, a educação pública brasileira instituída nunca foi
investida para possibilitar que a população saqueada enxergasse a ladroagem e as
extorsões contra as suas vidas e as vidas dos seus, muito pelo contrário, ela traz,
historicamente, a incumbência de controlar os corpos rebeldes em potencial,
explorados e oprimidos preferenciais. Todos pobres dos direitos violados: todo corpo
escolar, sobretudo professoras, estudantes e suas famílias (CARVALHAL;
OLIVEIRA; RIBEIRO, 2020, p. 26).

Conforme o fragmento citado acima, Marques, Assis e Gomide (2020) desvelam o


quanto a sociedade foi atingida pelo irracionalismo, neopragmatismo, fundamentalismo e
negacionismo. Os autores ainda destacam que a educação é um direito de deveria ser garantido:
Na conjuntura atravessada por uma pandemia viral, que tem retroalimentado o
darwinismo social do “faz parte do processo, sempre tem uns que caem e outros que
resistem”, destacamos algumas das tantas desgraças que a pandemia tem exposto,
daquilo que já é política de morte faz tempo, mas, ainda, bastante invisibilizado na
educação pública remotamente emancipatória.
Entendemos a educação como direito que precisa garantir acesso e a apropriação dos
conhecimentos produzidos pela humanidade, ao longo da nossa história. Educação
como política de vida e convivência interseccionalmente coletiva (CARVALHAL;
OLIVEIRA; RIBEIRO, 2020, p. 22- 23).

Castro (2020) aponta que não é imprudente afirmar que a mudança radical do ensino
presencial para o ensino remoto, ou outra modalidade, como EaD, tem gerado consequências
catastróficas para educação brasileira, e mais, que existia uma crise estrutural disfarçada muito
antes da pandemia, e com toda sinceridade, há pelo menos 500 anos.
Marques, Assis e Gomide (2020) percebem o ensino remoto como uma forma de
impulsionar a desigualdade social, pois diferente das instituições privadas que podem manter
o ensino devido todas as condições disponíveis, as instituições públicas, para a classe
desprovida de recursos tecnológicos, internet, não há possibilidade de ter acesso mínimo de
qualidade para participar efetivamente das atividades online:
Grande parte da população brasileira não possui os instrumentos tecnológicos
mínimos e acesso à Internet com a qualidade necessária para participar efetivamente
das dinâmicas pedagógicas não presenciais. Além disso, boa parte das instituições de
ensino denominadas “públicas”, financiadas pelo Estado, não possuem recursos
financeiros, tecnológicos e humanos para migrar o ensino para o ambiente digital.
Assim, ampliam-se antigas desigualdades socioeducativas, num evidente
favorecimento das classes mais abastadas da sociedade brasileira (MARQUES;
ASSIS; GOMIDE, 2020, p. 8).

No contexto da pandemia, o ensino remoto escancarou as desigualdades sociais, a


sobrecarga do trabalho docente e a busca incessante da classe dominante em restringir o acesso
à educação. Nas palavras de Neto e Pires (2020) o ensino remoto não é ensino, e na tentativa
forçosa de tentar fazer parecer ser, na prática acarretou ainda mais a sobrecarga do trabalho
docente por terem que adequar suas práticas para que essa maneira se tornasse o mais próximo
88

possível do modelo real de ensino, e assim passaram a trabalhar mais de 16 horas diárias e
muitas vezes tiveram seus salários reduzidos.
Professores exaustos, tentando manter crianças na frente da tela do computador ou
da Tv e, ao mesmo tempo, tiveram que dar conta da aula de seus filhos, além de,
numa sociedade capitalista patriarcal, cuidar dos afazeres domésticos, sendo esses,
quase sempre, tarefa feminina. A roda do capital não pode parar de produzir
mercadoria e a rede particular de ensino demorou a seguir seu suposto funcionamento
normal, exigindo mais dos professores, repetindo a tendência desse “século de
incertezas” em que as empresas pensam o assédio ao trabalhador como estratégia de
gestão (NETO; PIRES, 2020, p. 43-44).

Ainda sobre as lacunas no ensino, Neto e Pires (2020) afirmam que a educação tem
experienciado esse processo, antes mesmo da pandemia, por fazer parte dessa sociedade
capitalista.
A escola vivencia todos os problemas de uma sociedade capitalista e tem sido
agredida no seu campo ideológico, como pode ser visto, por exemplo, no movimento
escola sem partido, em que professores são chamados de doutrinadores, em que o
conhecimento científico, artístico e filosófico é limitado para a classe trabalhadora a
partir de reformas curriculares como a Base Nacional Comum Curricular (BNCC)
(NETO; PIRES, 2020, p. 41).

Além das complexas questões pedagógicas relativas ao ensino remoto, a discussão


sobre o contexto atual do trabalho docente envolve o tema da infraestrutura das escolas, das
condições sociais e de saúde de toda a comunidade escolar (DUARTE et al., 2020, p. 5).
Zaidan e Galvão (2020) observam que tal situação apontada no parágrafo anterior não
se instalou com a pandemia, pois, tal situação é, antes, consequência da exasperação de forças
conservadoras e neoliberais na política brasileira, que fortalece a exploração da mão de obra,
uma vez que o trabalho se apossa de todos os momentos e espaços, como do ambiente de
descanso e do lar dos docentes, sem qualquer ressarcimento. Essa situação nem é percebida ou
valorizada. Ao contrário, muitas vezes, o trabalho docente é subestimado. Além disso, além de
serem tomados por uma situação não prevista, muitos docentes não estão preparados para a
utilização das ferramentas de aula remota.
O isolamento social impôs novas rotinas de trabalho aos docentes. A oferta de ensino
remoto, utilizando-se de meios tecnológicos pouco usuais no trabalho presencial, tem sido uma
novidade e um grande desafio para a maioria dos professores (DUARTE et al., 2020).
Zavandelli e Santos (2020) elencam algumas questões inquietantes durante o ensino remoto:
Observa-se no caso brasileiro muitos fatores preocupantes: a) a fragilidade da
formação inicial e continuada de professores para o uso de TDICs pela
descontinuidade de políticas nessa área; b) a infraestrutura escolar carente de
equipamentos tecnológicos adequados e suficientes, bem como cobertura de internet
insuficiente; c) as limitações de acesso às tecnologias por parte dos estudantes e de
suas famílias; d) o agravamento da situação socioeconômica bastante desfavorável
da maioria da população brasileira, dada a crise econômica e o desemprego crescente
(ZAVANDELLI; SANTOS, 2020, p. 2).
89

Não só na educação pública brasileira observou a exploração do trabalho docente.


Souza, et al. (2021) retratam a sobrecarga dos professores de escolas privadas no período da
pandemia:
Destarte, professoras e professores de escolas particulares passaram a realizar suas
tarefas de forma inesperada por meio de aparatos tecnológicos e plataformas digitais
sem terem sido formados ou recebido condições materiais e prescrições mínimas para
isso. Essa exigência obrigou essas e esses profissionais abruptamente a se adaptarem
ao novo formato de ensino e ao ambiente virtual de trabalho, tendo que improvisar o
próprio espaço doméstico e dividir, simultaneamente, a sua atenção entre as
atividades profissionais e familiares (SOUZA, et al., 2021, p. 3).

O fato é que esse isolamento tem levado ao mal-estar individual no trabalho e desafia
as organizações sindicais a construírem novas ações coletivas de resistências e lutas contra a
nocividade do trabalho (SOUZA, et al., 2021).
As professoras e os professores, sobretudo de educação básica, já encontravam
dificuldades anteriores à pandemia, tanto pela carga horária extraclasse, quanto pela
remuneração e condições de exercício no que toca às ferramentas de trabalho. A
precarização da classe professoral não é uma temática nova. Em tempos de pandemia,
é necessário discutir e evidenciar o possível aumento da demanda de trabalho dos
professores, a possibilidade de redução de carga horária, a não familiarização com
novas ferramentas e a falta de formação sobre esses meios, entre tantas outras facetas
do fazer docente (PALUDO, 2020, p. 45).

A pandemia intensificou o trabalho docente e descarregou uma série de situações


novas em sua rotina de trabalho, além das já existentes. O professor se deparou com novas
funções que vão além do domínio de conteúdos e estratégias pedagógicas. Foi lhe imposto a
obrigatoriedade de se inteirar da ferramenta online e adaptar o ensino remoto, sendo de sua
responsabilidade despertar o interesse dos alunos independente do âmbito das questões
sanitárias Pontes e Rostas (2020):
Além de precisar adaptar o conteúdo e as rotinas para um modelo diferente do
habitual, vivenciando inclusive experiências pedagógicas síncronas e assíncronas e
estar disponível para participar de conferências virtuais em horários díspares ao seu
trabalho presencial, precisou ajustar a sua casa para receber os alunos e os colegas
nas diversas reuniões de trabalho (PONTES; ROSTAS, 2020, p. 279).

Dados sobre o trabalho docente em tempos de pandemia, no relatório do Duarte et al.


(2020) realizado durante a pandemia e a execução do trabalho remoto, apontam que grande
parte (84%) dos professores de todo o país continua a desenvolver atividades de trabalho de
forma remota. Quase a metade (46%) desses docentes mantém a interação com os estudantes
e mais da metade (53,6%) não possui preparo para ministrar aulas não presenciais. Os dados
observados no relatório realizado em todos os estados do país realçam, por si só, a excessiva
carga física e psíquica assumida pelos docentes durante o período de pandemia.
Não só os docentes vivenciam as angústias, as limitações e o acesso restrito às
tecnologias. Os alunos, em sua grande maioria, também sofrem com o ensino remoto, a
realidade, acesso à tecnologia não existe para a maioria dos estudantes de escola pública, e por
90

vezes quando possuem acesso a ferramentas, como computador, internet, o uso é


compartilhado:
Se para o docente as condições estão difíceis, para o estudante não é diferente. A
universalização da educação passa a ser uma condição difícil de ser alcançada visto
que muitos não possuem acesso à rede de internet e, quando o possuem, o
computador, o celular, o smartphone é de uso comum/coletivo. A realidade social
brasileira está repleta de multiplicidades de classes sociais (PONTES; ROSTAS
2020, p. 282).
.
Pereira e Barros (2020) listam três fatores essenciais para o processo de ensino e
aprendizagem durante o período da pandemia. O primeiro refere-se à formação de professores
e à qualidade de materiais didáticos, acesso e habilidades no uso de tecnologias. Em relação
aos alunos, o segundo e o terceiro fatores mencionam a necessidade de acesso ao computador,
com boa conexão de internet e motivação para que encontrem significado no aprendizado.
Frisam, como os demais autores, que a pandemia trouxe à tona o fato de que os alunos menos
favorecidos não possuem os recursos tecnológicos ou as condições necessárias para o
acompanhamento efetivo das aulas remotas.
Jackson Filho et al. (2020) ressaltam a importância da visibilidade para o aspecto do
adoecimento durante o período de pandemia, para que não implique sua pouca valorização nas
políticas públicas. O campo do trabalho de forma integral deve ser considerado nesse momento
de enfrentamento da COVID-19.
Não restam dúvidas sobre a situação caótica e estarrecedora que denunciou os agravos
da educação e as desigualdades sociais durante a pandemia. Se entendemos que a educação
representa o principal potencial para o ser humano se aprimorar como espécie e agir para a
edificação de relações conscientes, afetivas, de respeito e humanizadas, a valorização da
educação pode contribuir para a erradicação da disparidade do acesso de direitos e respeito a
todo e qualquer cidadão.
Freire, Rodrigues e Urt (2021) reforçam que a educação pode favorecer e contribuir
para a transformação da sociedade, desde que todos tenham acesso a ela, em seus mais
profundos e verdadeiros sentidos, significados e recursos favoráveis ao aprendizado. Uma
sociedade que vê a educação como principal mecanismo de desenvolvimento pessoal, cultural,
histórico e econômico forma um coletivo de pessoas com valores éticos e morais que, em
momentos atípicos, como em uma pandemia, disseminam respeito, cooperação,
responsabilidades mútuas e empatia.
Conhecer o que dizem as pesquisas sobre o sofrimento psíquico do docente é de
extrema importância para traçar políticas de prevenção e enfrentamento e para perceber quais
fatores influenciam o aparecimento do adoecimento. No entanto, tornam-se eficazes a
organização e a amplitude de possibilidades para que se tenha acesso a essas informações.
91

Poema: "Educação, Ratos e Inversão"


[...] "Quanto vale um professor e a formação das gerações futuras em nosso quadro
social?
Oxalá fossem os salários, proporcionais ao impacto e relevância social da atividade
exercida.

Afinal, não apenas através da medicina é possível se salvar uma vida.


Mas, a sociedade vendida ao camarote, assiste imóvel ao cúmulo da desvalorização
Dos mestres nas salas de aula; dos ‘valores’ a inversão.

Um verme de paletó e gravata, valendo-se dos privilégios de ser político,


Desviando rios de dinheiro e fazendo o eleitor de otário;
Enquanto um professor dedicado, Socialmente indispensável e devidamente formado,
Faz malabarismos intermináveis com as migalhas que lhe ensinaram a chamar de
salário.

Elites políticas aprenderam há séculos, a fazer papel de parasita.


E o fazem muito bem, infelizmente. Sugam tudo o que podem, até de quem mais
necessita.
Pensam: “Pra quê investir em Educação se o que nos mantêm é a doce alienação?”
“A essa gente, já lhes basta circo e pão!”
[...]

Rosilene Rocha. Disponível em: ( https://www.pensador.com/frase/MTk4MjA4Mg/).


92

3.0 SOFRIMENTO PSÍQUICO E ATIVIDADE DOCENTE: como os professores


percebem o adoecimento.

A economia da educação torna-se refém da tecnologia


da informação. De intensiva de trabalho, a escola
passará a intensiva de capital. (Peter Drucker)

O filme A poeira – uma história do Pantanal, baseado no conto “Nessa poeira não vem
mais seu pai”, de Augusto César Proença, de roteiro e direção geral do próprio e de Hélio
Godoy, lançado em 2008, é um curta-duração de 14 minutos10. O filme conta a história de um
menino que perde seu pai, vaqueiro do Pantanal em um acidente de cavalo, mas as lembranças
do pai e da paisagem pantaneira ficam para sempre guardadas, inspirando-lhe coragem e
bravura.
O curta retrata a história do peão que, ao realizar sua atividade (trabalho), perde a vida,
devido aos riscos de sua profissão. No entanto, mesmo que as condições e instrumentos
apresentem perigos, o amor pelo ofício prevalece. Não só a dedicação ao trabalho, mas também
as relações e a cultura são retratadas na obra, além de explanar a influência da atividade do pai
no desenvolvimento do filho. Sem contar que tal atividade é um aspecto indissociável da cultura
regional e do desenvolvimento do povo pantaneiro.
Como nos demais capítulos, aqui também citamos uma obra cinematográfica que
pudesse ser relacionada ao tema em discussão. O filme elencado, A poeira – uma história do
Pantanal por retratar a vida de um peão (profissional do campo) e todas as particularidades que
dizem respeito a sua atividade, como as condições, as dificuldades, mas também os prazeres, a
satisfação e demais circunstâncias que envolvem a atividade do ser humano, está relacionado
diretamente com o capitulo a ser apresentado. Os dados coletados apresentam a percepção dos
professores sobre todos os aspectos que podem ser observados no curta, e nos permitem
relacionar a motivação e afeto pela profissão, mas também, as inúmeras consequências que
podem ser causadas por meio da atividade.
Partindo da interpretação do filme, iniciamos esse capítulo apresentando os
pressupostos teóricos e o percurso metodológico, o contexto e os sujeitos da pesquisa, os dados
sobre a compreensão do sofrimento/adoecimento para professores e gestores do município de
Corumbá MS.

10
Link para acessar o filme: A poeira – uma história do Pantanal liberado na plataforma YouTube
(https://www.youtube.com/watch?v=BKw0MaUt04A
93

3.1 Pressuposto teórico

A Psicologia Histórico-Cultural de Vigotski (1991) postula que o desenvolvimento


biológico e histórico do ser humano, solidificado na filogênese e na ontogênese, desvelam
divergências entre espécie e gênero humano. Hominização e humanização compõem
particularidades da evolução humana, ou seja, uma vez constituído o homo sapiens, surgem
novas necessidades que, por meio do trabalho e dos elementos sociais dele decorrentes,
possibilitam a ascensão do homem como ser social.
Para propormos uma discussão e a análise dos resultados obtidos a partir dessa
pesquisa, foi essencial escolher uma abordagem que considera o ser humano em sua magnitude,
suas mudanças e transformações durante todo o seu crescimento pessoal e intelectual. A PHC
– Psicologia Histórico-cultural - possibilita essa análise, pois leva em consideração as
transformações advindas das experiências, aprendizados, conhecimentos e relações sociais, por
ser um ser social.
Pensando assim, a construção e a execução da pesquisa foram pautadas na Psicologia
Histórico-cultural, por conceber que as transformações e o desenvolvimento do ser humano
acontecem de forma permanente, por meio da educação. Trata-se da junção entre o
conhecimento social, do cotidiano, advindo das relações sociais e o conhecimento teórico,
crítico e sistematizado, que se consolida por meio do ensino:
Tratar-se-á dos princípios básicos que orientam a escolha do método para abordar a
complexa tarefa de pesquisar um objeto, cuja essência é um processo em constante
movimento, automovimento e transformação. Assim, o método deve corresponder ao
caráter dinâmico do próprio objeto e imbricado nele explicá-lo nas suas múltiplas
facetas. Esta tarefa exige aproximar-se ao conhecimento do objeto mediante a análise
explicativa das relações dinâmico-causais e não da análise descritiva e/ou da medição
quantitativa pontual. Resulta difícil separar a função do pesquisador e do educador,
quando de pesquisa educativa se trata (MENDONÇA; PENITENTE; MILLER, 2017,
p. 39).

A percepção de que a educação pode desencadear a transformação do sujeito se


fundamenta no método materialista histórico-dialético, que dá sustentação à PHC. Esse método
trata das leis mais gerais do desenvolvimento da natureza, da sociedade e do pensamento
humano. A aplicação desse instrumental metodológico possibilita ao educador apreender os
fenômenos humanos e sociais mais verdadeiros na sua totalidade de existir e manifestar. Como
o psiquismo humano está em constante transformação, em função das interações com a
realidade social, as determinações sociais, históricas e culturais o constroem, pois são
transformações qualitativas impostas ao psiquismo durante todo o processo de desenvolvimento
ontogênico do ser humano (FILHO, 2007).
94

O processo educativo é amplo, complexo e deve ser dinâmico para quem colabora com
a aprendizagem e para quem aprende. Apesar da relevância da educação para o ser humano
visualizam-se atitudes de descaracterização e desvalorização, em especial quanto ao
profissional que desempenha suas atividades laborais com o intuito de contribuir para o
desenvolvimento do ser humano, o professor. A escola é um ambiente onde essas relações
ocorrem de forma intensa, por isso merece atenção especial.
As relações na escola são contínuas, criadoras de significados intersubjetivos, que
geram novas relações, integram histórias de vidas com experiências e vivências, originando os
sentidos subjetivos, que nem sempre são percebidos por quem ensina e por quem aprende.
Assim, é a vida em sociedade, como constituição histórica e produto de inúmeras
determinações, que possibilita que o ser humano se desenvolva (TUNES; TACCA; JÚNIOR,
2005; BERNARDES, 2010).
Zanella et al. (2007) avaliam que a psicologia de Vigotski vem se solidificando no
panorama científico como referência em pesquisas que discutem o processo de construção do
sujeito em diferentes contextos e condições sociais, incialmente no contexto educacional. Dessa
forma, descrevem como a PHC propõe a análise de um conteúdo:
Neste sentido, a Psicologia Histórico-cultural caracteriza-se pela concepção da
realidade como complexa, da interdependência entre fenômenos, da mútua
constituição de sujeitos e sociedade. Cada aspecto contemplado na análise, nesse
sentido, não é apenas mais um “apêndice” que faz parte de um todo, pois é, ao mesmo
tempo, manifestação da totalidade e determinante desta totalidade, pela maneira como
se relaciona com os outros aspectos. Por isso, privilegiam-se os movimentos,
transições, aquilo que propicia uma compreensão integral dos fenômenos, por
contemplar as relações de constituição recíproca desses e da totalidade que os mesmos
compõem, e também a gênese das mudanças de qualidade propiciadas por estas
íntimas relações (ZANELLA et al. 2007. p. 28).

Bernardes (2010) concebe que esses pressupostos teórico-metodológicos indicam a


superação das condições estabelecidas na realidade, além da crítica aos elementos próprios da
sociedade. Visam a constatar, na historicidade dos fenômenos estudados, as condições
necessárias para que a potencialidade do gênero humano se objetive na individualidade dos
sujeitos. Além do mais, ter como referencial teórico-metodológico o materialismo histórico-
dialético e a Psicologia Histórico-cultural como o instrumento que permeia as atividades
práticas na vida em sociedade requer a objetivação de compromissos políticos e sociais.
O método da PHC favorece a compreensão do sujeito em sua completude, considera
seu conhecimento prévio sucedido de suas relações, cultura, meio e o integra aos conhecimentos
que o levam a ampliar sua forma de pensar e agir, satisfazer suas necessidades e se tornar crítico.
Assim, esse aporte metodológico nos auxilia na compreensão dos fenômenos que envolvem o
processo de humanização do coletivo ao individual. Bernardes (2017) pondera:
95

Para não cair no antigo erro das pesquisas de corte behaviorista, baseadas no esquema
estímulo-reação, o pesquisador deve levar em consideração que o comportamento
observável guarda uma estreita relação com os processos internos, estes últimos,
filtram e organizam o comportamento, mas, ao mesmo tempo controlam e regulam os
impactos que tal comportamento tem na realidade, sofre uma nova filtragem para
adequar e reconfigurar a conduta em geral. Nesta dialética complexa das funções
psicológicas, em que o psíquico, surgido na relação com o contexto, uma vez que se
expressa externamente o faz através da autorregulação, que conduz por sua vez a
transformação do ato psíquico, exige do pesquisador uma postura dialética. Para
compreender esta relação, a organização da pesquisa e a análise dos resultados deve
partir do fenômeno em estudo como um processo e não como um resultado. Os
fenômenos psíquicos quando refletem a realidade cumprem a função reguladora,
transformando constantemente a relação entre o externo e o interno. Apesar do
esclarecimento teórico da dinâmica desta relação, ainda é comum o uso de
instrumentos de pesquisa voltados para a medição do resultado tácito, externo, a partir
dos quais os sujeitos são classificados e incluídos em categorias, que servirão para
deduzir aspectos sobre o desenvolvimento psíquico (BERNARDES, 2017, p. 46).

Esses compromissos políticos e sociais, assim como a integração de conhecimentos,


experiencias e vivências ocorrem por meio da apropriação da e na educação:
O papel das pesquisas educacionais orientado à aplicação da teoria histórico-cultural
deve estar atrelado à compreensão dos aspectos centrais que determinam a
transformação do natural em cultural e em social. Elucidar com um olhar prospectivo,
como, e em função de quais processos e atividades acontece essa transformação
constitui um dos desafios principais das pesquisas em educação (MENDONÇA;
PENITENTE; MILLER, 2017, p. 42).

Partimos do pressuposto de que a educação é um processo essencial para o


desenvolvimento humano e que as relações, nesse contexto, são intensas e de grande relevância.
Também assumimos que os significados, sentidos e conceitos sucedidos de todo esse conjunto
são integrantes no processo de humanização e pensamos a Psicologia Histórico-cultural como
aporte teórico metodológico que colabora de forma ampla para o entendimento no âmbito
escolar do processo de constituição do ser humano. Assim, nosso objeto de pesquisa propõe
compreender a percepção do profissional de educação em relação à saúde psíquica e ao
adoecimento, considerando todo o seu contexto histórico e cultural.
Deduza-se que a condução das pesquisas educacionais na perspectiva histórico-
cultural requer a determinação e desenvolvimento de métodos que sejam capazes de
penetrar na essência dos processos e funções psíquicas com um olhar prospectivo
sobre o objeto. Entenda-se aqui processos e funções que têm sua origem e se
desenvolvem na interação com a cultura, que se transformam nela e ao mesmo têm
impacto transformador sobre ela. Trata-se, portanto, de um objeto que só existe em
desenvolvimento e transformação. Daqui a necessidade de métodos específicos
adequados às particularidades deste objeto de altíssima complexidade que não pode
ser enquadrado nem preso em compartimentos estancos, parcelas, fatores e todo
gênero de classificações esquemáticas (MENDONÇA; PENITENTE; MILLER,
2017, p. 42-43).
.
O percurso que traçamos foi uma tentativa de aproximação do método de investigação
utilizado por Vigotski em suas pesquisas, por exemplo, passando a compreender o mais simples
a partir do mais complexo. Tentamos estabelecer, portanto, as condições materiais e as relações
96

sociais mais complexas que podem envolver as formas mais imediatas e habituais em relação à
percepção do professor sobre o sofrimento psíquico.

3.2 Percurso metodológico


Inicialmente, pretendíamos coletar dados com a aplicação presencial dos instrumentos
pela própria pesquisadora. Porém, devido à pandemia, essa opção teve de ser revogada, pois o
município passou a desenvolver o trabalho remoto a partir de março de 2020 com base no
Decreto nº. 2.266 de 19 de março de 2020 que dispôs sobre a jornada especial e temporária nas
repartições Públicas do Município de Corumbá como medida de combate ao novo coronavírus
COVID-19.
Assim, em reunião com a Secretária Adjunta de Educação, optamos pelo envio dos
instrumentos por meio do aplicativo WhatsApp, a fim de alcançar maiores índices de
participação que por outros meios virtuais por existir o grupo do aplicativo de cada escola, pois
o ensino presencial retornou apenas em agosto de 2021, conforme o Decreto nº 2.620, de 15 de
julho de 2021, que dispôs sobre o retorno das aulas presenciais para o segundo semestre de
2021 na Rede Municipal de Ensino de Corumbá, e a coleta de dados ocorreu durante o primeiro
semestre do ano de 2021.
Os instrumentos foram enviados pela própria Secretária Adjunta de Educação que se
disponibilizou em encaminhar o formulário devido o quantitativo de profissionais e por cada
escola ter o próprio grupo de WhatsApp dos professores. Os instrumentos foram enviados por
três vezes para todas as escolas de Corumbá, as do território urbano, rural e das águas, com uma
mensagem introdutória da pesquisadora esclarecendo o objetivo e a importância da participação
de cada um. Também foi ressaltada a valiosa participação dos Profissionais de Educação
durante as reuniões (online) da Secretaria Municipal de Educação e gestores de cada instituição
escolar durante o período em que esteve disponível para preenchimento, de maio a agosto de
2021. No ano em que a pesquisa foi realizada haviam 984 professores em sala de aula, e ao
final recebemos 118 (12%) respostas. Em relação aos gestores, o mesmo processo foi realizado,
e de 251 participantes, recebemos 26 (10,35%) respostas. Na soma das respostas dos
professores e gestores somamos 144 participantes no total
Como procedimentos adotados os seguintes instrumentos para a coleta de dados dos
professores:
01 questionário, com cinco itens de investigação: dados de identificação (sexo, idade,
estado civil, formação, ano e instituição, Pós-Graduação, ano e instituição); questões sobre o
trabalho docente; questões sobre adoecimento; questões sobre trabalho docente na pandemia;
questões sobre ações para o enfrentamento docente.
97

02 escalas: o Questionário de estresse nos Professores: Ensino Básico e Secundário


(QSPEBS) e o Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20).
Os três instrumentos para coleta dos dados, foram organizados em um único
documento e aplicado por meio da plataforma google forms.
Em relação aos gestores, foi aplicado o questionário online que objetivou coletar as
informações sobre a existência de algum programa, projeto ou ação para prevenção e a
concepção sobre o sofrimento/adoecimento docente. As informações foram coletadas a partir
das seguintes questões: dados de identificação; Questões sobre Projetos realizados para prevenir
o adoecimento docente e Questões sobre o processo de Trabalho Docente em tempo de
pandemia, também por meio da plataforma do google forms.
A pesquisa foi realizada durante o período de pandemia, motivo pelo qual aplicamos
os instrumentos por meio de ambiente virtual. Por ambiente virtual entende-se:
Meio ou ambiente virtual: aquele que envolve a utilização da internet (como e-
mails, sites eletrônicos, formulários disponibilizados por programas, etc.), do
telefone (ligação de áudio, de vídeo, uso de aplicativos de chamadas, etc.), assim
como outros programas e aplicativos que utilizam esses meios (CONEP, 2021,
s/p).

Apesar de termos optado pelo meio virtual devido a pandemia, e por entendermos que
todos, senão a maioria dos professores teriam acesso ao aplicativo WhatsApp, percebemos que
o período em que a pesquisa foi realizada, na pandemia, pode ter influenciado na participação
dos sujeitos. Esse fato foi observado após a insistência em reenviar o questionário aos os
professores e gestores, além dos constantes lembretes realizados pela Secretária Adjunta
durante as reuniões. Os professores e encontravam em intenso uso de tecnologias por causa do
trabalho remoto.
A aplicação objetivou um alcance maior de respostas, além de proporcionar o sigilo e
outras diretrizes, conforme preconizados pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres
Humanos por meio da Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012, e também quanto à
tranquilidade dos participantes, por se tratar de um município onde as relações são próximas.
Além dos motivos já elencados para a coleta de dados por meio de plataforma online,
Dasmaceno et al. (2014) descrevem outras vantagens:
[...] o método online apresenta vantagens que podem também minimizar os custos da
realização da pesquisa, tais como: facilidade de agendamento da entrevista;
possibilidade de executar outras tarefas durante a condução da entrevista; possibilita
ao pesquisador e pesquisado não estarem necessariamente na mesma localidade e; por
fim, permite uma maior reflexão e objetividade das respostas (DAMASCENO et al,
2014, p. 8).

Organizamos os dados coletados por meio dos questionários em tabelas, para melhor
compreensão da análise. Reunimos as respostas por frequência e calculamos o percentual dos
participantes em algumas questões. Para o processo de análise e discussão, consideramos as
98

quatro primeiras respostas de cada tabela, por estarem listadas de acordo com o número de
frequência.
Para a coleta de dados, solicitamos a autorização da Secretaria Municipal de Educação
após a aprovação do projeto pelo CEP – Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos,
com o Parecer 4.717.66.

3.3 Contexto e sujeitos da pesquisa

A pesquisa comentada a seguir foi realizada no município de Corumbá – Mato Grosso


do Sul. De origem tupi-guarani, o nome Curupah significa ‘lugar distante’. Depois de ter outras
denominações ao longo de sua história, Corumbá é conhecida como Cidade Branca, devido à
cor clara de seu solo, rico em calcário. A ocupação da região teve início no século XVI quando,
com a expectativa de encontrar ouro, a área do atual município foi explorada pelos portugueses,
que começaram a chegar em 1524 (PMC - PREFEITURA MUNICIPAL DE CORUMBÁ).
Localizado na zona fisiográfica da Baixada Sul, no pantanal mato-grossense, está
integrado à bacia do Paraguai. Limita-se com os municípios de Cáceres, Poconé, Barão de
Melgaço, Santo Antônio de Leverger, Itiquira, Coxim, Rio Verde de Mato Grosso, Aquidauana,
Miranda, Ladário e Porto Murtinho, além de ser fronteira internacional com as Repúblicas da
Bolívia e do Paraguai. Ocupa uma área territorial de 64.438,363km²; sua população é estimada
em 112.669 pessoas.

Figura – 1 Localização de Corumbá em Mato Grosso do Sul

Fonte: Wikipedia.

Conhecida como a ‘Capital do Pantanal’, destaca-se principalmente no turismo de


pesca nas margens do rio Paraguai, que possui uma grande diversidade de espécies de peixes.
Além disso, o visitante pode fazer mergulhos, turismo contemplativo na região da Estrada
Parque e visitas às minas do Urucum (GOVERNO DO ESTADO DO MATO GROSSO DO
SUL).
99

O Plano Municipal de Educação 2015-2025, em consonância com o Plano Nacional


(PNE) Lei 13.005, de 25 de junho de 2014, e o Plano Estadual de Educação (PEE) Lei nº 4.621,
de 22 de dezembro de 2014, visa, de forma objetiva e organizada, trabalhar abordando a
universalização e a qualidade do ensino, a formação e a valorização dos profissionais de
educação, a democratização da gestão e o financiamento da educação (PMC – SEMED).
De acordo com informações disponibilizadas pela Secretaria Municipal de Educação
– SEMED, o município possui 42 escolas mais as extensões: as urbanas, das águas e rurais e os
CEMEI – Centro Educacional Municipal Integral. Há, atualmente, 1.314 11 Profissionais de
Educação no município.

3.4 Dos questionários dos professores: resultados e análises


3.4.1 identificação dos participantes da pesquisa
Iniciamos a caracterização dos participantes a partir das questões de 1 a 5 da primeira
parte do questionário, referentes à sua identificação: sexo, idade, estado civil (tabela 08);
graduação e ano (tabela 09) e ainda, Pós-Graduação e ano (tabela 10).

Tabela 8 - Identificação: sexo, idade e estado civil.


Sexo Idade Estado civil
Feminino 95 (80,3%) 20 a 30 anos 17 (14,5%) Casado 56 (47,9%)
Masculino 22 (18,8%) 31 a 40 anos 38 (32,5%) Solteiro 31 (26,5%)
Outros 01 (0,9%) 41 a 50 anos 39 (32,5%) União estável 16 (12,8%)
51 ou mais 24 (20,5%) Divorciado 15 (12,8%)

Fonte: Freire, 2023

Tabela 9 – Graduação e ano de conclusão.


Formação inicial Ano de Graduação
Pedagogia 61 (52%) 1984-2004 54 (46%)
Letras 13 (11%) 2005-2020 21 (18%)
Geografia 07 (6%) não informaram 43 (36%)
Educação Física 06 (5%)
Ciências Biológicas 03 (2%)
Artes/Artes Visuais 03 (2%)
Curso superior 03 (2%)
Duas graduações 03 (2%)
Matemática 04 (3%)

11
A Rede Municipal de Ensino de Corumbá possui 1.314 Profissionais de Educação, sendo 973 estatutários e 341
contratados. Destes, 139 possuem dois vínculos (dobra de carga horária), totalizando 1.175 pessoas. Desse total,
1.156 atuam diretamente nas escolas, sendo que 815 possuem vínculo estatutário e 341 contratados. Nas unidades
de educação, existem 134 Coordenadores Pedagógicos, 30 Gestores Escolares e oito Gestores Adjuntos (todos
com vínculos estatutários). Atualmente, a Secretaria Municipal de Ensino possui 79 vínculos de Educação
distribuídos em um Secretário de Educação, uma Secretária Adjunta de Educação, dois Servidores cedidos de
outros órgãos e 75 Assessores Técnicos.
100

não especificaram 15 (13%)


Fonte: Freire, 2023

Tabela 10 – Pós-Graduação e ano de conclusão.


Pós-Graduação Ano de Conclusão da Pós
Especialização 75 (63%) 1994-2004 07 (6%)
Não possuem 11(9%) 2005-2015 08 (15%)
2 ou mais Especializações 10 (8%) 2006-2021 40 (34%)
9 em andamento 09 (8%) Não responderam 53 (45%)
Mestrado 09 (8%)
Mestrado e Especialização 02 (2%)
Doutorado 02 (2%)
Fonte: Freire, 2023

Dos 118 professores que participaram da pesquisa, observamos que quase a totalidade
de respostas recebidas foi de participantes do sexo feminino.
As informações cedidas levam-nos a algumas interpretações. Primeiramente, nos
parece haver maior interesse pelo tema sobre o adoecimento por parte das professoras. Segundo
a maioria dos professores do município é do sexo feminino. De acordo com Viana (2001), à
docência foi assumindo um caráter eminentemente feminino. Hoje, em especial na Educação
Básica (composta da Educação Infantil, do Ensino Fundamental e do Ensino Médio), é grande
a presença de mulheres no exercício do magistério. O autor complementa:
No século XX, o caráter feminino do magistério primário se intensificou a tal ponto
que, no final da década de 20 e início dos anos 30, a maioria já era essencialmente
feminina. O Censo Demográfico de 1920 indicava que 72,5% do professorado do
ensino público primário brasileiro compunha-se de mulheres e, no total de docentes,
sem distinção de graus de ensino, elas somavam 65%. 9 A presença feminina no
magistério estendeu-se aos demais níveis de ensino após a progressiva expansão da
oferta de vagas nos cursos de ensino primário em cidades de grande porte, como São
Paulo, no final da década de 30 e meados de 1940 (VIANA, 2001, p. 85).

Araújo e Purificação (2021) explicitam sobre a inserção da mulher na carreira docente


e como isso pode influenciar a desvalorização da profissão, pois a presença feminina no
mercado de trabalho ainda era escassa em meados do século XIX, e só foi possível devido a
lacuna deixada pelos homens, favorecendo a emancipação da mulher, da cuidadora do lar no
mercado de trabalho.
Em 2017, O INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira) divulgou um estudo sobre o perfil dos professores no Brasil, revelando que
“os professores típicos brasileiros em 2017 são mulheres (81%).” Esse número deixa
claro a predominância da mulher no magistério, porém, quando se trata dos setores
mais valorizados da profissão, como a universidade, elas representam 45,28% e os
homens 54,72%. (ARAÚJO; PURIFICAÇÃO, 2021, p. 3-4).

Na área da educação a participação feminina é extensa. A partir da expansão desse


setor no Brasil, no início do século 20, as mulheres foram convidadas a desempenhar a função
de educadoras, e sua inserção ao trabalho formal em educação ocorreu devido a percepção de
101

que a docência, o ato de educar, deveria ser desempenhada por mulheres por caracterizar o
cuidado com o outro (ARAÚJO et al., 2006).
Pinho, Ferreira e Pina (2017) descrevem que no Brasil, a predominância de mulheres
no setor educacional é evidenciada principalmente no ensino médio, diferentemente do ensino
superior, que apesar de a presença feminina no setor da educação superior esteja aumentando
significativamente, o percentual de professores do sexo masculino no nível superior é, em
média, 10 pontos percentuais mais elevado do que o feminino.
Em uma pesquisa realizada na rede estadual de educação do Paraná, onde a maioria
dos participantes eram do sexo feminino, Tostes et. al. (2018) verificaram índices elevados de
sofrimento mental (depressão, ansiedade e distúrbios psiquiátricos menores), bem mais
elevados que em outros estudos também com professores e outras categorias.
A partir dessas informações, é importante salientar que as mulheres em sua grande
maioria trabalham para além de três turnos. Tal afirmação é relevante por ser realidade a
necessidade de o referido gênero precisar cumprir não só com o trabalho enquanto profissão,
mas também em grande parte precisam cuidar da casa, dos filhos, cônjuges, afazeres diversos
que contribuiu para o desgaste físico e mental, e talvez, seja por isso que quando pesquisado a
prevalência de afastamentos para tratamentos e/ou acompanhamento de familiares, as mulheres
sobressaem.
Nesse caminho, entendemos que por ser as mulheres, a maioria dos profissionais no
setor educacional, também compreendemos a prevalência do sexo feminino na participação em
pesquisas realizadas nessa área, e consequentemente serem mais acometidas pelo
sofrimento/adoecimento psíquico.
Outro dado que chama a atenção é o número de professores que possuem Pós-
Graduação e suas respectivas idades. Pessoa (2019) ressalta que, para cumprir a sua função, a
escola precisa estar em condições para superar a alienação presente na realidade por meio da
apropriação dos conhecimentos sistematicamente organizados. Essa afirmação conduz à
constatação do interesse dos docentes em alcançar maiores e melhores conhecimentos, com o
objetivo de mediar conteúdos de qualidade para propiciar o aprendizado aos seus alunos.
Pessoa (2019) ainda aponta que quanto mais se garante que novas gerações tenham
acesso e mais apropriações sejam feitas a partir do que foi já produzido, é mais possível que se
criem novos trajetos ao desenvolvimento humano. Ou seja, professores e alunos aprendem mais
e melhor quando o acesso ao conhecimento é disponibilizado e ocorre em uma via de mão
dupla, a partir da troca de experiências. Contudo, sobre o número de pós-graduações dos
docentes, sugerimos que há a busca pela melhoria salarial, considerando que, em sua maioria,
102

os planos de cargos e carreiras viabilizam um acréscimo no valor do salário base, o que não é
diferente no município de Corumbá.12

Figura 2 – Valores - Profissional de Educação 20 horas

Fonte: Secretaria Municipal de Finanças e Gestão. Superintendência de Gestão de Recursos Humanos.

Nesse tópico foi possível conhecer um pouco dos participantes dessa pesquisa, e
partimos para o próximo item refletindo na citação de Bendassoll e Gondim (2014), que nos
faz pensar o ser humano como ser transformador e transformado a partir de suas ações e
resultados.
[...] o sentido é entendido como construído nos processos de mediação semiótica entre
homem e natureza (atividade), dentro de um contexto sócio-cultural particular. Assim,
o trabalho é entendido como uma atividade orientada, ao mesmo tempo para o sujeito,
para os outros e para o objeto da atividade, resultando em uma transformação de si,
dos outros e do mundo (BENDASSOLL; GONDIM, 2014, p. 137).

A partir deste tópico tratamos dos eixos, que foram criados a partir das questões do
questionário aplicado aos professores. Com base nas questões pesquisadas os eixos foram
organizados propondo a compreensão das análises e discussões das respostas, e foram
identificados por meio do diagrama e suas respectivas cores com o objetivo de orientar a
compreensão do leitor dos temas abordados nessa pesquisa.
No eixo Percepção do trabalho docente foi pesquisado o grau de satisfação do
professor em relação a sua atividade. As questões elencadas foram: o grau de satisfação do
trabalho docente; condições que mais e menos agradam os professores; Atividades realizadas
no trabalho considerada prazerosa e considerada menos prazerosa.
No eixo seguinte, Visão sobre o trabalho docente pesquisamos se os professores
gostam da atividade que exercem e as respostas se referem às questões: Gosta do trabalho?

12
De acordo com informações da Secretaria Municipal de Finanças e Gestão. Superintendência de Gestão de
Recursos Humanos da Prefeitura de Corumbá MS, os valores correspondem: PI = Graduação; PII= Pós-Graduação;
PIII = Mestrado; P IV = Doutorado; A cada 05 anos mudança de CLASSE A-B-C-D-E-F-G-H.
103

Motivos que justifiquem gostar do trabalho; se pudesse, mudaria de profissão? Caso sua
resposta for sim, para qual profissão? Por que?
A visão sobre o adoecimento do docente é o eixo seguinte e se constituiu das
perguntas que propuseram investigar a percepção sobre problemas de saúde e a relação com a
atividade docente: Possui problema de saúde? Caso tenha respondido Sim, qual? Seu problema
de saúde é anterior ou posterior ao início da sua atividade
profissional? hipótese sobre o adoecimento e situações que pode manifestar a doença;
Solicitação de afastamento do trabalho por razões de saúde nos últimos 12
meses. Se sim, por quanto tempo ficou afastado? toma ou tomou algum medicamento nos
últimos 12 meses? Caso sim, qual medicamento; Efeitos positivo e Efeitos negativo do
medicamento; você considera que os problemas de saúde enfrentados causam prejuízo na sua
atividade profissional? Considerações sobre os prejuízos na atividade devido aos problemas de
saúde; considera que a atividade docente pode ter provocado seu problema de saúde? Se sim,
como o trabalho pode ter causado seu problema de saúde;
Trabalho remoto e adoecimento docente se refere ao penúltimo eixo que trata do
trabalho docente durante o período da pandemia do COVID- 19, e investigou a percepção sobre
esse modelo de trabalho e suas consequências: A pandemia prejudicou sua saúde? Você teve
dificuldade de exercer seu trabalho em tempo de pandemia? Caso sim, qual? Foram
disponibilizados os recursos tecnológicos para o desempenho das atividades docente? Caso sim,
quais? Foi ofertada formação para a utilização? Caso tenha respondido Sim, fale sobre essas
formações. A pandemia prejudicou a qualidade do seu trabalho? Caso tenha respondido Sim,
de que forma? Exemplifique.
No ultimo eixo, Enfrentamento ao adoecimento objetivamos apurar a existência de
algum programa, ação, projeto que contribuísse para a elaboração, organização e manejo das
diferentes situações que pudessem gerar o sofrimento/adoecimento psíquico e quais ações
consideram importantes existir. Solicitamos aos professores: Relate alguma experiência ou
projeto de enfrentamento que você conhece ou participou para situações emergenciais de
adoecimento? Quais medidas/ações de enfrentamento poderiam ser realizadas para minimizar
o Sofrimento/adoecimento psíquico do(a) professor(a)?
104

EIXOS NORTEADORES DAS ANÁLISES:

Eixo:
Eixo: Visão sobre o trabalho docente
Percepção do trabalho docente

Eixo: Eixo:
Trabalho remoto e adoecimento docente Visão sobre o trabalho docente e
adoecimento

Eixo:
Percepção docente sobre o enfrentamento
ao adoecimento
105

3.4.2 Percepção do trabalho docente


[...] o sentido de uma palavra é a soma de todos os fatos
psicológicos que ela desperta em nossa consciência.
Assim, o sentido é sempre uma formação dinâmica,
fluída, complexa, que tem várias zonas de estabilidade
variada. O significado é apenas uma dessas zonas do
sentido que a palavra adquire no contexto de algum
discurso e, ademais, uma zona mais estável, uniforme,
exata. Como se sabe, em contextos diferentes a palavra
muda facilmente de sentido. O significado, ao
contrário, é um ponto imutável que permanece estável
em todas as mudanças de sentido da palavra em
diferentes contextos [...] (VIGOTSKI; 2008, p. 125).

Neste tópico, abordamos o trabalho docente, a satisfação e a percepção em relação à


atividade. As questões que tratam da satisfação estão apresentadas na Tabela 11. Na tabela
12 os participantes descreveram as três condições que mais os agradam e as três que os
desagradam, igualmente na tabela 13, para as três atividades consideradas mais
prazerosas e as três menos prazerosas.

Tabela 11- Sensação em relação ao seu trabalho


Satisfeito 53 (45%)
Muito satisfeito 23 (19%)
Razoavelmente satisfeito 22 (19%)
Extremamente satisfeito 16 (13%)
Insatisfeito 02 (2%)
Pouco satisfeito 02 (2%)
Total 118
Fonte: Freire, 2023.

A satisfação no trabalho de professores é compreendida por Ramos et al. (2016) como


o nível de desempenho docente à eficiência no alcance dos objetivos de ensino, e entendem que
os professores mais satisfeitos com a função alcançam melhores resultados e por isso pode ser
considerada como um aspecto fundamental da docência.
Entende-se que a satisfação estimula o entusiasmo e o comprometimento, favorecendo
a dedicação de mais tempo e energia à melhoria da aprendizagem dos alunos (RAMOS et al.,
2016, p. 180). O ser humano é um ser social. Sua atividade orienta a sua existência; a satisfação
no desempenho de suas funções estabelece o grau de motivação e significação de sua ação. A
concretização do trabalho resulta no sentimento de pertencimento de uma sociedade que é
produzida a partir do seu trabalho.
Rebolo e Bueno (2014) acrescentam que o trabalho permite o ser humano a
transformar sua realidade e a si próprio, e que inicialmente foi percebido de duas maneiras.
Primeiro, como uma ação que servisse apenas para sobrevivência, segundo, como uma ação do
106

ser humano que gera prazer, satisfação. Contudo, são dois extremos que não podem ser
separados, fazem parte de um mesmo processo.
Essa ambiguidade se deve, principalmente, ao fato de a realização do trabalho
depender de determinadas condições concretas que podem ou não corresponder às expectativas
de quem o executa (REBOLO; BUENO, 2014, p. 324).
Os dados levantados nesta pesquisa em relação à perda da satisfação no trabalho por
24% dos docentes podem levar a crer que há uma ruptura na motivação do desempenho da
atividade. Dias e Nascimento (2020) apontam para complexidade do trabalho docente que
envolve fatores históricos, sociais, culturais, políticos, econômicos, institucionais, entre outros.
O ensinar é uma parte do trabalho docente, pois integra também questões e dificuldades
próprias.
[...] colocamos como hipótese que a percepção da valorização/desvalorização social
docente é um componente capaz de influir particularmente na relação entre autoestima
docente e satisfação/insatisfação profissional do professor, e nas decisões e
considerações do professor sobre docência, modulando seu empenho nela,
considerando docência como atividade promovida num certo espaço institucional e
relacional, e num contexto político, social e econômico determinante (DIAS;
NASCIMENTO, 2020, p. 75).

Nesse viés, Rego (2014), com base na teoria marxista, complementa que a origem da
sociedade humana e suas especificidades são resultados do trabalho do ser humano, e que, é
por meio do trabalho que transforma a si e a tudo que está a sua volta. E a partir da obtenção da
satisfação de suas necessidades, a sociabilidade toma formas complexas, sendo a finalidade do
trabalho como objetivo necessário para a vida social.
Desta forma, a consciência resulta no pôr de finalidades intrinsecamente ao processo
de trabalho, porém ela não se resume a isso, ou seja, na busca da satisfação das
necessidades por meio do processo de trabalho. A consciência se dá simultaneamente
ao fazer prático humano (FACCI; CRISPIN, 2020b, p. 151).

Ao organizar suas ações com base em suas motivações e a partir dos resultados
alcançados, o ser humano se sente realizado, é essa realização que o motiva a buscar sempre
por mais e melhores resultados, suas expectativas aumentam, seus desejos são atendidos, e todo
esse processo gera a satisfação, pois, é o resultado esperado que ao ser alcançado o permite
perceber, dominar e aprimorar suas habilidades.
Ao descrever as três condições que mais os agradam 13 (Tabela 12), temos as
questões que envolvem as relações, como equipe, companheirismo, cooperação, comunicação
são as mais importantes como condições satisfatórias para o trabalho, também as pertinentes as
relações, mas especificamente com a chefia, como suporte, chefia direta, organização e ética.

13
Todas as respostas foram reunidas preservando a ideia original dos participantes (palavras, termos,
variedades).
107

Outros docentes apontam estrutura física, recursos materiais, local e boas condições de trabalho.
Os alunos, amor e/ou satisfação pela profissão, o salário e plano de carreira, assim também o
bom relacionamento com os familiares dos alunos. A carga horária respostas, autonomia, como
a valorização que também foi citada.

Tabela12 – Repostas das condições que mais e menos agradam os professores


Condições que mais agradam Frequência Condições que desagradam Frequência
76 Falta de estrutura física/Recursos
Equipe/Companheirismo/Cooperação/
materiais/ condições de 80
Trabalho em equipe/comunicação
trabalho/Localização
Inexistência de Suporte chefia direta
Suporte/Chefia direta
57 /Organização/ética/diretrizes/comunicaçã 33
/Organização/ética
o
Estrutura física/Recursos
materiais/Boas condições de 43 Desvalorização/desmotivação/sobrecarga 25
trabalho/Local
Ausência do trabalho em
Os alunos 26 equipe/Companheirismo/Cooperação/co 15
municação
Amor pela profissão/Satisfação 9 Nada há o que dizer/relatar 10
Salário/plano de carreira 8 Salário/plano de carreira 7
Bom relacionamento com familiares 8 Ausência dos familiares 7
Funções Administrativas/Excesso de
Carga horária 7 5
informações
Ausência do cuidado com o professor
Autonomia 6 3
(saúde física e psíquica)
Valorização 1 Ausência dos alunos 3
Carga horária 2
Falta de investimento/Política partidária 2
Falta de autonomia/inflexibilidade 2
Razoável 1
Total 241 Total 195
Fonte: Freire, 2023

As condições que mais agradam os professores são atinentes, na maioria, às


circunstâncias que abarcam as relações interpessoais. Das quatro maiores frequências de
respostas, três estão ligadas diretamente às relações, ao convívio com o outro, seja entre os
próprios docentes, com a chefia, e as relações com os alunos. E uma das quatro maiores
respostas registra questões de estrutura física, recursos materiais, boas condições de trabalho e
local.
Esses dados instigam-nos a resgatar a discussão da questão anterior, sobre a satisfação.
Ao verificar as condições que mais agradam aos professores, as respostas apontam para as
situações que envolvem as relações humanas, e não especificamente a prática docente.
Sobre as relações, a teoria do desenvolvimento de Vigotski, tendo a linguagem como
ponto de partida, desde o início preconizou as relações como fatores primordiais para o seu
percurso. Primeiramente, ressaltando a importância da relação entre os fatores biológicos e os
culturais como aspectos essenciais no desenvolvimento humano. Segundo o aperfeiçoamento
108

da linguagem só foi possível devido às relações do ser humano com outros seres humanos e
todas as demais relações existentes que pudessem contribuir de forma qualitativa para a sua
evolução.
A partir das relações sociais, o ser humano percebe a realidade e se integra à sociedade
de forma consciente (tem a percepção de si e de tudo a sua volta), e a escola por ser uma
instituição indispensável para a formação da personalidade e para o desenvolvimento das
aptidões, das funções psicológicas superiores, possui um importante papel para a continuidade
e qualidade das relações.
Ao considerar o desenvolvimento biológico e social concomitantemente, Vigotski
verificou que as contradições existentes entre os dois possibilita o desenvolvimento da criança.
As influências de fatores específicos, por vezes com características próprias desse processo,
junto às interações sociais, mediações e internalizações integram o desenvolvimento das
funções psicológicas superiores.
O ser humano cria maneiras de se relacionar com o mundo, toda a história individual
e coletiva dos homens está ligada ao seu convívio social. Sendo assim, a compreensão
do desenvolvimento não pode ser justificado, apenas, por fatores biológicos. O
desenvolvimento ocorre a partir de diversos elementos e ações que se estabelecem ao
longo da vida do sujeito. Neste processo, sem dúvida, a interação com outras pessoas
desempenha papel fundamental na formação individual (MELLO; TEIXEIRA, 2012,
p. 1).

Ao postular que o desenvolvimento das funções psicológicas superiores é produto da vida


social, Vigotski enfatiza que o ponto crucial do desenvolvimento cultural do comportamento
baseia-se nas relações entre o desenvolvimento histórico e o trabalho social e que, ao
transformar as inclinações e funções naturais, altera e incorpora formas absolutamente novas e
mais complexas de comportamento (MARTINS, 2015b).
As relações estão conectadas diretamente ao desenvolvimento do psiquismo humano
e podem contribuir de forma positiva ou não. O reconhecimento próprio, como aspecto da
satisfação surge como um fator importante para o desenvolvimento humano e desempenho de
sua atividade, o leva a realizar sua ação de forma organizada e consciente, e nesse caminho as
relações estão presentes como forma de contribuir ou não, interferindo diretamente no resultado
da atividade humana.
A capacidade de as pessoas manterem relações interpessoais positivas, caracterizadas
por laços significativos, calorosos e confiáveis, refere-se à dimensão: relações
positivas com os outros. É a capacidade de nutrir sentimentos de empatia, de
compreensão e de afeto a todos os seres humanos, assim como a capacidade de manter
as relações íntimas e amizades profundas com outras pessoas. Indica um sinal de
maturidade (GONÇALVES, 2009, p. 52).

Quanto às três condições que mais os desagradam, os professores apontam a falta de


estrutura física, recursos materiais, condições de trabalho e localização como as principais
109

causas desfavoráveis. Fatores como falta de organização do trabalho, de suporte da chefia


direta, ética e comunicação também aparecem, assim como a desvalorização, a desmotivação e
a sobrecarga. Ainda mencionam ausência do trabalho em equipe, companheirismo, cooperação
e comunicação, além de questões salariais e do plano de carreira, as funções administrativas e
a ausência de cuidado com o professor, a falta de investimentos e a falta de autonomia/ e
flexibilidade.
A falta de estrutura física, recursos materiais, condições de trabalho, localização,
inexistência de suporte chefia direta, organização, ética, diretrizes, comunicação,
desvalorização, desmotivação, sobrecarga, ausência do trabalho em equipe, companheirismo,
cooperação, comunicação estão entre as quatro respostas mais frequentes sobre as condições
que desagradam o professor. Essas questões são debatidas de forma rotineira quando se fala das
condições do trabalho do professor, e de fato interferem diretamente no resulto advindo do seu
trabalho.
As condições de trabalho docente é um dos fatores mais discutidos em todas as
ocasiões em que se trata da melhoria do ensino, qualquer que seja a disciplina
considerada. Existem vários fatores que determinam as condições do trabalho
docente, para uma análise/reflexão crítica, dentre eles: as condições físicas das escolas
e a relação com os professores; as condições profissionais dos docentes; o sistema
burocrático que é imposto aos docentes; os controles externos sobre o trabalho
docente e as implicações do projeto político pedagógico do governo (SILVA;
ROSSO, 2008, p. 2014).

As condições desfavoráveis para a realização da atividade docente podem atingir o


sujeito não só de forma objetiva, mas também subjetiva, causando a precariedade na sua
atividade, contribuindo para sua insatisfação. As condições por muito tempo foram pensadas
como aspectos visíveis, estruturais, mas trata se também, das diferentes situações que levam os
professores a desanimar durante o desempenho do trabalho, quando precisa organiza-lo e
executá-lo. Essas situações vão desde a falta de estrutura física, prédios danificados, falta de
recursos tecnológicos, aparatos para o desenvolvimento prático da ação, como ainda, constantes
pressões vivenciadas devido as imposições e falta de liberdade nas tomadas de decisões.
Importante atentar-nos para as contradições encontradas nas respostas dos professores
referentes as condições na tabela 12. Os achados apontam que as mesmas condições que são
consideradas agradáveis para alguns são desagradáveis para outro. Esses dados apontam para
importância do respeito a individualidade, dos aspectos subjetivos, pois o que é compreendido
de uma maneira por um grupo, não é por outro. Outro ponto importante é a existência de uma
boa comunicação para que as necessidades, angustias, experiencias possam ser verbalizadas, e
diante da organização do trabalho objetivar considerar, compreender as percepções e desejos
diferentes em uma mesma equipe de trabalho.
110

Quando falamos de condições de trabalho não podemos e não devemos separar os


aspectos objetivos dos subjetivos, é uma relação que deve ser estabelecida para que o professor
possa desempenhar sua atividade com motivação e alcançar a satisfação. Quando esses aspectos
começam a ser considerados isoladamente é como se desintegrássemos o trabalhador, e a partir
daí, o desempenho passa a não obter a satisfação, o prazer, mas sim, o sentimento de obrigação
em fazer para sobreviver, o levando a iniciar o processo de sofrimento/adoecimento psíquico.
A desvalorização profissional, baixa autoestima e ausência de resultados percebidos
no trabalho docente são fatores importantes a serem investigados no âmbito do
profissional em educação. Além disso, existem queixas muito frequentes relacionadas
à saúde dos docentes como distúrbios psíquicos, associada ao trabalho repetitivo,
insatisfação no desempenho das atividades, ambiente intranquilo e estressante,
desgaste na relação professor-aluno, falta de autonomia no planejamento das
atividades, ritmo acelerado de trabalho e à pressão da direção. Os professores nas
escolas inventam todo instante estratégias e saídas para driblar suas dificuldades
cotidianas deficitárias de trabalho (SILVA; ROSSO, 2008, p. 2043).

Não há dúvidas quanto à necessidade de uma organização do sistema que reúna todos
os elementos necessários para realização do trabalho de forma satisfatória. As relações entre as
instituições e as pessoas nelas envolvidas devem ser a mais saudáveis possíveis pensando em
todos os atores evolvidos no processo ensino-aprendizagem.
O trabalho, para que seja realizado satisfatoriamente e para que cumpra seu papel
equilibrador, requer o estabelecimento de vínculos específicos com determinadas
classes de objetos: instituições, pessoas, instrumentos, organizações. Esses vínculos,
no caso deste estudo, são entendidos como o conjunto de relações que o professor
estabelece com a escola e com o trabalho docente, e que depende da combinação das
características pessoais do professor, das formas de organização e funcionamento da
escola, do grupo e do contexto social em que ambos (professor e escola) estão
inseridos (LAPO; BUENO, 2003, p. 75).

As atividades (Tabela 13) enumeradas como as mais prazerosas no trabalho são as


atividades lúdicas, artes, contação de história, atividades com os alunos ou coletivas. Outros
descrevem como prazeroso ensinar, ministrar, planejar, ser formador, elaborar as aulas e atender
aos alunos, realizar projetos, planejamento, eventos ou reuniões pedagógicas ou inovações.
Também mencionam atividades que envolvem os familiares, formações, desenvolvimento
pessoal e profissional, bom relacionamento com a direção, coordenação, entre outras.
Entre as diversas atividades menos prazerosas estão, burocracia, conselho de classe,
atividades online, gravação de vídeos, desinteresse do aluno, indisciplina, desinteresse dos pais,
reuniões virtuais e reuniões sem objetivos, dar aulas de inglês e história, ficar em sala, aula no
final de semana, jornadas pedagógicas, falta de autonomia e política partidária, ainda sistema
Tagnos, alimentar a plataforma, nada a declarar, burocracia, preenchimento do diário de classe,
avaliação e conselho de classe.
111

Tabela 13 - Atividades realizadas no trabalho considerada prazerosa e considerada menos prazerosa

Atividades prazerosas Frequência Atividades menos prazerosas Frequência


Atividades lúdicas, artes, contação de
Sistema Tagnos/alimentação de dados na
histórias, atividades com 50 19
plataforma
alunos/coletivas
Ensinar/Ser formadora/ministrar e
planejar aulas /elaborar as aulas/atender 50 Nada a declarar 17
os alunos
Projetos, planejamento, eventos ou Burocracia/preenchimento do diário de
16 16
reuniões pedagógicos/inovação classe/avaliação/conselho de classe
Atividades que envolvam familiares/ Atividades online/gravar vídeos/ Pandemia/
15 14
atender bem alunos e os pais Uso do celular para auxiliar as atividades
Formação/desenvolvimento pessoal e Desinteresse dos alunos/indisciplina/busca
5 11
profissional ativa (pandemia)
Bom relacionamento com a direção,
4 Desinteresse dos pais/falta de comunicação 11
coordenação, apoio
Bem estar dos
4 Reuniões virtuais / Reuniões sem objetivos 9
alunos/desenvolvimento/feedback
Falta de apoio e compreensão/
Todas/amo o que faço 3 9
intransigência/pressão/organização/arrogância
Troca de experiências 3 Falta de recursos materiais/internet/estrutura 8
Trabalho docente/dar aula/ aula inglês e
Nada a declarar/nenhuma 2 4
história /ficar em sala/aula final de semana
Momentos de descontração 2 Jornada Pedagógica/ escalas 3
Ser cooperativa 1 Planejamentos repetitivos 2
Atendimento ao aluno especial 1 Capacitações/formações impróprias 2
Atividades externas 1 Falta de autonomia 1
Cuidado com a higiene como um todo 1 Política partidária 1
Formas / promoção para adquirir materiais
Dia a dia, cotidiano 1 1
para a instituição
Coordenar atividades 1 Acordar cedo 1
Salário 1
Desvalorização/desmotivação 1
Atividades que utilizam materiais impressos,
1
exposição e confecções

Total 160 Total 152


Fonte: Freire, 2023.

Entre as atividades registradas como as mais prazerosas, identificamos as que


envolvem a finalidade da ação educativa e o papel do professor como mediador na constituição
do aluno enquanto ser humano em desenvolvimento. As atividades lúdicas, artes, contação de
histórias, atividades com alunos, coletivas, ensinar, ser formadora, ministrar e planejar aulas,
elaborar as aulas, atender os alunos e projetos, planejamento, eventos ou reuniões pedagógicas
e inovação aparecem com maior frequência entre as tidas como prazerosas.
O sujeito professor, ao passar por formações, ao se constituir sujeito (Eu) e profissional
(Professor), objetiva a satisfação no desempenho de sua função e compreende a importância de
sua atividade na vida de outro ser humano, bem como as ações de outrem em sua vida. Essas
ações partem das relações estabelecidas durante sua vida e fazem parte do processo de
112

constituição de sua personalidade e concorrem para a realização da sua atividade e


desenvolvimento de todos à sua volta.
A atividade humana, por ser objetivadora, social, e consciente, realiza o processo
histórico de constituição do gênero humano, pelo qual e no qual o homem se apropria
de todas as forças essenciais da natureza, constrói e significa os objetos atribuindo-
lhes funções histórico-sociais a serem também apropriadas – promove a
universalização humana (MARTINS, 2015b, p. 44).

Sob esse foco, Moretti e Moura (2012) revelam a formação do ser humano e todos os
subsídios existentes no contexto escolar que permeiam das relações, e percebem que esse
processo se dá no decorrer do desempenho de sua atividade e vai revelando sua finalidade que
depende da qualidade de suas ações, e de tudo que compõem o contexto escolar e suas
interdependências.
A constância da motivação, do prazer na atividade docente contribui para a realização
de uma função consciente e emancipadora, e com satisfação e agrado, a ação envolve todos os
aspectos do ser humano. Ao realizar sua atividade com a finalidade real da educação que é a de
mediar o conhecimento, contribuir para o desenvolvimento do ser humano, o professor trabalha
para além do recebimento do seu salário, mas também, para alcançar a finalidade do seu objeto
de trabalho, a experiencia de conhecer e aprimorar o novo, situação vivenciada pelo aluno por
meio do trabalho docente que possibilita constante e contínuo aprendizado de todos envolvidos
nesse processo.
O professor, ao elaborar e desenvolver sua atividade docente, constrói sentidos sobre
os conteúdos que se apropria e os carrega consigo ao trabalhar com seus alunos. Se
esses sentidos estão próximos ao significado social da Educação de apropriação de
conhecimentos e formação de sujeitos, maiores chances se têm de que as ações de
ensino se configurarem em atividade, para além do exercício de um trabalho que vise
apenas a remuneração salarial (PESSOA, 2019, p. 4).

Não só consciente e emancipadora, a atividade pautada no sentido que lhe é atribuído


pelo docente pode ser também criativa e crítica, pois integra elementos essenciais que
possibilitam alcançar a satisfação a partir de sua execução que pode ocorrer de diferentes
maneiras tendo como objetivos propiciar aos alunos a autonomia, a criatividade, desenvolver
novas habilidades, concentração, percepção, entre outros fatores importantes no processo de
ensino-aprendizagem (REBOLO; BUENO, 2014, p. 327).
A docência tem ainda a seu favor o fato de envolver o uso de diversas habilidades que,
embora diferenciadas, não são dissonantes entre si, além de permitir o ‘desligamento’,
ou certo distanciamento, dos problemas cotidianos e a chance de o professor fazer
escolhas e ter certo controle sobre o processo de trabalho (REBOLO; BUENO, 2014,
p. 327).

Diante dessas considerações, Bendassoll e Gondim (2014) descrevem sentido e


significado no processo de trabalho, declarando que o significando surge a partir do
compartilhamento do grupo, pensando na coesão e adesão, quanto ao sentido, pode ser
113

entendido na individualidade, independência, na apropriação singular do significado. E a


função psicológica do trabalho, pode ser compreendida na articulação do sentido e significado
que é orientada por meio da atividade e consciência humana.
É pertinente defender que o sistema escolar transfere ao profissional a responsabilidade
de cobrir as lacunas existentes da instituição, a qual estabelece mecanismos rígidos e
redundantes de avaliação e contrata um efetivo insuficiente, entre outras ações (GASPARINI;
BARRETO; ASSUNÇÃO, 2005a). Além disso, a precariedade das condições de trabalho do
docente se associa a fatores físicos, administrativos, relacionais, pessoais e éticos, em uma
realidade que compõe um cenário de esgotamento físico e mental do docente (CASTRO, 2020).
É comum constatar que, como resultado do excesso de trabalho muitos professores
não usam sequer o quadro-negro, limitando-se a, sentados ditar a matéria para os
alunos. A estafa também determina que o tempo das aulas seja subutilizado,
desperdiçado muito dele para fazer a chamada, passar de uma classe para a outra,
conversar sobre assuntos não relativos à matéria (SILVA; ROSSO, 2008, p. 2046).

Cantarelli, Facci e Campos, (2017) refletem que, “[...] no professor, o trabalho


pedagógico, por exemplo, deveria ser a mola mestra que impulsiona o desenvolvimento de suas
potencialidades – muito embora isso nem sempre ocorra, devido ao processo de alienação”.
Especificamente na educação, há uma cobrança de que os produtos rentáveis da
atividade sejam mensurados através de notas, controle de evasão ou outras ações que
pragmaticamente provem a utilidade e a produtividade do investimento (HASHIZUME, 2020).

Preenchimento do tagnos (o programa é horrível), busca ativa (a gente precisa meio


que implorar para os pais fazerem as atividades, ir na casa. Acho muito desgastante
para o professor (Resposta A)14.

A falta de organização, o excesso de trabalho burocrático, o prejuízo nas relações são


algumas situações que podem ocasionar a perda da motivação, interesse da atividade docente,
resultando no desprazer. A sobrecarga, além de ocasionar o desagrado da atividade, ainda impõe
a constante busca de indicadores. Toda essa conjuntura gera a perda do estímulo do trabalho
docente, que não mais seguem seus fins, prejudicando a compreensão psíquica da atividade,
resultando no desgosto em trabalhar.

Atividades que envolvem muitos documentos e burocracia; conversar com


pais/familiares que não entendem/se interessam pelas dificuldades de seus filhos
(Resposta B).

A organização do trabalho, as condições e as atividades desenvolvidas são fatores


importantes de investigação do contexto escolar. Trata se de uma categoria com elevado índice

14
Ao longo do trabalho, estão transcritas algumas respostas dissertativas contidas no questionário. Por não haver
qualquer identificação, estão apresentadas em ordem alfabéticas.
114

de profissionais, onde os estudos podem apontar as alternativas possíveis e reais que venham a
contribuir para a melhora e valorização dessa profissão.
A desvalorização profissional, baixa auto-estima e ausência de resultados percebidos
no trabalho docente são fatores importantes a serem investigados no âmbito do
profissional em educação. Além disso, existem queixas muito freqüentes relacionadas
à saúde dos docentes como distúrbios psíquicos, associada ao trabalho repetitivo,
insatisfação no desempenho das atividades, ambiente intranqüilo e estressante,
desgaste na relação professor/aluno, falta de autonomia no planejamento das
atividades, ritmo acelerado de trabalho e à pressão da direção (SILVA; ROSSO, 2008,
p. 2043).

Facci, Urt e Barros (2018) analisam o quanto as condições podem prejudicar a prática
docente, pois não permitem que a ação seja realizada pautada na sua essência, que seria ensinar,
isso devido as condições que lhes são apresentadas. Esse caminho os leva a adoecer por terem
clareza da finalidade de suas funções, mas que não conseguem realizá-las de fato, apesar de
perceberem que mesmo assim é possível o aluno aprender.
Gostam dos alunos, ficam felizes quando eles aprendem, mas as condições de trabalho
não possibilitam que eles se vejam como fazendo parte do processo; são apenas apêndices
(FACCI; URT; BARROS, 2018, p. 284-285).
Diante o exposto, é notório o quanto as condições influenciam na maneira do professor
desenvolver seu trabalho e como podem leva-lo a sentir prazer ou não. interfere diretamente na
ação, no processo e resultado, limita-os de serem criativos e autônomos, geram angustias e por
vezes o levam a duvidar de suas próprias possibilidades de mediar o conhecimento, podem
provocar o aparecimento de sentimentos negativos, como os de incapacidade, inutilidade.
Assim, o conceito de atividade está necessariamente ligado ao conceito de motivo.
Não existe atividade sem motivo; atividade não motivadora! Não há atividade desprovida de
motivo, mas pode haver atividade com motivo subjetiva ou objetivamente oculto (LEONTIEV,
2021).

3.4.3 Visão sobre o trabalho docente


Para abranger totalmente o processo integral da educação
e apresentar à luz da psicologia todos os principais
aspectos de seu transcurso, também é preciso levar em
conta a psicologia do trabalho docente e mostrar a que leis
ela está sujeita (VIGOTSKI, 2003).

Esse eixo trata da visão do professor sobre a atividade docente. Assim organizamos os
temas para investigação: se gosta do trabalho; os motivos que justifiquem gostar do trabalho;
se pudesse mudaria de profissão; caso sua resposta for sim, para qual profissão? Por quê? (tabela
14)
115

Alguns deles são: gostar de estar com as crianças, ver o seu desenvolvimento,
formação, crescimento intelectual, moral e útil, sentir-se realizado profissional e pessoalmente,
identificar-se com o que faz, gostar de ser professor e ensinar/transmitir conhecimento, ter um
ambiente acolhedor, com amigos, acreditar na educação como forma de mudar o mundo,
apreciar desafios e competição.

Tabela 14 - Gosta do trabalho? Motivos que justifiquem gostar do trabalho


Sim 112 (94%)
Não 3 (3%)
Razoável/maior parte das vezes sim 3 (3%)
Motivos Frequência
Gosto de estar com as crianças/ Gosto de ver o
20
desenvolvimento/formação/crescimento intelectual e moral/útil
Amo o que faço 19
Sim/Gosto 14
Realização profissional/pessoal/identificação 11
Gosto de ser professor/ não vejo outra coisa a fazer/motivador 9
Gosto de ensinar/transmitir conhecimento/dar aula 8
Ambiente acolhedor/amigos 8
Prazer no que faço/orgulho 7
Acredito na educação como forma de mudar o mundo/ mudança 4
Vocação 4
Gosto dos desafios 3
Não gosto/faço o melhor/falta de valorização e reconhecimento/falta estrutura 3
Por ter exemplos na família da profissão 3
Bem remunerada/ respeitado 2
Aprendo com o meu trabalho 1
Apesar de ver situações que não condizem com o papel do professor/da falta de
1
compromisso/estimulo na competição
Carinho dos alunos/retorno 1
Total 118
Fonte: Freire, 2022.

O sentido da ação é determinado por aquilo a que visa o agente e pela sua referência à
conduta dos outros, isto é, compartilhada por outros, dando-lhe significado (BENDASOLLI;
GONDIM, 2014).

Sim, eu gosto de ser educadora, porém não estou confortável com este modelo de
educação que está sendo ofertado, crianças pequenas são induzidas à competição,
comunidade escolar é condicionada a participar desde que receba algo em troca, seja
um prêmio ou um status. Professores são selecionados e destacados como de
excelência. Outros acabam nem tendo condições de participar. Vejo que esta educação
acaba sendo muitas vezes injusta e excludente. E principalmente a sociedade e muitos
professores acabam se esquecendo que nosso maior compromisso tem que ser com a
educação, e nosso maior prêmio é ter um processo de ensino e aprendizagem que
garantam o desenvolvimento integral dos envolvidos. (Resposta C)

A satisfação em ser professor é um misto de sentimentos e perspectivas que os


preparam e os envolvem na atividade docente desde o início, que constituídos de vários sentidos
desde o aprender ao ensinar. Assim, materializa-se o processo de inserção do professor nas
116

escolas, carregando sentimentos, sensações, afetos e aspectos subjetivos que os levam a se


consolidarem professores diante da complexidade dessa profissão (MORAIS, 2019, p. 305).
Sim. Apesar das dificuldades, é muito bom saber que estou contribuindo para a
formação integral das crianças, algo que fará bem a elas e a toda a sociedade.
(Resposta D).

O professor ocupa um papel fundamental no desempenho do aluno. Por meio da sua


mediação gera o interesse, colabora para o desenvolvimento das habilidades, aptidões e
interesses do educando, vai além das paredes da sala de aula. O gostar da profissão, por assim
dizer, estabelece uma relação propulsora, estimuladora, que assegura aos professores e alunos
aprendizados da vida e para vida.
A formação do professor não passa apenas por sua competência técnica, mas também
por sua competência em termos de distinguir os conhecimentos necessários ao homem
na sociedade atual. São esses os requisitos básicos que permitem ao educador explorar
seus limites e possibilidades, de forma que sua prática imediata seja consequente e
incorpore uma compreensão das tendências históricas da sociedade contemporânea.
Para ensinar não é suficiente conhecer os conteúdos, é preciso saber o que seja a
educação e como se configura quanto ao homem educar e quanto ao projeto de uma
sociedade justa e desenvolvida (FUNGHETTO; NETTO, 2005, p. 6).

A consciência sobre o próprio trabalho permite manter a motivação e o prazer em seu


exercício, e gostar da docência são resultados da satisfação na atividade, e que podem contribuir
para a instrumentalização do professor para saber lidar com as adversidades e dificuldades da
profissão, das condições que lhe são apresentadas. Nesse viés, reportamo-nos a Leontiev
(2021):
Psicologicamente, ou seja, no sistema da consciência do sujeito, e não como seu objeto
ou produto, os significados em geral não existem de outra forma senão na realização
de determinados sentidos, assim como suas ações e operações não existem senão na
realização de determinada atividade, estimulada por um motivo ou necessidade. Outro
aspeto é que o sentido pessoal é sempre um sentido de algo: um sentido “puro”,
imaterial, é tão absurdo quanto uma criatura imaterial (LEONTIEV, 2021, p. 173).

Ao serem questionados se mudariam de profissão, obtivemos 25 respostas,


apresentadas na Tabela 15.

Tabela 15 - Se pudesse, mudaria de profissão? Caso sua resposta for sim, para qual profissão?
Por que?
Sim 22 (19%)
Não 96 (81%)
Respostas
1. Músico. Por conveniência.
2. Estou satisfeita
3. Professora de Universidade. Porque é o meu sonho, sempre gostei muito de falar.
4. Alguma profissão relacionada à área administrativa. Também me identifico.
5. Arquitetura
6. Não mudaria de profissão, mas se pudesse eu mudaria a forma desrespeitosa, desumana, injusta,
competitiva, repressiva que a educação vem sendo compreendida e tratada.
7. Medicina
8. Uma que trabalhasse com plantas ou animais. Trabalhar com pessoas é muito estressante
9. Medicina Veterinária, pois amo animais
117

10. Ainda não sei


11. Terapeuta, porque percebo que eu cresci muito neste sentido. No entanto, percebo hoje que a
educação precisa mais deste olhar humano e nós, enquanto profissionais, precisamos trabalhar nossas
questões pra acolher o nosso aluno.
12. Bombeiro
13. Odontologia. Profissão que sempre quis, mas não pude fazer pois não tenho condições financeiras.
14. Empreendedorismo
15. Serviços manuais e também culinária
16. Arquitetura. Gosto de construções e viajo nos desenhos.
17. Assistente administrativo, contábil ou de RH.
18. Area da saúde
19. Não se aplica.
20. Atuar somente como Ator ou professor da UEMS. Como curso de Artes Cênicas
profissionalizante.
21. Enfermagem. Realização de um sonho de infância.
22. Ainda não sei, mas por um trabalho que exija menos esforço físico e estresse. Mas isso não é de
imediato.
23. Concurso de nível federal.
24. Medica
25. Veterinária, gosto de animais.
Fonte: Freire, 2022.

Como já mencionado, a educação é um assunto amplo e dinâmico, que dá margem a


inúmeras pesquisas, sob diferentes enfoques. Entre as diversas possibilidades está a identidade
do professor, sujeito integrante e participativo no processo de desenvolvimento humano. O fato
do ser humano pensar em mudar de profissão, é o resultado da insatisfação em realizar a
atividade, das poucas ou nenhumas perspectivas, da desmotivação, do desprazer. Esses
pensamentos podem ser decorrentes de vários motivos, mas que com certeza engloba a
decepção, o cansaço e/ou desânimo de tentar lutar contra um sistema que pouco se importa com
a educação.
O tema da identidade na educação, vem se configurando cada vez mais como
emergente e necessário, tendo em vista a própria condição mutável e existencial da
essência humana, como em decorrência das transformações que são impulsionadas
pela sociedade na vida das pessoas, e nesse contexto específico, na vida dos/as
professores/as, os quais sofrem os impactos e metamorfoses do meio circundante, em
diferentes espaços e tempos históricos, e que acabam trazendo implicações no ser
pessoa e profissional, o qual vai se constituindo, paulatinamente (MORAIS, 2019, p.
306).

Escolher a profissão para atuar não é uma tarefa fácil, vários aspectos precisam ser
considerados, entre eles os subjetivos que envolvem os desejos, os motivos que impulsionam o
ser humano a se formar, a se capacitar e transformar a si e aos outros. Mas, diante as dificuldades
encontradas e as impossibilidades de exercer sua profissão, o professor se depara com a
decepção e não se percebe mais como agente capaz de produzir mudanças e mediar os
conhecimentos. Essa sensação de não pertencimento gera o sofrimento e por muitas resulta no
adoecimento. Ao se deparar com a insatisfação e surgir a possibilidade de se pensar em mudar
de profissão, quando não o faz, o professor passa então a silenciar suas percepções quanto a si
e ao seu trabalho.
118

Escolher a profissão de professor implica um grande desafio, principalmente porque


o professor tem que estar atualizado e olhando para o futuro. Muitas vezes, o professor
sabe que tem condições de realizar muito mais do que exige a programação escolar,
mas nem sempre consegue alcançar tais realizações (ESCARABOTO, 2007, p. 134)

Araújo e Purificação (2021) discutem sobre a distorção da imagem social do professor


criada pela visão mercantilista de classes dominantes. Nesta visão, o professor é importante na
formação dos jovens, para que sejam inseridos no mercado de trabalho, sem capacidade de
refletir e intervir nas demandas sociais. Ademais, percebem que muitos permanecem nessa
profissão devido à falta de outras oportunidades, ou porque justificam por ser vocação, paixão,
como se fosse a atividade do qual foi predestinado.
Procura-se associar o trabalho do professor a uma atividade celestial, que deve ser
realizada por amor, sem pensar em compensação social ou financeira. Como se o
professor fosse um beato obrigado a ter voto de pobreza e “castidade social”. A
desvalorização profissional, o desprestígio social e as péssimas condições de trabalho
são as mais recorrentes tentativas de explicação para sanar os questionamentos
apontados em relação à cada vez mais escassa presença de professores jovens nas
escolas de ensino primário e médio (ARAUJO; PURIFICAÇÃO, 2021, p. 2).

Ainda não sei, mas por um trabalho que exija menos esforço físico e estresse. Mas
isso não é de imediato. (Resposta E)

O fato de 22 (19%) professores terem respondido que mudariam de profissão pode ser
a perda do sentido pessoal, da motivação na sua atividade. Diversos fatores podem contribuir
para esse fim, mas o que podemos certificar é a perda do prazer. O ser humano baseia sua
atividade na relação com o meio, os objetivos, os motivos. Quando não há a confirmação das
ideias iniciais, principais, perde-se o significado. O sentido e o significado não podem ser
separados. Caso isso aconteça, resultará no rompimento da estrutura interna da consciência
(MARTINS, 2004; PESSOA; LEONARDO, 2020).
Por meio do trabalho, o ser humano se relaciona com a sociedade e pode desenvolver
suas potencialidades. Não é isso o que sempre ocorre na sociedade capitalista, devido à
alienação, mas esta deveria ser uma possibilidade indissolúvel do campo de atuação profissional
(FACCI; URT; BARROS, 2018).
De maneira geral, o desejo de mudar de profissão nada mais é que o resultado de um
processo de desmotivação, desinteresse, de relações geradoras de ansiedade, angústias, estresse
e perda da consciência. Ainda nesse cenário, Araújo e Purificação (2021) citam dados de uma
pesquisa da Fundação Victor Civita, realizada por Ratier e Salla em 2013, sobre os inúmeros
fatores vinculados ao desinteresse na profissão docente:
Dentre os motivos desta mudança de ambição estão o desinteresse e a falta de apreço
por parte dos colegas, as pressões e o estresse causados pela constante cobrança de
melhoria no desempenho (como se o culpado fosse somente o professor, e não toda a
engrenagem educacional), a falta de remuneração digna e de um plano de carreira que
garanta ao profissional o reconhecimento pelos serviços prestados. Tudo isso fez os
119

poucos jovens que sonhavam com a docência abdicarem de sua vontade e seguir a
tendência das profissões que oferecem maior prestígio social e bons salários
(ARAÚJO; PURIFICAÇÃO, 2021, p. 5).

Portanto, ao desempenhar a sua função sem o real motivo que o levou à escolha da
profissão, o professor perde o entusiasmo em realizar sua atividade, e o fazer por fazer acarreta
no sofrimento/adoecimento respectivo a alienação, pois não há satisfação em sua atividade, o
que o leva por vezes, a procurar, em outras atividades, a satisfação que atribua razão às suas
ações.
O sujeito desenvolve as formas superiores de sua conduta por meio de sua atividade,
apropriando-se dos conteúdos da cultura humana e objetivando-se em novos produtos
sociais e culturais. No contexto educacional, a atividade aqui mencionada se configura
enquanto atividade de ensino, que é o objeto de trabalho do professor.
O significado da atividade do professor é a ação de ensinar e de conduzir o processo
de apropriação do conhecimento do aluno. Quando há a ruptura entre o significado
social e o sentido pessoal, provocado pelas crises sociais, caracterizada pela
consciência humana alienada, não se estabelece o alicerce subjetivo construído por
essa dinâmica (SANTOS; URT; VITAL, 2017, p. 78).

Importante nos atentarmos que muitos profissionais não mudam de profissão por terem
deixado de gostar do trabalho da noite para o dia, mas na grande maioria é a desmotivação, o
desencanto, as decepções, a desvalorização que os levam a pensar em algo menos estressante,
que cause menos frustração e angustias. Quando o profissional tem a percepção que sua função
que lhe causa sofrimento/adoecimento, ele pode agir de várias maneiras. Uma das possíveis
alternativas é a mudança de profissão, procura não continuar exercendo mais uma função
geradora de sofrimento/adoecimento. Outra possibilidade, pode ser que ele permaneça
realizando a mesma atividade e silenciar suas dores, suas angustias e sofrer ao ponto de adoecer,
alienar se conscientemente.

3.4.4 A visão sobre o adoecimento do docente

A forma mais fácil e simples de esclarecer os


mecanismos do processo do pensamento e da vontade,
antes descritos, é o exemplo particular da linguagem,
que constitui o elemento básico realizado por nosso
pensamento como sistema de organização interna da
experiência (VIGOTSKI, 2003, p. 169).

Neste eixo, versamos sobre a visão do professor no que tange ao


sofrimento/adoecimento docente. Para reunir e analisar as respostas, organizamos os temas da
seguinte maneira: Se possui algum problema de saúde; caso tenha respondido Sim, qual; seu
problema de saúde é anterior ou posterior ao início da sua atividade profissional; você tem
alguma hipótese sobre os motivos do seu adoecimento? Caso tenha respondido que tem algum
problema de saúde, quais; há situações específicas em que sua doença se manifesta? Caso tenha
120

respondido que tem algum problema de saúde, quais; Solicitação de afastamento do trabalho
por razões de saúde nos últimos 12 meses; Caso afirmativo, quantas vezes nos últimos 12
meses? Se sim, por quanto tempo ficou afastado; Toma ou tomou algum medicamento nos
últimos 12 meses; Caso sim, qual medicamento; Efeito positivo do medicamento; Efeito
negativo do medicamento; Você considera que os problemas de saúde enfrentados causam
prejuízo à sua atividade profissional; considerações sobre os prejuízos na atividade devido aos
problemas de saúde; Considera que a atividade docente pode ter provocado seu problema de
saúde; Se sim, como o trabalho pode ter causado seu problema de saúde;
Iniciamos sobre a percepção e a consciência do adoecimento docente perguntando
aos participantes se possuem algum problema de saúde. Pedimos aos participantes que
responderam ter problema de saúde que informassem qual seria. Importante ressaltar que o
número de doenças especificadas não é o mesmo das respostas afirmativas para sim, porque
há professores com mais de um problema de saúde. (Tabela 16).

Tabela 16 – Possui problema de saúde? Caso tenha respondido Sim, qual?


Sim 49 (42%)
Não 69 (58%)
Respostas Frequência
Pressão alta/hipertensão 16
Depressão/ Crises de ansiedade/ Transtorno de ansiedade /Síndrome do pânico 16
Diabetes 7
Lesão na coluna, cervical e lombar/ Lombalgia/ Desgaste na coluna/ Escoliose 6
Sinusite/rinite 4
Doença autoimune/Fibromialgia/ Vitiligo 4
Asma crônica, Bronquite Asmática/ Bronquite 3
hérnia de disco 2
Síndrome do Túnel do carpo (Dormência e formigamento na mão e no braço causados por
2
um nervo comprimido no punho) / LER
Hipotireoidismo/Tireoide 2
Obesidade 2
Transtorno Afetivo Bipolar 1
Ceratocone (visão) 1
Enxaqueca. 1
Artrite/Bursite 1
Adenomiose (Condição em que tecido endometrial cresce na parede uterina) 1
Em recuperação (sem especificação) 1
Tendinite (pé) 1
Gastrite nervosa 1
Cardiomiopatia 1
Dermatose 1
Labirintite 1
“Não vou falar sobre o assunto, é muito pessoal” 1
artrite reumática 1
Total 77
Fonte: Freire, 2023

Mota (2012) assinala como a saúde docente vem sendo objeto de estudos e da
importância de elaboração de políticas públicas e cuidado quanto ao adoecimento, e enfatiza
que os dados que estão sendo gerados são reveladores, pois vêm rompendo o silêncio sobre
todos os dissabores vividos pelos professores e apresentam os fatores de risco que os
professores estão expostos.
121

A questão da saúde docente, já se mostra como um campo profícuo de investigação


científica, com possibilidades diversas de abordagem, e que pode vir a ser fértil em
elementos, que possibilitem a elaboração de políticas públicas inovadoras, no sentido da
prevenção e da humanização das condições de trabalho docente (MOTA, 2012, p. 25).

Souza (2017) descreve as precariedades do trabalho docente e o quanto contribuem


para o adoecimento, e envolto a muitos questionamentos sobre a organização do trabalho nessa
sociedade neoliberal, discorre sobre as inúmeras condições de trabalho desfavoráveis, os
vínculos precários e as constantes perdas que permeiam o professor.
A categoria práxis revela o ser humano como ser criativo e autoprodutivo. Ser da
práxis, o ser humano é produto e criação de sua autoatividade, ele é o que (se) fez e
(se) faz. Se as condições de trabalho são precárias, o ser humano que se produz nessas
condições é um ser humano empobrecido enquanto ser portador de capacidades
humanas; meramente reduzido à animalidade da reprodução física – comer, beber,
dormir – ou seja, mero reprodutor de força de trabalho (SOUZA, 2017, p. 177).

Além do mais, a forma como a sociedade debruça sobre o professor as cobranças e os


vários índices a serem alcançados, a organização desorganizada, os levam a terem sentimentos
ambíguos quanto a profissão exercida, e essa relação dos sentimentos apesar de algum momento
serem naturais do ser humano, ora sentir prazer, ora estar desanimados, se torna patológico à
medida que o descontentamento prevalece devido a percepção do professor diante suas próprias
condições perante as condições a ele impostas.
Não é difícil entendermos o processo histórico e dialético que acarretou tais extremos.
A partir do século XVIII, o trabalho docente ganhou novo formato, mantendo a ordem
capitalista, pautando-se na mais valia e na competição, acarretando salários
desvalorizados, extenuante jornada de trabalho e uma maior exposição dos
professores a fatores de risco (WEBBER; VERGANI, 2010, p. 8809).

Essas condições, podem influenciar de forma direta ou indireta o


sofrimento/adoecimento psíquico, e os estudos que vem revelando as consequências para saúde
do professor devido as condições desfavoráveis, os desprazeres, apontam para uma semelhança
nas sequelas a saúde do professor.
Ao encontro do nosso estudo, Baião e Cunha (2013) verificaram, por meio de uma
revisão de literatura, que as disfunções que tiveram maior destaque foram estresse e exaustão
emocional, seguidas de distúrbios da voz e distúrbios musculoesqueléticos, síndrome de
Burnout, depressão e Hipertensão Arterial, e como fatores desencadeantes do adoecimento,
estão a carga horária elevada, condições de trabalho e dupla jornada e falta de lazer. O
adoecimento e desgaste físico do professor advêm da sua atividade e forma que esta é realizada,
levando em conta o excesso de trabalho e agentes estressores persistentes (BAIÃO; CUNHA,
2013, p. 18).
Essas informações também são apontadas por Gouvêa (2016), ao expressar que vários
outros estudos com base em dados de órgãos oficiais de perícia médica apontam a prevalência,
122

entre os professores, dos transtornos mentais e comportamentais como os principais motivos de


afastamento do trabalho, seguidos pelos transtornos da voz e pelas doenças osteomusculares.
Fonseca et al. (2009) salientam que o que se pode inferir por meio de pesquisas sobre
o tema, é que o risco de desenvolvimento da hipertensão arterial e da reatividade cardiovascular
parece ser influenciado por fatores emocionais como impulsividade, hostilidade, estressores,
ansiedade e raiva. Em contrapartida, Rebolo et al. (2020) realçam que as patologias que surgem
com maior prevalência, de 29%, são descritas como transtornos mentais comuns (TCM), 26%
lesões vocais ou de voz, 18% síndrome de Burnout, 17% problemas musculares, 4% problemas
auditivos e 9% outros problemas.
Diante das exigências, do excesso de burocracias, de condições desfavoráveis e
relações humanas desumanas, o professor passa a desenvolver percepções negativas quanto a
si e quanto a sua atividade, se sente desprovido de conhecimento e de capacidades, gerando
sentimentos de inaptidão. Essas sensações vão tornando se presentes no dia a dia do professor
e sem expressar, ele toma para si os sentimentos e percepções negativas e desencadeia o
sofrimento/adoecimento.
O professor sente que é alguém improdutivo, que não tem competência. O trabalho
em sala de aula, as pressões postas, as cobranças, as dificuldades de lidar com o aluno
são tão grandes, que ele incorpora a noção de incapacidade e adoece diante do trabalho
que quer executar. Não é necessário que alguém fale que ele não está conseguindo
realizar a tarefa proposta. Ele mesmo se sente ameaçado diante dos alunos, dos pais,
não consegue lidar mais com o cotidiano, o que leva ao adoecimento (FACCI; URT;
BARROS, 2018, p. 285).

Na tabela 17, vemos as respostas dos participantes quanto ao fato de o problema de


saúde ser anterior ou posterior ao início da atividade profissional.

Tabela 17 - Seu problema de saúde é anterior ou posterior ao início da sua atividade


profissional?
Não se aplica 61 (52%)
Posterior 31 (26%)
Anterior 17 (14%)
Não tenho problema de saúde 09 (8%)
Total 118
Fonte: Freire, 2022

Apesar de a maioria dos participantes declarar que não se aplica o problema de saúde
anterior ou posterior à atividade profissional, o segundo maior resultado aponta que sim, que o
problema de saúde é posterior ao início da atividade. Segundo Silva e Rosso (2008, p. 2050):
“[...] o desgaste dos professores é determinado em boa parte, pela carga horária, natureza da
atividade, pela forma de organização do seu trabalho, bem como todo o sistema burocrático que
é imposto aos docentes, implicando no processo político-pedagógico”. Dessa maneira,
conforme complementado pelos autores:
123

A intensificação do trabalho docente pode contribuir para o aumento de uma


desqualificação intelectual do docente, pois, ao ter que cumprir mais essas tarefas,
reduz o seu tempo disponível para estudos individuais ou em grupos, participação em
cursos e outros recursos que possam contribuir para a sua qualificação e favorecer o
desenvolvimento profissional (SILVA; ROSSO, 2008 p. 2050).

Em complemento, Souza (2017) esclarece que a divisão social do trabalho e a


propriedade privada são as bases materiais do capitalismo, são características das sociedades
de classes. O produto, resultado do trabalho do trabalhador (a) pertence ao seu patrão e não a
ele que o executou.
A forma como o trabalho está organizado é responsável pela maneira que o ser humano
se vê, e mesmo tendo a consciência, enquanto percepção do modo que está inserido nessa
sociedade e nas relações nela existente que o leva a se silenciar para poder atender suas
necessidades básicas, excluindo as suas necessidades subjetivas.
Cantarelli, Facci e Campos (2017) consideram que esse problema é um reflexo, na
subjetividade do sujeito, da forma como a atual organização da base material incide sobre a
ideação e as condições de sua objetivação:
O ser humano se constitui nas e pelas relações que estabelece com o mundo físico e
social, com vistas a atender as suas necessidades.
Para que se possa compreender o processo de objetivação/ apropriação, é preciso
assinalar que a consciência é constituída também pela linguagem. Por meio dela os
homens se apropriam dos significados dados socialmente (CANTARELLI; FACCI;
CAMPOS, 2017, p. 31).

A percepção da situação e a ausência de algumas habilidades, como por exemplo


conseguir se expressar, para lidar com as divergências são essenciais para que o professor
perceba as circunstâncias que ocasionam o sofrimento/adoecimento psíquico, e mais, para que
possam compreender que não são responsáveis pelos resultados frente a tantas condições
impróprias para e na execução de suas atividades. O fato de o professor perceber essas
condições e toda contrariedade que envolve o seu trabalho geram conflitos e angustias que não
são demonstradas devido a inúmeros motivos, entre eles o medo de retaliações, desemprego,
julgamentos, até mesmo a vergonha de expor seus sentimentos acarretam no
sofrimento/adoecimento.
Sentem-se adoecidos, sofrem, mas ainda pensam que a culpa é deles. Sentem
vergonha, choram quando falam da situação, principalmente no caso dos transtornos
psíquicos, que são os mais difíceis de serem compreendidos pelos demais professores
e mesmo por especialistas, no caso das perícias. Sentimentos contraditórios permeiam
a atividade profissional desses professores (FACCI; URT; BARROS, 2018, p. 288).

O contexto envolvendo a insatisfação causam a perda do prazer em realizar a atividade,


mesmo percebendo tudo a sua volta, o professor desempenha a atividade de maneira alienada
porque apesar de perder os desejos, motivos subjetivos da sua ação, precisa se manter
trabalhando para sobreviver, e é nesse processo que ao silenciar suas emoções, suas angústias
124

o leva ao sofrimento/adoecimento psíquico, pois o professor tem noção da real situação, do


contexto que está inserido e desenvolvendo sua atividade.
Esta contradição entre o sentido e o significado apresenta o esvaziamento da atividade
docente, na medida em que os professores estão adoecendo e afastando-se das práticas
pedagógicas, ou seja, da atividade que os caracteriza e proporciona o sentido pessoal
de ser professor (SANTOS; URT; VITAL, 2017, p. 81-82).

As hipóteses sobre os motivos do adoecimento (Tabela 18) foram descritas por 50


participantes. Em se tratando de situações específicas quanto à manifestação da doença, houve
uma frequência de 45 respostas:

Atividades estressantes, sobrecarga de trabalho, ausência de lazer, cobrança rígida,


atividades diárias: correções de atividades, escrita em quadro, violência escolar.
(Resposta F).

Tabela 18 – hipótese sobre o adoecimento e situações que pode manifestar a doença


Alguma hipótese sobre os motivos do Situações específicas em que sua doença
Frequência Frequência
seu adoecimento se manifesta
Hereditariedade 9 Excesso de trabalho /prazos 12
Não tenho nenhuma hipótese 8 Ansiedade / nevoso/ estresse 10
Desgaste mental/ Busca pela perfeição
7 Clima 8
/ansiedade/ estresse
Excesso de trabalho/ ambiente de Situações específicas como sair de casa,
7 4
trabalho ficar em casa
Falta de cuidados com a alimentação /
4 Não tem situações específicas 3
Sedentarismo
Dificuldade de me expressar / lidar com
2 Má alimentação 3
as emoções
Desorganização com o tempo 2 Postura durante a atividade laboral 2
Pandemia 2 Problemas familiares/ pessoais 1
Má postura 2 Falecimento decorrente da COVID-19 1
Devido a outros problemas de saúde 2 Relacionamento com colegas de trabalho 1
Violência na escola 1
Infância 1
Perda de familiares 1
Problemas pessoais 1
Mudança de estado/cidade 1
Total 50 Total 45
Fonte: Freire, 2022

“Cobrança maçante, em relação a prazos de finalização de bimestre, difícil


aprendizagem por parte do aluno, irresponsabilidade da família,
dos pais em relação ao auxílio no processo ensino e aprendizagem do filho”. (Resposta
G).

No que tange às hipóteses sobre os motivos do adoecimento, as quatro maiores


frequências englobam as questões biológicas (hereditariedade), como também as respostas que
não indicam nenhuma hipótese e as desenvolvidas a partir das relações (meio/atividade), tais
como: desgaste mental, busca pela perfeição, ansiedade, estresse e excesso de trabalho e
ambiente de trabalho. As repostas relacionadas às situações que podem contribuir para a
125

manifestação da doença destacam excesso de trabalho, prazos, ansiedade, nervoso, estresse,


clima e situações específicas, como sair de casa e ficar em casa.
Embora conscientes de que o adoecimento não é uma exclusividade da profissão
docente, vários são os exemplos, as formas e os meios de compreender como o
sofrimento/adoecimento se desenvolve nessa profissão. Trata-se de uma resposta das condições
impostas à subjetividade do sujeito, por meio da organização do trabalho (CANTARELLI;
FACCI; CAMPOS, 2017; MARINO FILHO, 2020).
Há pessoas que não sofrem quaisquer consequências diante as condições impostas para
o desempenho do trabalho, pois conseguem se adaptar e suportar o sofrimento sem adoecer, e
essa contradição que nos leva a pensar quais são as causas mais peculiares do trabalho que se
relacionam a questões afetivas, emocionais no âmbito da personalidade (MARINO FILHO,
2020).
Por esse motivo, é necessário compreender o desenvolvimento das funções
psicológicas superiores, pois se entendemos que o ser humano se desenvolve de forma
quantitativamente e qualitativamente por meio de suas relações incluindo as da educação, a
forma de como ele se instrumentalizará para lidar com as adversidades no ambiente de trabalho
serão resultados da qualidade dessas relações e do desenvolvimento das suas funções
psicológicas superiores. E a consciência como função superior é essencial para que o ser
humano desenvolva sua atividade de forma conscienciosa e organizada, objetivando a
materialidade do seu desejo e mantendo a subjetividade dos seus motivos. Sobre tais questões
abordadas em relação à consciência, Luria (2010) aponta:
A consciência nunca foi um "estado interior" primário da matéria viva; os processos
psicológicos surgem não no "interior" da célula viva, mas em suas relações com o
meio circundante, na fronteira entre o organismo e o mundo exterior, e ela assume as
formas de um reflexo ativo do mundo exterior que caracteriza toda atividade vital do
organismo. A medida que a forma de vida se torna mais complexa, com uma mudança
no modo de existência e com o desenvolvimento de uma estrutura mais complexa dos
organismos, estas formas de interação com o meio ou de reflexo ativo mudam;
todavia, os traços básicos desse reflexo, bem como suas formas básicas tais como
foram estabelecidas no processo da história social devem ser procurados não no
interior do sistema nervoso, mas nas relações concernentes à realidade, estabelecidas
em estágios sucessivos de desenvolvimento histórico (LURIA, 2010, p. 194).

Luria (2010) esclarece que Vigotski partiu da posição, perfeitamente lógica para a
filosofia marxista, de que a consciência, que é a ‘vida tornada consciente’, é sempre
significativa e subjetiva em suas características.
A criança, no estágio sensório-motor de seu desenvolvimento, ainda não faz distinção
entre si e o mundo exterior, e o reflexo dos estímulos diretos recebidos por ela não vai
além das impressões elementares ou de respostas motoras difusas. Na criança, pouco
antes do período pré-escolar, estas formas primitivas de consciência são substituídas
por formas mais complexas de análise das informações, formadas com o
desenvolvimento das ações manipuladoras e a percepção de objetos que surgem em
126

suas bases, com os traços de seletividade e a constância característica desta percepção


(LURIA, 2010, p. 196).

Esse percurso do desenvolvimento humano surge de uma relação dialética dinâmica e


complexa. Quando não elaborados de forma qualitativa, geram a má organização ou a não
organização dos pensamentos, sentimentos e percepções, e mais que ter a consciência e a
percepção exata das condições e adversidades do trabalho que são alheias a sua
responsabilidade, é conseguir administrar e se expressar para não resultar no
sofrimento/adoecimento. Nesse momento que a linguagem é percebida com aspecto
fundamental do desenvolvimento humano, mas imprescindível para as relações, e mais, para
tudo que envolva as propriedades objetivas e subjetivas do ser humano.
Finalmente, como foi revelado pelas pesquisas das últimas duas décadas, é com base
na linguagem que se formam complexos processos de regulação das próprias ações
do homem (Luria, 1956, 1958) — embora, no início, a linguagem seja uma forma de
comunicação entre o adulto e a criança, a linguagem vai assim gradualmente se
transformando em uma forma de organização da atividade humana (LURIA, 2010, p.
197).

Ao organizar o trabalho, o sujeito elabora, planeja e executa de forma consciente e


segura toda e qualquer atividade. Incorpora seus desejos, motivos, necessidades, valores
necessários para o alcance dos seus objetivos, pois passa a operar com diferentes sistemas
psicológicos, enquanto permanece desenvolvendo o psiquismo. Todo esse percurso passa a ser
realizado por meio do pensamento abstrato originário do desenvolvimento da linguagem. Luria
(2010) tece comentários sobre a correlação entre as palavras e a consciência, segundo Vigotski;
Enquanto nos primeiros estágios de sua formação o papel principal na estrutura da
consciência é desempenhado pelas impressões emocionais diretas, nos estágios
posteriores o papel decisivo é assumido inicialmente pela percepção complexa e pela
manipulação com objetos, e nos estágios finais, por um sistema de códigos abstratos,
baseado na função abstrativa e generalizadora da linguagem. A consciência humana,
formada com base na atividade manipuladora, adquire naturalmente um caráter novo,
radicalmente diferente dos processos psicológicos dos animais. Vigotski estava, pois,
perfeitamente certo ao insistir em que as palavras, como elementos da fala, são
correlativas da consciência, são as unidades básicas da consciência humana e não
correlativas do pensamento (Vigotski, 1958). Ficará claro como o conceito de
consciência, tal como formulado na psicologia moderna, difere radicalmente das
noções anteriores, que encaravam a consciência como um estado subjetivo primário,
desprovido de conteúdo concreto e de desenvolvimento histórico (LURIA, 2010, p.
198).

Nesse foco, a partir da compreensão do importante papel da linguagem no


desenvolvimento do psiquismo que analisamos sob o olhar da Psicologia Histórico-Cultural o
quanto o silenciamento das emoções contribui para o sofrimento/adoecimento psíquico docente.
As emoções são processos que decorrem da relação do organismo com o meio, podem
sinalizar situações favoráveis ou desfavoráveis para sobrevivência. As condições externas
provocam reações comportamentais (bioquímicas, fisiológicas, expressivas e motoras) que
127

contribuíram para o processo evolutivo e sobrevivência da espécie humana. (MESQUITA;


BATISTA; SILVA, 2019).
As emoções são, portanto, na sua gênese, reações do organismo à avaliação contínua
da sua relação com o meio e compreendem alterações que ocorrem diante da
apreensão sensório-perceptual da realidade, incluindo sensações provenientes do
exterior e do interior do organismo (sensações exteroceptivas, interoceptivas e
proprioceptivas). Nessa perspectiva, a emoção corresponde ao conjunto formado pelo
seu objeto, apreendido sensório-perceptualmente, e pelas sensações corporais
decorrentes das alterações orgânicas causadas para facilitar a ocorrência de um
comportamento externo adaptativo, necessário à manutenção da vida (MESQUITA;
BATISTA; SILVA, 2019, p. 3).

Nesse mesmo sentido, Vigotski (2003) exemplifica que o comportamento e a reação


do ser humano ocorre por meio do processo de interação do organismo com o meio, e esse
processo ocorrer de três formas. O primeiro caso se dá quando as exigências externas não
causam tensão, quando o comportamento flui sem nenhuma intercorrência e o organismo se
adapta, predomina sobre o ambiente e gasta o mínimo de energia e força. Outra situação é
quando o organismo se adapta com dificuldade ao meio, e o organismo sente uma tensão
desmesurada, gastando muita energia, e a adaptação ao meio é mínima. No último caso, ocorre
quando há um equilíbrio na interação do organismo com o meio, quando nenhum prepondera,
ambos estão equilibrados na disputa. Todos os três casos são essenciais para o desenvolvimento
emocional (VIGOTSKI, 2003, p. 117).
Vigotski (2003) entende as emoções como uma reação dos comportamentos nos
momentos críticos e desastrosos, como pontos de desequilíbrios, resumo e resultado da conduta
que, a qualquer momento retoma as formas do comportamento posterior: “o comportamento
emocional tem uma difusão sumamente ampla e, a rigor, até em nossas reações mais primárias
é fácil descobrir o aspecto emocional” (VIGOTSKI, 2003, p. 117).
Mesquita, Batista e Silva (2019) entendem que as emoções assim como os processos
culturais complexos, são desencadeados a partir dos processos socias, coletivos, que supõe que
as emoções culturais são antes de ser uma reação do ser humano, são padrões culturais de
reação.
A relação das emoções com o sofrimento/adoecimento é intrínseca, pois, ao se calar e
deixar de expressar seus sentimentos, angústias e medo, o professor acumula sensações que
sobrecarregam seu pensamento e provocam diferentes sintomas.
[...] o processo de adoecimento do educador/professor ocorre principalmente pelos
agentes estressores enfrentados diariamente na docência e pela maneira que estes são
enfrentados. Sabe-se que cada indivíduo responderá de modo diferente a um estímulo,
mas isso dependerá da capacidade psicológica, física e intelectual (BAIÃO; CUNHA,
2013, p. 13).

O controle das emoções está fortemente ligado à consciência, a percepção do


professor. O prejuízo na personalidade do sujeito que o leva à alienação é resultado da maneira
128

que se percebe, que administra, organiza e controla as suas emoções, e a ausência de uma
instrumentalização emocional pode provocar a instabilidade das funções psíquicas superiores.
A história do desenvolvimento das emoções vincula-se à história da atividade de
produção da realidade. Como ser social, o ser humano responde a necessidades forjadas na
relação ativa com o mundo, satisfazendo-as por meio da atividade consciente. As emoções se
desenvolvem imediatamente após o nascimento, e a cada novo período do desenvolvimento
novas formas psíquicas são concebidas e vão provocando mudanças no comportamento da
criança (MESQUITA; BATISTA; SILVA, 2019).
É preciso estudar as emoções e de como ela tem a capacidade de influenciar o
comportamento do ser humano, é necessário entender como elas vão alcançando funções
importantes e passam a regular, mediar, inibir os comportamentos e influenciar a atividade. As
emoções compõem a ação do ser humano enquanto desempenha seu trabalho, são partes
integrantes de todo processo da atividade, todas as suas relações e de sua vida, e se não são
expressadas, se acumulam ao ponto de transbordar por meio do sofrimento/adoecimento.
A periodização do desenvolvimento em geral, bem como do emocional
especificamente, corrobora um princípio metodológico do materialismo histórico-
dialético, pelo qual o estudo científico das emoções e dos sentimentos demanda a
análise desse objeto como processo histórico, no decurso dos períodos do
desenvolvimento infantil, explicitando sua origem e explicando suas mudanças a
partir das transformações na estrutura e dinâmica da atividade que vincula o indivíduo
à realidade (MESQUITA; BATISTA; SILVA, 2019, p. 4).

A tabela 19 demonstra a quantidade de solicitações de afastamento do trabalho por


razões de saúde nos últimos 12 meses (período que corresponde aos últimos 12 meses que
anteciparam a essa pesquisa), e temos o motivo da quantidade de vezes em que os docentes
se afastaram.
129

Tabela 19 – Solicitação de afastamento do trabalho por razões de saúde nos últimos 12


meses. Se sim, por quanto tempo ficou afastado?
Sim 17 (14%)
Não 101 (86%)

Motivo
Resposta Frequência Período
COVID – 19
Uma vez 4
1 professor por 9 meses
(grupo de risco)
3 professores para tratamento
(entre 10 a 14 dias)

Não informou o motivo


1 6 meses
2 Não informaram o motivo
Trinta dias
1 Cirurgia de catarata
15 dias 2 Não informaram o motivo
3 meses 1 Não informou
20 anos 1 Readaptação de função
10 dias 1 Não informou
7 dias 1 Não informou
5 dias 1 Não informou o motivo
Não informou o motivo
3 vezes 1
5 dias cada uma das vezes que afastou
2 vezes 1 Não informou o motivo nem o período
Total 17
Fonte: Freire, 2022

Quanto ao número de professores afastados nos últimos 12 meses, podemos inferir


duas hipóteses. A primeira é que o instrumento foi aplicado inicialmente no mês de junho de
2021, período em que as aulas estavam ocorrendo por meio remoto devido à COVID 19; a
segunda, porque os professores podem sofrer prejuízos salariais em decorrência o afastamento.
Caso a segunda hipótese seja realmente um dos motivos do não afastamento para
tratamento de saúde, novamente observamos o silenciamento das emoções frente às angústias
e apreensões nas relações com a atividade. As consequências da repressão das emoções podem
desencadear sintomas físicos, clínicos, que são não são mais apenas o sofrimento, mas sim o
adoecimento psíquico.
Percebe-se que a associação entre distúrbios emocionais e alterações nas funções
viscerais, como a hipertensão arterial, se evidencia quando as estruturas límbicas,
responsáveis pelas emoções, são acionadas e produzem respostas cardiovasculares e
respiratórias (FONSECA, et al. 2009, p. 133).

A percepção de todo o contexto onde realiza o seu trabalho, a identificação das


situações que geram a angustia e aflições que levam o professor a sofrer/adoecer. Quando esse
sofrimento não é mais algo que faz parte como algo que ainda gere satisfação, do tipo, é sofrido,
mas gosto do que faço, algo que não o desmotive, e sim, não aguento mais, sofro sem qualquer
prazer, resulta na incapacidade de executar sua ação, passa então, do sofrimento ao
adoecimento.
130

O significado da escola – socializar os conhecimentos – deixa de motivar o professor


ao ensino, levando-o a desenvolver outro sentido pessoal para sua ação profissional.
Tais pontos interferem na hierarquização de suas atividades e contribuem para a
constituição da personalidade marcada pelo adoecimento (FACCI; CRISPIN, 2020b,
p. 36).

A consciência do sujeito reforça sua autonomia e subjetividade. É por meio dessa


relação que o ser humano realiza suas atividades, objetivando materializar seus desejos, e
mantém suas relações coletivas e universais, sem comprometer sua personalidade e sua
individualidade. As emoções são aspectos predominantes nesse percurso e contribuem para a
permanência da essência e do motivo da atividade:
A partir do exposto sobre as emoções na natureza, a emoção humana pode ser
compreendida como os estados do corpo na atividade concreta, dotados de significado
e enredo social. Examinando a dinâmica e a estrutura da atividade, identifica-se que
as emoções estão vinculadas ao plano concreto (social e histórico) e se expressam na
vivência de uma ação concreta (MESQUITA; BATISTA; SILVA, 2019, p. 5).

O uso de medicação nos últimos 12 meses e os medicamentos utilizados pelos


participantes foram reunidos e descridos na conforme as indicações de cada medicamento,
para elucidar melhor os motivos das prescrições. Houve uma frequência de 73 respostas, como
vemos na tabela 20.

Tabela 20 - Toma ou tomou algum medicamento nos últimos 12 meses? Caso sim, qual medicamento?
Sim 54 (46%)
Não 64 (54%)
Respostas / Medicamentos Indicação Frequência
Losartana/ Hidroclorotiazida /
novanlo / diovan hct / Pres plus /
Copressotec/ Pressat Vasopril Hipertensão. 23
/Holmes H / Brasart. HCT/ Ablok/
Concor / Propanslol
1 antidepressivos
1 Nortriptilina / Citalopran /
2 indicado para pessoas que querem parar de fumar,
Sertralina Donaren / Fluoxetina /
ajudando a reduzir os sintomas da síndrome de
bupropiona
abstinência e a vontade de fumar. Além disso,
também pode ser usada para tratar a depressão.
2 VENLIFT/ Venlafaxina 12
3 antidepressivo da classe dos inibidores seletivos da
recaptação da serotonina, que age inibindo a absorção
de serotonina pelos neurônios. Os níveis baixos
podem causar depressão, síndrome do pânico,
3 Fluoxetina
ansiedade ou sintomas obsessivo-compulsivos.
Glifage / outros (diabetes) 6
1 dor e febre
1 Dipirona 2 indicado para dores moderadas a severas de caráter
agudo, subagudo e crônico.
2 Revange 3 anti-inflamatório e relaxante muscular que pode ser
usado no tratamento de doenças como artrite
3Torcilax reumatoide, gota, dor na coluna. 6
4 indicada para adultos para: tratamento da dor
4Pregabalina neuropática (dor devido à lesão e/ou mal
funcionamento dos nervos e/ou do sistema nervoso)
5 Paracetamol em adultos; como terapia adjunta das crises epiléticas
parciais convulsões, com ou sem generalização
131

secundária em adultos; tratamento do Transtorno de


Ansiedade.
5 reduz a febre e proporciona alívio temporário de
dores leves a moderadas, tais como dores de cabeça.
Amoxicilina/azitromicina Antibióticos 4
Cloridrato de Hidroxizina, Alenia soro nasal, antialérgicos problemas
4
(bombinha) Awamys respiratórios/sinusite.
1 indicado para adultos e crianças, como adjuvante no
tratamento de crises epilépticas parciais, com ou sem
1 Amato generalização secundária e crises tônico-clônicas
generalizadas primárias/ Insônia. 4
2 melatonina / Zolpidem
2 contribui para uma melhor qualidade do sono e
ajuda a tratar a insônia.
1 ansiedade/ fobia.
2 indicado para tratamento do transtorno de ansiedade
1 Frontal/ alprazolam social (TAS), também conhecido como fobia social;
2 Venlafaxina tratamento do transtorno do pânico, com ou sem 3
3 Calman agorafobia.
3 calmante leve, indicado nos quadros de ansiedade
leve a moderada e distúrbios do sono.
para o tratamento de enfermidades causadas pela
Pantoprazol/ omeoprazol 2
acidez estomacal.
1 destinado ao tratamento das crises de dor de cabeça
1 Cefaliv
(cefaleia), incluindo a enxaqueca.
2 Amitriptilina 2
2 Antidepressivo com propriedades analgésicas,
(de acordo com o participante toma
utilizado no tratamento da depressão e da dor
para enxaqueca)
neuropática.
indicado para o alivio da febre e da dor, como dor de
cabeça, dor muscular, dor de dentes, enxaqueca ou
Ibuprofeno/ antiflamatório cólica menstrual. Além disso, também pode ser usado 1
para aliviar a dor de corpo e febre em caso de
sintomas de gripes e resfriados comum.
Puran T4 reposição ou suplementação do hormônio, 1
medicamento utilizado para tratar lesões e
Dexilant inflamações no esôfago causadas por esofagite 1
erosiva, bem como agir contra o refluxo ácido ou azia.
reduzir os riscos à saúde decorrentes das doenças
cardiovasculares, diminui os níveis do mau colesterol
Sinvastatina 1
(LDL) e de triglicérides ao mesmo tempo em que
aumenta o bom colesterol (HDL) no sangue.
mineral essencial para a construção e manutenção dos
ossos e dos dentes, além de ser muito importante para
Cálcio 1
a contração muscular e transmissão dos impulsos
nervosos.
Synthroid Hipotireoidismo. 1
anti-inflamatório e imunossupressor, que é indicado
Predinisolona.
para o tratamento e o controle de vários problemas de
(de acordo com participante, tomou 1
saúde, como alergias, distúrbios do sangue, e até
para tratamento pós-COVID)
certos tipos de câncer, entre outras enfermidades.
Total 73
Fonte: Freire, 2022

A Tabela 21 informa os efeitos positivos e negativos obtidos pelo uso dos


medicamentos.
132

Tabela 21 – Efeitos positivo e Efeitos negativo do medicamento


Efeitos positivos Frequência Efeitos negativos Frequência
Reduz/estabiliza/controla a pressão 14 Nenhum efeito 15
Alivia a dor 12 Dor no estomago/ gastrite/problema 13
renal/ arritmia / enjoo /dor de cabeça/
Irritabilidade / falta de atenção/
sensação de estar dopada/ visão turva
Tranquiliza/relaxa 7 Dependência / medo de ficar 10
dependente do remédio
Diminui 4 Sonolência 6
ansiedade/irritabilidade/depressão
Melhora a qualidade de vida/saúde 4 Indisposição física/ sensação de 2
cansaço
Controla/estabiliza a glicose 3 Ter disciplina 1
Mais disposição 3 Não gosto de tomar remédio 1
Mantém o nível de hormônio 2 Uso prolongado/ contínuo 1
Normaliza o sono 2
Me ajudam/sinto bem 2
Relaxa os músculos 1
Respiração mais leve 1
Curou a COVID 1
Controla o colesterol 1
Total 57 49
Fonte: Freire, 2022

Todos (transtorno mental): disposição para o trabalho, diminuição de tensão e


ansiedade e irritabilidade. Os de coluna apena alívio momentâneo da dor (RESPOSTA
H).

A curto prazo não sei, talvez a longo prazo possa prejudicar meu organismo
(RESPOSTA I).

Dificuldade de sentir e perceber, sensação de estar "dopada" (RESPOSTA J).

Em relação ao uso de medicação, mais da metade dos participantes 54 (46%)


mencionam terem ingerido nos últimos 12 meses, prevalecendo o uso de medicamentos para
HAS – hipertensão arterial, os antidepressivos e os para tratamento de diabetes e as medicações
para alivio das dores.
O trabalho e suas formas de organização criadas para atender a sociedade capitalista
tem trazido inúmeros prejuízos à saúde da classe trabalhadora. Os prejuízos em sua
personalidade podem ser observados a partir da ruptura das necessidades objetivas e subjetivas,
mais especificamente a perda do prazer e satisfação em realizar sua atividade.
O uso da medicação é histórico e cultural. Busca-se a eliminação do problema de forma
imediata e não o conhecimento da causa e percurso do problema de saúde, seja por questões
físicas ou psíquicas. Eliminar apenas a dor é prática dessa sociedade que precisa do ser humano
pronto a atende-la e a produzir, e não como algo a ser investigado, amplo e complexo advindo
do meio, das relações desconcertantes que interferem na vida do trabalhador.
133

A prescrição médica tem o poder de determinar e controlar os vários âmbitos da vida


das pessoas. Tal fato é mantido por uma lógica que mascara os problemas sociais,
transformando-os em individuais, gerando culpabilização no indivíduo e
invisibilidade dos reais problemas sociais engendrados por este modo de produção no
qual estamos inseridos, que culmina na medicalização da sociedade. Sendo a escola
parte desta, adentrou nesse contexto (FACCI et al., 2017, p. 101-107).

Facci et al. (2017) asseveram que a entrada do saber médico na educação é iniciada
por meio do Movimento Higienista e prevaleceu à medida que a sociedade foi evoluindo para
um tempo cada vez mais acelerado, e ainda, à medida que o professor resiste as diversas
situações que afetam sua prática tendem a adoecer.
Conforme conceitos abordados pela Psicologia Histórico-Cultural, a atividade
exercida pode ser emancipadora ou alienante, dependendo das relações de sentido e
de significado que promove. Logo, a busca de unidade entre aquilo que o professor
crê ser o papel da educação e o que exerce ou é forçado a exercer, causa intensos
incômodos, e essa é, em nosso entendimento, a gênese de grande parte de seus
sofrimentos e adoecimento, levando-o muitas vezes ao consumo de medicamentos
(FACCI; ESPER, 2020c, p. 53).

Entre as diferentes condições que podem resultar no sofrimento/adoecimento psíquico,


encontra-se a negação ou simplesmente a anulação da subjetividade do sujeito. Esse fato dá-se
em função da necessidade de produção e resultados para atender às demandas da sociedade
capitalista. Nesse caminho, o professor perde a vontade do fazer, e apenas faz para cumprir.
Não há mais a satisfação em mediar, contribuir, mas sim, a obrigatoriedade de exercer e a
necessidade de sobreviver.
Essa lógica cientificista e biologizante, que vem pautando nossas vidas, é responsável
pela naturalização de diversas práticas sociais e aparta do cotidiano a dimensão das produções
de subjetividade, quando é exatamente no cotidiano que essas produções se fazem presentes.
Não o bastante, essa organização estabelecida por essa sociedade pautada no capital gera a
individualização, o isolamento exagerado. As crianças são medicadas com base nos problemas
que lhes são atribuídos, e os professores partilham dessa ideia da medicalização. Os desejos, as
demandas, anseios, problemas e responsabilidades estão individualizados (FIORE, 2009, p. 2).
Nesse sentido, Facci e Esper (2020c) ressaltam a importância de analisar
qualitativamente as formas que desintegram a psique humana e considerar todos os aspectos
que envolvem os meios de trabalhos que são alterados e as possíveis formas de recuperação. O
que ocorre é que não considera se o contexto que causa o sofrimento/adoecimento resultando
na medicalização do professor, e dessa maneira o responsabilizando pela sua doença.
As doenças são banalizadas, como se fizessem parte da vida cotidiana, e comumente
recorre-se a histórias de personagens famosos que tiveram alguma patologia, mas que
conseguiram superá-la pelo uso de medicamentos. Se a cura depende somente do uso
do medicamento, então tenta-se convencer o leitor, a todo custo, que o problema está
nele, em seu corpo, no aspecto biológico (FACCI; ESPER, 2020c, p. 62).
134

Os efeitos da medicação, quando apontados como positivos, revelam o alívio do


sofrimento/adoecimento psíquico, sejam físicos ou psicológicos. Nas respostas dos docentes
entrevistados, é perceptível a busca pela cessação da dor e a permanência da sensação de
obrigatoriedade de trabalhar, e não a intenção de expor o que de fato o incomoda. Resgatando
os dados que antecederam sobre os problemas de saúde e o uso da medicação, se torna cada vez
mais nítido o quanto as condições de trabalho levam os professores a perceberem o conjunto a
sua volta, e diante o seu silencio sofre/adoece psiquicamente.
O professor, no contexto de luta pela sobrevivência no trabalho, recorre muitas vezes,
ao o uso de medicamentos. O significado da educação, que deveria ser a transmissão-
apropriação dos conhecimentos científicos, não é o mesmo sentido que o professor,
frequentemente, tem em relação ao seu trabalho: desenvolve sua prática para
sobreviver (FACCI; ESPER, 2020c, p. 70).

Novamente o capitalismo age, ao referendar a farmacologia como alternativa do fim


do sofrimento/adoecimento psíquico, e não o interesse em entender e investigar as verdadeiras
causas que o originaram. Não permite ao trabalhador expressar o que lhe causa realmente o
sofrimento/adoecimento psíquico e apontar as circunstâncias do contexto de trabalho que
podem contribuir para essa situação.
Uma sociedade fortemente medicalizada é fruto de grandes investimentos da indústria
farmacêutica que, sem considerar as reações adversas, promove o medicamento como o único
meio de obter o bem-estar (FACCI; ESPER, 2020c). Em relação aos efeitos negativos da
medicação, apesar de a maioria dos participantes ter respondido não ter nenhum sintoma, as
outras duas maiores frequências mencionam o medo da dependência da medicação e os
sintomas clínicos causados pela ingestão do medicamento.
Sob uma perspectiva consumista, pela busca do bem-estar a qualquer preço, em que
há a banalização das doenças e dos medicamentos, os indivíduos são levados cada vez mais ao
consumo de uma quantidade enorme e variada de medicamentos (FACCI; ESPER, 2020c):
A forma como a sociedade desconsidera a historicidade, as relações, e empurra
exclusivamente ao ser humano a responsabilidade de toda as situações, inclusive as da sua saúde
e/ou doença, ocorre devido a individualidade instaurada na maneira que está organizada e de
como se esquiva de qualquer compromisso e responsabilidade com os seres humanos que fazem
parte dessa mesma sociedade. É de caráter individual, você é responsável, logo, você deve se
tratar, e não prejudicar a produção, assim se medica e não pare.
Entendemos que esta mesma sociedade, que revela os produtores, demonstra a forma
como os sujeitos vêm sendo formados e educados, formação esta que deveria ser
responsável pela humanização dos homens e pelo desenvolvimento psicológico, mas
que vem produzindo um desenvolvimento parcial e a consequente desumanização.
Por meio desse processo, que evidencia a forma como o gênero humano vem lidando
com os insumos tecnológicos e com o remédio, o medicamento se constitui em uma
mercadoria, é consumido e acaba por influenciar todas as esferas da vida das pessoas,
135

prometendo soluções rápidas e milagrosas para problemas de ordem social (FACCI et


al., 2017, p. 107).

Os que não consideram que os problemas de saúde prejudicam a sua atividade


profissional está representado na tabela 22. Os participantes especificaram os prejuízos
impostos à atividade pelos problemas de saúde, que são inúmeros, como ansiedade,
dificuldade de concentração, absenteísmo devido aos efeitos da medicação ou aos sintomas,
irritabilidade, estresse, mudança de humor e outros:

Tabela 22 – Você considera que os problemas de saúde enfrentados causam prejuízo na


sua atividade profissional? Considerações sobre os prejuízos na atividade devido aos
problemas de saúde
Sim 29 (25%)
Não 89 (75%)
Respostas Frequência
Ansiedade, dificuldade de concentração, prejuízos no desempenho do trabalho 9
Absenteísmo devido os efeitos da medicação ou sintomas 5
Irritabilidade; estressada; mudança de humor 4
Não se aplica 4
Dificuldade para trabalhar, relacionar com colegas ou alunos 3
Sensação de cansaço, indisposição, falta de concentração devido a medicação 3
Total 28
Freire: (2021)

Considerando que o trabalho garante ao ser humano a sua independência e a sua


humanidade, é a partir de seus resultados que a qualidade e a motivação se tornam
características dos seus objetivos. Por meio da atividade, percebemos as propriedades do
desenvolvimento humano, pois devido à sua complexidade e magnitude, o ser humano tem a
capacidade de realizar transformações na natureza que podem provocar mudanças em sua
própria vida e na vida de outras pessoas.
A escola, enquanto uma instituição organizada, sistematizada, na sociedade atual pode
contribuir para a formação da consciência dos alunos. O professor, nesse caso,
colabora para esse processo, uma vez que cabe a ele, por meio da transmissão dos
conhecimentos científicos, fornecer subsídios para que o aluno compreenda a
realidade para além da aparência.
Sendo a consciência o reflexo psíquico da realidade, por meio do conhecimento das
várias ciências, o professor instrumentaliza o aluno para que possa analisar os fatos e,
na coletividade, buscar transformá-los. Ele contribui para própria formação humana
(CANTARELLI; FACCI; CAMPOS, 2017, p. 25).

Por representar uma atividade singular para o desenvolvimento humano, o trabalho


docente precisa estar integrado aos seus motivos objetivos e subjetivos, atrelado as suas funções
superiores, como a percepção que lhe permite ter consciência da sua ação e tudo que a envolve.
A partir do momento em que o professor deixa de realizar a atividade com prazer, suas ações
não mais atenderão às suas reais necessidades e não alcançarão seus objetivos, tornando-se uma
atividade mecanizada, pois as necessidades não são mais as do sujeito, a não ser a necessidade
de sobreviver.
136

Sem necessidades e aspirações próprias, o sujeito se nega. Sua atividade é executada


somente pelo valor de troca, não manifesta sua individualidade, característica própria da
organização capitalista (MARTINS, 2004):
Alguns transtornos e doenças relacionados ao trabalho têm sido característicos do
trabalho atual, marcado por novos modelos de gestão flexíveis, que solicitam
mudanças e pressões constantes na atuação dos profissionais. A tensão resultante está
muitas vezes associada a ambientes de trabalho marcados por violência psicológica e,
em situações extremas, a assédio moral no trabalho (MOREIRA; RODRIGUES,
2018, p. 239).

Assim, Gouvêa (2016) assinala como a expansão da educação básica contribuiu para
gerar condições desfavoráveis de trabalho e, ao mesmo tempo, instigado estudos sobre o
adoecimento docente, pois diante a universalização da educação básica, o país produziu uma
elevação na incorporação da força de trabalho dos professores. Nessa direção, o adoecimento
docente como consequência de suas condições de trabalho, vem sendo tema de estudos tanto
no âmbito acadêmico quanto nas instituições sindicais.
questionamos se a atividade docente pode ter sido a causa dos problemas de saúde, e
pedimos aos participantes que responderam que sim, que a atividade docente pode ter
causado o problema de saúde para especificar de que maneira. A maior frequência de 10
professores, foi dos que acreditam que os fatores excesso de trabalho e excesso de prazos são
os responsáveis.

Tabela 23 – Considera que a atividade docente pode ter provocado seu problema de saúde?
Se sim, como o trabalho pode ter causado seu problema de saúde
Sim 22 (19%)
Não 96 (81%)
Respostas Frequência
Excesso de trabalho e de prazos 10
Falta de respeito, motivação, companheirismo, apoio, ambiente desfavorável 6
Devido ao trabalho, estudo 2
Postura inadequada por longo período 1
Ausência de resultados 1
Gradativamente 1
Total 21
Fonte: Freire, 2023

Analisando as respostas em relação à possibilidade de o trabalho ter provocado o


problema de saúde, é evidente o desencadeamento do sofrimento/adoecimento docente devido
às condições e exigências de trabalho impostas pela sociedade neoliberal. Como verificado em
outros estudos as condições de trabalho atingem diretamente a saúde do professor e podem
desencadear o sofrimento/adoecimento psíquico caso não seja realizado ações, programas,
formações que possam instrumentalizar os professores para enfrentarem as adversidades do dia
a dia.
137

Sob essa perspectiva, Freitas e Cruz (2008) apontam como a organização de trabalho
pode ocasionar o sofrimento/adoecimento dos professores frente as insatisfações e
constrangimentos que estão submetidos ao longo da história profissional, as diferentes
patologias, o absenteísmo e até mesmo o abandono da profissão, tem instigado estudos mais
aprofundados.
O professor, exigido pela necessidade de se adaptar as condições sociais, econômicas,
tecnológicas e ainda pela exigência continua de se manter atualizado diante da rápida
transformação do conhecimento cientifico entre outros fatores da vida moderna, torna-
se vulnerável as manifestações de estresse (FREITAS; CRUZ, 2008, p. 7).

A qualidade de vida no trabalho requer estrutura e recursos apropriados para o bom


desenvolvimento das atividades, assim como para a saúde, segurança e satisfação dos
indivíduos (MOREIRA; RODRIGUES, 2018).
Em se tratando do trabalho docente, as exaustivas cargas horárias, o excesso de
burocracia e de prazos e os ambientes de trabalho, as relações, integram alguns dos vários
fatores citados pelos participantes, que se confirmam em outros estudos que apontam como a
organização atual do trabalho tem provocado prejuízos na saúde do trabalhador.
Numa quadra de precarização do trabalho, com a lei da acumulação capitalista se
impondo cada vez com mais celeridade, na qual aumenta a concentração de riqueza
na mão de poucos ricos e aumenta o número de pobres cada vez mais pobres, as
subjetividades se tornam cada vez mais empobrecidas (SOUZA, 2017, p. 171).

O trabalho organizado pela sociedade atual promove o sofrimento/adoecimento


psíquico do professor por oferecer condições desumanas, exigências exacerbadas e por
pormenorizar a contribuição do professor para o desenvolvimento humano e de toda sociedade.
Trata se de uma organização precarizada que vem sendo estendida por um longo tempo e que
não induz a nenhuma tendencia de mudança.

3.4.5 Trabalho remoto e adoecimento docente

O ser humano enfrenta a natureza como uma força da


natureza." O organismo enfrenta o mundo como uma
magnitude que luta ativamente e enfrenta as influências
do ambiente com a experiência herdada. O ambiente
esmaga e forja essa experiência com uma espécie de
marteladas e a deforma. O organismo luta pela auto-
afirmação. O comportamento é um processo dialético e
complexo de luta entre o mundo e o ser humano no seio
do próprio ser humano. E, no desenlace dessa luta, as
forças do próprio organismo, as condições de sua
construção herdada, desempenham um papel igual ao
das influências incisivas do ambiente (VIGOTSKI,
2003, p. 78-79).
138

Neste eixo, estudamos as condições de trabalho e percepções do professor durante o


período da pandemia da COVID 19. Na questão organizada na Tabela 24, investigamos o
quanto o trabalho remoto durante a pandemia pode ter prejudicado a saúde dos
professores.

Tabela 24– A pandemia prejudicou sua saúde?


O trabalho remoto Frequência Caso tenha prejudicado sua saúde de Frequência
prejudicou sua saúde? que forma?
Não prejudicou 57 Saúde física 07
Prejudicou levemente 31 Saúde psíquica 32
Prejudicou moderamente 20 Ambas 23
Prejudicou gravemente 09 Não houve prejuízos 56
Perdeu espaço, a privacidade* 01
Total 118 Total 118
Fonte: Freire, 2022.

“Perdi meu espaço privado, agora a sala de aula está em todos os lugares, no meu
WhatsApp pessoal, no meu Facebook, no YouTube, em desafios..., mas totalmente
distante de quem realmente precisa, crianças que não têm conseguido usufruir do seu
direito à educação, ou ainda pior, que estão recebendo essa educação por meio de
metodologias que não contribuem para o seu desenvolvimento” (RESPOSTA L).

Apesar de 57 participantes terem respondido que a sua saúde não teve prejuízos
durante a pandemia, somando as demais respostas que tiveram prejuízos de forma leve,
moderada e grave e uma resposta dissertativa, 61 responderam que tiveram algum tipo de
prejuízo. Ao solicitar que informassem como percebem o prejuízo, novamente a soma da
maneira como a saúde foi prejudicada prevalece, em comparação com os que não tiveram
qualquer prejuízo.
Não nos restam dúvidas de que a pandemia apenas intensificou uma crise já existente,
uma crise muito além da saúde pública, mas também social. No contexto da pandemia, setores
tradicionalmente organizados em razão de atividades coletivas, como é o caso da educação e
da cultura, foram bastante afetados (SOUZA et al., 2021). Ainda sobre tais questões em relação
à pandemia, Teixeira (2020) pontua:
A pandemia do Coronavírus não é um evento de apreensão imediata, que pode ser
considerado apenas na dimensão dos seus efeitos sobre o corpo biológico, nem mesmo
se acrescentarmos a isso, os impactos na saúde mental decorrentes do medo do
contágio e das mudanças abruptas produzidas pelas práticas de isolamento social.
Evento complexo, a pandemia nos convoca a compreendê-la na multiplicidade de suas
consequências sociais, culturais e econômicas, como também nos seus efeitos sobre
os modos de subjetivação. Não por acaso, diversos intelectuais acreditam que estamos
diante de um acontecimento histórico, que marcará os rumos do mundo como o
conhecemos desde a modernidade, embora haja divergências radicais nas leituras de
como será esse novo mundo (TEIXEIRA, 2020, p. 202).

Devido à pandemia, os professores tiveram que se adaptar a um novo modelo de


trabalho, e a carga de tarefas para desenvolver duplicaram, e com isso a saúde emocional foi
139

sobrecarregada por estar submetida as mudanças repentinas das atividades e as exigências do


novo modelo de ensino. Como na área da saúde os profissionais tiveram que aprender a realizar
suas funções perante o risco desconhecido, os professores também tiveram que modificar a
maneira de trabalho. Apesar das disparidades das funções durante a pandemia, tanto a saúde
quanto a educação sofreram com excessiva carga emocional.
Em meio à pandemia, o fator emocional também está atrelado ao trabalho docente.
Sentimentos de ansiedade, estresse, angústias, incertezas, acúmulo de informações e,
principalmente, o acréscimo de tarefas a serem realizadas pelo professor são temas
diariamente discutidos desde o início do estabelecimento das atividades remotas,
onde, a partir da invasão do ambiente domiciliar, o docente possui a difícil tarefa de
fazer a distinção entre vida privada e vida profissional (DELFINO et al., 2020, p. 250-
251).

Diferentes níveis de governo aderiram ao sistema do trabalho remoto, mas em sua


maioria, poucos se preocuparam com o professor e suas condições na realização das atividades,
tão pouco com as condições dos alunos, e frente essa situação as ordens eram entre algumas
gravas vídeos, manter o aluno online prestando atenção, elaborar exercícios, mesmo sabendo
que a grande maioria, se não, todos alunos da rede pública não disponibilizassem qualquer
acesso à internet ou qualquer equipamento que pudessem utilizar para manutenção do
aprendizado.

“A quantidade de informações que estamos recebendo e tendo que lidar durante a


pandemia; problemas com a internet da nossa cidade” (RESPOSTA M).

A nível estadual e municipal houve também a adesão ao ensino remoto por meio da
aquisição de plataformas privadas, que reduzem o trabalho educativo a elaboração de
tarefas e a gravação de aulas transmitidas pela TV ou de modo síncrono. O discurso
de alguns gestores da mídia passa, em maior ou menor grau, por “o tempo está
passando e como ficarão nossas crianças sem aula?” ou ainda “é uma oportunidade de
nos reinventarmos e criarmos uma escola do futuro”. Sem oferecer nenhuma
condição, resta ao docente fazer um esforço desumano para conseguir estabelecer
algum contato educativo com o estudante (NETO; PIRES, 2020, p. 52).

Como uma tempestade, a falta de empatia transborda em meio a cobranças,


desvalorização, desrespeito e descaso com o trabalho docente. E toda a fúria dessa tempestade
brotou desenfreadamente de todos os lados, governos, pais, gestores locais, e nem mesmo os
alunos pouparam os julgamentos. As constantes críticas em relação ao professor provocaram a
retomada das discussões sobre as formações. Pois, as dificuldades em realizar o ensino remoto
denunciou a fragilidade das formações quanto ao uso das tecnologias. Essa percepção fez com
que o professor desencadeasse diversos sentimentos negativos.
Nesse contexto em que vidas são tratas como números, o sofrimento psíquico, a
sobrecarga do trabalho, os assédios sofridos no trabalho, entre outras questões,
seguem sendo desprezadas. Não é a qualidade do ensino ou a segurança dos atores da
escola que é colocada em pauta, mas a ideia de que professores precisam voltar ao seu
trabalho para justificar seu salário (NETO; PIRES, 2020, p. 52).
140

A percepção do professor sobre o novo modelo de trabalho ocasionou sentimentos de


angústias, ansiedade, insegurança que contribuíram para o surgimento ou o agravo dos
problemas de saúde. Se tratou de uma situação que o professor mesmo diante da percepção real
das condições precárias de trabalho foi obrigado a exercê-la para atender as cobranças.
Diante de condições tão extenuantes, incertas e que impedem o professor de saber se
sua vida material está garantida no próximo mês, aliado ao fato de que sua atividade
fim – educar os estudantes – está impossibilitada e, além disso, é preciso fingir, com
um sorriso rosto, que ali está acontecendo uma aula normal, não há dúvida que o
sofrimento psíquico adoecedor será inevitável. Essa situação forma o professor
cindido: de um lado, preocupado com seus estudantes e sem querer perder o vínculo
com ele, angustiado com sua possibilidade de evadir, ou mesmo não ter nenhum
contato com o patrimônio da humanidade a ser ensinado, o professor tenta fazer o
melhor que pode nessas condições. Do outro, a vigilância de ter suas aulas gravadas,
do questionamento sobre sua competência, a pressão constante do patrão (do estado
ou da iniciativa privada) e o medo da situação em que o mundo se encontra tornam o
peso desta proto-docência insuportável (NETO; PIRES, 2020, p. 54).

Tozatto (2020) nos remete à resposta do participante identificado nesse trabalho pela letra
L, que em seu texto, a autora descreve como o trabalho remoto interferiu em sua vida particular
e em seu estado emocional:
O trabalho passou a ocupar a maior parte do meu dia. Reservava as tardes para
preparar as aulas e esse tempo era dividido com inúmeras e intermináveis reuniões.
Durante a manhã, eu me dedicava a cuidar dos afazeres domésticos e das atividades
do meu outro emprego. Inúmeras outras demandas foram surgindo: atendimento aos
alunos (de outros cursos) em crise, lives sobre saúde mental, estágios clínicos e
supervisão. Os links de reuniões começavam a me causar um sentimento de angústia,
comecei a me sentir sobrecarregada. Via minhas amigas cuidando de si, fazendo
artesanatos, montando jardins e eu só conseguia trabalhar, trabalhar e trabalhar. Parei
de produzir, parei de sentir prazer em ler. Eu só contava os minutos para desconectar,
sentar na minha varanda e beber uma taça de vinho no final da noite. Com isso me
desconectei da minha filha e mergulhei em crises de ansiedade diárias (TOZATTO,
2020, p 276-277).

A nova forma de ensino e suas consequências também foram verificadas por Souza et
al. (2021) em uma pesquisa com professores de diferentes níveis de ensino que sofreram por
terem que migrar de uma forma de trabalho para outra nunca antes experienciada e sem as
condições necessárias para poder exercê-las.
As condições adversas enfrentadas pelos professores nessa migração das aulas
presenciais para as plataformas virtuais são diversas evidenciadas por 92% dos
professores brasileiros. Essas dificuldades englobam desde condições materiais e
informacional a conflitos na dimensão das relações interpessoais. Dentre essas
condições adversas destacam-se as dificuldades em pensar uma didática adequada
para as aulas on-line (53%) e as dificuldades inerentes à preocupação em decorrência
do não acesso dos alunos às atividades (51%), sendo essa mudança abrupta e não
planejada dos ambientes de ensino, reconhecidamente difícil tanto para professores
quanto alunos. Essas dificuldades vivenciadas pelos professores estiveram associadas
ao aumento nas condições de depressão, ansiedade e estresse
(SOUZA et al., 2021. p. 149-150).
141

O cenário de crise pandêmica trouxe uma dura verdade, difícil de ser aceita: a
vulnerabilidade da vida humana, a certeza de que há uma linha tênue entre a vida e a morte e
que, um dia, o pêndulo da vida se inclinará para o outro lado (LADEIRA, 2020).
Dos professores que responderam ter tido dificuldade em exercer a atividade docente,
como mostra a Tabela 25, houve igualdade de frequência de respostas. As dificuldades
apontadas pelos professores são de diferentes naturezas, desde a falta de domínio da
tecnologia, a falta de recursos para uso da internet, a produção de materiais para a preparação
das aulas, até sentimentos como frustração em termos do rendimento, ansiedade, preocupação,
exaustão, estresse e medo do adoecimento, entre outros fatores.

Tabela 25 – Você teve dificuldade de exercer seu trabalho em tempo de pandemia? Caso sim, qual?
Sim 59 (50%)
Não 59 (50%)
Respostas Frequência
Dificuldade em lidar com a tecnologia / falta de materiais – acesso (internet) 13
Elaborar as atividades / gravar vídeos / digitar 11
Ansiedade / preocupação / exaustão / estressada / Exposição dos professores 11
durante a busca ativa / medo / adoecimento
Ausência das aulas presenciais 8
Pouco rendimento devido às aulas remotas 6
Pouco retorno das atividades dos alunos 5
Ter que cumprir prazos / cobranças / falta de direcionamento 3
Os alunos não tem acesso à internet 3
Falta de recursos em casa / Gastos com internet 2
Vários 1
Total 63
Fonte: Freire, 2022.

Quando falamos de dificuldades na educação, temos a clareza de que existem, seja no


modelo tradicional de ensino (presencial) ou no ensino remoto. Há tempos a educação pública
brasileira tem comportado inúmeras incongruências que respaldam em todos os personagens do
contexto escolar, o que ocorreu com a pandemia foi a exposição das condições existentes e a
afirmação das desigualdades e da falta de estruturas materiais e humanas necessárias para uma
educação de qualidade.
Escrever sobre educação e pandemia é, portanto, um grande desafio. Em primeiro
lugar, porque a pandemia é um evento em andamento, sem que saibamos ainda os
seus desdobramentos e suas consequências. Em segundo, porque a educação no Brasil
já estava alinhada a um projeto neoliberal, que é decisivo para compreensão do cenário
onde a ela se instaura e, portanto, para os rumos dos acontecimentos (TEIXEIRA,
2020, p. 202).

O isolamento social foi uma das estratégias adotadas por governos e autoridades
sanitárias para a contenção da COVID-19 e se estendeu às escolas. O professor, de forma
instantânea e forçosa, teve a sua modalidade de trabalho reformulada mesmo não tendo nunca
142

vivenciado esse método de trabalho, e consciente da pouca ou nenhuma condição favorável


para sua realização.
A pandemia da COVID-19 nos tem feito vivenciar diversas experiências antes
inimagináveis. Dentre elas, a impossibilidade da continuidade de aulas presenciais,
desde março de 2020, tem causado forte impacto no cotidiano dos alunos e de suas
famílias, na comunidade escolar e, especialmente, no trabalho docente (SILVA;
PIATTI, 2021, p. 2)

No mesmo caminho, Teixeira (2020) acrescenta que o trabalho remoto gerou inúmeras
questões e desafios que afetaram o trabalho docente, dentre eles, estão a necessidade de adaptar
o modelo de trabalho para dar continuidade as atividades escolares utilizando as tecnologias,
reconfigurando o ensino. Junto ao novo modelo de trabalho, houve o aumento das exigências e
o professor não se deu conta da quantidade de serviço que passou a realizar extra aula.
A princípio, foi solicitado que cumpríssemos metade da nossa carga horária em aulas
online, para dispender o tempo restante nas outras atividades, mas em pouco tempo
não só nos vimos cumprindo todo o horário contratado de aula (pois os conteúdos não
foram modificados e exigiam este tempo) como precisávamos nos desdobrar nas
novas demandas obrigatórias no ambiente remoto como fazer chamada, viabilizar a
entrada dos alunos na sala, escutar e acolher as queixas, os medos e as inseguranças
que atravessavam a todos (TEIXEIRA, 2020, p. 211).

O professor se deparou com a obrigatoriedade de manusear os diferentes dispositivos


tecnológicos para exercer a sua atividade durante o período da pandemia, porém é fato que as
escolas públicas não disponibilizam de condições e recursos eletrônicos que pudessem
favorecer ou colaborar para que o ensino ocorresse de fato. Muitos professores, ainda se
utilizam dos quadros negros e giz para ensinar, o acesso à tecnologia não é uma privação apenas
dos alunos, mas de todos que compõem esse contexto, e mais esse modelo de trabalho
estruturou, escancarou a precariedade do trabalho docente. Todos sofreram, estão sofrendo e
sofrerão com as consequências da pandemia do COVID-19.
No arremedo de educação, “aqui tudo parece que era ainda construção, e já é ruína”.
A pandemia somada aos ditames neoliberais de política de morte, orquestrada por um
fascista, tem vulnerabilizado ainda mais a educação pública, que, não mais vista como
necessária aos interesses burgueses, míngua na precarização louvada por entusiastas
das tecnologias digitais (CARVALHAL; OLIVEIRA; RIBEIRO, 2020, p. 30).

As cobranças, a duplicidade das tarefas e a sobrecarga de trabalho foram, aos poucos,


se intensificando, foi necessário que os professores aprendessem em tempo recorde a manusear
e utilizar ferramentas para elaborar e realizar as aulas, as avaliações, gravações, e correções,
tudo como se fosse algo natural, não sendo. Não é natural quando não se tem acesso a esses
mecanismos no dia a dia, também não é, quando se tem que faze-lo por conta própria utilizando
também os seus próprios recursos digitais.
Silva e Piatti (2021) apresentam dados que corroboram com os elementos levantados
por outros pesquisadores quanto ao uso das tecnologias pelos professores durante o ensino
143

remoto. Todas as pesquisas veem apresentado a escassez de materiais tecnológicos nas escolas
e as cobranças sofridas pelos professores quando tiveram que mudar a forma de trabalho.
A informação de que a grande maioria (89%) dos professores/as não possuía nenhuma
experiência com ensino remoto não nos causou surpresa, mas a informação de que,
diante desse quadro 41,8% dos/as professores/as puderam contar apenas com seus
esforços para realizar as atividades que envolviam recursos tecnológicos se mostrou
assustadora. Aliado a isso, pesa o fato de que mais da metade dos colaboradores se
declaram despreparados paras as atividades exigidas na modalidade remota (SILVA;
PIATTI, 2021, p. 11).

Somando-se às dificuldades do professor, a realização para o ensino remoto também


depende de que o aluno possua os recursos necessários (celular, computador, acesso à internet).
Mas não foi essa situação verificada na maioria das escolas públicas e que foi denunciada
durante a pandemia. Apesar dos discursos terem sido em prol a manutenção e regularidade do
ensino, não foi o que se constatou. Ao contrário das escolas privadas que sempre
disponibilizaram condições estruturais para o aprendizado de seus alunos e de trabalho para os
docentes, as escolas públicas se viram despidas das ferramentas necessárias para a permanência
do ensino. A desigualdade de oportunidades nunca foi tão evidenciada quanto na pandemia.
Enquanto que, para estudantes nascidos e criados em áreas nobres das grandes capitais
brasileiras, com acesso pleno aos mais diversos recursos educacionais, o grande
obstáculo atual entre uma aprovação ou não no Enem parece ser o foco e a
determinação para continuar seus estudos remotamente, a população periférica - que
sequer possui acesso significativo aos aparatos tecnológicos de ponta que são exibidos
no ambiente de estudos de cada um dos jovens no vídeo - enfrenta outros desafios,
que vão muito além do simples desejo de estudar (HEINSFELD; PINTO, 2020, p.
157).

Pois nem todos os responsáveis possuem acesso às aulas remotas, com isso meu
trabalho não chega a todos os alunos (RESPOSTA N).

Mesmo diante da disponibilidade e interesse dos professores e demais colaboradores,


na tentativa de manter o ensino, as desigualdades sociais já estabelecidas antes mesmo da
pandemia foram escancaradas. Embora seja recente apontarmos as consequências para a
educação devido às inúmeras dificuldades na realização do ensino remoto, é plausível
inferirmos que não são superficiais e tão poucas reversíveis. Temos a consciência de que a
pandemia muito contribuiu para o escancaramento essas desigualdades e mais pavorosa foi a
constatação do quanto a sociedade neoliberal, além de ter conhecimento dessa realidade,
normalizaram a barbárie. A pandemia apenas colaborou para
Em nosso contexto atual, em que deslocamentos e interações sociais foram cerceados
por conta do inimigo invisível SARS-CoV-2, projetamos um desejo insaciável pelo
“novo normal”. Afinal, “a vida não pode parar”. No entanto, às populações pobres,
faveladas e periféricas, esse “novo normal” nunca foi genuinamente ofertado: a
violência, o extermínio e a fome indicam que o único “normal” proposto a esses
territórios é a normalização da barbárie pelo olhar daqueles que apenas observam, de
longe, essa realidade (HEINSFELD; PINTO, 2020, p. 168).
144

Os recursos tecnológicos não são acessíveis a todos os alunos, os pais não conseguem
acompanhar o aprendizado dos filhos e como consequência, as crianças não tiveram
nem de longe o aproveitamento que teriam em dias de aulas normais (RESPOSTA O).

A tabela 26 trata da disponibilização de recursos tecnológicos para o desempenho da


função.

Tabela 26 – Foram disponibilizados os recursos tecnológicos para o desempenho das atividades


docente? Caso sim, quais?
Sim 67 (57%)
Não 51 (43%)
Respostas Frequência
Recursos como redes sociais / celular / e-mails / computadores / Google drive / 18
Google Meet/vídeos / lives
Acesso à internet 15
Sistema Tagnos 14
Sala de tecnologia / sala para aplicação das atividades / meios midiáticos / 13
capacitação e Orientações / impressões / material de apoio / atividades
complementares / etc.
Formação para professores / oficinas / treinamentos / reuniões para uso de 8
ferramentas tecnológicas / edição de vídeos
Plataforma online 5
Wi fi liberado para comunicação através de Whatsapp 4
Recursos próprios 2
AVA 2
Tripé para celular 1
Utilizo a internet de casa, pois a internet da escola é muito lenta 1
Total 83
Fonte: Freire, 2023.

Internet e computadores, entretanto, em home office, os recursos são todos


particulares, envolvendo aplicação financeira própria para manter o funcionamento
(RESPOSTA P).

Tenho internet em casa e no trabalho (escola). Contudo, na escola a internet é muito


lenta (RESPOSTA Q).

Como se não bastasse o novo cenário que a pandemia impôs aos trabalhadores e em
especial aos professores, além de novas formas de preparar, executar e acompanhar as aulas, o
ensino remoto atribuiu a esses profissionais de forma contundente a pressão em lidar com as
tecnologias, sem quaisquer outras alternativas, como se fosse algo simples. Mas, diante da
necessidade de conter o vírus do COVID-19, o ensino remoto foi a única maneira que se pensou
como meio de dar continuidade no ensino, contudo, o que não se pensou é que essa forma de
trabalho iria intensificar o trabalho do professor, além de gerar um grau elevado de sofrimento/
adoecimento psíquico. Anterior a pandemia, a tecnologia por meio da educação a distância já
se apresentava como uma imposição, pois diante a criação de cursos por meio de plataformas
online essa metodologia já se apresentava, mas nada tão repentino e estruturação.
145

Apresentada como possibilidade que “amenizava” o desinteresse dos poderes públicos


em investir em mais políticas públicas de construção e expansão das universidades, a
inclusão acontecia nos remendos da precarização, enquanto abria caminho para a
iniciativa privada explorar mais um nicho de mercado. Um exemplo bastante
representativo é o caso da formação de professores em nível inicial, em especial a
partir da década de 1990 (CARVALHAL; OLIVEIRA; RIBEIRO, 2020, p. 32).

Tamanha desigualdade de condições de acesso aos recursos sociais e educacionais,


aprofundada com o modelo remoto de ensino, tem como consequência o êxito e a permanência
dos alunos da classe média e alta e o fracasso escolar dos pobres (CASTRO, 2020).
Não se resume apenas em ter acesso aos materiais eletrônicos, mas a dificuldade em
ter acesso a internet, que é uma realidade do povo brasileiro, e que mesmo diante um aumento
na expansão desse serviço, poucos são os que conseguem adquiri-los. Essa mesma população
que não tem acesso à internet, é a população que está à mercê do ensino ofertado nas escolas
públicas e que terão como resultado a impossibilidade de terem na educação uma maneira de
transformar suas vidas.
De acordo com pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE, 2018), uma em cada quatro pessoas no Brasil não tem acesso à internet. Em
números totais, isso representa cerca de 46 milhões de brasileiros que não acessam a
rede. Nas casas em que se observou acesso à internet, a renda média por pessoa era de
R$ 1.769,00, já nas casas que não tinham acesso, a renda média por pessoa era de R$
940,00, praticamente a metade. Não por coincidência se trata, justamente, da mesma
parcela da população a quem ainda hoje tem sido negado o acesso à educação básica,
e para quem tem sido oferecido, no caso dos que têm acesso à escola, condições
pedagógicas de péssima qualidade e geralmente pautadas pela lógica economicista.
Nesse barulho, a boiada da EaD vai sendo empurrada, fundamentada na naturalização
das desigualdades, retroalimentando o darwinismo social do “faz parte do processo,
sempre tem uns que caem e outros que resistem” (CARVALHAL; OLIVEIRA;
RIBEIRO, 2020, p. 30-31).

Esse momento foi propício para o favorecimento da privatização de determinados


serviços para a escola pública, com a justificativa de melhorias, a empresas privadas adquiriram
espaços e foram se estabelecendo com as promessas de melhoria no ensino por meio das
plataformas digitais, porém não são os alunos das escolas públicas que realmente foram ou
serão os verdadeiros beneficiados.
No caso da escola pública, o vírus COVID-19 forneceu, entre outras coisas, espaço
necessário para o Estado abrir brechas para fazer “parcerias” com a iniciativa privada,
adquirindo plataformas digitais pagas e fazendo um processo pedagógico excludente,
visto que a maioria da população não tem acesso à internet e nem condições de estudo
nas suas casas. Se o ensino remoto já é um simulacro de aula presencial, no contexto
do ensino público, por falta de condições objetivas e a desigualdade abissal,
escancarada na pandemia fruto do neoliberalismo, esse simulador é ainda mais
precário e pode prejudicar gravemente os filhos da classe trabalhadora (NETO;
PIRES, 2020, p. 44).

Como se não bastasse a desigualdade social e econômica, outra situação evidenciada


durante a pandemia foi também a desvalorização e as constantes críticas ao professor, como se
a escolha pelo ensino remoto coubesse total responsabilidade a esse profissional. A sociedade
está tão alienada que não perceberam que os professores sofreram tanto quanto os alunos, ou
146

até mais, porque observaram a verdadeira realidade ser escancarada e confirmada, a


precariedade do ensino e a falta de condições para exercer a profissão.
O que se percebe também é que o momento atual despontou uma crescente
desvalorização deste profissional e uma enxurrada de críticas indevidas pelos mais
diversos motivos. Facilmente nos deparamos com comentários pejorativos que se
dirigem ao professor como alguém que hoje “recebe o salário sem trabalhar”, ou
como, “ganha para ficar em casa”. Esses comentários apontam a falta de
reconhecimento e empatia em relação ao trabalho docente (FREIRE; RODRIGUES;
URT, 2020, p. 2).

Neto e Pires (2020) rebatem as críticas aos professores ao ouvirem que são
profissionais resistentes ou tecnofóbicos, pois não se trata de não querer aceitar a tecnologia e
utiliza-la, mas sim, de ter de entender que é preciso que a sociedade esteja realmente envolvida
nesse processo, que a tecnologia seja de fato acessível a todos.
Chamar qualquer professor de resistente ou tecnofóbico quando faz alguma crítica à
inserção da tecnologia dentro de uma lógica mercadológica tem apenas como função
minar o debate e deixar transparecer que a tecnologia é neutra e que sua entrada na
escola/universidade tem apenas benefícios. Na contrariedade ou adesão aos projetos
políticos burgueses, alertamos que não temos medo ou ódio às máquinas, como os
ludistas. Por conseguinte, o que aqui destacamos é a necessidade de o projeto de
sociedade que envolva a tecnologia seja explícito antes de adentrar qualquer
instituição de ensino (NETO; PIRES, 2020, p. 56).

A pandemia foi a forma mais triste de se confirmar a precarização e desvalorização da


educação e do professor. o modelo do ensino remoto contribuiu para expor a degradação da
educação pública, apontou inúmeras lacunas que desde a formação às condições de trabalho, e
mais ainda, constatou que não há qualquer preocupação com a saúde dos professores, nem por
meio de políticas públicas nem pela forma de organização de trabalho.
Quanto à oferta de formação para a utilização dos recursos tecnológicos, as formações
informadas, constam na tabela 27.

Tabela 27 – Foi ofertada formação para a utilização? Caso tenha respondido Sim, fale
sobre essas formações.
Sim 67 (57%)
Não 51 (43%)
Respostas Frequência
Formação online / vídeos/ lives / WhatsApp / Facebook / Google meet / You 25
tube
Formação / Oficina / Orientações em serviços oferecido pela SEMED - 13
Núcleo de Tecnologias
Formação para uso do sistema Tagnos 9
Muito boas / objetivas 6
Cansativas / difícil entendimento / superficiais 3
Formação com os Gestores 2
Várias formações 2
Formação para uso de tecnologias / aplicativos 1
Materiais impressos 1
Formações para uso de tecnologias de informação, utilizando 1
computador/celular particulares
Total 63
Fonte: Freire, 2023.
147

Diante do contexto caótico em que estamos é preciso resistir para não sucumbir. Como
se não bastassem todas as angústias e males sociais e econômicos produzidos pela
pandemia da COVID-19, os profissionais da educação e os estudantes ainda precisam
lidar com os desafios impostos pelo ensino remoto (CASTRO, 2020, p. 116).

A formação dos professores para o uso de tecnologias durante o período da pandemia


alertou-nos para a necessidade da formação contínua e de qualidade, o uso das ferramentas
tecnológicas, durante o ensino remoto, escancarou o descaso com as formações educacionais e
nenhuma consideração com o objetivo real da educação. Essa atitude é visivelmente mantida
pela sociedade pautada em produção e exclusão:
A qualidade social da educação se manifesta na integralidade da formação, no
compromisso com a formação de sujeitos e profissionais críticos e comprometidos
com a transformação, com a reversão das desigualdades sociais e com a emancipação.
Nesse sentido, observou-se que a mudança do ensino presencial para o remoto
contribui para o agravamento da crise educacional brasileira e para o aumento das
desigualdades educacionais e sociais entre estudantes (CASTRO, 2020, p. 116-117).

Além do medo da situação e do desconhecido, os professores se viram tomados por


demandas exacerbadas pelo novo modelo de ensino, e o tema formação também ficou em
evidencia por ter exposto a fragilidade das formações em relação ao uso das tecnologias, e mais,
de existir realmente essas ferramentas dentro das escolas independente de situações adversas
que requerem nova formulação dos métodos de ensino diante a situações inesperadas. É fato
que a pandemia confirmou a precariedade existente no ensino público e a desvalorização do
trabalho do professor. Calejon e Brito (2020) reforçam a importância da formação inicial dos
professores e da valorização do trabalho docente:
Assim, não basta o uso e o acesso às tecnologias mais modernas para que o processo
de produção do conhecimento na escola tenha a dimensão de cidadania. Entendemos
como necessário considerar a formação inicial e continuada dos professores, assim
como as condições de trabalho e a valorização social dada ao trabalho do professor.
O relato de docentes sobre as condições de realização da atividade pedagógica e
educativa desenvolvida a distância com os recursos da tecnologia digital demonstra a
ansiedade e o desgaste produzido pela atividade. Não se rata de negar ou desconsiderar
a contribuição e importância destes recursos, mas de compreender as exigências de
uma educação escolar de qualidade e as possibilidades de incorporação das TICs. Para
tanto consideramos relevante analisar a formação inicial de professores e
particularmente os professores que atuam nos anos iniciais do ensino fundamental
considerados como polivalentes (CALEJON; BRITO, 2020, p. 296-297).

Por consequência, os pesquisadores enfatizam a importância da linguagem no uso das


tecnologias e acrescentam que a teoria criada por Vigotski esclarece, de forma cuidadosa, a
relação entre o processo de ensino e aprendizagem e o desenvolvimento humano.
O uso da tecnologia digital requer o desenvolvimento da capacidade de lidar com
símbolos e signos, um processo adequado de domínio da linguagem escrita que por
sua vez requer o desenvolvimento adequado da linguagem oral. A natureza das
relações interpessoais produzidas a partir dos recursos da tecnologia da informação e
da comunicação precisa ser compreendida de modo mais adequado, na medida em
148

que estes recursos criam cenários novos e relações de outra ordem (CALEJON;
BRITO, 2020, p. 307).

E, mais uma vez, deparamo-nos com a linguagem como aspecto fundamental seguida
das relações interpessoais para o desenvolvimento e condições favoráveis para o desempenho
de qualquer ação do ser humano. Embora as relações e a linguagem tenham outro formato, outra
maneira de se desenrolarem por meio da tecnologia, é a linguagem oral e as relações
interpessoais que estarão subsidiando esse modelo.
Por esse motivo, é fundamental que a formação docente seja pautada em motivos,
desejos, anseios próprios e objetivos, que não seja apenas mais uma ação imposta ao seu
trabalho. É necessário que o professor esteja confiante, satisfeito, motivado no desempenho da
sua função, para que possa de fato alcançar os objetivos propostos pela educação, a
transformação.
Assim, é importante que, mais que conhecimento tecnológico, a formação docente
inspire confiança nos resultados e contribua para a alteração do sentido da docência,
provocando uma abertura para as modificações. Sem isso, a utilização das TDIC,
independentemente do serviço, será apenas uma repetição de ações não exitosas, mas
agora realizadas com outro meio (SILVA; PIATTI, 2021, p. 7).

As explicações sobre os prejuízos causados na qualidade do trabalho estão listadas


na Tabela 28. As mais frequentes foram a falta do contato com os alunos e a baixa
produtividade, entre outras

.
Tabela 28 – A pandemia prejudicou a qualidade do seu trabalho? Caso tenha respondido
Sim, de que forma? Exemplifique.
Sim 73 (62%)
Não 45 (38%)
Respostas Frequência
Não ter contato direto com os alunos 26
Baixa produtividade / prejuízo na qualidade da educação 16
Nem todos os alunos não tem acesso à internet 10
Pouco interesse / acompanhamento dos pais 10
Sobrecarga de trabalho / cobranças 3
Em todo o momento / todas 2
Dificuldade de fazer as atividades, dificuldade de manusear a tecnologia / 2
Dificuldade em planejar / enviar atividades para alunos desconhecidos

Falta de outros recursos dos alunos impressora, livros 1


Não dá para identificar habilidades ou dificuldades do aluno por meio do ensino 1
remoto
Dificuldade de ensinar por meio do ensino remoto 1
As atividades ficam limitadas 1
Não houve excelência no exercício do trabalho, não houve plenitude e por vezes, 1
sequer entusiasmo próprio.
Necessidade de mudança para reinventar e adaptar 1
Prejuízo no vínculo afetivo e no desenvolvimento 1
Total 76
Fonte: Freire, 2022.
149

Passados os quinze primeiros dias do isolamento social, iniciou-se o questionamento


quanto à continuidade do período escolar. E como seria dar encaminhamento sem que pudessem
estar interagindo presencialmente? E no Brasil, como isso poderia ocorrer, com as constatações
das gigantescas diferenças sociais? Com as incoerências tanto para os professores quanto para
os alunos? O ensino remoto, modelo de ensino utilizado por outros países para não interromper
o ano letivo, foi a opção abraçada também no Brasil. Algumas das demandas são citadas por
Ladeira (2020):
“Grava o vídeo da aula!”, “Produz a apostila para os alunos!”, “Entrega tudo até sexta
às 14 horas!”. São alguns dos desafios que se apresentaram para mim ao longo das
aulas remotas. “Não ficou bom. Refaz essa parte. Reajusta aquela outra”.
E tantas outras demandas do ensino remoto me desafiaram ao longo de toda a
quarentena, fazendo das minhas manhãs e tardes uma grande sinfonia de vários tons,
a empolgação de estar produzindo um material didático autoral para os alunos era no
final do dia substituída por um cansaço e um sentimento de esgotamento, uma
sensação de que no ensino remoto, o trabalho havia aumento.
Isso justifica, por exemplo, uma sensação de perda da qualidade em elaborar as aulas,
com uma ausência de sentido no próprio trabalho desenvolvido. Um sentimento, de
que aquilo não estava colaborando em nada para os alunos. Valendo-me da famosa
expressão, fazendo “apenas para inglês ver” (LADEIRA, 2020, p. 272).

O professor, já assoberbado com tantas informações e orientações quanto o manejo da


tecnologia, ainda precisou aprender a prender a atenção e o interesse dos alunos, para conseguir
mediar o aprendizado por meio das plataformas digitais. Além de não ter o domínio das
ferramentas tecnológicas, tentar prender a atenção dos alunos, todas as emoções durante esse
período foram reprimidas devido a necessidade de manter e executar o trabalho. Coube-lhes
mais não só lidar com a sobrecarga de trabalho, mas também a elevação dos sentimentos ruins
quanto ao seu trabalho durante a pandemia devido o modelo de trabalho remoto. Sobre tais
desafios, Teixeira (2020) aponta que:
O primeiro grande desafio consistiu em se comunicar com uma tela estática. O sistema
se mostrou insuficiente para sustentar tantos dados e a solução encontrada foi os
alunos desligarem as câmeras. Passamos a falar sozinhos, sem ideia de como nossas
falas estavam sendo recepcionadas. Fomos encontrando soluções, para manter o
diálogo e reduzir a sensação de solidão, como instituir um momento para nos
cumprimentarmos e nos despedirmos com as câmeras ligadas e pedidos explícitos de
feedback por áudio sobre o conteúdo no decorrer da aula. Rapidamente naturalizamos
a ideia de que todas as aulas eram gravadas e ficariam disponíveis, assim como
teríamos membros do administrativo e da coordenação com acesso às equipes.
Internalizamos, então, mecanismos de autovigilância e controle da fala e dos gestos,
receosos dos destinos dessas gravações (TEIXEIRA, 2020, p. 211-212).

O ensino remoto, além de confirmar a dimensão das diferenças sociais, possibilitou-


nos ampliar o olhar e avaliar a qualidade do ensino oferecido, e confirmou a necessidade de se
garantir o direito à educação. As contradições expostas durante a pandemia reforçam a
impetuosidade da sociedade neoliberal e preveem as desastrosas consequências para os sujeitos
privados de educação e o comprometimento, ou mesmo a impossibilidade do desenvolvimento
de uma sociedade, de fato, para todos.
150

Castro (2020) sublinha o valor da saúde mental, das formações apropriadas e da


qualidade das relações sociais como aspectos fundamentais no processo de humanização.
Diante de tal cenário, é fundamental refletirmos sobre a ineficácia do ensino remoto
na garantia de uma formação de qualidade, pelas razões que já foram expostas
anteriormente, e é bom reforçar, porque a boa saúde mental é condição sine qua non
para a aprendizagem. Se essa premissa não for devidamente considerada, será inútil
qualquer esforço técnico ou operacional para garantir a formação de nossos
estudantes. Além disso, ainda que garantíssemos o acesso de todos os estudantes ao
ensino remoto, seria impossível garantir a formação integral e a qualidade social da
educação, uma vez que o ser humano só se torna humano a partir de suas relações
sociais (CASTRO, 2020, p 108-109).

Essa tormenta que a educação passou durante a pandemia foi o começo do que vem
adiante. As consequências da precariedade das condições de trabalho durante o ensino remoto
estão por vir, e não serão em hipótese alguma superficiais, nem tão poucas breves, e mais, se
não houver políticas públicas que visem mudanças, financiamentos, valorização,
continuaremos a viver em uma permanente pandemia, a do descaso com a educação pública -
a deseducação

3.4.6 Enfrentamento ao adoecimento

A ciência ainda não chegou aos dados e às descobertas


que lhe permitiriam encontrar a chave para a psicologia
do professor. Dispomos apenas de dados
fragmentários, observações descontínuas ainda não
organizadas em um sistema, e algumas tentativas de
natureza puramente prática relacionadas à seleção
psicotécnica dos professores. Cabe observar que,
também no campo da psicotécnica, a elaboração de um
psicograma do professor apresenta maiores
dificuldades que para as demais profissões
(VIGOTSKI, 2003, p. 295).

No eixo sentido e consciência, objetivamos conhecer a percepção do docente sobre o


enfrentamento ao adoecimento por meio das questões sobre experiências em ações ou projetos
para enfrentamento ao adoecimento, alternativas que considerem ser importantes e informações
que possíveis queiram considerar sobre o tema.
Como verificamos na Tabela 29, os professores, em sua maioria, desconhecem ou
não participam de ações e projetos de forma contínua para a prevenção do adoecimento.
Alguns tomaram conhecimento sobre medidas de biossegurança, afastamento, vacina e
agravamentos da pandemia.

Tabela 29 -Relate alguma experiência ou projeto de enfrentamento que você conhece ou


participou para situações emergenciais de adoecimento?
Respostas Frequência
Nenhum 20
151

Desconheço 19
Não participei / não tenho experiência 19
Respostas aleatórias 14
Palestras / lives 12
No caso de pandemia, apenas medidas de biossegurança/ afastamento / vacina / 11
agravamento com a pandemia
Não recordo 6
Não se aplica 4
Formação na Escola / Realizada pelo município 3
Não sei responder 2
Sem resposta 2
Projeto Não pira não 2
CEREST 1
Curso do Ministério da Saúde 1
Protocolo de Segurança na Escola 1
Terapia 1
Total 118
Fonte: Freire, 2022.

Antes da pandemia, já ocorria um número considerável de adoecimento entre os


docentes, acredito que isto se agravou (RESPOSTA R).

As quatro maiores frequências de respostas sugerem que não há no município qualquer


projeto com o objetivo de prevenir o sofrimento/adoecimento docente, ao menos de forma
específica.
O município fez uma formação no início do ano falando sobre a síndrome de burnout,
um distúrbio psíquico causado pela exaustão extrema, sempre relacionada ao trabalho
de um indivíduo. Essa condição também é chamada de “síndrome do esgotamento
profissional” e afeta quase todas as facetas da vida de um indivíduo. Esse mesmo
município que liga a qualquer horário e manda informações de segunda a segunda,
em diversos grupos de WhatsApp criados (RESPOSTA S).

Ainda não verificamos um projeto específico que possa prevenir o


sofrimento/adoecimento, mas diferentes ações, programas podem ser pensados como
possibilidade de instrumentalizar o professor para enfrentar ao sofrimento/adoecimento
psíquico. A linguagem e o desenvolvimento das funções psicológicas superiores são fatores
imprescindíveis para instrumentalizar o ser humano a controlar e expressar suas emoções, pois
a fala e o manejo das emoções geram o alivio de angústias e sofrimentos, e podem prevenir o
adoecimento.
Nessa direção, Queiroz (2021) aponta a dificuldade de encontrar estudos que possam
orientar quanto a prevenção, pois não há uma técnica exata para executar projetos, ações,
programas de prevenção ao adoecimento:
Outro ponto importante que podemos averiguar é a escassez de pesquisas que visam
uma intervenção e/ou ações efetivas sobre o fenômeno do adoecimento psíquico
dos(as) professores(as), que propõem algum benefício direto de bem-estar para os
pesquisados. A partir das buscas foi encontrado somente 2 trabalhos com proposta de
estratégias e enfrentamentos frente ao adoecimento na atividade e atuação docente
(QUEIROZ, 2021, p. 159).
152

É necessário que se conheça todo o contexto que envolve o ser humano para pensar
em estratégias que cercam todos e tudo a sua volta. Como percebemos nas respostas dos
participantes as relações interpessoais e as condições são fatores de prevenção, mas também
causadoras de sofrimento/adoecimento psíquico, e para além dessa constatação, verificamos o
quanto a repressão das próprias emoções podem ocasionar o sofrimento/adoecimento psíquico
docente. Deve se observar e considerar o todo para ao se pensar em elaborar ou facilitar
estratégias o maior número de fatores do contexto seja abrangido. Por não haver nada definido,
específico, as questões individuais, grupais, estruturais e relacionais, devem ser consideradas
para elaboração de técnicas para o enfrentamento:

A utilização de um ou outro tipo de estratégia de enfrentamento será determinada não


só pelo repertório idiossincrático de cada professor, mas também pelas condições
externas, sociais e do ambiente de trabalho, que determinarão o modo, ou os modos,
que cada professor empregará para enfrentar as dificuldades (REBOLO, 2012, p. 128).

Na esteira dessas considerações apontadas, Dias (2021) assinala alguns aspectos


apontados pelos professores universitários como causadores do adoecimento, entre eles estão,
as políticas públicas, as formações, o próprio sistema produtivo, a precarização, flexibilização
e sobrecarga de trabalho, intensificação e o produtivismo acadêmico, e como demais
pesquisadores também percebe incipientes as formas de prevenir o adoecimento.
O bem-estar docente, delimitado como algo que decorre da vivência de experiências
positivas é, desse modo, um processo dinâmico construído na intersecção de duas dimensões,
uma objetiva e outra subjetiva (REBOLO; BUENO, 2014).
A relação entre as dimensões objetivas e subjetivas e a organização do pensamento só
se viabilizam por meio das relações interpessoais e da linguagem, que contribuiu para o
desenvolvimento das funções psicológicas superiores, e da compreensão e conhecimento de si
e do outro, controle e organização das emoções e mecanismos de expressar o que o incomoda.
Não basta apenas relacionar-se, é preciso reconhecer-se expressar-se diante de toda e qualquer
situação:
As avaliações cognitivas e afetivas que o professor faz de si próprio como trabalhador
e das condições oferecidas para a realização do seu trabalho é que determinam o bem-
estar ou o mal-estar docente. Considerando que é da natureza humana buscar o
equilíbrio e o bem-estar, investigar os modos de lidar com os conflitos e com as
situações avaliadas como não satisfatórias é fundamental para que se possa melhor
entender as dinâmicas de obtenção do bem-estar docente (REBOLO; BUENO, 2014,
p. 325).

Leão (2020) assinala como a subjetividade interfere na constituição da identidade e


ações do sujeito no decorrer do desempenho de sua atividade, e de como as palavras utilizadas
ajudam a compreender a realidade. Ressalta que ao realizar uma atividade o ser humano
153

constitui sua identidade, conforme os seus sentidos e significados pessoais, e produzem novas
representações da realidade e de si em função das relações inter e intrapessoais.
As formas como o professor recorre às estratégias tanto externas quanto internas para
a prevenção ao sofrimento/adoecimento psíquico dependem, além das condições de trabalho,
ambiente e estruturas físicas e materiais, das condições psicológicas superiores. Estas só podem
ser utilizadas quando o funcionamento psíquico do ser humano obtém condições, aspectos
qualitativos. Além do mais, esse desenvolvimento e funcionamento nortearão a forma de como
o ser humano se percebe, reage e se expressa. É necessária essa organização interna para que
suas emoções, seus pensamentos por meio da linguagem contribuam como ferramentas de
instrumentalização para prevenção ao sofrimento/adoecimento psíquico.
Indagados a respeito das medidas de prevenção de enfrentamento que poderiam
serem realizadas (Tabela 30), os docentes listaram as seguintes:

Tabela 30 - Quais medidas/ações de enfrentamento poderiam ser realizadas para minimizar o


Sofrimento/adoecimento psíquico do(a) professor(a)? Descreva neste espaço.
Respostas Frequência
Terapia / Acompanhamento psicológico individual ou grupo / profissional da área da 33
saúde mental / Formações com pessoas especializadas / presença do psicólogo na
escola
Mais valorização do profissional / empatia / motivação / respeito 15
Não sei responder/nenhum/ em branco/ desconheço 15
Melhor organização de trabalho / menos burocracia / Sobrecarga de trabalho e horário 13
Medidas Preventivas / palestras 10
Melhores condições, estrutura para o professor trabalhar 9
Medidas de prevenção/ ação relacionado à COVID-19 8
Grupos de ajuda e análise / dinâmicas de motivação / yoga / ginástica laboral / diálogo 6

Compreensão por parte da direção/ menos pressão/ cobranças 5


Tomar medicação / acompanhamento médico 4
Orientações de profissionais de fisioterapia e fonoaudiologia e terapia ocupacional 4

Outros / respostas aleatórias 3


Mais empenho de pais e alunos nas atividades remotas / respeito 3
Melhores salários 2
Retorno das aulas 2
Projetos 1
Difícil cada um tem seu sofrimento e doenças 1
Total 134
Fonte: Freire, 2022.

Quanto se trata de ações consideradas necessárias para prevenir o


sofrimento/adoecimento psíquico, os professores se reportam a um suporte emocional por meio
da relação com um profissional especializado, da saúde mental. Questões subjetivas quanto ao
respeito e valorização antecedem questões de ordem objetivas como organização, menos
burocracia e sobrecarga de trabalho.
O enfrentamento ao sofrimento/adoecimento psíquico dos professores comporta,
sobretudo, uma consciência do conturbado momento em que vive, do funcionamento do modo
154

de produção capitalista e como isso influencia a saúde ou o adoecimento dos professores


(REBOLO, et al., 2020). Segundo a PHC:
Para entender o adoecimento segundo a abordagem da Psicologia Histórico-Cultural,
de base marxista, é preciso compreender que estamos falando de homens reais, que
vivem dentro de uma sociedade desigual, em que as relações de trabalho são alienadas
e, portanto, influenciam na formação do psiquismo, que, por sua vez, reflete no
sofrimento/adoecimento (FACCI; LEONARDO; ALVES, 2020a, p. 186).

O enfrentamento é um processo dinâmico que implica a tentativa de adaptar-se às


condições e situações que também se alteram constantemente (REBOLO; BUENO, 2014).
Além das possibilidades de desistir da carreira ou seguir trabalhando na pós-graduação, as
estratégias de enfrentamento dos professores são individualizadas, tais como: a autopercepção,
o autocuidado, as atividades físicas, a meditação e a oração (DIAS, 2021, p. 51).
Por meio do pensamento, o ser humano organiza seus comportamentos e suas
motivações. A consciência permite-lhe avaliar as diferentes situações que lhe são impostas e o
quanto podem prejudicar sua saúde física e psíquica. Entretanto, esse processo só é possível
quando sua personalidade não foi fragmentada pela atividade alienante e o reconhecimento e
manejo de suas emoções:
O pensamento racional analisa a vivência emocional e a categoriza sob uma
determinada denominação, explicitando-a como emoção, caraterizada pelas
condições socioculturais. É como emoção que o sentido pessoal da atividade
demonstra os interesses do sujeito pelo objeto e o relaciona com a possibilidade de
êxito da atividade condicionada pelas relações sociais (LEÃO, 2020, p. 385).

O sujeito só pode avaliar e dominar o que compreende, e só por meio da consciência,


da percepção de si e do que o rodeia tem condições de organizar seus pensamentos e
comportamentos, objetivando mudanças de situações que lhe causam sofrimento/adoecimento.
Assumir e expressar o que sente fará com que o ser humano seja ele próprio, o fato de ser quem
a sociedade exige o faz esmagar seus sentimentos, suas emoções, e a partir dessa percepção
sofre resultando no adoecimento:
Como o mal-estar é um estado incômodo, de desconforto psicológico, desencadeia
reações que visam eliminá-lo ou diminuí-lo. Haverá, nesse sentido, uma tentativa de
alterar as condições externas ou modificar a própria conduta e o modo de perceber as
situações, com a finalidade de obter bem-estar (REBOLO; BUENO, 2014, p. 328).

Vigotski (2003) não só atribui méritos à linguagem e ao pensamento sobre o


comportamento humano, como explica como se dá esse percurso e como se perceber a partir
relações interpessoais. Essas relações interferem diretamente na maneira que o ser humano se
reconhece e também se comportará em suas relações.
Além das condições de trabalho e as individuais, Queiroz (2021), a partir de sua
pesquisa, aponta algumas considerações sobre o enfrentamento que podem acontecer à medida
que as exigências da sociedade sejam repensadas e deixam de acontecer pautadas apenas na
155

produção, no lucro, no capital. Trata se de uma questão histórica, que percebe no trabalhador a
forma de alcançar e priorizar apenas os resultados, e não o percurso e quem os alcançou:
[...] que as possibilidades de enfrentamento ao adoecimento do professor
universitário se constituem a partir da compreensão dos determinantes do
adoecimento, que são históricos e socialmente produzidos. Em última análise, o
enfrentamento ao adoecimento comporta a necessidade de alteração da lógica
capitalista, centrada no produtivíssimo, na expropriação e no lucro; para uma lógica
que tenha como centro a emancipação e a realização das possibilidades do
desenvolvimento humanizante. É possível superar o adoecimento, sobretudo o
adoecimento psíquico (QUEIROZ, 2021, p. 111).

Silva (2020) complementa a hipótese de que a forma de organização da sociedade atual


é que causa o sofrimento/adoecimento dos trabalhadores entre eles o professor. Mesmo que
poucas e remotas, há sim a possibilidade de prevenir ou minimizar o sofrimento/adoecimento
docente:
Apesar dos limites impostos pelo atual momento histórico, com poucas perspectivas
revolucionárias, há possibilidades de superação, mesmo que pontual, da situação
degradante imposta a milhões de trabalhadores em todo o mundo, sendo parte deles
os professores. É urgente que estudos sobre a saúde do professor sinalizem
possibilidades mais efetivas para a transformação da realidade, tendo em vista que se
considera o sofrimento e o adoecimento ocupacional como um repúdio do corpo à
exploração que os trabalhadores sofrem cotidianamente (SILVA, 2020, p. 47).

Na Tabela 31, a seguir, foram inseridas informações que os participantes


consideraram importantes acrescentar. De modo proposital mantivemos as respostas na
íntegra, sem agrupá-las, para mostrar aos leitores que os temas da teoria de Vigotski como
sofrimento/adoecimento psíquico, as emoções, a constituição do sujeito professor e as relações
surgem como fatores importantes para os participantes.

Tabela – 31 Informações que considere importantes acrescentar:


1. Identificação do clima escolar e da comunidade em torno da escola.
2. Buscar sempre ouvir os professores.
3. Que a secretaria de educação Municipal fosse coerente.
4. Reuniões, estratégias de atendimento e saúde
5. A pandemia tem prejudicado ainda mais o trabalho pedagógico
6. Empatia.
7. Acredito bastante na relevância social dessa pesquisa, parabéns.
8. Cobrança por resultados ocasiona desgaste físico e emocional. Prof. contratado tem a maior carga, pois
se não apresentar rendimento, não continua na escola. Prof. antigo sente-se desmotivado.
9. Acredito que uma profissão não deva ser para adoecimento do ser e se isso está acontecendo, cabe ao
profissional mediante a sua dor, recorrer à análise e ajuda. Pois só assim saberá o que lhe falta. Celas
mentais são terríveis!
Se, após análise de toda a sua trajetória, até chegar aonde estar, perceber que o que exerce já não lhe dar
prazer, procurar novos horizontes. Vejo muitos colegas adoecerem por não aceitarem isso. Problemas
financeiros, salários incompatíveis com o dia a dia do educador, política corrosiva e tóxica, problemas
com a marginalidade, as drogas e a evasão escolar sempre irão existir, pois fazem parte do processo. O
importante é manter a sensatez dentro de toda essa problemática, encontrando soluções criativas e
motivantes. Mantendo o bom ânimo para continuar o bom e velho combate que é a vida. E viver é um
ato de coragem.
10. Acho que como estamos trabalhando totalmente com recursos tecnológicos, a escola devia liberar o Wifi
ao professor
11. Observo na equipe a procrastinação, ansiedade e frustação. No grupo de dez pessoas, duas se
reinventarem e estão otimistas, oito falam pra quê?...
156

12. Só retomar as aulas presenciais quando a maioria das pessoas estiverem vacinadas
13. Ser profissional da educação nestes tempos está difícil, angústias e falta de um salário condizente
desafiam e fazem a gente pensar em desistir. Comigo isso não aconteceu, mas tem muita gente que
ocorre. Ter una política de apoio à docência em termos de saúde psíquica faz toda a diferença.
14. O papel do docente é muito importante para a sociedade, e essa pandemia serviu para muitas coisas, Os
pais estão valorizando mais o professor, pois perceberam o quão importante é o seu papel. Os docentes
evoluíram muito profissionalmente com relação às tecnologias, com o intuito de chegar até seus alunos.
Mas quem está no papel de gestor, diretor, coordenador, que devem ser os direcionadores das políticas
públicas, devem saber dar suporte e mediar esse processo, para evitar a sobrecarga emocional e de
trabalho e consequentemente o adoecimento dos docentes.
15. A pandemia veio derrapante, todos sem exceção sofreram com as consequências. O que nos resta é
aproveitar cada oportunidade de desenvolver nosso trabalho, de acordo com esta nova realidade.
16. Afeto um pelo outro.
17. Deve sempre existir um comprometimento mútuo entre escola e todos os envolvidos na educação.
18. Divulgação da pesquisa.
19. Tenha empatia pelo seu próximo. Juntos vamos vencer, mas cada um deve fazer a sua parte.
20. Falta agir. É muita burocracia, pouca ação.
Muitas reuniões, que apenas ficam arquivadas e só reativadas quando novos/velhos problemas
ressurgem. Muitos profissionais têm receio de serem o que de fato são, pelo medo de serem isolados.,
não relatando o que de fato acontece, mantendo seus nomes ou títulos profissionais reservados de
problemas.
21. Gostar do que você faz no seu serviço.

22. Sempre motivar para não desistir neste momento difícil.


23. O professor precisa ser valorizado não só em termos de salário, mas como pessoa essencial para o
desenvolvimento da aprendizagem do aluno.

24. O próximo questionário deveria ter a opção, às vezes.


25. Que sua pesquisa seja divulgada. Para sabermos mais sobre a saúde dos professores do município de
Corumbá.
26. Valorização quanto ao salário para que os professores não precisem trabalhar três períodos.
27. O trabalho em equipe ajuda a diminuir a sobrecarga do trabalho, falta um pouco.
28. Todos pela Educação, sem falsidades, hipocrisias e valorizando os profissionais das escolas.
29. A secretaria de educação lutar pelos nossos direitos como o direito às férias dos professores contratados.
Ficamos reféns desse sistema. Sem voz.

30. Obtive formação fora da escola.


31. Desnecessária elaboração de tantas atividades, pois os pais não têm tempo para realizar, não têm preparo
e nós, os professores, também estamos vivenciando o luto, e a única coisa às vezes no pensamento é
querer viver.

32. Escolas equipadas com internet, computadores, uma sala de professores adequada, ...
33. A vida saudável é importante para o bom desempenho profissional.

34. Sugestão: Atendimento de um profissional fixo para atendimento específico da equipe escolar.
35. O professor que trabalha descontente adoece com frequência.

36. Em qualquer situação, devemos nos colocar no lugar do outro. Assim poderemos ajudar mais.
37. O mais fundamental para um bom desempenho é a sintonia entre toda a equipe, com respeito e
humildade, agindo como uma família.

38. Trabalho em equipe.


39. Trabalho coletivo.
Fonte: Freire, 2023.

A partir das relações do ser humano com a realidade, Vigotski observou a relação entre
o pensamento e a linguagem e sua inexigibilidade para o desenvolvimento humano. A
linguagem em suas diferentes formas, sejam elas escrita, falada ou expressada corporalmente,
157

são fundamentais para as relações, para o aprendizado, para a sobrevivência, e compõem o


processo de desenvolvimento do psiquismo humano.
A conversão desse processo natural elementar em processo cultural complexo ocorre,
como nos demais processos psicológicos que orientam e regulam a conduta humana, pela
interposição de signos na relação entre sujeito e objetos da realidade (MESQUITA; BATISTA;
SILVA, 2019).
Esse processo complexo de desenvolvimento resulta da constituição do ser humano e
trabalhador. Com base nos aspectos sociais, históricos e culturais, o ser humano vai se
desenvolvendo e se apropriando do sentimento de pertencimento da sociedade. Nesse meio,
forma-se humano e profissional, escolhe suas ferramentas, transforma a natureza para o alcance
de seus objetivos e a satisfação das suas necessidades, mas é dominando suas emoções que
consegue buscar o prazer e a satisfação, e não guarda para si o que lhe faz mal, consegue de
maneira madura expressar o que lhe incomoda, perturba.
Assim, a atividade interna, por sua forma, ao se originar da atividade externa prática,
não se separa e não se coloca acima dela, mas preserva uma ligação fundamental e, ademais,
dupla, com ela (LEONTIEV, 2021).
A partir do momento em que essa ligação deixa de existir, o ser humano perde sua
individualidade, sua personalidade é corrompida e os seus interesses pessoais deixam de ter
sentido, direção. Essa condição o leva a desempenhar sua atividade de forma alienada, mesmo
percebendo tudo a sua volta, o ser humano se cala, suas emoções não são mais controladas,
passam a ser silenciadas até que surgem os sintomas do seu sofrimento/adoecimento psíquico.
Para o entendimento das funções psicológicas no trabalho, devemos considerar que a
coincidência entre os interesses e os fins da atividade humana só ocorrem quando
estes últimos se tornam conscientes para o sujeito. Porém, apesar da consciência dos
interesses motivadores depender da realização da atividade, eles não estão ausentes
dos processos psíquicos, porque se manifestam na sua representação psicológica sob
a forma de tônus emocional das ações (LEÃO, 2020, p. 384-385).

A história do desenvolvimento das emoções se vincula à história da atividade de


produção da realidade. Como ser social, o ser humano responde às necessidades forjadas na
relação ativa com o mundo, satisfazendo-as por meio da atividade consciente (MESQUITA;
BATISTA; SILVA, 2019).
Vigotski e Moreno consideram que a relação dialética entre condições objetivas e
subjetivas, são promovedoras tanto do adoecimento, quanto das formas de
enfrentamento para manutenção da saúde. Os autores dão ênfase ao papel do outro, às
relações sociais, e têm como pressuposto da humanização a apropriação do que foi
objetiva e historicamente criado pelo ser humano – o que em Moreno é nominado
conserva cultural, e da ação criativa no universo – a ação do sujeito que transforma a
própria realidade objetiva. Para ambos, a constituição psíquica humana se dá no
processo social. Esse posicionamento expande o campo de interpretação sobre o
adoecimento e as considerações sobre os transtornos mentais (DIAS, 2021, p. 87).
158

Encerramos esse tópico com as análises dos questionários dos professores, e foi
possível perceber em determinados momentos que há a consciência e percepção da existência
do sofrimento/adoecimento, contudo, também inferimos haver uma dificuldade, “recusa” em se
expressar, mesmo que seja para falar de si, e mais ainda, sobre todo o processo de trabalho.
O silenciamento das emoções é de fato aspecto importante propulsor do
sofrimento/adoecimento psíquico, e mais, o quanto a percepção do ser humano sobre essa
atitude o faz gerar angústia, e aparição de sintomas que são devido essa repressão. O falar é
terapêutico, o silenciar é padecedor. Os dados até aqui confirmam nossa tese sobre o
silenciamento das emoções e suas consequências para o corpo e mente.

3.5 Das escalas dos professores: Resultados e análises

Assim, a psicologia não pode fornecer diretamente


nenhum tipo de conclusões pedagógicas. Mas como o
processo de educação é um processo psicológico, o
conhecimento dos fundamentos gerais da psicologia
ajuda, naturalmente, a realizar essa tarefa de forma
científica. A educação significa sempre, em última
instância, a mudança da conduta herdada e a inoculação
de novas formas de reação (VIGOTSKI, 2003, p. 41).

Neste tópico apresentamos as análises e discussões das 118 respostas de duas escalas
a Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20) e a Questionário de estresse nos Professores:
Ensino Básico e Secundário (QSPEBS). Os dois instrumentos foram aplicados no mesmo
formulário online junto do questionário.

3.5.1 Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20)


O Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20) se destina à detecção de sintomas, ou seja,
sugere nível de suspeição (presença/ausência) de algum transtorno mental, mas não discrimina
um diagnóstico específico. É formado por 20 questões para o rastreamento de transtornos não
psicóticos e as respostas são dicotômicas, sendo que, cada afirmativa soma um ponto, em um
escore de 0 a 20, que varia de nenhuma à extrema probabilidade de TMNP15.
As 20 questões da escala SRQ-20 e as 118 respostas estão organizadas na Tabela 32.
Referem-se a dores de cabeça, falta de apetite, dificuldades de sono, ocorrência de sustos,
tremores nas mãos, nervosismo, tensão, preocupação, má digestão, clareza de pensamento,
tristeza, frequência de choro, dificuldades para realizar com satisfação suas atividades diárias,

15
RENSTEIN, C.; WANG, Y-P.; HUNGERBÜHLER, I. (Org.). Instrumentos de avaliação em saúde mental.
Porto Alegre: Artmed, 2016.
Harding e cols. (1980) (Validação para uso no Brasil Mari & Williams, 1986).
159

dificuldades para tomar decisões, dificuldades no serviço, ser incapaz de desempenhar


um papel útil em sua vida, perda de interesse pelas coisas, sentir-se uma pessoa inútil, sem
préstimo, ideias de acabar com a vida, sentir-se cansado o tempo todo, sensações desagradáveis
no estômago e facilidade de cansaço.

Tabela 32 – Respostas da Escala – SRQ-20


Perguntas a respeito da sua saúde SIM NÃO Total
01- Tem dores de cabeça frequentes? 39 79 118
02- Tem falta de apetite? 9 109 118
03- Dorme mal? 49 69 118
04- Assusta-se com facilidade? 40 78 118
05- Tem tremores na mão? 16 102 118
06- Sente-se nervoso (a), tenso (a) ou preocupado (a)? 72 46 118

07- Tem má digestão? 33 85 118


08- Tem dificuldade de pensar com clareza? 29 89 118
09- Tem se sentido triste ultimamente? 54 64 118
10- Tem chorado mais do que de costume? 36 82 118
11- Encontra dificuldades para realizar com satisfação 36 82 118
suas atividades diárias?
12- Tem dificuldades para tomar decisões? 33 85 118
13- Tem dificuldades no serviço (seu trabalho é penoso, 13 105 118
causa sofrimento)?
14- É incapaz de desempenhar um papel útil em sua 11 107 118
vida?
15- Tem perdido o interesse pelas coisas? 30 88 118
16- Você se sente uma pessoa inútil, sem préstimo? 8 110 118

17- Tem tido ideias de acabar com a vida? 5 113 118


18- Sente-se cansado (a) o tempo todo? 29 89 118
19- Tem sensações desagradáveis no estômago? 38 80 118

20- Você se cansa com facilidade? 38 80 118


Fonte: Freire, 2022

Alguns dados são relevantes destacar na tabela SRQ-20, a questão número 03, onde é
questionado se dorme mal, há uma proximidade nas respostas, das 118 respostas, 49
responderam que sim, e 69 não, e a questão 09 que se refere sentir se triste ultimamente 54
professores afirmam que sim, e 64 não.
Vários estudos apontam as diferentes situações que podem desencadear o
sofrimento/adoecimento psíquico do professor e como os sintomas podem surgir de diferentes
maneiras, sem mesmo que o sujeito os perceba como resultado do sofrimento/adoecimento.
O trabalho é relevante para a vida dos indivíduos e tem consequências em suas
condições de saúde, tanto físicas quanto mentais (MOREIRA; RODRIGUES, 2018).
Outra questão que ressalta a importância de ouvir os professores trata sobre sentir- se
nervoso, tenso, preocupado, questão número 06. O resultado para sim, apresenta um número de
72 professores com essa sensação, sendo que para não apenas 46. Vale indagar-se o porquê
160

dessa sensação prevalecer entre os professores, o que pode estar causando preocupação, tensão
e o nervosismo? Inúmeras são as possibilidades, mas diante as respostas anteriores sobre as
condições, atividades, podemos sugerir que a organização do trabalho pode contribuir para o
aparecimento desses sintomas desse tipo. Não o bastante, cabe também ressaltar o período em
que a pesquisa foi realizada, em plena pandemia, onde a contaminação alcançava índices
alarmantes e não havia ainda iniciado a vacinação contra a COVID-19.
Oliveira e Santos (2021) verificaram que, devido às condições de trabalho, professores
têm solicitado afastamento por causa do adoecimento, e com base em pesquisas recentes sobre
o tema, a função de ensinar tem preocupado os profissionais da saúde e da educação. Com
resultado nos estudos, verifica se a presença de vários sintomas mentais nessa categoria devido
as condições de trabalho.
Sintomas estes, que estão causando longos afastamentos do trabalho por doença. A
partir desse debate sobre a relação do adoecimento mental e a categoria docente, se faz
importante uma busca de mudanças nessa relação (OLIVEIRA; SANTOS, 2021, p. 2).
Moreira e Rodrigues (2018) observaram em seu estudo diversas situações que podem
adoecer o professor. Dentre elas, os autores apontam as condições de trabalho dos professores
que não estão adequadas, e acabam adoecendo por falta de estruturas físicas e materiais,
violência e desrespeito. Além disso, os estudiosos ressaltam a importância de investigar formas
de melhorar essa situação, além de decisões efetivas dentro e fora das escolas que contribuam
para mudança dessa realidade. A educação brasileira e condições de trabalho docente são
assuntos de grande relevância.
As condições de trabalho são potencializadoras do adoecimento, inclusive dos
professores, como apontam as pesquisas levantadas por Oliveira e Santos (2021) e salientam,
que toda classe trabalhadora pode adoecer, porém as pesquisas têm apontado que os professores
pertencem a uma categoria com grande exposição ao adoecimento mental devido às condições
de trabalho.
Quanto a aplicação dos instrumentos no período crítico da pandemia, no início do
trabalho remoto, do isolamento social, do crescente número de óbitos e das diferentes e novas
formas de ministrar aulas e acompanhar o aprendizado dos alunos, nos permite sugerir que
podem ter influenciado às respostas.
O adoecimento docente é uma realidade que não deve ser negada ou negligenciada.
Essa condição experienciada pelo professor já trazia preocupações antes da pandemia
causada pela COVID-19. As dificuldades desencadeadas pela insegurança que a
pandemia mundial gerou nas pessoas, somadas às demandas de transformar às pressas
o ensino presencial em ensino remoto, mostraram-se como fatores que desencadearam
a tendência ao adoecimento psíquico dos professores brasileiros (SOUZA et al., 2021,
p. 154).
161

Os pesquisadores complementam os comentários, com considerações relevantes


quanto ao trabalho remoto e suas consequências, pois se trata de uma forma de trabalho que os
professores não concordam e reconhecem as dificuldades e limitações do processo. Essa
situação gerou estresse, ansiedade, e mesmo depressão.
Outro fator apontado nos diferentes estudos durante a pandemia sobre o trabalho
remoto e suas consequências, é o fato de os professores terem de lidar com o retorno das aulas
presenciais e todas as demais dificuldades encontradas pelos alunos durante e pós-pandemia:
Uma vez que, não se sabe ainda por quanto tempo as aulas on-line se manterão como
formato possível de escolarização de crianças, adolescentes e adultos, essa condição
laborativa experienciada pelo professor traz dados importantes, ao se pensar que,
mesmo quando for possível a ampliação do retorno às aulas presenciais, não se deve
negligenciar a saúde do professor. A sua integridade física e mental é absolutamente
necessária e o professor enfrentará novas demandas para a realização da readaptação
dos alunos ao contexto educacional, depois de terem ambos, professores e alunos
vivenciado o isolamento social e confinamento (SOUZA et al., 2021, p. 154).
.
O trabalho é uma atividade fundamental para o sujeito e sua existência, sobrevivência
e transformação. Essa atividade regula a vida e suas maneiras de existir. Quando o sujeito não
consegue ter controle, escolhas e objetivação próprias, o trabalho passa a desencadear o
sofrimento/adoecimento psíquico.
A Organização Internacional do Trabalho (OIT, 2005) avalia a atividade docente como
uma das categorias de trabalho mais estressantes, com forte incidência de elementos que
conduzem à Síndrome de Burnout (SB).
De maneira geral, o adoecimento mental docente se estabelece de modo gradual, e se
refere a eventos com os quais o sujeito não encontra estratégias de lidar, pois são situações
vistas por eles como adversas (OLIVEIRA; SANTOS, 2021).
Leontiev (2021) esclarece que o objeto da atividade confere a ela certa orientação.
Trata-se de seu motivo efetivo, podendo ser tanto material quanto ideal, mas o que de fato existe
é a necessidade, ou seja, o trabalho sempre responderá a uma necessidade.
Compreender todo o contexto que envolve o ser humano e sua atividade é essencial
para entender o sofrimento/adoecimento psíquico. As condições, as relações, os motivos e as
necessidades estão integradas na ação do sujeito, questões objetivas e subjetivas devem estar
integradas durante a atividade, essa relação é necessária.
O ponto de partida para a investigação do sofrimento e/ ou adoecimento ocupacional
é a própria atividade, as condições para a sua execução, sua estrutura e como esta
determina e é determinada por outros processos psíquicos, especialmente a
consciência e a personalidade num dado momento (se ela é ou não a atividade
principal), considerando os mecanismos e tipos de alienação existentes no e para o
indivíduo (SILVA, 2020, p. 48).

Não resta dúvida da necessidade de se (re)pensar, criar e aplicar estratégias de


prevenção ao sofrimento/adoecimento psíquico docente, considerando a atividade primordial
162

que desempenha para/na sociedade. Contudo, é fato que perante a organização da sociedade
atual dificilmente teremos a mudança necessária, mas se torna imprescindível diante a situação
que o trabalho docente se encontra nos dias atuais:
Especialmente se considerarmos que a educação tem papel importante nesse processo
de transformação social e emancipação humana. Tal processo fica bastante limitado
com a intensificação dos processos destrutivos da saúde e da vida, que desorganizam
ou desintegram o psiquismo, caracterizando o adoecimento. Entende-se que o
adoecimento é construído na relação do indivíduo com o mundo, em que apropriações
alienantes e desumanizadoras promovem a cisão e fragmentação do indivíduo,
ampliando os conteúdos inconscientes e restringindo as possibilidades da consciência,
o que ocasiona a alteração na hierarquia dos motivos, das necessidades e da própria
personalidade (SILVA, 2020, p. 70).

A resposta da questão 16 nos remete a satisfação em ser professor dos participantes


dessa pesquisa. Ao serem questionados sobre a sensação de inutilidade, apenas 08 responderam
que sim, que tem essa sensação, ao contrário de 110 professores que responderam não se
sentirem inúteis. Percebemos que os professores percebem em si a possibilidade de fazer, criar,
construir. Podemos relacionar essas respostas não só a satisfação em ser professor, mas também
as atividades que mais consideram prazerosas onde se referem as diferentes formas de ensinar,
de trabalhar, se percebem uteis, criativos, capazes.
Apesar do instrumento não ser direcionado especificamente para o ambiente de
trabalho, percebemos que as respostas nos remetem ao tema da percepção e subjetividade. Por
ser um instrumento de respostas objetivas, diretas observamos ao mesmo tempo que ora há
situações que confirmam o sofrimento/adoecimento, ora não. Essa contradição nos confirma a
importância do ser humano se perceber, se conhecer e de tudo que está a sua volta. Refere-se a
um instrumento que procura investigar a percepção de si próprio, de como se vê e como se
sente, e contribui para compressão de como a saúde vai sofrendo alterações gradativamente
devido a maneira de reagir diante a percepção de si e do mundo. E como um instrumento de
rastreio pode colaborar para o planejamento e elaboração de estratégias para que os professores
consigam administrar, ter o manejo de situações ou outros eventos que possam causar o
sofrimento/adoecimento psíquico.
3.5.2 Questionário de estresse nos Professores: Ensino Básico e Secundário (QSPEBS)

O outro instrumento que foi aplicado junto ao questionário foi o QSPEBS, que também
obteve 118 respostas, e é constituído por duas partes distintas. A primeira parte é caracterizada
por uma questão destinada a avaliar os níveis globais de estresse dos professores, numa escala
que varia entre 0 (Nenhum estresse) a 4 (Elevado estresse). Na segunda parte são incluídos 36
itens, correspondentes a diferentes fontes de estresse colocadas aos docentes no processo de
163

ensino, sendo respondidos em uma escala tipo “Likert” de cinco pontos (0 = Nenhum estresse;
1 = Pouco estresse; 2 = Moderado estresse; 3 = Bastante estresse 4 = Elevado estresse)16.
Na escala, na parte 1, o entrevistado responde assinalando com um círculo o número
que melhor indicar o nível de estresse que sente geralmente no exercício da sua atividade
profissional. A questão dessa parte investiga o nível de estresse que a atividade profissional
provoca no professor, e está organizada dividida em 05 níveis que correspondem 0 para nenhum
estresse; 01 para pouco estresse; moderado estresse 02, bastante estresse 03 e elevado estresse
04.
Na parte 1 da escala QSPEBS as respostas estão expostas na tabela 33.
Nenhum Pouco estresse Moderado Bastante Elevado estresse
estresse estresse estresse
0 1 2 3 4

Tabela 33 - o nível de estresse que sente geralmente no exercício da sua atividade


profissional.
Repostas Frequência
Nenhum estresse 17 (14%)
Pouco estresse 45 (38%)
Moderado estresse 39 (33%)
Bastante estresse 10 (09%)
Elevado estresse 07 (06%)
Total 118
Fonte: Freire, 2022

Na parte 2 da escala QSPEBS, verificamos as respostas referentes às 36 questões,


envolvendo possíveis causadores de estresse vinculados ao exercício da profissão docente, em
termos de alunos, colegas, locais de trabalho, autoridades, tipo de ações docentes, questões
salariais e de carreira. Para melhor compreensão do leitor organizamos a tabela por quesitos
que se apresentam da seguinte maneira17:
Tabela 34 Quesito ALUNO - questões que envolvem as relações, percepções sobre os
alunos. Se referem as questões da escala QSPEBS: 01, 04, 07, 10, 13, 16, 19, 22, 27, 30, 34 e
36.
Tabela 35 Quesito CARREIRA – questões que avaliam a percepção sobre a carreira,
e são as questões da escala: 06,12, 14, 18, 24, 29, 35.

16
Rui Gomes (QSPEBS). Universidade do Minho. Escola de Psicologia.
17
Organizamos a apresentação por quesitos para que o leitor tenha melhor compreensão durante a leitura, a escala
com sua estrutura original está anexa a esse trabalho.
164

Tabela 36 Quesito ORGANIZAÇÃO/CONDIÇÕES DE TRABALHO – investigam a


percepção referente ao processo de trabalho e dizem respeito as questões: 02, 03, 05, 08, 09,
11, 15, 17, 20, 21, 23, 25, 26, 28, 31, 32, 33.
165

Tabela 34 - Fontes potencialmente geradoras de estresse – Quesito ALUNOS


FONTES POTENCIALMENTE 0=Nenhum % 1= Pouco % 2 = Moderado % 3= Bastante % 4=Elevado % Total %
GERADORAS DE ESTRESSE estresse estresse estresse estresse estresse
1. Mau comportamento dos alunos em 41 35 48 41 14 12 10 8 5 4 118 100
geral
4. Falta de iniciativa e vontade de 52 44 34 29 22 19 6 5 4 3 118 100
trabalhar pelos alunos
7. Comportamento 47 40 35 30 19 16 9 7 8 7 118 100
indecente/descarado dos alunos
10 Alunos com baixas capacidades 54 46 38 32 15 13 6 5 5 4 118 100
13. Mau comportamento contínuo de 44 37 34 29 22 19 9 7 9 8 118 100
alguns alunos
16. Disparidade nas capacidades dos 53 45 35 30 19 16 7 6 4 3 118 100
alunos
19. Alunos barulhentos 54 46 35 29 15 13 8 7 6 5 118 100
22. Alunos com capacidades muito 53 45 40 34 12 10 10 8 3 3 118 100
diferentes
27. Alunos que demonstram falta de 28 24 49 41 22 19 7 6 12 10 118 100
interesse
30. Problemas de comportamento 43 36 42 35 15 13 9 8 9 8 118 100
difícil por parte dos alunos
34. Alunos pouco motivados 36 30 45 38 15 13 15 13 7 6 118 100
36. Turmas difíceis 46 39 39 33 15 13 8 7 10 8 118 100
Fonte: Freire, 2022
166

As dinâmicas, as relações, as condições e organização de trabalho dos professores


comprometem a qualidade do ensino. A própria atividade gera angústias e sentimentos negativos
que acabam desencadeando uma série de consequências, inclusive para saúde desses
trabalhadores.
No que se refere aos comportamentos dos alunos, de forma geral, 48 (41%) professores
sentem pouco estresse. Não diferentemente, o mau comportamento contínuo é considerado por
outros 34 (29%) como provocadores de pouco estresse. A falta de interesse dos alunos é apontada
por 49 (41%) como propensão a pouco estresse e 22 (19%) para moderado estresse. A falta de
motivação dos alunos é apontada por 45 (38%) como causa de pouco estresse, 15 (13%) de
moderado estresse e também 15 (13%) de bastante estresse.
É interessante apontar que, diante disso, conforme Pontes e Guaraldo (2014), o ser
humano, como sujeito histórico, produz história e se (re)constrói na relação com o outro. Portanto,
é um ser social, que influencia e sofre influência da sociedade na qual se insere (PONTES;
GUARALDO, 2014).
As respostas referentes a percepção dos professores em relação aos alunos confirmam e
reafirmam o quanto as relações interpessoais influenciam não só os aspectos objetivos como os
subjetivos na atividade humana. Se sentir estressado devido a maneira que o outro se comporta em
relação a si, do pouco ou nenhum interesse pelo seu trabalho, por sua contribuição, faz com que o
professor inicie um processo de desmotivação. A sensação de desrespeito e inutilidade passam a
comprometer não só o trabalho, mas também sua saúde.
O processo de ensino e aprendizagem se dá por meio da relação professor-aluno, da
organização do conteúdo, da mediação. Esse percurso só é possível quando os sujeitos envolvidos
se relacionam mutuamente e motivados, assim transmitem, organizam e transformam o conteúdo,
contribuindo para o desenvolvimento do psiquismo.
Vale ressaltar a compreensão de que, no desenvolvimento do psiquismo humano, as
dimensões afetiva e cognitiva existem em unidade, de forma que os processos educativos
incidem sobre a unidade afetivo-cognitiva, envolvendo a transmissão-apropriação de
conhecimentos em unidade com o desenvolvimento de motivos e sentidos da atividade.
Para tanto, o professor organiza o conteúdo escolar e as estratégias de ensino,
considerando, por um lado, os princípios e as particularidades do desenvolvimento
infantil em cada período do desenvolvimento humano e, em particular, o
desenvolvimento real e o desenvolvimento próximo (ou iminente) do educando. O
professor é, portanto, aquele que dirige o processo de ensino e aprendizagem do aluno.
Entre professor e aluno há uma relação de desigualdade no ponto de partida do processo,
que deve ser superada no ponto de chegada. (PASQUALINI; EIDT, 2013, p. 40).

Em todos os lugares, as relações são fundamentais para o desenvolvimento humano.


Contudo, no contexto escolar a relação professor-aluno é indispensável para o desenvolvimento
das funções psicológicas superiores, apropriação do conhecimento, além de ser um aspecto
importante para não ocorrer o desencanto em relação a profissão, além disso, as relações interferem
167

diretamente na maneira de agirmos, nos comportarmos. Assim, as relações precisam de afeto,


respeito mútuo, pois o sentimento negativo na relação professor-aluno interfere na maneira de
como um perceberá o outro, e esse processo pode ser além de uma fonte geradora de estresse,
também um desencadeador do sofrimento/adoecimento psíquico:
Por exaustão emocional entende-se o estado em que os vínculos afetivos, característica
estrutural do trabalho que envolve o cuidado para com o outro, se encontram desgastados.
O professor nessa situação percebe esgotados seus recursos emocionais próprios, em
decorrência do desgaste resultante dos inúmeros desafios com os quais deve lidar em seu
dia a dia.
A despersonalização é caracterizada pela substituição do vínculo afetivo por um vínculo
racional, pela qual se perde o sentimento de que se está lidando com outro ser humano.
as relações interpessoais acabam caracterizando-se pela dissimulação afetiva, por atitudes
negativas, exacerbadamente críticas, comprometendo como consequência a própria
integração social do professor (MARTINS, 2015b, p. 15).

As relações estão envoltas de emoções, quando há a perda do encanto, do interesse, da


admiração, a repressão dos sentimentos envolvidos nessas relações provocam a decepção, e essa
situação leva não só a renúncia em realizar a atividade com prazer e satisfação, mas também de se
relacionar com as pessoas envolvidas nesse processo. Esse contexto é gerador de
sofrimento/adoecimento, pois o professor assegura a necessidade de realizar a atividade para
sobreviver, e não porque se percebe essencial nessa atividade, as relações sadias são
imprescindíveis para a saúde psíquica do ser humano.
As relações interpessoais é um dos assuntos de grande importância nas organizações e na
gestão de recursos humanos por estar presente no dia a dia de nossas vidas e por envolver
aspectos tanto do crescimento pessoal e interpessoal, como profissional. Hoje se vive um
mundo tecnológico, onde muitas das interações pessoais e profissionais ocorrem por este
meio. Assim, há necessidade de uma atenção e preparo por parte das organizações de
cultivarem de forma estratégica os relacionamentos internos (DANTAS; HENRIQUES,
2020, p. 2).

Podemos inferir que uma das consequências da pandemia foi o fortalecimento do


distanciamento social e pessoal: uma individualização. Por termos consciência que os meios
eletrônicos já induziam ao afastamento das pessoas, agora pós pandemia essa situação pode se
intensificar. Essa situação deve ser verificada diante a escassez de empatia e envolvimento pessoal
nas relações atuais, pois podem contribuir para o sofrimento/adoecimento psíquico de forma
concreta e demasiada.
168

Tabela 35 - Fontes potencialmente geradoras de estresse – Quesito CARREIRA


FONTES POTENCIALMENTE 0=Nenhum % 1= Pouco % 2 = Moderado % 3= Bastante % 4=Elevado % Total %
GERADORAS DE ESTRESSE estresse estresse estresse estresse estresse
6. Salário inadequado 28 24 34 29 28 24 13 11 15 12 118 100
12 Poucas oportunidades de promoção 49 42 32 27 16 14 11 9 10 8 118 100
14. Falta de poder e influência nas 52 44 36 30 16 14 8 7 6 5 118 100
sanções disciplinares
18. Baixo estatuto socioprofissional da 58 49 30 25 14 12 7 6 9 8 118 100
profissão
24. Carreira mal estruturada 43 37 37 31 17 14 8 7 13 11 118 100
29. Falta de perspectivas de 45 38 37 31 19 16 8 7 9 8 118 100
desenvolvimento e promoção na
carreira
35. Falta de estabilidade e segurança 51 43 23 20 25 21 7 6 12 10 118 100
na carreira
Fonte: Freire, 2022
169

No quesito que avaliou a percepção dos professores sobre a carreira, o salário inadequado
é apontado como agente de pouco estresse para 34 (29%) professores, de moderado estresse para
28 (24%) e de elevado estresse para 15 (12%).
Apesar das poucas oportunidades de promoção terem sido apontadas por 49 (42%) como
fonte de nenhum estresse; para 32 (27%) dos participantes causam pouco estresse; moderado
estresse para 16 (14%); bastante estresse para 11 (9%); e elevado estresse para 10 (8%).
A carreira mal estruturada é uma condição que resulta em pouco estresse para 37 (31%)
dos docentes, moderado estresse para 17 (14%) e elevado estresse para 13 (11%). A falta de
perspectiva de desenvolvimento e promoção na carreira é indicada como fonte de pouco estresse
para 37 (31%) e moderado estresse para 19 (16%). A falta de estabilidade e segurança na carreira
é determinante de pouco estresse para 23 (20%) dos professores, moderado estresse para 25 (21%)
e elevado estresse para 12 (10%).
O termo valorização docente reúne três importantes elementos que interferem na
condição profissional: 1) a remuneração; 2) a carreira e condições de trabalho; e 3) a formação
inicial e continuada (OLIVEIRA, 2013).
As constantes mudanças no âmbito educacional, a ampliação do acesso à educação,
qualificação do ensino, materiais e condições melhores também levaram ao aumento das
discussões no que tange à valorização do sujeito professor:
O direito à diferença e ao reconhecimento vêm sendo fortemente afirmados por vários
movimentos na sociedade contemporânea. Esses movimentos produzem impactos na
educação, especialmente nas disputas relativas aos currículos escolares, portanto na
formação dos professores e no seu trabalho. Ambas as tendências são forças sociais que
se avolumam e colocam novas condições para a concepção e consecução de políticas
públicas voltadas ao social, e, mais enfaticamente, para as redes educacionais escolares.
Aqui, o fator humano – quem ensina, quem aprende, quem faz a gestão do sistema e da
escola e como – destaca-se como polo de atuação dos vários grupos envolvidos na busca
de uma nova posição social e de novas condições para suas relações sociais, de
convivência e de trabalho. A uma vez, o reconhecimento social de grupos diversificados
que demandam por escolarização, e, simultaneamente, a necessidade do reconhecimento
social da categoria dos professores como trabalhadores essenciais. Essas questões se
inserem no amplo âmbito da justiça social. Não se trata, portanto, de reconhecimento no
sentido do orgulho pessoal, mas no sentido de uma subjetividade coletiva na demanda
por equidade social (GATTI, 2012, p. 91-92).

No tocante ao sujeito (EU) e professor (PROFISSIONAL), o conjunto dos aspectos que


envolvem a valorização do professor deve considerar as diferentes circunstâncias que precisam
abarcar desde a formação, a remuneração e as condições de trabalho. São as condições para o
desempenho da atividade que colaboram para a permanência da satisfação e prazer em exercer a
profissão. Não há condições de trabalhar de forma prazerosa se não haver qualidade para execução
da atividade, pois as péssimas conjunturas nas suas diferentes esferas fazem com que a profissão
docente deixe de ser atraente, vai se perdendo o encanto:
170

Ainda quanto à valorização docente e às condições de trabalho, no âmbito dos sistemas


de ensino, ressalta-se a importância dos planos de carreira por pressupor a inserção na
profissão via concurso público de provas e títulos, definir a remuneração com base no
piso salarial profissional e estimular o crescimento profissional por meio da formação
continuada e da avaliação do desempenho docente. Os planos de carreira tendem a
favorecer a atratividade da profissão ao promover a articulação entre formação inicial e
continuada, remuneração, condições de trabalho (especialmente, no que se refere à
remuneração e à jornada, incluindo um terço da carga de trabalho para planejamento,
reuniões pedagógicas e elaboração de avaliações) e possibilidades de progressão
profissional (GOMES; NUNES; PÁDUA, 2019, p. 282).

Trata-se de voltar o olhar para o ser humano que, por meio da sua atividade, se desenvolve
e satisfaz as suas necessidades, ao mesmo tempo em que colabora para o desenvolvimento e a
hierarquização de motivos do outro sujeito da relação, o aluno. A inconstância das condições de
trabalho oportuniza de forma progressiva uma descontinuação com a docência, ou pelo
adoecimento ou pelo desapontamento pela profissão. Nessa direção, é fundamental a adoção de
políticas de cuidado para com a saúde do professor, as quais também podem ser compreendidas
como uma das estratégias de valorização docente (GOMES; NUNES; PÁDUA, 2019, p. 292).
Gatti (2012) sinaliza para a pertinência das discussões sobre a valorização do profissional-
professor que realiza a educação e as mudanças culturais indispensáveis para o seu reconhecimento
social.
É preciso assumir a existência da desvalorização e das condições precárias de trabalho do
professor. Além disso, é fundamental iniciar um processo de retomada de empatia por esse
profissional que necessita de novos olhares, que vão desde sua formação aos planos de cargos e
carreiras. A segurança e estabilidade são condições necessárias para todos os trabalhadores, e não
há qualquer possibilidade de se trabalhar de forma satisfatória e prazerosa se não houver o
reconhecimento profissional, é essencial retomar o prestigio de ser professor!!
Assim, compreender as políticas governamentais em relação aos docentes pode iluminar
aspectos da relação opaca entre legisladores e gestores dessas políticas e as novas
postulações de grupos sociais que reivindicam para si, de diferentes formas, equidade,
reconhecimento social e dignidade humana. Grupos sociais que se candidatam à formação
e adentram a profissão docente, por diversas injunções, e grupos sociais que adentram,
por meio dos filhos, as escolas. Transformar a educação escolar implica transformar
radicalmente o reconhecimento social da profissão docente e dos professores (GATTI,
2012, p. 92-93).

Souza (2018) declara que os professores percebem uma desvalorização da profissão


docente em todas as esferas da sociedade, principalmente com relação ao reconhecimento social
do professor.
Esse sentimento o leva a frustração, e percebe sua profissão como desmerecedora de
reconhecimento, e a sociedade da qual de forma incisiva tem reforçado esse sentimento, intensifica
essa percepção de inutilidade, e nesse sentido o professor perdendo o prazer em lecionar apenas
resiste, eis o caminho para o sofrimento/adoecimento, pois essa sensação de descaso com a
profissão que exerce realiza gera dor em qualquer trabalhador.
171

Assim, essa ausência de reconhecimento da sociedade a respeito do seu trabalho pode


contribuir para que o docente se sinta desvalorizado e frustrado, assumindo uma imagem
negativa da profissão que, em seguida, será transmitida à mesma sociedade, reforçando
sua visão. Diante das frustrações que afirmaram vivenciar em seu trabalho, vários
admitiram já terem pensado em trocar de profissão. No entanto, muitos não o fizeram
porque realmente gostam da área da Educação. E outros por não terem mais motivação
para voltar aos estudos (SOUZA, 2018, p. 112).

As consequências do sofrimento/adoecimento psíquico docente são tantas, que os


próprios professores percebem e sentem os resultados do descaso com a profissão. No entanto,
diante da sensação de perda do prazer em ensinar muitos não conseguem nem mesmo motivos
para mudar de profissão. As emoções são as mais negativas possíveis, e vão desintegrando o ser
humano a ponto de não perceber outra saída a não ser de lutar contra suas próprias emoções e as
silenciar a ponto de sofrer/adoecer.
A exata percepção das condições que rodeiam a profissão e a pouca/nenhuma
possibilidade de melhora leva o trabalhador a desempenhar sua atividade com base no racional. O
emocional deixa de existir a partir do momento que sua subjetividade é abolida e tem a profissão
apenas como forma de existir e não de sentir. Assim, é retirado do ser humano a possibilidade de
se sentir útil, feliz, realizado, motivado, e a sensação de não pertencimento na sociedade
desencadeia uma série de emoções que vão sendo silenciadas e vão aos poucos se tornando
sintomas.
172

Tabela 36 - Fontes potencialmente geradoras de estresse – Quesito ORGANIZAÇÃO/CONDIÇÕES DE TRABALHO


FONTES POTENCIALMENTE 0=Nenhum % 1= Pouco % 2 = Moderado % 3= Bastante % 4=Elevado % Total %
GERADORAS DE ESTRESSE estresse estresse estresse estresse estresse
2. Existência de sanções disciplinares 42 35 42 36 22 19 5 4 7 6 118 100
pouco adequadas
3. Falta de tempo para preparar as 55 47 28 24 24 20 6 5 5 4 118 100
aulas
5. Trabalho administrativo 49 41 40 34 14 12 8 7 7 6 118 100
8 Falta de aceitação da autoridade do 53 45 29 25 19 16 12 10 5 4 118 100
professor
9 Demasiado trabalho para fazer 40 34 37 31 16 13 16 14 9 8 118 100
11 Obrigações burocrático- 40 34 33 28 21 18 11 9 13 11 118 100
administrativas
14. Falta de poder e influência nas 52 44 36 30 16 14 8 7 6 5 118 100
sanções disciplinares
17. Demasiado trabalho burocrático 33 28 40 34 22 19 5 4 18 15 118 100
20. Ineficácia das sanções 52 44 38 32 13 11 8 7 7 6 118 100
disciplinares existentes
21. Exigências ou obrigações para 38 32 36 31 17 14 8 7 19 16 118 100
além do período letivo
23. Excesso de tarefas de caráter 35 30 36 30 22 19 4 3 21 18 118 100
burocrático
25. Políticas disciplinares inadequadas 48 41 36 30 17 14 8 7 9 8 118 100
da escola e do ensino
26. Ritmo demasiado rápido do 49 42 36 31 17 14 6 5 10 8 118 100
período letivo
28. Deveres e obrigações 45 38 30 25 23 20 8 7 12 10 118 100
administrativas
31. Falta de participação nas decisões 55 47 32 27 16 13 6 5 9 8 118 100
disciplinares a tomar
32. Falta de tempo para cumprir o 49 42 35 30 17 14 7 6 10 8 118 100
programa
33. Nível de barulho bastante elevado 50 42 41 35 12 10 6 5 9 8 118 100
nas aulas
Fonte: Freire, 2022
173

A intensificação do trabalho gera desconforto e estresse para o professor, conforme as


respostas dos participantes. O trabalho administrativo é apontado por 40 (34%) professores,
como também demasiado trabalho a se fazer. 37 (31%) apontam como situação que gera pouco
estresse; 16 (13%) consideram como fonte de moderado estresse; 16 (14%) como bastante
estresse e 9 (8%) como elevado estresse.
Outra situação gerada por essas mudanças educacionais é relativa aos trabalhos
burocráticos direcionados aos professores. Na presente pesquisa, 40 professores (34%) apontam
essas situações como relacionadas a pouco estresse, mas 22 (19%) consideram como geradoras
de moderado estresse e 18 (15%) apontam como elevado estresse. Sob essa mesma perspectiva,
encontram-se as exigências ou obrigações além do período letivo, que são percebidas por 36
(31%) professores como dispositivo para pouco estresse e com elevado estresse por 19 (16%).
Entre outras respostas, o excesso de tarefas de caráter burocrático é assinalado por 36 (30%)
como ocasiões de pouco estresse, por 22 (19%) como moderado estresse, e como elevado
estresse por 21 (18%). A falta de tempo para aprofundar o estudo de temas curriculares gera
pouco estresse para 25 (21%), moderado estresse para 21 (18%) e bastante e elevado estresse
para 10 (9%).
As novas políticas educacionais surgiram visando a ampliação da educação, porém
não se repensou a adequação das condições e organização do trabalho dos professores. Ao
contrário, houve um aumento na quantidade de alunos em sala de aula, das novas grades
curriculares e o acréscimo dos trabalhos burocráticos reformulados apenas com base em
quantidade, e esse novo formato resultou na intensificação dos afazeres docente, que por sua
vez, inibi qualquer possibilidade de se ter qualidade no ensino e tão pouco a valorização
docente.
A docência é uma das mais antigas ocupações e a figura do professor é anterior à
criação das instituições de ensino. A docência e os processos de ensino-aprendizagem
vêm se modificando ao longo da institucionalização dos processos de formação
profissional, especialmente em função das transformações no mundo do trabalho e da
produção, das mudanças culturais e da evolução tecnológica, que repercutiram e
repercutem sobre as condições de vida e trabalho dos professores (CRUZ; LEMOS,
2005, p. 65).

As condições de trabalho se modificam para atender às demandas capitalistas, mas não


consideram o trabalhador, nesse caso o professor, os reflexos dessa situação caótica sobressaem
em sua saúde. Não se pode falar em qualidade da educação diante as condições de trabalho dos
professores nos dias atuais. Trata se de situações degradantes, que corroboram cada vez mais
para a perda do interesse na profissão. Aos que permanecem resistindo, tem restado o
silenciamento das emoções, a busca por sobrevivência e o sofrimento/adoecimento psíquico
por constatarem as reais condições e a desvalorização do seu trabalho.
174

[...] as condições de trabalho dos professores estão distantes do adequado. Professores


responsáveis por formar novas gerações de alunos adoecem no trabalho, por falta de
estrutura física e material, por violência nas escolas e por desrespeito profissional.
Esse quadro é muito sério e tem se agravado. Seria importante investigar medidas que
tenham sido tomadas para a melhoria dessa situação e, mais do que isso, tomar
decisões efetivas, dentro e fora das escolas, para mudar essa realidade. O tema é de
grande importância para o aperfeiçoamento da educação brasileira e das condições de
trabalho dos professores (MOREIRA; RODRIGUES, 2018, p. 246).

Até este ponto, organizamos e analisamos os dados obtidos por meio dos questionários
e escalas para analisar as causas do sofrimento/adoecimento psíquico dos docentes. As análises
dos instrumentos aplicados aos professores nos possibilitaram até aqui confirmar nossa Tese.
O silenciamento das emoções é sim de fato um propulsor para o
sofrimento/adoecimento psíquico. Trabalhar tendo total percepção das condições e
desvalorização do próprio trabalho é angustiante, é como se o professor se levantasse todos os
dias sabendo a que horas se iniciará e terminará a tortura. É exercer uma atividade que na grande
maioria foi escolhida pela paixão e por acreditar na possibilidade de mudança, mas que na
realidade se depara diariamente com a indiferença, com as constantes críticas destrutivas, com
a falta de empatia, com as imposições, com o excesso de trabalho, com as cobranças, com a
anulação de um ser humano.
As emoções regem as relações, os comportamentos, as escolhas e o modo de ser. Ao
se silenciar as emoções, cala-se os desejos, vontades, motivos, prazeres e percepções. Ou seja,
o sujeito deixa de ser quem se é.
O que esperar do ser humano nessas condições? Pois bem, sabendo da necessidade de
sobreviver e na grande maioria de cuidar dos seus também, o ser humano tem a consciência de
que a forma de como a sociedade está organizada não tem qualquer pretensão de mudar essa
situação. Não é o trabalhador que não reage, é a sociedade que não lhe dá opções de mudança,
não o garante a possibilidade de escolhas. Igualmente, como se popularizam algumas profissões
serem uma atividade de retorno financeiro e prestígio de imediato, como por exemplo, a
medicina, contudo, é necessário frisar a mercantilização dessa profissão, ao contrário da
profissão docente. Ao mesmo tempo, por outro lado, no que se refere à profissão da docência,
é tida, de modo estereotipado, como algo fulcrado na paixão, admiração e excelência, todavia,
hoje escutamos também que a escolha se deu pela necessidade de trabalhar, por ter mais vagas,
de ter cursos de formação superiores mais fáceis, à distância, como resultado da organização da
sociedade atual. Os dois exemplos de profissão aqui citados não são isolados, muitas outras
profissões passam por desvalorização, mercantilização. Contudo, é necessário frisar, no
entanto, que toda profissão perpassa por uma formação a qual é sempre regida por um professor.
Diante dessas constatações, e com base em suas próprias percepções, o ser humano luta para
resistir e silencia sua dor devido a inevitabilidade de sobreviver.
175

Um dado relevante percebido, a partir das análises dos instrumentos dos professores e
que também corrobora com a nossa Tese, foi que, os questionários permeiam um certo receio
em descrever claramente os sentimentos, as emoções, as angústias, ainda que tenham sido
registradas, entretanto de forma sucinta. Mas, ao analisarmos as escalas, verificamos que os
professores não hesitaram em assinalar as diferentes situações e sensações em relação ao
trabalho, suas condições e consequências. Esse dado nos chamou atenção. Será as escalas uma
forma de registrar as reais situações e não ter qualquer possibilidade de identificação? Esse
questionamento é pertinente quando recordamos que os participantes responderam ao
questionário e as escalas ao mesmo momento, em um único formulário, pois estavam juntos na
plataforma do google forms, contudo, as escalas são instrumentos que não nos permite
identificar de maneira alguma qualquer participante, ao contrário dos questionários, que podem
elucidar a identificação de algum participante por meio da escrita.
Dessa maneira, houve um silenciamento das emoções nas respostas que pudessem
induzir a alguma identificação. De certa forma, foi silenciado o desejo de se expressar,
recorrendo as respostas objetivas das escalas. Esse dado é de extrema importância! Sim, os
professores temem se expressarem, e diante as respostas de todos os instrumentos apuramos
que as emoções estão sendo silenciadas e o sofrimento/adoecimento psíquico tem sido resultado
desse processo.
O filme citado no início desse capítulo apresenta a paixão pela profissão, a
historicidade e peculiaridade da atividade, as funções do trabalho do peão e as consequências
para as outras pessoas. Outra questão abordada no curta, são os riscos e as inúmeras implicações
que a atividade pode acometer quem a exerce, além da influência que pode causar nas pessoas
próximas, como o caso do filho, que admira e deseja ter a mesma profissão do pai, mesmo
diante os riscos que tem. Essa percepção que propomos instigar aos eleitores quanto a
importância e implicações para si e para os outros da profissão docência.
A partir do próximo subtítulo, conheceremos os sujeitos que realizam a gestão da
educação no município, e abordaremos o conhecimento, a percepção e a consciência dos
gestores quanto às Ações, Programas ou Projetos para prevenir o adoecimento docente e a
percepção e a consciência quanto à primordialidade da existência de práticas que promovam a
saúde psíquica do docente.

3.6 Dos questionários dos gestores: resultados e análises

Entretanto, o comportamento do ser humano se


desenvolve no complexo contexto do ambiente social.
O ser humano só entra em contato com a natureza
através desse ambiente e, por isso, esse meio é o fator
176

mais importante que determina e organiza o


comportamento humano (VIGOTSKI, 2003, p. 39-40).

3.6.1 Identificação dos participantes da pesquisa

O questionário para os gestores foi direcionado aos Profissionais de Educação que


desempenham função de chefia e não de docência, como Secretários de Educação, Assessores
Pedagógicos, Diretores, Coordenadores, entre outros que atuam nas Escolas e na Secretaria
Municipal de Educação (SEMED).
É importante ressaltar que o objetivo em aplicar o questionário aos gestores, foi o de
investigar a existência ou não de ações, programas, projetos para enfrentar o
sofrimento/adoecimento docente e a concepção desses profissionais sobre o tema abordado
nessa tese.
Iniciamos a apresentação da caracterização dos gestores expondo os dados das
questões de 1 a 8 da primeira parte do questionário, referentes à identificação (sexo, idade,
estado civil, formação, ano e instituição, Pós-Graduação, ano e instituição, vínculo
empregatício, cargo atual e função que desempenha).
De 251 gestores, 26 responderam ao questionário online conforme Tabela 37. Na
Tabela 38, constam a formação inicial e o ano de graduação, e apresentam ainda as informações
quanto a Pós-graduação e o ano de conclusão.

Tabela 37 - Identificação: sexo, idade e estado civil


Sexo Idade Estado civil
Feminino 19 (73%) 20 a 30 anos 02 (08%) Casado 13 (50%)
Masculino 07 (27%) 31 a 40 anos 05 (19%) Solteiro 03 (12%)
41 a 50 anos 13 (50%) União estável 06 (23%)
51 ou mais 06 (23%) Divorciado 04 (15%)

Fonte: Freire, 2023.

Tabela 38 – Graduação e ano de conclusão.


Formação inicial Ano de Graduação
Pedagogia 13 1991-1999 08 (31%)
Letras 03 2000-2009 08 (31%)
Ciências Biológicas 02 2011-2021 08 (31%)
Geografia 01 não informaram 02 (07%)
Artes/Artes Visuais 01
Ensino lúdico 01
2 graduações ou mais 02
não especificaram 02
Fonte: Freire, 2023
177

Tabela 39 – Pós-Graduação e ano de conclusão.


Pós-Graduação Ano de Conclusão da Pós
Especialização 14 (54%) 1998-2009 05 (19%)
Mestrado 06 (23%) 2012-2018 10 (38%)
Mais de 01 Pós 02 (0,8%) 2019-2021 03 (12%)
Graduação
Não informaram 03 (11%) Não responderam 07 (27%)
Não possuem 01 (0,4%)

Fonte: Freire, 2023.

A tabela 40 se refere ao Vínculo empregatício, Cargo que ocupa, Função que


desempenha:

Tabela 40 – Vínculo empregatício/ Cargo que ocupa/ Função que desempenha


Vínculo Frequência cargo que ocupa Frequência Função que Frequência
empregatício Desempenha
Estatutário 25 (96%) Gestor (a) 08 (31%) Gestor (a) 09 (35%)
Comissionado 01 (0,4%) Assessor (a)técnico 04 (15%) Diretor (a) 06 (23%)
Pedagógico
Coordenador (a) 02 (0,8%) Assessor (a) técnico 03 (11%)
Pedagógico
Profissional de 10 (38%) Coordenador 03 (11%)
educação
Direção 01 (0,4%) Apoiador de formação 01 (0,4%)
de professores
Secretária 01 (0,4%) Formador em 01 (0,4%)
Adjunta tecnologias
educacionais
Ordenadora 01 (0,4%)
Gerente 01 (0,4%)
Professora 01 (0,4%)
Fonte: Freire, 2023.

Ainda são poucos os estudos encontrados sobre os gestores escolares. A inexistência


de uma formação especifica e a definição da função e legislações podem ser alguns dos motivos
para o desinteresse de pesquisas sobre o tema, apesar de serem de extrema relevância, mesmo
porque, o trabalho dos gestores conduz o trabalho dos professores.
Oliveira e Vasques-Menezes (2018) assinalam que, em relação à gestão escolar, há
lacunas que as pesquisas precisam preencher sobre o cotidiano da gestão e dos sujeitos que
compõem a comunidade escolar (OLIVEIRA; VASQUES-MENEZES, 2018). Vieira e Vidal
(2014) também reforçam que no Brasil são poucos os estudos sobre essa relevante categoria, e
salientam que as próprias mudanças nas políticas de educação confundem a formação, a
definição de papéis, o acesso ao cargo, e a importância desse profissional no contexto escolar.
Contudo, mesmo com poucas pesquisas disponíveis, é possível encontrar trabalhos que
contribuam para uma reflexão sobre a importância da função exercida por esse profissional.
Bizol (2018) esclarece que esse profissional é responsável em garantir a qualidade do ensino
178

ofertado ao aluno, condução da elaboração do Projeto Político Pedagógico (PPP), auxilia na


elaboração do currículo escolar, acompanha e avalia a aprendizagem:
Portanto, é necessário, que o gestor esteja devidamente equipado para criar e sustentar
um ambiente que promova e incentive a participação ativa de todos, dando destaque
à responsabilidade que possui no bom desenvolvimento do processo educacional.
Desta forma, entende-se que essa é a maneira que um gestor deve conduzir uma
escola, de forma que os inúmeros segmentos da comunidade escolar sejam
representados, em um lugar onde todos consigam participar de maneira ativa para a
melhoria da qualidade de ensino (BIZOL, 2018, p. 3-4).

Cabe aos gestores a organização e o funcionamento da educação. As diferentes tarefas


atribuídas a esse profissional devem contribuir para uma gestão democrática e transformadora:
Entende-se que o trabalho do gestor é transformar a realidade, com a finalidade de
alcançar a aprendizagem de todos na escola e para isso ele precisa saber conduzir bem
os processos e mobilizar as pessoas para que todos tenham o mesmo foco, que no caso
é o aluno, mantendo seu compromisso com a aprendizagem. Os gestores sabem que
apesar de serem os responsáveis pela escola, sua função não é apenas burocrática, mas
também deve participar das reuniões pedagógicas, ajudar a planejar projetos e
atividades, dar sugestões de livros a serem lidos ou comprados e acompanhar de perto
as dificuldades dos docentes, colaborando, desta forma, com a aprendizagem de todos
na escola (BIZOL, 2018, p. 8).

O gestor é quem direciona as atividades do professor. Cabe a esse profissional adequar


toda a estrutura do âmbito escolar para que o professor utilize de seus conhecimentos e medeie
o aprendizado. Essa organização faz a diferença na percepção do professor quanto as condições
de trabalho, e podem ser realizadas além do objetivo de propiciar o aprendizado do aluno,
também de manter a satisfação e o prazer do professor em ensinar.

3.6.2 Projetos realizados para prevenir o adoecimento docente


Neste tópico pesquisamos acerca de Programa, Ação ou Projeto existente que tivessem
o intuito de prevenir o adoecimento psíquico docente. Nisso, obtivemos alguns principais
tópicos os quais utilizamos como base de observação, como: que ações realizadas nas escolas
dos gestores pelos Projetos/Ação/Programa; quais temáticas seriam necessárias em programas
para prevenir o adoecimento docente; qual a frequência considerada importante para realização
de ações que visam à prevenção; e se os gestores têm conhecimento das principais causas de
afastamento para tratamento de saúde dos docentes, e caso tenham, quais seriam.
Para iniciarmos a investigação sobre ações de prevenção ao adoecimento docente no
município de Corumbá MS, perguntamos aos gestores (tabela 41) se existe algum Programa,
Ação ou Projeto para prevenir o sofrimento/adoecimento psíquico docente18.

Tabela 41 - Existe algum Programa, Ação, Projeto para prevenção do adoecimento


docente no município de Corumbá MS? Se sim, Qual?
Sim 05 (19%)
Não 21 (81%)

18
Todas as tabelas tiveram suas respostas organizadas por frequência e mantido o texto original dos participantes.
179

Resposta Frequência
Secretaria de Saúde / Na Secretaria de Saúde, existe o atendimento, 02
principalmente em relação à COVID
Atividade laboral 02
Eu não sei 01
Forma de tratamento qualificada tentando ouvir funcionários driblando o 01
dia a dia com escuta qualificada
Palestras 01
Total 07
Fonte: Freire, 2023

Ao perguntarmos aos gestores sobre o porquê da inexistência. Tabela 42 a maioria não tem
conhecimento ou simplesmente diz que não existe.

Tabela 42 – Caso Não, por quê?


Resposta Frequência
Não tenho conhecimento/Desconheço/Não existe/Nenhum 11
Estamos estudando possibilidades/ Acredito, que iniciaram agora esses debates. 02
Na verdade, existe uma rede de atendimento, porém neste momento atual, com 01
pandemia e tudo mais, essas iniciativas não estão acontecendo na nossa rede.
Não tenho conhecimentos de um programa específico para esse fim, mas 01
existem palestras motivacionais através de lives.
Ausência de estudos para verificar necessidade. 01
O poder público não investe no setor de prevenção a doenças dessa área. 01
Não atuo como gestor 01
Total 18
Fonte: Freire, 2023

Embora a maioria dos gestores tenham respondido que não existe nenhum
programa, ação ou projeto, cinco responderam o contrário, logo pedimos que informassem
quais seriam essas ações.
A Educação no Brasi, sofreu uma expansão da escolarização, com o objetivo de
ampliar o acesso ao ensino. Contudo, não fez parte desse processo uma organização que
cuidasse de todos os aspectos pertinentes à intensificação do trabalho dos professores ou que
visasse à prevenção do sofrimento/adoecimento psíquico docente. Apesar das constantes
mudanças, busca de adequações, a saúde do professor ainda parece ser um tema pouco pensado.
Nesse contexto, o profissional que atua para que sejam efetivados os pressupostos de
uma educação diferente, com qualidade e que atenda aos anseios da comunidade
educacional, enfrenta cada vez mais os desafios para atuar na área, tanto em
instituições públicas quanto privadas, haja vista que o docente sofre pressões e
cobranças, sendo atribuída e a este profissional a responsabilidade por resultados.
Logo, se o profissional da educação é considerado como elemento básico para elevar
o nível da educação no Brasil, preocupar-se com suas condições físicas e mental são
imprescindíveis para que isso aconteça.

Os professores se deparam com péssimas condições de trabalho, e que são


repetidamente citadas, por serem bem conhecidas, que vão desde as estruturas físicas até as
relações existentes nesse contexto. Todos os dias essas e outras diversas situações têm gerado
um aumento na insatisfação e desprazer em lecionar. Não há mais como deixar de questionar e
180

discutir as causas que podem causar o sofrimento/adoecimento psíquico docente, os


sentimentos de insatisfação e desprazer giram em torno do desrespeito, pouco ou nenhum
reconhecimento, planos de cargos e carreiras precários, relações entre outros.
Por outro lado, os profissionais sentem-se desvalorizados e desencantados pela
profissão, pois em quase todos os discursos políticos está sempre presente o ponto
valorização docente, entretanto, pouco se efetivam as propostas suscitadas o que vem
causando desgaste para os docentes. Nesse caso, compreender as causas que
desencadeiam o sofrimento, seja físico ou psíquico, é relevante para que se possa
pensar em ações para, senão dirimir, ao menos minimizar tais problemas.
Via de regra, o docente trabalha em mais de um turno e/ou estabelecimentos distintos
em razão de a remuneração para a classe ser baixa e ser preciso complementar a renda.
Além disso, sente-se enfraquecido, desrespeitado, desmotivado, trabalhando num
ambiente sem estrutura, com turmas cheias, alunos desinteressados e indisciplinados,
com inúmeras negações de direitos e violações (SILVA; VIEIRA, 2021, p. 182).

Mesmo que um maior número de gestores tenha respondido que não existe nenhuma
ação para prevenir o adoecimento, os que responderam que sim não souberam especificar quais.
Essas contradições podem sugerir que pouco se conhece ou se tem discutido, planejado e
realizado na gestão municipal pra prevenir o sofrimento/adoecimento psíquico docente. Nesse
ponto, verificamos mais uma vez o quanto a comunicação (fala) é importante para organização
do trabalho.
O termo gestão de pessoas está atrelado ao processo administrativo e funcional de
uma organização, ou seja, podemos entender que gira em torno da dinamização dos
processos, o planejamento, a direção e ao fortalecimento do controle dos recursos da
organização para o alcance dos objetivos desejados. A tarefa da gestão relaciona-se a
administrar, dispor, gerar, arranjar, conduzir, governar e propor os processos e
procedimentos para dar fluxo positivo dentro da organização.
A tarefa da gestão relaciona-se a administrar, dispor, gerar, arranjar, conduzir,
governar e propor os processos e procedimentos para dar fluxo positivo dentro da
organização (SILVA, 2016, p. 33).

Nesse cenário, é preciso que os gestores estejam focados nos sujeitos que realizam as
atividades que objetivam os resultados, seja das escolas públicas ou privadas. Assim, é
fundamental que os gestores tenham conhecimento das lacunas existentes, mas persistentes no
contexto escolar que podem desencadear o sofrimento/adoecimento psíquico. Ademais pensar
na gestão enquanto forma de organizar o trabalho é orientar quem, como e o que fazer de forma
a dispor de todos os recursos necessários:
A Gestão de Pessoas é um campo vasto que recentemente vem sendo discutido sob
diferentes enfoques, estes que vão desde as conceituações elementares sobre o termo,
até uma visão mais aprofundada no que concerne a motivação, desempenho e
engajamento pessoal, entre outros na vida da organização/instituição que direcionam
e estimulam a participação direta ao bem-estar, proporcionando a reciprocidade de
ações que tão grandiosamente vem-se abordando como mote da mudança de
paradigmas nas relações entre pessoas e atuação de seu trabalho. E nos ambientes
escolares essa premissa é de abordagem central, quando ressaltamos a importância de
seus gestores estimularem essa participação de suas categorias de trabalho,
especialmente dos professores (SILVA, 2016, p. 34).
181

Os gestores, por exemplo, que estão ligados diretamente nas atividades da organização,
metas e objetivos, necessitam desenvolver bom relacionamento interpessoal com sua equipe e
mediar todos os processos internos (DANTAS; HENRIQUES, 2020, p. 2)
Procuramos, também, examinar se na escola que os gestores coordenam existe
alguma Ação, Projeto ou Programa para prevenir o adoecimento, como vemos na tabela
43. Para os gestores que responderam sim, solicitamos que especificassem.

Tabela 43 - Em relação a escola que coordena, existe alguma Ação, Projeto, Programa
para prevenir o adoecimento docente? Caso afirmativo, como?
Sim 03 (12%)
Não 22 (88%)
Resposta Frequência
Tentativas de utilizar o que aprendi no curso de psicologia tentando distribuir 01
sementes, influenciando, sugerindo a criação do espaço verde, de forma a
diminuir ansiedade, depressão, digo, tentativas além de roda de conversa com
a gestora
Ginástica laboral 01
Palestras 01
Total 03
Fonte: Freire, 2023

Sobre as respostas positivas percebemos que se trata de gestores que atuam


especificamente nas escolas, pois a própria questão foi direcionada às ações nas escolas
coordenadas pelos participantes e de uma forma mais explicativa que na questão anterior (tabela
43), quando os participantes descreveram o que e como são realizadas as ações para contribuir
na prevenção do sofrimento/adoecimento psíquico docente.
Diante das complexidades atuais das instituições escolares, cabe a figura do gestor
escolar encaminhar-se na busca de resoluções eficazes capazes de desvendar
obstáculos que atrapalham e dificultam o processo educativo. E, para esta missão tão
importante, observar os valores organizacionais que auxiliam nesta tarefa, uma vez
que é a partir deles que se procurarão elementos dentro da cultura organizacional que
possam estar sendo violados. O contrário também é verdadeiro, acontece quando a
dificuldade parte dos gestores onde pouco ou nenhum esforço é feito para vivenciar
novos valores, ou mesmo erradicar obstáculos culturais que impedem o sucesso
(SILVA, 2016, p. 39).

Na escola em que atua, o gestor conhece sua equipe, clima, situações que podem
contribuir ou prejudicar um resultado e toda a dinâmica de trabalho. Por mais que sejam muitos
professores em uma única escola, cada um possui sua individualidade e subjetividade, nos
desejos, motivos e emoções. O gestor precisa conhecer e identificar o potencial e também as
dificuldades de cada profissional, o todo só se forma por meio do individual.
O problema surge quando as instituições se dão conta, que o simples fato da equipe
possuir características de alto desempenho funcional não lhe é o suficiente para
garantir o sucesso e mantê-la eficiente em seus resultados. Os seres humanos são
complexos e singulares, cada membro da equipe pode dar uma conotação diferente,
podendo interpretar os padrões estabelecidos, as normas e autoridade de forma
diferenciada.
182

Ante ao exposto, cabe aos gestores, enquanto líderes diretos das instituições
educacionais, acreditar que cada grupo ou categoria dentro das escolas possui a
potencialidade singular e essencial para se chegar a possíveis soluções dos problemas
que se apresentam, reforçando a função da diagnose como instrumento auxiliar para
a identificação dos principais entraves que emperram a sua dinâmica (SILVA, 2016,
p. 40).

Na organização do trabalho, nas relações, no planejamento, o gestor necessita


considerar o sujeito (EU) e profissional (Professor) como um ser humano atuante, responsável
e parte integrante de todo o processo de ensino. Não deve caber ao professor somente ‘acatar’
ordens e receber demandas absurdas de trabalho, mas participar da construção do processo. Dar
voz ao professor é respeitar sua percepção, seu entendimento das situações no contexto escolar,
e isso influencia diretamente a saúde psíquica, pois ele não se vê apenas como o trabalhador
obrigado a executar, mas como parte integrante e existente da equipe de trabalho.
O sofrimento característico da profissão, principalmente dos docentes de escola
públicas, ocorre tanto pela evidente perda da substância de seu trabalho quanto pela
perda de seu próprio valor como trabalhador, uma vez que o professor se obriga a
aceitar condições laborais muito aquém das que merece, com atribuições que não
fazem parte de seu trabalho, não raro acumulando a função de pai, mãe, orientador,
psicólogo dos estudantes.
A falta de apoio psicológico para esses profissionais compromete o desenvolvimento
laboral, considerando que em muitas situações recai sobre eles a tarefa de resolver os
problemas de aprendizagem e emocionais dos alunos. Esses pontos vêm criando uma
crise de identidade nos docentes, que vão perdendo a referência sobre o que fazer,
como trabalhar, como comportar-se em sala. O ofício de ensinar vai se perdendo
juntamente com o papel do professor (SILVA; VIEIRA, 2021, p. 182).

Vigotski (2003) contribui com observações que consideram todos os integrantes


seres ativos no processo de educação, pois a dinamização do processo educativo resulta da
participação de todos. Essa constatação abrange toda e qualquer situação do contexto escolar,
inclusive para a prevenção do sofrimento/adoecimento:
O processo educativo não deve ser concebido como algo unilateralmente ativo, nem
devemos atribuir tudo à atividade do ambiente, anulando a do próprio aluno, a do
professor e tudo o que entra em contato com a educação. Pelo contrário, na educação
não há nada passivo ou inativo. Até as coisas inanimadas, quando incorporadas ao
âmbito da educação, quando adquirem um papel educativo, se tornam dinâmicas e se
transformam em participantes eficazes desse processo (VIGOTSKI, 2003, p. 78).

Na Tabela 44 foram listados os temas necessários em Programas para prevenir o


adoecimento docente, segundo os gestores:

Tabela 44 - Na sua opinião, quais temáticas e períodos seriam necessários em Programas


para prevenção do sofrimento/adoecimento docente?
Respostas Frequência Período Frequência
Doenças emocionais/estresse/síndrome 14 Semestral 8
de Burnout/depressão

Políticas públicas na área da saúde 6 Mensalmente 6


Gestão de Trabalho/Carga horária/ 2 Sempre/ 5
organização de agenda do Frequentemente
trabalho/EPIs/ Salário
Palestras direcionadas à educação 2 Bimestral 3
183

Relações interpessoais /questões sociais 2 Permanente 2

Orientação sobre 1 Semanalmente 1


indisciplina/violência/uso de
drogas/temas do cotidiano escolar
Nenhum 1 Importante a criação 1
Total 28 26
Fonte: Freire, 2023

Os temas que apresentaram maior frequência nas respostas são sobre sofrimento
mental, estresse, síndrome de Burnout, depressão e doenças emocionais. Apesar de não existir
nenhum projeto, ação ou programa específico, os gestores percebem a necessidade da
prevenção do sofrimento/adoecimento psíquico docente.
Souza (2018) verificou, em sua pesquisa com professores de uma escola pública, que
a maioria já se afastou para tratamento de depressão, síndrome do pânico, estresse e problemas
com a voz, que são os casos mais comuns da categoria: “Os docentes apontaram o risco de
adoecimento mental no exercício da sua profissão, pois avaliam que o desgaste emocional e o
esforço cognitivo são altos” (p. 112).
Silva e Vieira (2021) registraram em seu estudo, os mesmos motivos que resultaram
no afastamento dos professores, onde os transtornos mentais e comportamentais, seguidos das
doenças osteomusculares são as principais causas de licença-saúde, como o próprio afastamento
do professor de suas funções. Entre os transtornos mentais e comportamentais, os mais
frequentemente observados são: estresse, depressão, ansiedade, nervosismo e síndrome do
pânico (SILVA; VIEIRA, 2021, p. 189).
Outros estudos que buscaram identificar as causas de sofrimento/adoecimento docente
também apontam que os transtornos mentais estão entre a maioria das causas dos afastamentos
para tratamento de saúde dos docentes. Depressão, transtorno misto ansioso, estresse, síndrome
do pânico, tristeza, ansiedade, insônia, síndrome de Burnout são alguns dos motivos mais
prevalentes (BASTOS, 2009; BAIÃO; CUNHA, 2013; SOUZA; COUTINHO, 2018; SOUZA,
2018; FERNANDES, 2019; FACCI; ESPER, 2020c; SILVA; VIEIRA, 2021);
Trata-se de um panorama geral, em que diversas pesquisas identificam as causas que
estão acometendo a saúde docente: a intensificação de trabalho, a ausência de políticas públicas
voltada para essa temática, a constante e recorrente desvalorização da profissão, a imposição
de trabalhos burocráticos, ambiente e relações desfavoráveis são algumas das muitas causas
identificadas em diferentes estudos. Em todas as situações há uma coisa em comum, o
silenciamento do professor, de suas emoções. Em nenhuma das situações, o professor é ouvido,
é permitido falar o que pensa, o que sente, o que deseja, se concorda ou não.
184

[...] considerando-se um retrato geral da saúde no trabalho docente, é possível inferir


o seguinte quadro: a intensificação da jornada de trabalho e a desarticulação das
políticas que legislam sobre o tema perpetuam a construção de um ciclo de
adoecimento físico e mental que implica sofrimento, desestruturação psíquica e
problemas vocais aos professores (SOUZA, et al., 2017, p. 119).

A segunda reposta com maior frequência foi políticas públicas na área saúde, o que
também é observado por outros pesquisadores como uma possibilidade de ação para prevenir
ou minimizar o sofrimento/adoecimento docente. Souza e Coutinho (2018) com base nas
demandas dos professores, verificaram a implementação de políticas públicas direcionadas para
o atendimento profissional do professor com o intuito de minimizar o sofrimento docente.
Sempre urgente! Rodas de conversas, inclusive com equipe de gestores. Também é
muito tenso este outro lado, quando chegam as informações e é necessário ter
equilíbrio emocional para filtrar e ouvir de todos os lados, mantendo a calma da equipe
(RESPOSTA T).

Nesse víeis, os pesquisadores também apontam que o corpo, mente e ambiente de


trabalho devem estar alinhados. São um conjunto de fatores importantes para que as emoções
estejam organizadas. É certo que por vezes sofremos de alguma maneira ou outra em
decorrência de uma situação no trabalho, mas esse sofrimento não pode ser contínuo, pois ele
se torna adoecimento, e o sofrimento/adoecimento psíquico aqui entendido nesse trabalho, é
justamente essa condição duradoura, que passa de um para o outro devido a permanência de
sua existência.
Pois a observação acerca de que o corpo, a mente e o ambiente de trabalho devem
funcionar em um estado de harmonia para que seja possível diminuir os fatores
causadores de mal-estar, desconforto e sofrimento na atividade ocupacional que em
conjunto com a prática pedagógica prevalece sobre o trabalho docente, foi unânime.
Dessa forma, a necessidade de encontrar meios, através de políticas públicas
determinantes visando qualidade de vida desta classe profissional, já está atrasada há
muitas décadas (SOUZA; COUTINHO, 2018, p. 24).

Todavia, pouco se discute sobre políticas de prevenção ao sofrimento/adoecimento


docente. O adoecimento docente constitui um tema de grande relevância e tem sido objeto de
inúmeros estudos e pesquisas realizados no país nos últimos 15 anos. No entanto, as políticas
de prevenção à saúde docente ainda são escassas (SILVA; VIEIRA, 2021).

Acredito na importância de se criar rede de apoio socioemocional e afetivo aos


professores. (RESPOSTA U)

Vários autores apontam para a imprescindibilidade de melhoras nas condições de


trabalho, valorização, remuneração, organização no processo de trabalho, formação, jornada de
trabalho, ambiente de trabalho, planos de cargos e carreira, para fazer frente a problemas como
falta de autonomia, estruturas e recursos precários, indisciplina dos alunos, falta de
acompanhamento familiar, violência e salas superlotadas, como formas de prevenir ou amenizar
185

o sofrimento/adoecimento (BAIÃO; CUNHA, 2013; BARROS; GRADELA, 2017; SOUZA,


2018; SOUZA; COUTINHO, 2018; DAGHER, 2019).
A maior amplitude temática, além de expandir o foco de atenção, evidencia um
movimento relevante na compreensão dos processos de adoecimento numa
perspectiva de produção social, redirecionando a atenção para processos coletivos,
rompendo, mesmo que timidamente, com a ênfase nos indivíduos.
Desse modo, adquirem maior potência e capacidade transformadora, posto que as
medidas a serem propostas ultrapassam a perspectiva individual de ação (cuidados
com a voz, postura corporal, clima organizacional ou relacional) e inclui ações
coletivas como a elaboração de políticas públicas, de leis que regulem os ambientes
escolares, de oferta de serviços de atenção e assistência à saúde, dentre um conjunto
de outras medidas (ARAUJO; PINHO; MASSON, 2019, p. 10).

Não obstante, diante das constatações, por meio de pesquisas, sobre a


indispensabilidade de se pensar em evitar ou amenizar e sobre quais temas considerar para
contribuir nesse processo, chama-nos a atenção o fato de um gestor declarar que não interessaria
discutir nenhuma temática. Espera-se que o gestor se comprometa com a qualidade do clima de
trabalho, encadeie ações e motivação de todos os envolvidos no processo de aprendizagem,
demonstrando que o interesse pelos cuidados de todos os envolvidos é uma de suas prioridades.
Para que a escola alcance os ideais de qualidade de ensino e para que a aprendizagem
de todos de fato aconteça, é necessário que o gestor torne-se um articulador, atuante
e participativo em todas as questões que envolvam o campo pedagógico de sua escola.
Sabemos que a gestão pedagógica é a razão de ser de uma escola, pois uma
organização bem gerenciada é que direciona e dá qualidade ao ensino através do
planejamento, acompanhamento e avaliação do rendimento da proposta pedagógica;
além de observar o desempenho dos alunos, do corpo docente e de todos que formam
a equipe escolar (BIZOL, 2018, p. 7).

A busca pela qualidade da aprendizagem também requer uma boa gestão, não cabe
somente o domínio do conteúdo por parte do professor para obter bons resultados, é preciso
uma boa organização, bom planejamento, boas intervenções e acima de tudo que haja o bom
senso nas divisões de tarefas e o respeito com os profissionais que estarão executando tudo o
que foi programado, nesse caso com os professores.
Portanto, é indispensável salientar que um dos grandes desafios no gerenciamento das
escolas refere-se à busca de uma educação de qualidade, em que uma equipe gestora,
comprometida e qualificada torna-se fundamental para garantir a qualidade das
aprendizagens. Devido a isso, o planejamento precisa ser constantemente avaliado,
não somente pela equipe gestora escolar, mas também por todos os envolvidos no
processo de ensino-aprendizagem. Em consequência disso, as aprendizagens de todos
na escola serão de fato significativas e eficientes, sendo capazes de nortear as tomadas
de decisões para uma formação educacional de qualidade (BIZOL, 2018, p. 7).

Considera-se que o gestor também é um professor, já exerceu a docência, e/ou poderá


retornar à sala de aula, e como o professor também precisa por meio da mediação contribuir
com o aprendizado, dominar os conteúdos, além do mais, o gestor precisa também dominar as
legislações, as políticas educacionais e tudo que envolva os objetivos da educação para que ele
possa contribuir com o direcionamento de sua equipe e efetivar o trabalho enquanto
desempenha sua função, e diante essas circunstâncias, o gestor conseguirá conduzir um bom
186

trabalho, formar e manter uma boa equipe, e ao mesmo tempo atingir as mudanças, as
transformações dos envolvidos.

Nesse período de pandemia e pós-pandemia, acho que teríamos todos ter


acompanhamento psicológico, pelo menos uma vez ao mês. Foi e está sendo um
período de lidar com as emoções do aluno, do familiar responsável pelo aluno e do
próprio profissional da educação. (RESPOSTA V)

Sempre, pois sempre temos relatos dos profissionais em situações delicadas com
relação ao tema abordado. (RESPOSTA X)

Por meio das respostas da Tabela 44 ou pelas respostas descritivas, os gestores


percebem a necessidade de ações, programas ou projetos permanentes. A existência do
sofrimento/adoecimento psíquico é perceptível e o fato de considerarem que as ações devem
ocorrer em intervalos curtos, de forma permanente, corrobora com essa constatação.
As enfermidades dos docentes podem ser analisadas como respostas, provisórias ou
não, do organismo, à pressão do ambiente, podendo seus sintomas representar mecanismos de
defesa pelos trabalhadores, frente às pressões desfavoráveis do ambiente laboral (SILVA;
VIEIRA, 2021):
O docente precisa sentir-se mais seguro e amparado pelo seu empregador e não
ameaçado, pressionado e culpado por eventuais fracassos dos alunos. Há que se pensar
nos protagonistas do processo educacional e entender que os problemas devem ser
repensados e as possíveis soluções devem perpassar também pelo papel do professor
como um profissional a ser respeitado e valorizado não somente nos discursos
políticos e nos planos postos pelos gestores, mas sim em ações concretas (SILVA;
VIEIRA, 2021, p. 190).

Perguntamos aos gestores se teriam conhecimento das principais causas de


afastamento para tratamento de saúde dos docentes? E caso tenham respondido sim,
pedimos que especificassem quais eram (Tabela 45).

Tabela 45- Atualmente tem conhecimento das principais causas de afastamento para
tratamento de saúde dos docentes? Se sim, fale sobre elas
Sim 18 (69%)
Não 08 (31%)
Depressão, ansiedade e síndrome do Pânico/estresse/ doenças 16
psicológicas/Pressão
Coluna 03
Doenças físicas e emocionais 02
COVID-19 02
Estresse devido à pandemia 01
HAS 01
doenças causadas por esforço repetitivo 01
doença do intestino, câncer 01
Total 27
Fonte: Freire, 2023.

De acordo com as respostas dos gestores sobre as principais causas de afastamento dos
docentes para tratamento de saúde, os transtornos mentais, como em outros estudos
187

(GASPARINI; BARRETO; ASSUNÇÃO, 2006b; BASTOS, 2009; BAIÃO; CUNHA, 2013;


SOUZA; COUTINHO, 2018; SOUZA, 2018; CARLOTTO et al., 2018; FERNANDES, 2019;
ARAUJO, PINHO; MANSSON, 2019; FACCI; ESPER, 2020c; SILVA; VIEIRA, 2021),
lideram as estatísticas.
As causas osteomusculares, LER, também surgem como segunda causa de afastamento,
em outros estudos (BAIÃO; CUNHA, 2013; BARROS; GRADELA, 2017; SOUZA;
COUTNHO, 2018; SILVA; VIEIRA, 2021); além da presença pandêmica da COVID- 19 que,
como já salientamos anteriormente, ocasionou o afastamento pela própria infecção do vírus
e/ou suas consequências.
Souza et al. (2021) esclarecem que o adoecimento psíquico dos professores já era
conhecido e destacado por departamentos responsáveis pelos registros. Porém, a pandemia da
COVID-19 desencadeou a insegurança e o desconforto, sobretudo pela nova forma de trabalho:
os professores tiveram que adaptar todo o seu cotidiano e práticas para atender às demandas
educacionais, sem formação adequada para propiciar o suporte necessário ao desenvolvimento
das atividades desempenhadas (SILVA; SILVA, 2021):
Diante desta realidade, ainda é fundamental destacar que os professores e alunos
enquanto seres sociais, estão vivendo e sendo afetados por esse contexto de pandemia
em diversos aspectos, não apenas o educacional. Assim, é necessário se preocupar
com tais indivíduos para além do cotidiano escolar, mas também pensar no pós-
pandemia, que profissionais e alunos estarão de volta ao ambiente escolar quando tudo
isso passar (SILVA; SILVA, 2021, p. 830).

O período pós-pandemia inicia, as aulas aos poucos foram sendo retomadas. Nesse
cenário, estão os professores e alunos que, de forma experimental, estão sendo colocados em
uma verdadeira berlinda e a única certeza que temos é um relevante atraso na aprendizagem e
mais sobrecarga de trabalho.
A conjuntura revela que nossa sociedade está adoecida. Toda vez em que há a perda
de alguém para o COVID-19 e que a fome bate na porta daqueles que perderam seus
vínculos de trabalho em função da pandemia, o sentimento de luto se apresenta, nem
sempre objetivamente com a perda do outro, mas em certos momentos, com a perda
de si mesmo e da dignidade humana (PRADO; LADEIRA; SENTINELI, 2020, p.
227).

E como se não bastasse, o retorno vem carregado de lutos, inseguranças, tristezas e


profundo sentimento de incertezas. Famílias foram arrebatadas pelo desemprego, fome, perda
de entes queridos, e mais nitidamente, a exposição às desigualdades vividas pela sociedade que
no dia a dia se debruça nas poucas oportunidades em busca de sobrevivência. Ademais, surge
como consequência nesse momento de pós-pandemia uma nova pandemia que parece estar
sendo negligenciada aos olhos dos responsáveis, a pandemia da saúde mental, ou melhor, do
sofrimento mental. Após um longo período de medo e incertezas, o que vimos agora é uma
tempestade de pessoas com transtornos depressivos, ansiosos, pensamentos suicidas,
188

transtornos de humor, entre outros que tem acarretado prejuízos significativos passando de
sofrimentos para adoecimento psíquico por iniciar um processo de incapacidade e
descontinuidade das atividades do ser humano.

3.6.3 Processo de trabalho docente em tempo de pandemia


O trabalho remoto se tornou, assim, uma realidade para os professores devido à
pandemia da COVID-19 e suas consequências. Quando perguntamos se foram disponibilizados
recursos tecnológicos para o trabalho docente, tabela 46, a maioria respondeu que sim.
Complementando a questão sobre os recursos disponibilizados para o trabalho docente,
solicitamos que especificassem quais. Sobre a qualidade dessa disponibilidade a tabela 47
traz as respostas transcritas integralmente.

Tabela 46 - Foram disponibilizados recursos tecnológicos para o desempenho das


atividades docentes? Se sim, quais?
Sim 20 (77%)
Não 06 (23%)
Resposta Frequência
Rede de internet e computadores 11
Foram várias/ quadro digital / Ferramentas e mídias/biblioteca 05
Cursos e formações continuados sobre o tema / Formações continuadas 03
com uso dos aplicativos
WhatsApp 03
Plataforma remota 03
Palestras online 01
celulares e notebooks (pessoais) 01
Tagnos 01
equipamentos de áudio e vídeo. 01
Total 26
Fonte: Freire, 2023

Tabela 47 - E quanto à qualidade dessa disponibilidade, fale sobre ela


Resposta Frequência
Regular, devido ao acesso à internet/ A nossa internet é bem precária na 06
cidade, muitas vezes perdemos os cursos e capacitações por conta do sinal/
Mais ou menos
Atualmente a conexão é boa/ Boa qualidade na sala de Tecnologia. 04
Cursos de muito boa qualidade/Boas/ Bons 04
Existe ausência de recursos didáticos tecnológicos educacionais, os que 04
existem precisam ser atualizados/ Temos poucas máquinas na escola pela
quantidade de profissionais/ computadores antigos
Está em adaptação cada vez se aprimorando mais/ Poucos computadores mais 03
todos funcionando/ Alguns percalços como tudo que é novo
Os professores utilizaram seus próprios equipamentos 01
São as que os alunos responderam melhor ao chamado dos professores e ali 01
conseguem fazer até algumas chamadas de vídeo.
Temos em nossa Unidade Escolar uma profissional que auxilia os professores 01
quanto ao uso dessas ferramentas. Mesmo com uma internet ruim os
profissionais são bem atendidos.
Ótima 01
189

Mensalmente 01
Só foi ofertada à comunidade uma plataforma e pro docente trabalho de 01
preenchimento dela, impressão e alimentação do sistema Tagnos. Entrega de
kit merenda e kit escolar aos alunos
Total 27
Fonte: Freire, 2023

Em se tratando de formação para os docentes utilizarem os recursos tecnológicos, a


maioria confirmou que sim tabela 48 e mostramos quais formações foram realizadas, segundo
os gestores entrevistados:

Tabela 48- E houve formação para os docentes utilizarem os recursos tecnológicos? Se


sim, qual?
Sim 22 (85%)
Não 04 (15%)
Resposta Frequência
Formações /Formação do Ntec, e oficinas que o Proatic realiza/Formações 09
internas
Formação continuada sobre a utilização do Google meet e outras ferramentas 07
de apoio do Google/ Ferramentas do Google Apps/ Google forms
Sobre a plataforma/plataforma online 03
Lives/ 03
Digitalização de documentos/Informática básica/ entre outros 02
Total 24
Fonte: Freire, 2023

O uso da tecnologia, apesar de ser uma realidade para muitos, não passa de
privilégios para poucos, as escolas públicas em sua maioria não disponibilizam recursos
tecnológicos adequados e disponíveis para todos os professores e alunos. A pandemia apenas
mostrou a realidade de todos os dias do ensino público, independente de situações adversas,
emergências que requerem uma reestruturação do ensino.
Assim, surgem alguns problemas na dinâmica de aulas que são comuns nas diversas
realidades da educação e por que não dizer que são comuns a realidade do país, são
eles: problemas com manuseio das tecnologias necessárias, computador, internet ou
mesmo os celulares, falta de disciplina no gerenciamento do tempo, falta de
infraestrutura básica, sobretudo nas escolas públicas para promover aos professores e
alunos o material necessário ao desenvolvimento das aulas remotas (SILVA; SILVA,
2021, p. 830).

O acesso e o manuseio das tecnologias ainda não é uma realidade comum nas escolas
públicas, as inúmeras alterações e expansões das políticas públicas da educação ainda não
permitiram uma equidade no que diz respeito ao acesso e qualidade do ensino público. Silva e
Silva (2021) esclarecem que a relação da escola e do professor com as tecnologias ainda é
bastante confusa e conflituosa, sobretudo nas instituições públicas. Em complemento, Pereira
e Barros (2020) afirmam que:
É necessário considerar a inserção de todos num contexto mundial e por esse fato não
se pode ficar à margem dos acontecimentos e das consequências, nem sempre
positivas. A educação deveria ser beneficiada e privilegiada com os avanços
190

tecnológicos, porém, infelizmente não é devidamente contemplada como deveria,


afinal, mesmo considerada prioridade pelos órgãos governamentais, continua de modo
geral, obsoleta em tecnologia e elitista, na qual os menos favorecidos lutam por uma
escola pública de maior qualidade e por um acesso à universidade mais democrático
e menos excludente (PEREIRA; BARROS, 2020, p. 4).

O ensino remoto e o uso das tecnologias surgem como algo miraculoso para o ensino,
mas essa percepção não é a realidade da escola pública e seus protagonistas. Não dá para crer
que da noite para o dia tudo estaria resolvido, de forma rápida e automática. Vigotski (2003)
elucida que a educação não é um processo mecânico e ressalta o mérito do processo de troca,
do acesso aos conteúdos, das experiências. Com o uso das tecnologias e o ensino remoto, não
seria diferente:
Com uma visão superficial fica fácil extrair da teoria dos reflexos condicionados a
conclusão de que o comportamento humano e a educação são entendidos de forma
totalmente mecânica e que o organismo é parecido com um robô [autômato] que
responde com regularidade maquinal às excitações do meio. Já destacamos que esse
critério é incorreto. O próprio processo de formação do reflexo condicionado - como
demonstramos - surge da luta e do encontro de dois elementos totalmente
independentes um do outro em sua natureza, que [...] se cruzam e interceptam no
organismo conforme as leis desse mesmo organismo (VIGOTSKI, 2003, p. 78).

As mudanças no contexto escolar, assim como durante toda a vida do ser humano, são
partes essenciais de sua transformação, pois nada e ninguém são imutáveis, quando se relaciona,
o ser humano interage com o meio e aprende. Por isso, é essencial compreender que essas
mudanças não ocorrerão de maneira breve e com facilidade. Trata-se de um processo, e o uso
da tecnologia nas escolas, ainda que importantes, também faz parte desse processo e requer um
minucioso estudo para que seja feito de forma apropriado.
Para tanto, é fundamental lembrarmos que esse debate e a introdução de tecnologias
na educação e no cotidiano escolar não acontecerão de forma instantânea, existem
uma série de fatores que precisarão ser pensados antes disso acontecer, tais como a
infraestrutura das escolas, a capacitação dos profissionais para seu uso e mesmo a
instrução dos alunos, e acima disso tudo, a reflexão da necessidade e da colaboração
que tais instrumentos podem de fato ter na educação (SILVA; SILVA, 2021, p. 830).

As respostas dos gestores vão ao encontro de outros estudos sobre formação, uso das
tecnologias, acesso e qualidade. No Brasil, o acesso aos recursos tecnológicos não é presente
nas escolas, nem para os professores nem para os alunos. Tampouco as formações até então
previam o uso de tecnologias para o desempenho de ensino remoto.
No contexto atual, vivemos uma situação atípica, em que o uso do computador (ou
celular) e da internet se tornaram fundamentais para o cotidiano escolar, a sala de aula
foi substituída pelas salas virtuais, a presença física deu espaço a imagem em telas, o
contato humano trocado pelas videoconferências ou videoaulas. Tudo isso sem que as
escolas, alunos e professores pudessem se preparar. Um momento em que, além da
preocupação com a vida e saúde, os alunos, professores e demais profissionais da
educação também precisam se preocupar em cumprir horários, metas, e tudo o que
envolve os regulamentos escolares (SILVA; SILVA, 2021, p. 830).
191

Não obstante, há preocupação com os conteúdos os quais se têm acesso nas redes. A
falta de uma formação crítica leva ao aprendizado alienante, e quem os acessa pode facilmente
ser envolvido pelos interesses obscuros das redes sociais, midiáticas e perversas do capitalismo.
Como se não fosse suficiente, a preocupação com os conteúdos disponíveis também é assunto
de extrema importância nesse cenário de expansão da tecnologia. Diferentemente dos alunos
que já possuem as oportunidades tecnológicas, de ensino de qualidade, pode ser, que tenham
uma maior percepção ao conteúdo disponível, isso não é uma regra, mas é um fato. Por terem
maiores e melhores condições, pode ser que tenham maiores e melhores percepção do mundo
a sua volta.
Além disso, também se deve levar em consideração que, para as que têm acesso fácil
à internet, aos outros dispositivos necessários, assim como outras condições objetivas
de participação das aulas remotas, a compreensão crítica das informações ali
encontradas só ocorre àquelas que tiveram acesso a formações críticas (não
necessariamente escolares), pois são essas formações que contribuem para dar sentido
ao que se vê, ouve, lê, acessa. Ou seja, a busca por informações nos meios digitais
pode ser facilmente capturada pela rede alienante do capital, impedindo a livre
navegação e afogando o sonho de emancipação pela tecnologia. Nesse sentido, o olhar
para as tecnologias deve deixar de ser em busca de sua natureza, que não é nada neutra,
voltando-se para a imbricada relação com suas finalidades políticas e éticas
(CARVALHAL; OLIVEIRA; RIBEIRO 2020, p. 32-33).

Os professores se depararam com uma situação que gerou diferentes e intensos


sentimentos quanto ao momento experienciado no ensino remoto. Silva e Silva (2021), ao
perguntarem aos professores para que expusessem, por meio de uma dinâmica, o que representa
o cenário educacional atual, verificaram:
[...] a palavra mais apontada pelos professores para definir a educação neste momento
de pandemia foi “desafiadora”, seguida de outras como: difícil, exclusão, frustração,
estresse etc. Estas palavras nos permitem refletir o quão difícil tem sido o processo de
adaptação ao modelo de aulas remotas, visto que os profissionais não tiveram uma
preparação para o uso de tecnologias e na maioria das vezes já possuíam dificuldades
com o manuseio destas ferramentas. Esta realidade traz aos docentes uma carga de
estresse muito maior do que aquele já presente no ensino presencial, pois o desafio
vai além do domínio das tecnologias, está presente também no atual ambiente de
trabalho (a própria casa) que teve que ser adaptado no tempo destinado ao atendimento
dos alunos, aulas e tudo o que envolve as responsabilidades docente (SILVA; SILVA,
2021, p. 834).

Esses sentimentos por muitas vezes estavam acompanhados do silêncio. Os


professores foram pegos de surpresa e obrigados a desenvolver o trabalho de uma forma
totalmente alheia a sua rotina, e não lhe foi dado tempo e na grande maioria condições para que
desempenhassem a atividade, o que lhes causou grande angustia, medo, receio e novamente
emoções silenciadas.
Essas constatações estão presentes em diferentes estudos realizados durante o período
da pandemia, e nos possibilita verificar que novamente ocorreu o silenciamento dos professores,
pois por meio das pesquisas se observou o quanto esse modelo de trabalho gerou
192

sofrimento/adoecimento psíquico aos professores que não tiveram oportunidades de se


expressar diante as intensas cobranças na execução de suas atividades e as condições que lhes
foram apresentadas. Cabe aos gestores oferecer formação, recursos tecnológicos, suporte aos
professores e alunos, com o objetivo de criar condições favoráveis e saudáveis enquanto
prosseguir o ensino remoto.
É importante destacar que a gestão escolar significa o ato de gerir a dinâmica cultural
de uma escola juntamente com as diretrizes e políticas públicas educacionais para a
implementação de seu projeto político-pedagógico e, além disso, deve ser
compromissada com os princípios da democracia e métodos que proporcionem
condições para um ambiente educacional autônomo (soluções próprias, no âmbito de
suas competências), mas também permitindo a participação e compartilhamento das
demais pessoas envolvidas nesse processo educacional (tomada de decisões conjunta
e efetivação de resultados) com autocontrole (acompanhamento e avaliação com
retorno de informações).
A gestão escolar estabelece uma dimensão com enfoque de atuação na qualidade da
educação, que objetiva promover a organização, a mobilização e a articulação de todas
as condições materiais e humanas essenciais para assegurar o avanço dos métodos
educacionais dos estabelecimentos de ensino, contribuindo para uma aprendizagem
eficaz, de modo a tonar os alunos capazes de enfrentar, da melhor maneira possível
os desafios da sociedade complexa e da economia centrada no conhecimento (BIZOL,
2018, p. 6).

Contudo, a discussão sobre a inclusão da tecnologia no ensino se faz presente há


tempos, mas nada foi tão enfático como a pandemia para reforçar e retomar essa discussão.
Silva e Piatti (2021) assinalam que a pandemia acentuou o quanto é preciso discutir e incluir
nas formações docentes o uso de tecnologias e a inserção dessas ferramentas no processo de
ensino aprendizagem.
Porque o que era chamado de normal antes da pandemia e o que se convencionou
chamar de “novo normal” pouco colaboram para a Tecnologia Educacional; antes
afastam e traumatizam professoras e professores. Não é possível ensinar o que não se
sabe, como também é pouco provável que sejam incorporadas às práticas docentes
outras possibilidades que não sejam amplamente compreendidas (SILVA; PIATTI,
2021, p. 12-13).

Apesar de compreendermos a necessidade da inserção da tecnologia nas formações e


no cotidiano do processo ensino-aprendizagem, a forma imposta durante a pandemia pode ter
causada repulsa a esse método, por ter sido tão forçosa. Alguns professores podem ter
desencadeados comportamentos aversivos a esses recursos, situações importantes de serem
identificadas para que não haja novas emoções e sentimentos silenciados e geradores de
sofrimento/adoecimento psíquico frente a essas circunstâncias.
Quanto às ações necessárias para contribuir com o trabalho docente, caso persista
a pandemia (Tabela 49), os gestores sugeriram algumas medidas:
193

Tabela 49-Quais ações considera importante para contribuir com o Trabalho Docente
caso persista o trabalho remoto?
Resposta Frequência
Mais formações para o uso das tecnologias/ Formações técnicas específicas e 11
presenciais de como manusear a plataforma remota/ Formação qualitativa/
Continuidade das formações
Palestras direcionadas à saúde /Formações sobre a saúde psíquica que 07
contribuem com o emocional do docente/ Rodas de conversas voltadas para
tranquilizar a elasticidade de tantas mudanças/ Palestra de motivação/ as
palestras motivacionais principalmente para acalmar a angústia de não
conseguir alcançar o objetivo da forma que gostariam, enfim, ajudá-los sempre
a entender e aceitar a situação que vivenciamos/ Oferta de materiais pontuais
e prazerosos sobre a saúde emocional/ Acompanhamento psicológico

Investir mais em equipamentos tecnológicos/ Melhoria de equipamentos e 03


também da Internet. Temos uma Internet ruim na nossa cidade
Que a Internet funcione bem para que os trabalhos possam ser realizados com 03
sucessos
Assessoria pedagógica e coordenação/ Computadores para os professores, pois 02
nós é que compramos os nossos notebooks e impressoras coloridas
Uma plataforma online para os alunos. 01
Estimular os docentes a gravar as suas aulas, pois muitos não conseguem, fazer 01
as videoaulas, sobrecarregando os alunos com atividades
Mais empatia 01
Todas são extremamente relevantes 01
O apoio e acompanhamento dos responsáveis dos alunos é muito importante. 01

Total 31
Fonte: Freire, 2023.

Nesse tópico, conferimos que a maioria percebe a formação para o uso de tecnologias,
melhores recursos materiais e assessoria para o trabalho online como prioridades. Essas
constatações são importantes devido as consequências que o trabalho remoto ocasionou aos
professores. Não se tratou apenas de uma situação que tiveram que optar em trabalhar
remotamente em utilizar esse método de ensino, ao contrário, foi algo imposto, algo novo, com
pouco ou nenhum recurso que, bem possivelmente, causou vários sentimentos negativos.
Sendo o ensino remoto emergencial por ser uma necessidade no momento, muitas
foram as transformações no fazer docente de cada profissional que se viu diante de
uma nova realidade, onde ao invés do contato direto com os alunos, teriam que
aprender a interagir através do ensino a distância, o que além de desafiador, causou
estranheza e inquietações para esses profissionais da educação básica (FREITAS;
ALMEIDA; FONTENELLE, 2021, p. 2).

Apesar de sabermos que o ensino remoto foi pensado como uma alternativa durante as
ausências das aulas presenciais, são notórias as dificuldades encontradas. Vale ressaltar que não
foi um desafio que gerou expectativas positivas, ou excitação, mas sim estranhamento, medo,
angustias e inseguranças. Tanto os professores quanto os alunos se viram obrigados a manusear
recursos tecnológicos sem terem tido a chance de dominar esse método de ensino
aprendizagem, e não só a falta de domínio, mas o acesso a esses recursos era para poucos ou
nada disponíveis:
194

E isso tem sido um desafio para professores, alunos e famílias, pois alguns professores
não dominam ou não dominavam as ferramentas tecnológicas, famílias também não
dispõem dos suportes necessários para que os/as alunos/as possam acompanhar as
aulas remotas e isso tem gerado um cenário de muita complexidade (FREITAS;
ALMEIDA; FONTENELLE, 2021, p. 5).

Diante desse quadro, é razoavelmente possível concluir que não adianta informatizar
as escolas sem que haja esforços para capacitar os professores para o uso em sala de aula, com
perspectivas de mudanças na prática educativa (PEREIRA; BARROS, 2020).
O ensino remoto além de denunciar, provocou novas discussões sobre as formações
docentes. A forma como todos foram pegos de surpresa por uma pandemia que parou o mundo,
desestabilizou um dos setores essenciais para o desenvolvimento humano, a educação. E por
ter sido o trabalho remoto necessário para continuidade do processo de ensino aprendizagem, o
uso de tecnologias foi a única maneira de se fazer, mas foi feito sem quaisquer condições e/ou
tempo hábil de organização.
A discussão sobre a formação docente nesse período da pandemia se faz necessária
pelo motivo das aulas presenciais estarem suspensas e os professores terem que
produzir as suas aulas por meio das tecnologias, em muitos casos, não existirá tempo
suficiente para capacitar os professores para essa nova demanda que se faz presente.
(PEREIRA; BARROS, 2020, p. 2).

Castro (2020) cita diferentes possibilidades e ações de formação continuada, entre elas
a frequência em cursos de aperfeiçoamento, especialização, mestrado, doutorado, a participação
em palestras, minicursos, congressos, mesas-redondas e grupos de estudos. O autor sugere
ainda que as rodas de conversa podem ser fortes aliadas para a formação continuada em tempos
de pandemia, por ambiente virtual, e enfatiza que essa proposta se baseia na ação coletiva:
As rodas de conversa são um espaço de formação continuada do professor, em que,
juntamente com seus pares, ele reflete criticamente acerca da educação, do ensino e
de questões cotidianas da sala de aula; em que ele compartilha suas experiências,
angústias e desafios, formando uma rede de aprendizagem e de apoio, que são
fundamentais para o seu desenvolvimento profissional e para o “empoderamento” do
grupo. Elas podem ser um espaço de resistência às desigualdades sociais e aos ataques
antidemocráticos à educação e aos professores, também são e devem ser um espaço
de criação – aquela criação que sucede o caos – mas, acima de tudo, são um caminho
possível e que deve ser trilhado por todos os professores e profissionais da educação
(CASTRO, 2020, p. 104-105).

No que se refere à prevenção ao sofrimento/adoecimento docente caso persista o


trabalho remoto (Tabela 50), as sugestões variaram entre:

Tabela 50 – Quais ações considera importantes para contribuir com Saúde Psíquica do
Docente, evitando o seu adoecimento, caso persista o trabalho remoto?
Resposta Frequência
195

Clima organizacional e ambiente de trabalho saudáveis/ Apoio/ diminuir a carga 15


cognitiva diária sobre as ações do docente/ Atividade sobre a postura do
profissional. Formas de utilizar o computador. Tempo de permanecer sentado.
Alongamento/ grupos de atividades culturais coletivas para que o professor
possa vivenciar alguns momentos de descontração/ Incentivo aos exercícios, à
música e às técnicas de respiração/ Evitar o acúmulo de trabalho/Grupo de
estudos e de apoio às demandas do cotidiano escolar/ Palestras e muita
informação/ Palestra que trabalha temas que evitem o adoecimento do
profissional da educação/ Conversas constantes com os professores, precisamos
de momentos para ouvi-los/ Encontro semanal por meet de até uma hora os quais
tragam temáticas relativas a saúde emocional Etc.

Terapia, acompanhamentos terapêuticos/ Presença de um psicólogo na 07


instituição/ Que o docente tenha disponível um psicólogo
Ações de conscientização/ Continuar incentivando o trabalho em equipe 02
Formação em trabalho remoto/ Trabalhar com o docente também de forma que 02
ele se sinta seguro para o atendimento remoto e híbrido
Persisto na motivação tanto docente como discente e família 01
É complicado, pois cada um tem uma visão diante desta delicada situação, mas 01
ter uma equipe da saúde disponível com orientações básicas é fundamental

Salário digno para que não precisar trabalhar tanto 01


Prefiro falar em minhas terapias 01
Total 30
Fonte: Freire, 2023.

Como já apontado, devido à pandemia, os professores sofreram mudanças súbitas na


maneira de realizar seus trabalhos. Assim, o manejo das tecnologias e da internet foi imposto
de forma brusca. O pouco tempo e as demandas para a continuidade das aulas sobrecarregaram
os docentes, não lhes restando outra saída senão se debruçarem na realização do ensino remoto:
A transição abrupta do ensino presencial para o remoto, num contexto de medo e
preocupação devido ao novo coronavírus, trouxe uma série de novos desafios aos
professores. Expondo a categoria docente a diversas situações e pressões das
instituições escolares referentes ao manuseio das tecnologias que busca pela inovação
de ensino que garanta o envolvimento e aprendizagem dos alunos, o que reverbera no
adoecimento mental (OLIVEIRA; SANTOS, 2021, p. 39194).

É válido ressaltar que, mesmo antes da pandemia, os professores já vivenciavam uma


intensificação do trabalho e inúmeras condições desfavoráveis que contribuíam para o
sofrimento/adoecimento psíquico, o cenário da pandemia apenas elucidou e intensificou as
péssimas condições que os professores vinham se deparando rotineiramente e, mais ainda, o
sofrimento/adoecimento psíquico já existente também foram sendo estendidos perante os
sentimentos negativos nessa nova forma de trabalho. Porém, importante salientar que como a
pandemia apenas escancarou algo que há tempos vinha acontecendo, mas que intensificou, no
período pós-pandemia. É certo que essa situação pode agravar caso a negligência sobre essa
questão continue:
Com a pandemia então, escancara uma nova conjuntura de trabalho que acentua
quadros de adoecimento mental nos professores. Contexto que apresenta intensas
instabilidades nas relações humanas e rupturas para a educação. Uma vez que, o ritmo
do trabalho virtual se torna mais intenso do que nas aulas convencionais, exigindo dos
196

professores mudanças de práticas que resultam em sofrimento e possivelmente o


adoecimento mental.
Os professores, em virtude das condições de mudanças no trabalho, ensino presencial
para remoto, são impulsionados ou até mesmo obrigados a se adequarem às
atribuições de um “novo” perfil profissional e, consequentemente, às exigências de
novas performances para que as demandas sejam atendidas com qualidade. Fatores
que geram graves problemas à saúde mental dos professores (OLIVEIRA; SANTOS,
2021, p 39195-39196).

O cuidado com a saúde do docente deve ser tópico de discussões para os próximos
documentos que legislam a educação, devem se tornar políticas públicas, e antes mesmo que
essa isso aconteça, é fundamental que haja nesse momento um olhar diferenciado para a saúde
do professor. Após a passagem de um acontecimento como a pandemia que deixou rastros de
sofrimento/adoecimento, não há como não discutir e abordar as consequências causadas por
essa situação caótica que foi imposta aos trabalhadores. O retorno das aulas presenciais é certo,
e será tomada de resquícios desse período horrífico.
Contudo, a execução de ações e diligências preventivas e promotoras de saúde para
reduzir as implicações psicológicas da pandemia não podem ser deixadas de lado neste
momento (PEREIRA; SANTOS; MANENTI, 2020).
Diante do contexto atual, torna-se claro que o acompanhamento psicológico é
fundamental para os professores universitários. Neste aspecto, o psicólogo deve
trabalhar formas de minimizar os medos e frustações dos clientes e incentivar a busca
por atividades que estimulem a resiliência e a redução do estresse, com foco na
retomada do trabalho de forma segura, evitando futuros agravos psicológicos e
fortalecendo os docentes para o enfretamento de possíveis adversidades. Já que os
docentes apresentam uma grande incidência de síndrome de Burnout e transtornos
psicológicos, faz-se necessário que as instituições de ensino busquem formas de
proteger esses profissionais, colaborando para a melhor troca de experiências entre
alunos e professores (HERNANDES; ROZÁRIO, 2021, 1366-1367).

Importantes estudos indicam a necessidade do acompanhamento da saúde psíquica do


professor e a supervisão dos órgãos competentes, a gestão precisa tomar para si essa
responsabilidade, procurar por colaboração junto aos setores responsáveis pela saúde do
trabalhador, trata-se de condições de trabalho, não há como negligenciar essa situação. As
consequências advindas da pandemia na saúde do professor devem ser tema constante em todas
as pautas de organização e planejamento do trabalho a partir de agora.
Assim, reafirma-se a necessidade de monitoramento contínuo da saúde dos
profissionais da educação no contexto de retorno às atividades de trabalho, que precisa
ser direcionado sob o enfoque da saúde coletiva e da vigilância em Saúde do
Trabalhador, com adoção de estratégias de construção participativas com sindicatos e
base de professore(a)s (SOUZA et al. 2021, p. 11).

Pereira, Silva e Belmonte (2021) complementam que é imprescindível que órgãos


responsáveis abordem essa temática e que realizem ações que envolvam planejamento e
capacitação. Os autores salientam ainda que mesmo diante as dificuldades, incertezas, medo e
diferentes outros sentimentos, os professores protagonizaram a virtualização do ensino. Sob a
197

alcunha de imobilismo, essa categoria profissional tem transformado e ressignificado a sua


prática com criatividade, compromisso e responsabilidade (SANTOS; SILVA; BELMONTE,
2021, p. S250).
É preciso dar condições para que os professores trabalhem caso o ensino remoto
continue, e não o bastante, é preciso das condições para que consigam retomar o trabalho
presencial após a pandemia também. Os seres humanos são capazes de se adaptar, transformar,
mas é preciso lhe ofertar possibilidades, condições para se adaptarem, se transformarem, caso
contrário, apenas o farão sem qualquer satisfação.
Indagados se tiveram conhecimento sobre afastamento de docentes no período de
pandemia por problemas de ordem psíquica tabela 51 pouco mais da metade alegou que não
soube, também, solicitamos que descrevessem quais seriam caso tenham respondido que
sim. A metade não soube definir. Outros discorreram que foi por causa de ansiedade, pânico,
estresse, depressão, falta de saber lidar com a situação e perda de familiares.

Tabela 51- Houve afastamento de docentes por problemas de ordem psíquica no período
de pandemia? Se sim, saberia descrever quais?
Sim 12 (46%)
Não 14 (54%)
Resposta Frequência
Não 06
Ansiedade/ Pânico/estresse/depressão 04
No início, por causa de não saber lidar com a situação 01
Tenho conhecimento de professores que, por perderem familiares, não 01
conseguiram retornar às suas atividades
Total 12
Fonte: Freire, 2023

O período pandêmico colaborou apenas para comprovar a existência da desvalorização


do trabalho docente, contribuiu para a intensificação do sofrimento/adoecimento psíquico que
por diferentes motivos já surgiam durante o processo de trabalho, além da confirmação da
ausência de políticas públicas voltadas a saúde do professor.
Mediante ao atual cenário da educação devido a pandemia, a urgente necessidade de
se reinventar, tem provocado em muitos professores a sensação de mal-estar pelos
desafios impostos por esse cenário. Visto que, algumas demandas escolares como o
uso de tecnologias e aplicação de metodologias ativas para o ensino remoto exige
rápida adaptação dos professores (OLIVEIRA; SANTOS, 2021, p. 39196).

As causas verificadas pelos gestores são apontadas por diferentes pesquisadores que
constataram que não só há o medo e ansiedade em lidar com uma crise sanitária repercutiram
na saúde dos professores, nesse caso, pela pandemia, como também o incremento de trabalho e
as inseguranças que envolveram todo esse contexto.
Além da falta de capacitação, pressão de pais e gestores, esforço para repassar
aprendizado aos alunos, obrigações pessoais, os professores ainda têm a preocupação
de precisar conviver com uma doença que já matou milhares e, ainda, devido à crise
198

econômica causada pelo coronavírus, surge a angústia de ter seu salário reduzido e
sua carga horária aumentada (HERNANDES; ROZÁRIO, 2021, p. 1363).

O que parecia ser algo provisório tornou-se uma realidade para professores e alunos
que se depararam com uma modificação abrupta no processo de ensino e aprendizagem, as
relações, a afetividade, a proximidade foram substituídas por aparelhos, as atividades coletivas,
foram realizadas por meio da internet individualmente, os professores tiveram que dispor de
muita criatividade na elaboração, execução, explicação e correção do conteúdo, enquanto os
alunos tiveram que se desdobrar para conseguir ter acesso a internet e aparelhos. Vale ressaltar
que nem sempre havia tais estruturas em casa, portanto, deparavam-se com a dificuldade de
compreender as orientações e tarefas a serem executadas.
O caos causado pela pandemia propôs refletirmos porque há a dificuldade ou a negação
em discutir algo que a tempos tem gritado por atenção, a saúde dos professores. Durante a
pandemia vários foram os momentos que o sofrimento/adoecimento docente foi se expandindo.
Teixeira (2020) descreve como a saúde dos docentes foi sendo atingida ao longo da pandemia:
Focados em um processo educacional que foi sendo reduzido a transmissão de
conhecimentos e cumprimento de protocolos, os docentes passaram a sentir o peso do
esvaziamento dos espaços de encontro, desabafo, trocas afetivas e de conhecimento
que se davam pelos corredores com professores e alunos. Nos grupos de WhatsApp®
de docentes, assistimos a mensagens de colegas relatando perdas de parentes, pedindo

Tabela 52 - Causas de afastamento no período de 01/01/2020 até 31/12/2021 Quantidade de


CID 10- F: Atestados
F 31.3 Transtorno afetivo bipolar, episódio atual depressivo leve ou moderado 1
F 32 Episódios depressivos 7
F 32.0 Episódios depressivos leve 2
F32.1 Episódio depressivo moderado 3
F 33 Transtorno depressivo recorrente 3
F38.8 Outros transtornos especificados do humor (afetivos) 1
F 39 Transtorno do humor (afetivo) não especificado 1
F 40.1 Fobias sociais 1
F 41 Outros transtornos ansiosos 2
F41.0 Transtorno de pânico (ansiedade paroxística episódica) 2
F 41.1 ansiedade generalizada 2
F 41.2 Transtorno misto ansioso e depressivo 2
F 43 Reações ao “” estresse”” grave e transtornos de adaptação 2
F 43.2Transtornos de adaptação 1
F 45 Transtornos somatoformes 1
Total 31
Fonte: Freire 2023
indicações de médicos e remédios para dores no corpo decorrentes de horas sentados
em espaços improvisados em casa e dicas de anti-inflamatórios e analgésicos foram
tomando o lugar de uma crítica quando as novas posturas de trabalho. Subentendidos
e de modo mais sutil, também se comentava dos
ansiolíticos e remédios para dormir, que ajudavam a suportar a ansiedade, o medo, a
solidão e o excesso de tarefas.
Nos grupos e reuniões, sentimos o terror pelos colegas cada vez que alguém tinha
sintomas de gripe ou era confirmado com COVID-19, escutamos os relatos cada vez
mais frequentes de contágio e perdas de parentes e nos solidarizamos às famílias
atingidas, sem que ninguém se afastasse do trabalho por muito tempo. Alguns colegas
compartilhavam a dificuldade do espaço de casa, outros as dificuldades com os
cuidados com os filhos, agora coabitando integralmente no mesmo espaço doméstico,
199

outros anunciavam a mudança para um espaço maior, muitos compraram novos


equipamentos e todos aumentaram a velocidade da internet. Esse custo, claro, foi
assumido sem titubeio pelos docentes, que agora compartilham o receio de não
conseguir dar aulas por dificuldades técnicas e consequentemente ser detectado ou
punido, o medo ainda mais avassalador do desemprego e a preocupação constante
com uma volta precipitada ao trabalho e os consequentes riscos de contaminação.
(TEIXEIRA, 2020, p. 212-213).

Verificamos que a metade dos participantes não respondeu a essa questão, e outra
metade respondeu de forma monossilábica – não. Contudo, chamam-nos a atenção os registros
do setor de Recursos Humanos da Secretaria Municipal de Educação que nos foram
disponibilizados pelo Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (CEREST) do município
no qual apontam que, no período de 01/01/2020 até 31/12/2021, 31 profissionais de educação
solicitaram afastamento para tratamento de saúde com atestados CID F19. (Tabela 52).

O trabalho remoto, sem dúvida, ocasionou consequências avassaladoras para o


professor. Ainda não sabemos a amplitude e a permanência desses resultados e o quanto podem
contribuir para a perda da satisfação e prazer, seus motivos e objetivos em relação à sua
atividade.
Assim, os trabalhadores acabam sendo guiados por ações que levem a suprir as suas
necessidades básicas, deixando de lado a unidade consciente entre motivos e fins.
Executam o trabalho, mas somente para terem recursos financeiros para gastos com a
sobrevivência, sem ascender ao gênero humano, ou seja, sem se apropriar da riqueza
do que é produzido pelos homens historicamente (FACCI; LEONARDO; ALVES,
2020, p.186).

Silva (2021) enfatiza como as condições com que o ser humano se depara podem
desintegrar e debilitá-lo psicologicamente e que essas condições precisam ser repensadas, para
possibilitar a sua melhora, pois surgem a partir da internalização de uma realidade. Como o ser
humano adoece na realidade de uma sociedade, também é nessa mesma sociedade que deve
existir maneiras de superação.
Nesse viés, Teixeira (2020) nos instiga a pensar o mundo pós-pandemia, pois pouco
sabemos o que está por vir. Mas dois nortes apontam expectativas que se referem ao retorno do
bem-estar social, com a diminuição do consumismo e do individualismo, e assim,
fortalecimento das relações sociais, menos competição, e por outro lado, há quem acredita que
aumentará os nacionalistas, o obscurantismo, o fortalecimento das religiões, a desvalorização
humana, e como resultado, a mediocrização da morte.

19
Foi solicitado por interesse da pesquisadora ao Centro de Referência de Saúde do Trabalhador as informações
especificamente sobre os afastamentos dos professores relacionados ao CID-10 F.
200

Concluindo as entrevistas com os gestores, perguntamos se gostariam de


acrescentar algo. Suas respostas revelam preocupações em relação à saúde de todos, de modo
geral, e à valorização dos profissionais da Educação, como lemos na Tabela 53:

Tabela 53 - Informações que considere importantes acrescentar


1 Com a saúde não se brinca
2 Valorização da profissão da docência
3 São muito importantes terapias fora do ambiente também além das todas com temas específicos
4 Que todos os nossos docentes e funcionários tenham tomados a 2ª dose para poder receber os nossos alunos
5 Não
6 Vivemos em tempos difíceis, não temos mais certeza de nada. Os professores, pais e alunos estão desanimados
e com receio, acredito que isso abala muito o psicológico de muitos deles
7 Parabéns pela pesquisa! Temática muito relevante!
8 Na Rede existem profissionais que foram remanejados ou tiveram a função alterada por motivo de problemas
de ordem psíquica.
9 Espero que sua pesquisa retrate o quanto estamos necessitados de apoio psicológico agora em plena pandemia
principalmente depois dela, onde nada será como antes. As pessoas tiveram transformações profundas por vários
fatores como perdas na família, separação de pais, muito tempo em casa gerou tantos conflitos aflorando a
violência doméstica, não só entre cônjuges, mas de mãe batendo em filhos sem paciência para fazer tarefa, vó,
tio, enfim. As crianças estão ociosas, passam mais tempo na rua e isso vai refletir diretamente no comportamento
do grupo em sala de aula, quando houver o retorno. Então o acompanhamento de um profissional como
Psicólogo seria essencial em cada unidade de ensino de forma permanente. Boa sorte e parabéns pelo trabalho.
10 Não tivemos profissionais afastados durante a pandemia, mas em inúmeras conversas percebemos a
ansiedade, o medo e a preocupação de cada um.
11 Não houve afastamento formal, pois estávamos em teletrabalho, mas muitos professores entraram em
depressão, ficaram ansiosos.
12 Pensar em estudos e na saúde dos profissionais de educação é primordial para garantir uma Educação ativa
e de qualidade.
13 Somos a base, nos valorizem. É um absurdo o professor receber um mísero salário e com isso tem que
trabalhar 3 períodos para sustentar sua família.
Fonte: Freire, 2023

Como já mencionado anteriormente, as respostas dos gestores foram mantidas na


integra em todas as tabelas. Ao que tudo indica, as respostas reforçam que reconhecem a
necessidade de ações para a prevenção do sofrimento/adoecimento psíquico docente.
Os professores, profissionais mais afetados com o método do ensino remoto, tiveram
que adaptar todo o seu cotidiano para atender às novas exigências da educação e de sua
profissão docente (SILVA; SILVA, 2021).
Nessa nova forma de trabalho, de organização de vida, a pandemia, de maneira
explícita, revelou as grandiosas, inúmeras e sérias divergências no país. O número de óbitos, o
caos da saúde pública, o aumento da violência, as imposições para que serviços e produções
continuassem acontecer e o desemprego foram algumas das várias situações existentes da
sociedade que foram absurdamente escancaradas.
Nesse cenário, de corrida contra o tempo e cobrança pela continuidade das aulas para
que não houvesse prejuízos no ensino, o professor se deparou com as exigências da sociedade
e foi colocado no pelotão de frente dessa batalha, e sem poder se expressar, tendo que garantir
201

o seu sustento, o professor mais uma vez silenciou suas emoções e se viu em uma situação
inesperada e repleta de insegurança e incertezas.
[...] E com a pandemia causada pelo novo coronavírus, as mudanças tem-se
intensificado. Mudanças estas que causam repercussões, direta ou indiretamente, em
toda organização social e que geram impactos significativos na saúde mental do
professor (OLIVEIRA; SANTOS, 2021, p. 39194-39195).

Pessoa Pereira, Viana Santos e Aguiar Manenti (2020) apontam para o cenário
precário, e mesmo cruel da educação ao qual os professores foram submetidos, tendo que se
reinventarem a qualquer custo independente das condições de trabalho.
Ao que nos parece, em nenhum momento foi pensado nas condições de trabalho e as
consequências para os professores. As exigências foram exclusivamente para a continuidade do
ensino, cumprimento de prazos, conteúdos, metas, e sem ao menos, organizar um novo modelo
de trabalho que pudesse ser acessível e plausível as reais condições dos docentes. Essa situação
nos remete a discussão das formações, quando nos reportamos as observações de como
acontecem, sem qualquer participação ativa dos professores nas escolhas das teorias
pedagógicas, conteúdos, duração, entre outros elementos importantes. O que se percebe, é que
em todos os momentos, os professores apenas executam, não são ouvidos, não se expressam. O
silenciamento é característica constante na realização da atividade.
O que precisa ser pensado a partir de agora e não se pode deixar escapar esses
resquícios da pandemia na sociedade, é que se entendemos a educação como forma de
transformar, de criar possibilidades de mudanças, não podemos manter esse silêncio frente as
mais diversas atrocidades que a sociedade vem impondo a tempos. O negacionismo,
obscurantismo, as imposições aos profissionais da educação, as péssimas condições de trabalho
não são em hipótese alguma o real objetivo da educação. Como as diferentes sequelas da
pandemia, essas reflexões precisam acontecer, ser discutidas e repensadas para que possamos
assumir o quanto as desigualdades já existiam e estavam apenas mascaradas, e de alguma forma
iniciar um real processo de transformação.
Até esse ponto, conhecemos a organização, condições e ações existentes na educação
do munícipio. Percebemos que são inúmeras as questões existentes que precisam ser discutidas,
avaliadas e reorganizadas para que haja um bom ambiente de trabalho. Também, constatamos
que a comunicação, aspecto essencial para as relações, é um fator que precisa ser refletido.
Dentre as respostas, foi possível verificar que o município não realiza nenhum projeto
especifico e contínuo para prevenir ou instrumentalizar os profissionais da educação para
saberem lidar com o sofrimento/adoecimento psíquico. A linguagem e o silenciamento foram
aqui percebidos como temas necessários a serem abordados visando melhoria nas relações, nas
condições de trabalho e outros fatores importantes para organização e planejamento do trabalho
202

e futuras ações. No próximo tópico, abordaremos semelhanças e diferenças nos dados dos
professores e dos gestores.

3.7 DOCENTES X GESTORES: percepções sobre o sofrimento/adoecimento psíquico

A linguagem carrega consigo os conceitos


generalizados, que são a fonte do conhecimento
humano. Instrumentos culturais especiais, como a
escrita e a aritmética, expandem enormemente os
poderes do homem, tornando a sabedoria do passado
analisável no presente e passível de aperfeiçoamento
no futuro (LURIA, 2010, p. 26).

Com base nos dados coletados e analisados nessa pesquisa, esse tópico pretende
analisar fatores importantes que possam contribuir para confirmação dessa tese. A
comunicação, as semelhanças e/ou contradições entre as respostas dos participantes,
professores e gestores que podem ajudar na comprovação de que a linguagem e as emoções são
ferramentas indispensáveis para o ser humano se instrumentalizar e conseguir organizar e
refletir sobre suas percepções, sentimentos e prevenir o sofrimento/adoecimento psíquico.
A comunicação é primordial para o desenvolvimento, para as relações, para o convívio
e os bons resultados. É a linguagem – a comunicação que propicia uma boa integração e
resolutividade em diferentes situações, mesmo que inesperadas.
Quanto aos dados de identificação, professores e gestores são, na maioria, do sexo
feminino, com a faixa etária entre 41 e 50 anos. O estado civil é outro dado compatível entre
professores e gestores. Em relação à graduação, a maioria é formada em Pedagogia. A
instituição de ensino superior mais registrada tanto para professores quanto para os gestores foi
a UFMS – Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Observamos também uma
proximidade quanto aos períodos de formação. O curso de Especialização é a pós-graduação
predominante entre os dois grupos.
Chamam-nos a atenção as similaridades em todos os aspectos da identificação. A
maioria tem formação em Pedagogia e possui Especialização na instituição UFMS. Isso se
explica porque os cursos são oferecidos no CPAN – Campus do Pantanal, localizado em
Corumbá.
A partir desses dados, propomos uma análise por dois vieses. A primeira refere-se ao
meio. De acordo com Vigotski (2018), o meio tem papel e significado no desenvolvimento da
criança e o sentido direto da palavra se modifica para a criança a cada degrau etário:
Como se sabe o mundo distante não existe para o recém-nascido. Para essa criança,
existe apenas o mundo que se relaciona diretamente com ela, ou seja, o que se articula
203

em torno de um espaço estreito, formado por fenômenos e objetos ligados a seu corpo.
Aos poucos, o mundo distante começa a se aproximar. Contudo, no início, trata-se
também de um mundo muito pequeno: o mundo do quarto, do pátio mais próximo, da
rua. Quando começa a andar, esse mundo se expande e, cada vez mais, novas relações
entre a criança e as pessoas que a circundam se tornam possíveis. Posteriormente, o
meio se modifica por força da educação, o que o torna especifico para a criança a cada
etapa etária: na primeira infância, a creche; na idade pré-escolar, o jardim de infância;
na idade escolar, a escola. Cada idade tem seu próprio meio, organizado para a criança
de tal maneira que, quando tomando no sentido de algo puramente externo, se
modifica na passagem de uma idade para outra (VIGOTSKI, 2018, p. 74-75).

Esse primeiro viés nos leva a entender que os profissionais de educação optaram por
se formar em pedagogia, ter especialização, além da coincidência das idades e períodos por
influência do meio em suas escolhas, por viverem as experiências no mesmo momento histórico
e cultural, conforme as faixas etárias e interesses, como aponta Vigotski (2018).
Todavia, isso é pouco. Até mesmo quando o meio se mantém pouco alterado, o mero
fato de a criança mudar, no processo de desenvolvimento, faz com que se modifiquem
o papel e o significado dos momentos do meio que parecem permanecer inalterados.
Um evento que tem determinado significado desempenha um papel numa idade
específica. Todavia, dois anos depois, começa a ter outro significado e a desempenhar
outro papel por força de mudanças da criança. Ou seja, a relação da criança com
aqueles eventos do meio mudou.
Valendo-nos de exemplos que vimos quando analisamos crianças, podemos dizer,
com mais precisão ou exatidão, que os momentos essenciais para definição da
influência do meio no desenvolvimento psicológico, no desenvolvimento da
personalidade consciente, são a vivência. A vivência de uma situação qualquer, de um
componente qualquer do meio define como será a influência dessa situação ou meio
sobre a criança. Ou seja, não é esse ou aquele momento, tomado independentemente
da criança, que pode determinar sua influência no desenvolvimento posterior, mas o
momento refratado através da vivência da criança (VIGOTSKI, 2018, p. 75).

Mas, por outro viés, percebemos que as escolhas se deram por conta da restrição do
próprio meio, digamos, restrito, no sentido de localização, acesso. Se pensarmos no período de
graduação dos participantes, poucas eram as possibilidades de realizarem seus estudos e
pesquisas fora do município.
Corumbá é o município mais distante da capital do estado de Mato Grosso do Sul. Por
muito tempo, houve poucas possibilidades de locomoção e oportunidades de expandir seus
conhecimentos, que não na própria cidade. Essa análise ganha força quando observamos os
outros cursos, períodos de conclusões e faixa etárias. Constatamos que são profissionais mais
jovens, que tiveram acesso a novas oportunidades, concluíram seus estudos em outros
municípios, ou mesmo vieram de outras cidades.
Sobre o meio e o desenvolvimento, Vigotski (2018) ressalta:
O meio não deve ser estudado como um ambiente de desenvolvimento que, por força
de conter determinadas qualidades ou características, já define pura e objetivamente
o desenvolvimento da criança. É sempre necessário abordá-lo do ponto de vista da
relação existente entre ele e a criança numa determinada etapa de desenvolvimento
(p. 74).
204

Outro ponto em comum da investigação foi sobre o trabalho remoto. Perguntamos


sobre a disponibilização e formação para uso de recursos tecnológico no desempenho do
trabalho dos professores.
A maioria dos professores respondeu que foram disponibilizados recursos
tecnológicos. Essa informação vai ao encontro das respostas da maioria dos gestores. Sobre a
formação para utilizar os recursos tecnológicos a maioria dos docentes confirmou que as
recebeu. Nesse quesito, é possível verificar uma proximidade no número de respostas entre os
professores, supondo uma possível incongruência, ou mesmo a existência de diferentes
interpretações para o que seria uma ação proposta como formação.
Os dados coletados sugerem a existência de falhas na comunicação, conhecimento e
percepções em relação às situações desiguais desse mesmo meio.
De acordo com Vigotski (2018), o desenvolvimento do pensamento como dependente
de instrumentos externos, no caso a linguagem, está vinculado à experiência sociocultural da
criança.
A comunicação entre professores e gestores deve ser um dispositivo de aproximação,
de auxílio para as relações e a prevenção de conflitos. Só por meio de funções fundamentais
como o pensamento e a linguagem é que a consciência, a percepção e a memória também se
desenvolvem.
As informações extraídas da pesquisa revelam uma falha de comunicação e percepção
entre os professores, quando os participantes respondem sobre os recursos tecnológicos e a
formação disponibilizada. Há uma proximidade entre as respostas sim e não, mas que faz toda
diferença e pode direcionar a uma contradição entre essas ações, ou entre as percepções e/ou
compreensão dos participantes:
Para o materialismo histórico-dialético, o mundo empírico representa apenas a
manifestação aparente da realidade em suas definibilidades exteriores. Os fenômenos
imediatamente perceptíveis, ou seja, as representações primárias decorrentes de suas
projeções na consciência dos homens, desenvolvem se à superfície da essência do
próprio fenômeno (PASQUALINI; MARTINS, 2015, p. 363).

A linguagem e o pensamento são as principais funções para o sujeito aprimorar seu


conhecimento, sua consciência, desempenhar sua atividade, manter suas relações, expressar
suas emoções e impulsionar o desenvolvimento de outras funções superiores.
O progresso principal do desenvolvimento do pensamento assume a forma de uma
passagem do primeiro modo de utilizar uma palavra como nome próprio, para o
segundo modo, em que uma palavra é signo de um complexo e, finalmente, para o
terceiro modo, em que uma palavra é instrumento ou recurso para desenvolver o
conceito. Assim como se verificou que o desenvolvimento cultural da memória tinha
as mais intimas ligações com o desenvolvimento histórico da escrita, verifica-se que
o desenvolvimento cultural do pensamento possui a mesma conexão intima com a
história do desenvolvimento da linguagem humana (VIGOTSKI; LURIA, 1999, p.
133).
205

A consciência é outro fator importante do desenvolvimento, pois é um resultado das


experiências do sujeito e colabora ou não para percepção de si no mundo. Por isso a consciência
não pode ser identificada exclusivamente com o mundo das vivências internas, mas apreendida
como ato psíquico experienciado pelo indivíduo e, ao mesmo tempo, expressão de suas relações
com os outros homens e com o mundo (MARTINS, 2015a).
A consciência é a soma das experiências do sujeito e deve permitir-lhe compreender
os fenômenos à sua volta e a perceber a si mesmo. A forma que percebe o mundo a sua volta
influencia diretamente nos sentimentos, emoções, no psiquismo do ser humano.
Portanto, a imagem psíquica desenvolve-se com complexidade estrutural dos
organismos por meio da atividade que a condiciona, e nisso reside a materialidade da
própria consciência. Os fenômenos objetivos preexistem a ela, a quem compete a
captação e a reconstituição no plano subjetivo (MARTINS, 2015a, p. 29).

No que tange aos prejuízos a saúde por causa do trabalho remoto, novamente a soma
dos docentes que foram afetados ultrapassa a soma dos que não foram.
Os docentes, em condições de mudanças, são impulsionados ou obrigados a se
adequarem às atribuições de um novo perfil profissional e, consequentemente, às exigências de
novas performances para que as demandas sejam atendidas (PEREIRA, SANTOS e
MANENTI, 2020).
A nova forma de trabalho que devido a pandemia foi imposta aos professores, no traz
de maneira agressiva a necessidade de analisar o que o ser humano sente ou sentiu com toda
essa mudança. Se o ser humano é criador de sua história, se o seu trabalho transforma a si e ao
mundo a sua volta, o que pensar quando o professor se depara com as exigências e péssimas
condições do trabalho. Esse momento trouxe além das imposições das condições e excessos de
trabalho o silenciamento de um ser humano como um todo. As emoções, os prazeres, as
satisfações, desejos e motivos foram simplesmente enclausurados.
Partimos do pressuposto de que o homem é o sujeito da história, criador e reprodutor
de suas condições de existência e, por consequência, autor de seu processo de
personalização. O homem é um ser que produz pelo trabalho social os seus meios de
subsistência e dessa forma se produz a sei mesmo (MARTINS, 2015b, p. 112).

A pandemia ocasionou muitas e sérias mudanças no modo de trabalho docente, por


isso o cuidado com a saúde psíquica desses profissionais deve ser repensado. Pessoa Pereira,
Viana Santos e Aguiar Manenti (2020) realçam que o cuidado com a saúde do professor precisa
ser levado a sério e ainda ressaltam a importância de se considerar a forma de organização e
execução do trabalho remoto, como também o processo de retorno as aulas presenciais.
Aos gestores foi indagado se houve afastamento de professores para tratamento de
saúde durante a pandemia. Nesse ponto, averiguamos nova incoerência nas respostas, pois as
206

quantidades de sim e não estão bem próximas. Novamente desvelamos as diferentes possíveis
percepções existentes nesse contexto.
A percepção é corroborada, portanto, na atribuição de significado às impressões
sensoriais, e, na unidade que se forma entre estas, ela reside em um processo altamente
complexo e estruturado, constituído pelas imbricadas relações que fazem das
sensações os meios pelos quais os objetos e fenômenos da realidade são percebidos.
(MARTINS, 2015a, p. 130-131).

Perguntamos aos gestores quais os motivos dos afastamentos por sintomas psíquicos
durante a pandemia. Novamente observamos a falta de percepção, comunicação e
conhecimento sobre os afastamentos para tratamento de saúde durante a pandemia, pois 31
profissionais da educação, com critérios diagnósticos de sofrimento mental se afastaram nesse
período. Esse dado é de extrema relevância. Quando compreendemos a percepção como uma
abstração do concreto, torna-se conhecimento de uma dada realidade:
São os estreitamentos da função especifica no sistema psíquico, isto é, são as conexões
interfuncionais, que tornam possível à percepção “emancipa-se” de conexões
primitivas, próprias à sua manifestação natural, para, libertando-se delas, assumir um
papel altamente especializado na orientação do comportamento complexo. Destarte,
também, a percepção deve galgar uma formação que promova a “superação” do
atendimento aos ditames naturais, psicofísicos, em direção ao atendimento das
demandas da atividade complexa culturalmente formada (MARTINS, 2015a, p. 134-
135).

O gestor precisa estar atento às diferentes circunstâncias, não tão somente, mas ter
também conhecimento das situações, saber lidar com as adversidades e perceber o meio e suas
mudanças. A percepção é importantíssima para as relações, o convívio, o ambiente. Trata-se de
uma função psíquica superior que complementa outras funções e necessita de outras para o seu
desenvolvimento:
Verifica-se, pois, que a percepção não é um processo autônomo, em relação às
condições nas quais ocorre, tanto do ponto de vista biológico, quanto da atividade que
integra. Por conseguinte, sendo variável e instável, demandará vínculos com outros
mecanismos tendo em vista sua “correção”, ou seja, a conquista de correspondência
objetiva entre o objeto percebido e a imagem construída por ele. O desenvolvimento
da percepção requer, portanto, a formação dos referidos mecanismos-dentre os quais
se destacam os conhecimentos acerca dos objetos (MARTINS, 2015a, p. 137).

Apesar de metade dos gestores não especificar, a soma das demais respostas resulta na
outra metade, dos que indicam que os afastamentos foram por causas psíquicas e
biopsicossociais. Essa informação nos remete as observações de Pessoa Pereira, Viana Santos
e Aguiar Manenti, (2020) que elucidam sobre a educação e os professores percorrerem dias de
obscuridade, tanto na organização do processo de trabalho quanto as políticas, diretrizes,
formações e demais demandas. O período pandêmico apenas desmascarou o que já existia, não
surgiu nada a partir de agora, a dificuldade e fata de acesso à educação de qualidade já estavam
postas mesmo antes de toda essa reestruturação do ensino remoto:
Além dos impactos psicológicos diretamente relacionadas à COVID-19, coexistem
conjuntamente, os abalos biopsicossociais causados pelas medidas preventivas de
207

contenção da pandemia, como por exemplo, os efeitos da quarentena e do isolamento


social, que limitam não somente nossas interações presenciais e relações sociais, como
também, restringem a realização de atividades de lazer e entretenimento, sendo estes,
também considerados como potenciais fatores de risco à saúde mental e bem-estar
emocional (PESSOA PEREIRA, VIANA SANTOS e AGUIAR MANENTI, 2020, p.
30-31).

Em face das constatações sobre as diferentes formas de sofrimento/adoecimento


geradas por causa da pandemia, os pesquisadores ainda salientam que frente as velhas novas
condições de trabalho são preciso discutir as diferentes maneiras de resistir dos professores ao
adoecimento e discutir possibilidades de reconfigurar o trabalho (PESSOA PEREIRA, VIANA
SANTOS; AGUIAR MANENTI, 2020).
Sobre ter conhecimento ou participado de algum projeto para enfrentamento em
situações emergenciais para prevenção ao adoecimento, a maioria dos docentes desconhece a
existência de ações para tal enfrentamento, não teve experiência ou não participou. Quanto às
respostas afirmativas para a questão, não houve a descrição com maiores detalhes, citando
apenas palestras e lives. Para os gestores, questionamos se há programas para prevenção ao
adoecimento. A grande maioria negou a existência.
Essas novas formas de trabalho impostas ao docente devido à pandemia contribuem
para o sofrimento/adoecimento psíquico. Há tempos os sintomas vêm surgindo, e aos poucos
as consequências vão sendo conhecidas, registradas:
Neste seguimento, a literatura acerca da relação entre o meio do trabalho e os impactos
na saúde mental ressaltam que a conjuntura de exploração e precariedade das
condições de trabalho têm resultado em prejuízos preocupantes à saúde de professores
e demais trabalhadores da educação. Assim, é possível notar um indicador ascendente
no processo de adoecimento entre os docentes nas últimas décadas, denotando o
sofrimento mental como uma das formas mais preponderantes deste adoecimento,
ligado às novas condições de trabalho (PESSOA PEREIRA, VIANA SANTOS;
AGUIAR MANENTI, 2020, p. 28).

Por consequência, Hernandes e Rozário (2021) reforçam que a pandemia não permitiu
as pessoas retomarem suas vidas, o medo e a insegurança foram regulares. Diante disso,
circunstancia-se a necessidade de se retomar o trabalho, contudo, o convívio acaba gerando a
ansiedade, e como resultado surge os sinais e sintomas relacionados à saúde mental.
Seja durante ou pós-pandemia, os sentimentos mais diversos tomaram conta do ser
humano, e as consequências dessas sensações - a insegurança do retorno as atividades -
contribuem para o sofrimento/adoecimento psíquico. Os que de alguma forma já sofriam, em
algum momento, o sofrimento se intensificou; os que não, mas que também perpassaram o
período pandêmico, em sua grande maioria, desencadearam algum sofrimento/adoecimento
psíquico.
Por esse motivo, Santos, Silva e Belmonte (2021) salientam a imprescindibilidade de
existir estratégias com o objetivo de reduzir a sobrecarga intelectual, física e social dos
208

professores, além de criar espaços destinados ao compartilhamento de suas angustias, medos e


outros sentimentos.
Ao serem indagados sobre os temas e medidas que consideram importantes para a
prevenção ao adoecimento, tanto os professores quanto os gestores elencaram assuntos
pertinentes à saúde mental: atendimento psicológico, coletivo ou individual, ambientes de
trabalho saudáveis, mais e melhores formações e alguns aspectos relativos às condições de
trabalho e a profissão.
Em meio às diferenças e semelhanças nas respostas das questões em comum estudadas,
tanto professores quanto gestores percebem os mesmos temas para prevenção ao
sofrimento/adoecimento docente. Esse fato leva a crer que há consciência, a percepção dos
riscos que o trabalho docente tem gerado ou podem gerar frente às inúmeras adversidades.
Martins (2015b) esclarece que o ser humano é produto da vida material, das relações, das
condições alienantes, e a falta de consciência atende a uma ordem social, objetiva e prática.
Assim, essa condição afeta a personalidade por atingir os motivos e vivencias subjetivas:
Embora se possa pressupor que numa sociedade não alienada também existam
processos inconscientes, parece razoável supor que os indivíduos não sejam, porém,
dominados por esses processos. Nesse sentido, a alienação gera uma tirania do
inconsciente que só poderá ser superada com o fim das relações sociais que alimentam
esse fenômeno. Assim sendo, para esta inconsciência, a cura individual está longe de
ser a solução, pois, por sua própria natureza, só pode ser superada no âmbito de uma
luta coletiva por transformações sociais (MARTINS, 2015b, p. 101).

O contato com o mundo real e consciente favorece o ser humano a se desenvolver e


formar sua personalidade, fazer suas escolhas, priorizar seus motivos, intervir nas condições de
trabalho, nas relações interpessoais e nas formas de atender às suas necessidades e até mesmo
se instrumentalizar para enfrentar o sofrimento/adoecimento psíquico:
Pelo exposto, vemos que a tomada de consciência dos motivos envolve a
complexidade do funcionamento psicológico, surgindo no nível da personalidade,
acompanhando sua formação e desenvolvimento. A personalidade, por sua vez,
desenvolve-se nas situações de atividade do indivíduo, quando manifestando suas
particularidades este indivíduo estabelece relações com o mundo real.
A infraestrutura da personalidade compreende o conteúdo objetivo da atividade real
do indivíduo concreto, o que ele faz, encerra, portanto, a realidade prática de sua
existência, abarca o sistema de atividades que se constrói temporariamente, isto é, um
sistema cuja substância é o tempo. Se toda existência é existência temporal, o emprego
do tempo revela a base infraestrutral da personalidade desenvolvida.
O conjunto de atividades psicologicamente infraestruturais compreende as atividades
em relação ao trabalho socialmente produtivo, as atividades de relações diretas
consigo mesmo e as atividades de relações interpessoais (MARTINS, 2015b, p. 102).

A consciência e a percepção são aspectos importantes para personalidade do ser


humano, além do mais, contribuem para o reconhecimento e organização de suas emoções, e
motivam a busca pela satisfação e prazer em suas escolhas. A forma de se perceber e tudo ao
seu redor, contribuirá com a organização de seus pensamentos e de sua linguagem, percebe o
mundo e o contexto do qual está inserido, favorece ou não a constante construção de sua
209

personalidade. Essa construção se dá por meio do uso da linguagem falada e abstrata, do


controle de suas emoções, das relações, da sua atividade. Todos esses fatores interferem uns
nos outros e constrói a subjetividade humana.
Não só esse tópico, mas todos os outros nos permitiram esclarecer o quanto o
comprometimento das relações - sejam por causa do afastamento pelas (in)diferenças, ou
mesmo pela necessidade de manter o distanciamento social - e o silenciamento das emoções
podem causar o sofrimento e adoecer o ser humano. Ilustram o quanto as relações interferem
diretamente no comportamento, na percepção, nas emoções, na personalidade e na forma de
desempenhar sua atividade. Ademais, que o ser humano não vive só, necessita de outros seres
humanos, das relações, de ações que promovam a satisfação e o prazer. Não só as condições de
trabalho, tanto as objetivas quanto as subjetivas são importantes elementos para percepção do
todo, mas como nos expressamos frente a todas as adversidades, contradições, incongruências,
insatisfações compõem o dinâmico e extenso campo das relações humanas que acontece no
espaço chamado trabalho pode desencadear o sofrimento/adoecimento psíquico.
210

4. CONSIDERAÇÕES POSSÍVEIS

Analisar as causas que podem gerar o sofrimento/adoecimento psíquico docente foi o


objetivo principal dessa tese. Para tanto, foi necessário um intenso levantamento sobre de como
foi construída a percepção e o cuidado da pessoa com sofrimento mental ao longo dos anos,
além de compreender o sofrimento/adoecimento psíquico sob a luz da Psicologia Histórico-
Cultural, também, apreender sobre a formação e constituição do professor e a importância das
emoções e relações para o enfrentamento, além de realizar uma investigação das produções
científicas sobre o tema a partir dos descritores sofrimento psíquico, adoecimento psíquico,
adoecimento psíquico relacionado ao trabalho docente à luz da PHC e histórico-cultural.
Contudo, como no decorrer de todo o trabalho, aqui também ressaltamos que a partir dos dados
teóricos e empíricos entendemos que nem todo sofrimento gera o adoecimento.
Em relação ao objetivo geral foi possível analisar por meio dos dados coletados que as
condições sociais consequentes da materialidade da sociedade capitalista por meio da maneira
que organiza o trabalho oportunizam a desvalorização e desprestígio do trabalho do professor,
que na grande maioria possuem condições e sobrecarga de trabalho impróprias, além de intensa
responsabilização na pessoa do professor os levando a silenciar suas emoções, suas angustias
por inúmeros motivos, seja por medo, insegurança, fragilidade emocional, descontentamento,
desesperança, entre outros, e comprometer suas relações interpessoais. E diante de todo esse
contexto permanece trabalhando devido a precisão de sobreviver, mesmo negando a atender
suas necessidades subjetivas. Esse processo decorre de uma relação dialética que se inicia da
pluralidade das condições sociais existentes por meio da organização posta por essa sociedade
e atinge a singularidade do ser humano, do professor de forma física e emocional.
Essa conjuntura e a forma de como a sociedade percebe o professor reforçam a
continuidade das péssimas condições de trabalho gerando contradições importantes a serem
analisadas e discutidas, como exemplo, as verificadas nessa pesquisa apresentadas na tabela 12,
que exibe que as mesmas condições que agradam alguns professores, desagradam outros. A
partir desses dados, verificamos mais uma vez a dialética, do plural para o singular, onde mais
de uma condição foi citada como agradável por um grupo e desagradável por outro. Esse fato
constatado ressalta a importância de analisar o ser humano em sua individualidade mesmo
estando em coletividade, pois as percepções, sensações são diferentes, pois a soma das respostas
originara de percepções individuais.
E como se não bastasse as incontáveis condições desfavoráveis que envolvem o
trabalho docente, ainda é imprescindível refletir em situações e condições que podem surgir
frente a cenários súbitos e arrebatadores, como o caso da pandemia do COVID-19, que reforça
211

a nossa tese de que as condições precárias existem e são mascaradas pela sociedade neoliberal
e submetem o professor a modelos de trabalho impiedoso, comprometendo suas relações e
silenciando suas emoções.
O professor se deparou com situações adversas, inesperadas, com a pandemia, que
exigiu o distanciamento social, condições de trabalho nem um pouco adequadas, favorecendo
o surgimento do sofrimento/adoecimento psíquico. A dificuldade em se ter acesso aos recursos
materiais, a limitação no manuseio da tecnologia, a ausência dos alunos, a sobrecarga de
trabalho, o excesso de burocracia e de prazos foram alguns dos agravantes reforçados nesse
processo, e não o bastante, a constatação da desvalorização profissional pelas avaliações e
imposições que não consideraram o sujeito (EU) e o profissional (Professor). Ademais, a
pandemia da COVID-19 escancarou as desigualdades sociais, a precarização da educação e do
trabalho docente. Vale salientar, que essa pesquisa ocorreu em pleno período pandêmico, e
vários dados foram constatados nas respostas dos professores. No eixo que tratou sobre o
trabalho remoto e o adoecimento docente foi nítido a insegurança e a debilidade do trabalho
dos professores da rede pública pesquisada, além da forma como tiveram suas privacidades e
os sentimentos desrespeitados devido o modelo de trabalho imposto. O professor teve clareza
das condições difíceis para o exercício da profissão durante a pandemia, contudo sentiram se
obrigados a cumprir determinações por não obter outra forma de ensinar, mesmo não tendo
condição apropriada para tal.
Outro ponto importante a evidenciar é a quantidade de medicamentos ingeridos pelos
professores para amenizar a dor. Ao serem questionados sobre o tipo de medicação, a segunda
maior frequência estão os medicamentos psicotrópicos. A busca pelo alivio da dor física e
emocional está representado fortemente nesses dados, e corroboram para a tese de que as
condições socais adoecem ao impor uma forma de trabalho geradora de
sofrimento/adoecimento, podendo ser em tempo de pandemia ou não.
No que tange aos objetivos específicos, constatamos que: a) houve os afastamentos
nos últimos 12 meses por motivo de saúde, conforme frequência de 17 respostas, sendo 4 delas
especificamente a COVID-19 o motivo, e 11 não informaram (tabela 19). Entretanto, dados do
Centro de Referência de Saúde do Trabalhador (tabela 52) apontam para 31 atestados de
afastamento no período de 01/01/2020 até 31/12/2021 para CID F; b) Não há ações, programas,
projetos no município de Corumbá MS que visem instrumentalizar os professores para
administrar seus sentimentos, angustias, emoções e não ter prejuízos severos à saúde devido o
sofrimento/adoecimento psíquico. Essa constatação pode ser observada nas tabelas 30, 31 e 44;
c) Verificamos a partir dos dados dos participantes, tanto os professores quanto os gestores são
a maioria do sexo feminino, a faixa etária 41 a 50 anos, estado civil casados e graduados em
212

pedagogia e formados na instituição de ensino superior Universidade Federal de Mato Grosso


do Sul (tabelas 8,9,10,37,38,39).
A partir da Psicologia Histórico-Cultural, o sofrimento/adoecimento psíquico pode ser
compreendido como resultado das relações sociais do sujeito, da atividade alienante, da
repressão de seus sentimentos, das poucas oportunidades que o sujeito tem de se desenvolver e
da carência de acesso à educação, das condições inseguras para exercer sua atividade. Além
disso, como fator preponderante para o desenvolvimento humano, está a linguagem,
considerada a habilidade humana que estabelece e fortalece as relações contribuindo para o
desenvolvimento de todos os outros componentes do psiquismo humano, como as emoções,
sentimentos, consciência, percepção, atenção, memória, sentidos e significados que são
características próprias da espécie humana, e a constituição da personalidade. Fato observado
nas análises a partir da confirmação da percepção das condições insuficientes para exercerem
o trabalho e de como se silenciam e prejudicam suas relações por motivos já elencados
anteriormente.
A personalidade, por sua vez, é formada por meio das relações interpessoais, das
experiências, do conhecimento e da atividade. O trabalho (atividade) do ser humano precisa da
consciência para o seu desempenho. Quando o sentido pessoal rompe com o significado da
atividade, o ser humano passa a desempenhar sua função de forma alienada, vendida, e as
características individuais vão sendo enclausuradas, rompendo com a realidade. As emoções
não alcançam a catarse necessária no e para o gozo da atividade, que colabora para a realização
pessoal, deixa de existir, podendo desencadear o sofrimento/adoecimento psíquico.
O presente trabalho viabilizou conhecer particularidades dos professores do município
de Corumbá MS. Percebemos que a satisfação e o prazer ainda se mantêm interligados, mesmo
diante das inúmeras dificuldades no desempenho das atividades dos docentes. Essa constatação
derivou das declarações dos docentes, de que gostam da profissão e têm satisfação em ensinar.
Mas também, verificamos um certo receio quando solicitado que registrassem por meio dos
questionários de forma explicativas suas respostas sobre condições, atividades, percepções,
emoções ligadas diretamente ao processo de trabalho e suas consequências, poucas foram as
respostas com maior conteúdo explicativo, e essas foram inseridas ao longo do texto para
enriquece-lo, e esse fato dificulta a possibilidade de oportunizar mudanças necessárias e reais.
Entretanto, as respostas das escalas demonstram que o sofrimento/adoecimento permeiam o
contexto do trabalho, como alguns dados da tabela SRQ-20, que valem ser destacados, como
por exemplo, se dorme mal (questão 03), há uma proximidade nas 118 respostas, 49
responderam que sim e 69 não, e sobre sentir se triste ultimamente (questão 09), 54 professores
afirmam que sim e 64 não. Sobre o questionário de estresse nos professores (QSPEBS) a soma
213

de 101 professores aponta para algum grau de estresse, sendo 45 pouco estressado, 39
moderados, 10 bastante e 07 elevados estresse, além da tabela 36 que aponta que a
intensificação, o excesso de trabalho burocrático e administrativo são condições geradoras de
estresse.
Por outro lado, as análises nos permitem afirmar que não há uma ação, projeto,
programa específico de prevenção ou enfrentamento ao sofrimento/adoecimento docente
presentes na rede pública de ensino municipal, conforme tabela 29 que foi solicitado aos
professores que registrassem alguma experiência ou projeto de enfrentamento que conhecessem
ou tenham participado para situações emergenciais de adoecimento, e as importantes
informações das tabelas 30,31,44 corroboram para nossa afirmação.
O estudo possibilitou conhecer a percepção do professor e do gestor em relação ao
sofrimento/adoecimento psíquico, identificou angústias e anseios e a urgência de
implementação e/ou implantação de políticas públicas para instrumentalizar os professores , e
permitiu confirmarmos a tese inicial de que as condições sociais consequentes da materialidade
da sociedade capitalista resultam na desvalorização e falta de prestigio do trabalho docente, nas
condições inadequadas e sobrecarga de trabalho, e portanto propiciam o comprometimento das
relações interpessoais e o silenciamento das emoções dos professores oportunizando o
sofrimento/adoecimento psíquico. Assim, o professor sofre e se não se expressar, falar, expor
suas angústias, sua insatisfação e desprazeres adoece, e o resultado pode levar a sua própria
despersonalização. Ao falarmos, expulsamos o que nos causa dor, o coração e a mente aliviam,
os conteúdos reprimidos passam a ser organizados, e aos poucos a sensação de alivio gera a
sensação de deleito, podendo ser comparado a catarse. A fala e a escuta são terapêuticas.
Assim, admitimos e defendemos que há a necessidade de possibilitar melhoria nos
ambientes, condições e organização de trabalho, para que as relações interpessoais possam ser
mantidas de forma saudáveis, e principalmente que os trabalhadores possam se expressar, sem
calar seus sentimentos, suas emoções e ainda, receberem a atenção adequada para o
enfrentamento ao sofrimento/adoecimento psíquico.
Por fim, e não menos importante, retomamos as explicações quanto as possibilidades
de analisar o sofrimento/adoecimento psíquico pautado na Psicologia Histórico-Cultural. Após
todo o material teórico pesquisado e utilizado nessa tese para introduzir, amparar e pautar as
análises e discussões, primeiramente verificamos que a privação do acesso aos conteúdos
sistematicamente organizados, modificados histórico e culturalmente, carência do
desenvolvimento dos signos e instrumentos, podem desencadear o sofrimento/adoecimento
psíquico por não contribuir para que o ser humano desenvolva habilidades suficientes em lidar
com as dificuldades que permeiam suas diferentes relações, resultando no comprometimento
214

do desenvolvimento de suas funções psicológicas superiores, e também por terem sido


prejudicados quanto a escassez da qualidade no desenvolvimento do pensamento e da
linguagem. Segundo, e como efeito, o ser humano poderá ter consequências nas suas funções
psíquicas superiores, prejuízos em sua personalidade, e dificuldade para enfrentar as
adversidades, reprimir sentimentos e emoções causando o sofrimento/adoecimento psíquico.
Sem se expressar, o trabalhador adoece, trabalha de forma mecanizada e sofre
enquanto tem consciência, percepção da realidade. Pela necessidade da sobrevivência, procura
na farmacologia o alívio para a dor física e psíquica.
Consideramos, no entanto, que não se esgotou aqui a discussão sobre o tema. Ao
contrário, este texto anuncia a pertinência de novas e profundas análises e estudos sobre o
objeto, com o propósito sempre viável de ampliação e divulgação de novos conhecimentos, pois
a partir dos achados nessa pesquisa, se verificou a imprescindibilidade de valorizar o ser
humano e suas emoções mesmo diante a tantas e eficazes tecnologias, pois ainda somos a
principal ferramenta para a humanização.
Como pesquisadores assinalamos nesse trabalho questões acessíveis e fundamentais do
cotidiano que podem ser utilizadas como ferramentas para compor as estratégias e
instrumentalizar os professores a manter a saúde psíquica ou minimizar danos que possam vir
acomete-la, que passam pelas melhores e mais adequadas condições de trabalhos, maior
valorização e respeito com o trabalho docente, ambientes que favorecem o diálogo e a expressão
de sentimentos e emoções e valorização e respeito às relações interpessoais. Nesse caminho,
também desenvolvemos nossa responsabilidade social ao apresentarmos aos professores,
gestores e outros pesquisadores os conhecimentos aprendidos e compreendidos nessa pesquisa,
e que possam colaborar e instigar novas e importantes investigações sobre o tema por apresentar
ampla relevância para sociedade.
215

REFERÊNCIAS

AGUIAR, Maria Aparecida Lapa de. Processos de formação docente: a constituição do “ser”
professor. IX Congresso Nacional de Educação. EDUCERE. III Encontro Sul Brasileiro
de Psicopedagogia. 26 a 29 de outubro de 2009. PUCPR. Disponível em:
https://educere.bruc.com.br/arquivo/pdf2009/2024_1268.pdf. Acesso em 04 de jun de 2021.

ALMEIDA, Melissa Rodrigues. A formação social dos transtornos de humor. 416f. Tese
(Doutorado em Saúde Coletiva). Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho.
Faculdade de Medicina de Botucatu, 2018.

ALVES, Álvaro Marcel. O método materialista histórico dialético: alguns apontamentos sobre
a subjetividade. Revista de Psicologia da UNESP 9(1), 2010. Disponível em:
https://seer.assis.unesp.br/index.php/psicologia/article/view/422/400. Acesso em: 07 de mar. de
2022.

AMARANTE, Paulo. Saúde Mental e Atenção Psicossocial. Rio de Janeiro. Editora Fiocruz,
2007.

AMARANTE, Paulo; NUNES, Mônica de Oliveira. A reforma psiquiátrica no SUS e a luta por
uma sociedade sem manicômios. Ciênc. saúde coletiva [online]. v. 23, n.6, p. 2067-2074, 2018.
Disponível em: https://doi.org/10.1590/1413-81232018236.07082018. Acesso em: 15 de mar.
De 2020.

ARAÚJO, Álvaro Cabral.; NETO, Francisco Lotufo. A Nova Classificação Americana Para os
Transtornos Mentais – o DSM-5. Rev. Bras. de Ter. Comp. Cogn., 2014, v. 15, n. 1, 2016.
Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rbtcc/v16n1/v16n1a07.pdf. Acesso em 23 de abr. de
2021.

ARAÚJO, Sidnei Ferreira.; PURIFICAÇÃO, Marcelo Máximo. SER PROFESSOR:


VOCAÇÃO OU FALTA DE OPÇÃO? Os motivos que envolvem a escassez de jovens na
profissão docente no Brasil. Revista Científica Novas Configurações. Diálogos Plurais, v. 2
n. 1, 2021.

ARAÚJO, Tânia Maria de.; PINHO, Paloma de Sousa.; MASSON, Maria Lucia Vaz. Trabalho
e saúde de professoras e professores no Brasil: reflexões sobre trajetórias das investigações,
avanços e desafios. Cad. Saúde Pública, 2019. Disponível em:
https://pesquisa.bvsalud.org/portal/resource/pt/biblio-1001693. Acesso em 28 de mar. de 2022.

ARAÚJO, Tânia Maria de; GODINHO, Tiana Mascarenhas; REIS, Eduardo J F B dos;
ALMEIDA, Maura Maria G de. Diferenciais de gênero no trabalho docente e repercussões
sobre a saúde. Ciência & Saúde Coletiva, 11(4):1117-1129, 2006. Disponível em:
https://doi.org/10.1590/S1413-81232006000400032. Acesso em: 27 de jan. 2023.

ARBEX, Daniela. Holocausto brasileiro. 1 ed. São Paulo, Geração Editorial, 2013.

ASSUNÇÃO, Ada Ávila.; OLIVEIRA, Dalila Andrade. Intensificação do trabalho e saúde dos
professores. Educ. Soc., Campinas, v. 30, n. 107, p. 349-372, maio/ago. 2009. Disponível em:
http://www.cedes.unicamp.br. Acesso em 18 de jan. de 2022.
216

BAIÃO, Lidiane de Paiva Mariano.; CUNHA, Rodrigo Gontijo. Doenças e/ou disfunções
ocupacionais no meio docente: uma revisão de literatura. Revista Formação@Docente – Belo
Horizonte, vol. 5, n. 1, jan/jun 2013. Disponível em: https://www.metodista.br/revistas/revistas-
izabela/index.php/fdc/article/viewFile/344/338. Acesso em 11 de out. de 2021.

BARROS, Carlos Antonio Ferreira da Silva.; GRADELA, Adriana. Condições de trabalho


docente na rede pública de ensino: os principais fatores determinantes para o afastamento da
atividade docente. Revista de Educação da Universidade Federal do Vale do São Francisco,
Petrolina-PE, v. 7, n. 13, p. 75-87, agosto, 2017. ISSN: 2177-8183. Disponível em:
https://www.periodicos.univasf.edu.br/index.php/revasf/article/view/9. Acesso em 01 de mar. de
2022.

BASAGLIA, Franco Ongaro. Saúde/doença. In: AMARANTE, Paulo. Saúde Mental,


formação e crítica. Rio de Janeiro: Laps, 2015.

BASTOS, Josiane Aparecida Quintão Romero. O mal-estar docente, o adoecimento e as


condições de trabalho no exercício do magistério, no ensino fundamental de Betim MG.
Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-
Graduação em Educação, Belo Horizonte, 2009.

BIZOL, Kátia Maria Fabiani. O Papel do gestor na unidade escolar: desafios e


possibilidades. Instituto Federal Catarinense. Campus Abelardo Luz, Especialização em
Educação: Educação e Prática de ensino, Abelardo Luz, 2018. Disponível em:
http://abelardoluz.ifc.edu.br/wp-content/uploads/2019/02/TC-Katia.pdf. Acesso em 25 de fev. de
2022.

BUENO, Francisco da S. Grande dicionário etimológico-prosódico da língua portuguesa.


São Paulo: Lisa, 1988.

BRAATZ, J. P.; KRAEMER C. A norma, o saber e o poder. X Congresso Nacional de


Educação – EDUCERE. I Seminário de Representações Sociais, Subjetividade e
Educação. SIRSSE. Pontifícia Universidade Católica do Paraná – Curitiba, 2011.
https://educere.bruc.com.br/CD2011/pdf/5197_2725.pdf. Acesso em 15 de mar. de 2020.

BRANDAU, Ricardo.; MONTEIRO Rosangela; BRAILE Domingo M. Importância do uso


correto dos descritores nos artigos científicos. Rev Bras Cir Cardiovasc, v. 20, n. 1, 2005.
Disponível em:
https://www.scielo.br/j/rbccv/a/YjJ9Hw34dfDTJNcTKMFnKVC/?format=pdf&lang=pt. Acesso em 27
de ago. de 2021.

BRASIL. Reforma Psiquiátrica e política de Saúde Mental no Brasil. Brasília, novembro


de 2005. Disponível em:
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/Relatorio15_anos_Caracas.pdf. Acesso em 16 de mar.
de 2020.

BERNARDES, Maria Eliza Mattosinho. O método de investigação na psicologia histórico-


cultural e a pesquisa sobre o psiquismo humano. Rev. psicol. polít. [online], v. 10, n. 20, p.
297-313, 2010. ISSN 2175-1390. Disponível em:
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?pid=S1519-549X2010000200009&script=sci_abstract. Acesso
em 27 de ago. de 2021.
217

BERNARDES, Maria Eliza Mattosinho. O método na teoria histórico-cultural: a pesquisa sobre


a relação indivíduo-generecidade na educação. In: MENDONÇA, Sueli Guadelupe de Lima,
PENITENTE, Luciana Aparecida Araújo, MILLER Stela (organizadores). A Questão do
método e a teoria histórico-cultural: bases teóricas e implicações pedagógicas. Marília:
Oficina Universitária; São Paulo: Cultura Acadêmica, 2017.

BENDASSOLLI, Pedro F.; GONDIM, Sonia Maria Guedes. Significados, sentidos e função
psicológica do trabalho: Discutindo essa tríade conceitual e seus desafios metodológicos.
Avances en Psicología Latinoamericana. Bogotá (Colômbia). v. 32, n. 1, p.131-147. 2014.
ISSNe2145-4515. Disponível em: http://www.scielo.org.co/pdf/apl/v32n1/v32n1a10.pdf.
Acesso em 05 de out de 2021.

CALEJON, Laura Marisa Carnielo.; BRITO, Alan de Santana. Entre a pandemia e o


pandemônio: uma reflexão no campo da educação. Revista EDUCAmazônia - Educação
Sociedade e Meio Ambiente, Humaitá, v. 25, n. 2, jul-dez, 2020. Disponível em:
https://periodicos.ufam.edu.br/index.php/educamazonia/article/view/7835. Acesso 11 de mar. de
2022.

CANGUILHEM, Georges. O normal e o patológico. 6. Ed. Rio de Janeiro, Editora Forense


Universitária, 2009.

CANTARELLI, Adriana Gonzaga.; FACCI, Marilda Gonçalves Dias.; CAMPOS Herculano


Ricardo. Trabalho docente e personalidade: alienação e adoecimento. In: FACCI, Marilda
Gonçalves Dias.; URT, Sonia da Cunha. Precarização do trabalho, adoecimento e
sofrimento do professor (Orgs). EDUFPI, Teresina, 2017.

CARLOTTO, Mary Sandra.; CÂMARA, Sheila Gonçalves.; BATISTA, Jaqueline Vidal.


SCHNEIDER, Gabriela Azeredo. Prevalência de Afastamentos por Transtornos Mentais e do
Comportamento Relacionados ao Trabalho em Professores. PSI UNISC, Santa Cruz do Sul, v.
3, n. 1, jan./jun. 2019. Disponível em: https://doi.org/10.17058/psiunisc.v3i1.12464. Acesso em
01 de mar. de 2022.

CARNEIRO, Berenice Victor.; YOSHIDA, Elisa Medici Pizão. Alexitimia: Uma Revisão do
Conceito. Psicologia: Teoria e Pesquisa, v. 25 n. 1, 2009. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/ptp/a/WxJrZhZ9Nn78jyQqJD5ZyKp/?lang=pt&format=pdf. Acesso
em 12 de jul. de 2021.

CARVALHAL, Tito Loiola.; OLIVEIRA, Elaine Cristina de.; RIBEIRO, Maria Izabel Souza
Políticas de morte nas educações instituídas e contágios insurgentes em contextos pandêmicos.
In: INSFRAN, Fernanda Fochi Nogueira et al. (Orgs). Fraturas expostas pela pandemia:
escritos e experiências em educação. Encontrografia, Campos dos Goytacazes (RJ), 2020.

CASTRO, Karina Rocha Rosa de. Formação continuada de professores em tempos de


pandemia: empoderamento, resistência e possibilidades. In: INSFRAN, Fernanda Fochi
Nogueira et al. (Orgs). Fraturas expostas pela pandemia: escritos e experiências em
educação. Encontrografia, Campos dos Goytacazes (RJ), 2020.

CASTRO, Vanessa Mariano de. Trabalho e saúde: estudo sobre o adoecimento docente. Temas
em Educação e Saúde, Araraquara, v. 16, n. 1, p. 62–83, 2020. Disponível em: DOI:
10.26673/tes. v16i1.13489. Disponível em:
https://periodicos.fclar.unesp.br/tes/article/view/13489. Acesso em: 27 ago. 2021.
218

CEDRO. Wellinton Lima.; NASCIMENTO, Carolina Picchetti. Dos métodos e das


metodologias em pesquisas educacionais na teoria histórico cultural. In: MOURA, Manoel
Oriosvaldo de (organizador). Educação escolar e pesquisa na teoria histórico cultural.
Edição Loyola, São Paulo, 2017. ISBN 978-85-15-04452-8.

CERVO, A. L.; BERVIAN, P. A. Metodologia científica. São Paulo: Prentice Hall, 2002.

CICARELLO JUNIOR, Ivan Carlos.; CAMARGO, Denise de Tempo histórico: um importante


conceito para compreender a concepção Vygotskiana de desenvolvimento humano. In: DIAS,
Maria Sara de Lima (Org.) Introdução às leituras de Lev Vygotski: debates e atualidades
na pesquisa [recurso eletrônico]. Porto Alegre, RS: Editora Fi, 2019. 326 p. ISBN -978-85-
5696-645-2.

CODO, Wanderley. Por uma psicologia do trabalho: ensaios recolhidos [organizador];


Conselho Editorial Roberto Cruz, Marco Antonio Tadeschi, João Carlos Alchieri, Maria Helena
Hoffmann – São Paulo: Casa do Psicólogo, 2006.

COELHO, Elenise Abreu.; SILVA, Ana Claudia Pinto da.; PELLEGRINI, Tais Barcellos de.;
PATIAS, Naiana Dapieve. Saúde mental docente e intervenções da Psicologia durante a
pandemia. PSI UNISC, v. 5, n. 2, p. 20-32, 10 jul. 2021. Disponível em:
https://doi.org/10.17058/psiunisc.v5i2.16458. Acesso em 06 de jun de 2022.

CONSELHO NACIONAL DE SECRETÁRIOS DE SAÚDE. Vigilância em saúde. Brasília:


CONASS. 2011.

CONEP – Comissão Nacional de Ética em Pesquisa. Brasília, 24 de fevereiro de 2021.


Disponível em: https://mail-
attachment.googleusercontent.com/attachment/u/1/?ui=2&ik=4008041c6d&attid=0.2&permmsgid=
msg-f:16926885449… acesso em 01 de set. de 2021.

CRUZ, Roberto Moraes.; LEMOS, Jadir Camargo. Atividade docente, condições de trabalho e
processos de saúde. Motrivivência. Ano XVII, Nº 24, P. 59-80 2005. Disponível em:
https://doi.org/10.5007/%25x. Acesso em 16 de fev. de 2022.

DAGHER, Thalita Ortiz Neves. Trabalho docente e expressões do sofrimento psíquico: uma
análise a partir da psicologia histórico-cultural. Dissertação (Mestrado em Psicologia) UFMS-
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Campo Grande, p.184, 2019.

DAMASCENO, L. M. et al. Potencialidades e limitações da coleta de dados através de Pesquisa


online. XVII SEMEAD. Anais..., 2014. Seminários em Administração. outubro de 2014.
Disponível em: <http://sistema.semead.com.br/17semead/resultado/ trabalhosPDF/1099.pdf.>.
Acesso em: 9/7/2021.

DANTAS, Andrezza Aleixandre.; HENRIQUES, Fabiana Regina. Relacionamento


interpessoal no ambiente de trabalho. Revista Científica Integrada. v. 4, n. 5, 2020. Disponível
em: https://www.unaerp.br/revista-cientifica-integrada/edicoes-anteriores/volume-4-edicao-
5/4171-rci-relacionamento-interpessoal-122020/file. Acesso em 28 de set. de 2022.

DELARI Jr., Achilles. Personalidade e sofrimento psíquico: compilação de citações com


breves comentários. In: “Estação Mir” Arquivos digitais, 2017. 22 p. Disponível em:
http://www.estmir.net/delari_2017_sfr-psi-cmp-pdf. Acesso em 20 de abr. de 2021.
219

DELFINO Francisco Claudenio dos Santos.; SILVA Sara de Castro.; TEIXEIRA, Rejane Maria
Lacerda.; et al.. O trabalho docente no cenário da pandemia: relato de experiência sobre as
práticas pedagógicas no ensino remoto. Revista Eletrônica arma da crítica n.14, dezembro/
2020 ISSN 1984-4735. Disponível em:
http://www.armadacritica.ufc.br/phocadownload/10%20o%20trabalho%20docente%20no%20cenri
o%20da%20pandemia.docx.pdf. Acesso em: 14 de out. de 2021.

DEL’OLMO, Florisbal de Souza.; CERVI, Taciana Marconatto Damo. Sofrimento Mental e


Dignidade da Pessoa Humana: os desafios da reforma psiquiátrica no Brasil. Sequência
(Florianópolis), n. 77, p. 197-220, nov. 2017. Disponível em:
https://doi.org/10.5007/2177-7055.2017v38n77p197. Acesso em: 26. de abr. de 2021.

DIAS, Marina Abreu.; NASCIMENTO, Ruben de Oliveira. Autoestima do professor,


satisfação/insatisfação profissional e valorização/desvalorização docente: caracterização e
correlações. Perspectivas em diálogo: Revista de Educação e Sociedade – ISSN 358-1840.
2020. Disponível em: https://periodicos.ufms.br/index.php/persdia/index. Acesso em: 06 de dez.
de 2021.

DIAS, Alcione Ribeiro. Adoecimento docente no ensino superior na perspectiva da


Psicologia Histórico-cultural. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal de Mato Grosso
do Sul. Faculdade de Educação. Programa de Pós-Graduação em Educação. Campo Grande,
2021. p. 402.

DUARTE, Adriana Maria Cancella et al. Trabalho docente em tempos de pandemia –


relatório técnico. GESTRADO/UFMG, 2020. Disponível em: http://abet-
trabalho.org.br/relatorio-tecnico-trabalho-docente-em-tempos-de-pandemia/. Acesso em: 05 de
out. de 2020.

ESPER, Marina Beatriz Shima Barroco. Sofrimento/Adoecimento do Professor


Universitário e Relações de Trabalho: estudo a partir da psicologia histórico-cultural.
Dissertação. (Mestrado em Psicologia). Universidade Estadual de Maringá. Maringá. P. 152,
2019.

ESCARABOTO, Kellen M. Sobre a importância de conhecer e ensinar. PSICOL. USP, São


Paulo, out./dez. 2007, 18(4), 133-146. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0103-
65642007000400009. Acesso 08 de out. de 2021.

FACCI, Marilda Gonçalves.; LEONARDO, Nilza Sanches Tessaro.; SILVA, Rosane Gumiero
Dias da. O Trabalho e a formação do professor nos anais da Anped: uma análise a partir da
psicologia histórico-cultural. Intermeio: revista do Programa de Pós-Graduação em
Educação, Campo Grande, MS, v. 16, n. 31, p. 216-237, jan./jun.2010. Disponível em:
https://periodicos.ufms.br/index.php/intm/article/view/2451. Acesso em: 16 de jun. de 2021.

FACCI, Marilda Gonçalves Dias. O adoecimento do professor frente à violência na escola.


Fractal: Revista de Psicologia, v. 31, n. 2, p. 130-142, maio-ago. 2019. Disponível em:
https://doi.org/10.22409/1984-0292/v31i2/5647. Acesso em 26 de jul. de 2021.

FACCI, Marilda Gonçalves.; LEONARDO, Nilza Sanches Tessaro.; ALVES, Eloisa Rocha de
Sousa. Retrato do adoecimento e da medicalização de docentes no ensino superior: algumas
reflexões. In: INSFRAN, Fernanda Fochi Nogueira et al. (Orgs). Fraturas expostas pela
pandemia: escritos e experiências em educação. Encontrografia, Campos dos Goytacazes (RJ),
p. 320, 2020a.
220

FACCI, Marilda Gonçalves Dias.; CRISPIN, Crisleine da Silva. Significado social, sentido
pessoal e readaptação docente: reflexões à luz da psicologia histórico-cultural. In: FACCI,
Marilda Gonçalves Dias.; URT, Sonia da Cunha. Quando os professores adoecem [recurso
eletrônico]: demandas para a psicologia e a educação. Campo Grande, MS: Ed. UFMS, 2020b.

FACCI, Marilda Gonçalves Dias.; URT, Sonia da Cunha.; & BARROS, Ana Teresa Fernandes.
Professor readaptado: a precarização do trabalho docente e o adoecimento. Psicologia Escolar
e Educacional, v. 22, n. 2, maio/agosto de 2018e: 281-290. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/pee/a/Fp3LN9tv4Ym9QfpV8dfGyLS/abstract/?lang=pt. Acesso em ago de
2021.

FACCI, Marilda Gonçalves Dias.; MEZZARI, Diana Priscilla de Souza.; TESSARO, Nilza
Sanches Leonardo.; URT, Sônia da Cunha. Uso de medicamentos ou medicalização dos
professores? Uma discussão sobre as relações de trabalho e adoecimento. In: FACCI, Marilda
Gonçalves Dias.; URT, Sonia da Cunha. Precarização do trabalho, adoecimento e
sofrimento do professor (Orgs). EDUFPI, Teresina, p. 236, 2017.

FACCI, Marilda Gonçalves Dias.; ESPER, Marina Beatriz Shima Barroco. Adoecimento e
medicalização de professores universitários frente a precarização e intensificação do trabalho.
Movimento-Revista de Educação, Niterói, ano 7, n. 15, p. 50-78, set./dez., 2020c. Disponível
em: https://doi.org/10.22409/mov.v7i15.42453. Acesso em 13 de out. de 2021.

FERNANDES, Letícia Brito da Mota. O adoecimento psíquico (in)visível docente: uma


perspectiva da psicologia histórico-cultural. Dissertação (Mestrado em Psicologia) UFMS-
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Campo Grande, p.176, 2019.

FIORE, Mariana. O professor está doente? Refletindo sobre a dimensão política do sofrimento
docente. Anais XV ENABRAPSO, 2009. (online) Disponível em:
http://www.abrapso.org.br/siteprincipal/images/Anais_XVENABRAPSO/328.%20o%20professor%20e
st%C1%20doente.pdf. Acesso em 13 de out. de 2021.

FILHO Irineu A. Tuim Viotto. Psicologia histórico-cultural: contribuições para a ação do


educador numa escola em transformação. Revista em Educere at Educare. v. 2, n. 3, jan./jun.
2007 p. 49-68. Disponível em: http://e-
revista.unioeste.br/index.php/educereeteducare/article/view/654/546. Acesso em 18 de jun. de
2020.

FREIRE, Luís. Alexitimia: Dificuldade de Expressão ou Ausência de Sentimento? Uma Análise


Teórica. Psicologia: Teoria e Pesquisa, v. 26, n. 1, p. 15-24, Jan-Mar 2010. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/ptp/a/hYtYQV8tvhSbsfPNxKB3qDk/?lang=pt&format=pdf. Acesso em 12 de
jul. de 2021.

FREIRE, Silvia Segovia Araujo.; RODRIGUES, Adaline Franco.; URT, Sonia da Cunha. A
(des) empatia emergida e denunciada em tempos de pandemia: os dissabores vivenciados pelo
professor. XV ANPED. CO. Encontro de Pesquisa em Educação da Região Centro Oeste.
ISSN 25957945. Disponível em: https://www.anped.org.br/reunioes-cientificas/regional. Acesso
em 10 de jan. de 2022.

FREITAS, Claudia Regina.; CRUZ, Roberto Moraes. Saúde e trabalho docente. XXVIII
Encontro Nacional de Engenharia de Produção. A integração de cadeias produtivas com
a abordagem da manufatura sustentável. Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 13 a 16 de outubro de
221

2008. Disponível em:


http://www.abepro.org.br/biblioteca/enegep2008_TN_STO_072_509_10776.pdf. Acesso em 17 de
jan. de 2022.

FREITAS, Ana. Célia Sousa.; ALMEIDA, Nadja. Rinelle Oliveira de.; FONTENELE, Inambê.
Sales. Fazer docente em tempos de ensino remoto. Ensino em Perspectivas, [S. l.], v. 2, n. 3,
p. 1–11, 2021. Disponível em:
https://revistas.uece.br/index.php/ensinoemperspectivas/article/view/6068. Acesso em: 1 mar.
2022.

FONSECA, Fabiana de Cássia Almeida et al. A influência de fatores emocionais sobre a


hipertensão arterial. J Bras Psiquiatr. 58(2): 128-134, 2009. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/jbpsiq/a/CKrxBnS4hMw3dztH9mdjJpJ/?format=pdf&lang=pt. Acesso em 11
de out. de 2021.

FOUCAULT, Michel. Doença Mental e Psicologia. Edições Tempo Brasileiro LTDA. Rio de
Janeiro, Brasil, 1975.

FUNGHETTO, Suzana Schwerz.; NETTO, Regina Cláudía Coelho. Ser Professor: formação e
subjetividade. Revista Universitas FACE. v. 2, n. 1, 2005. Disponível:
https://www.publicacoesacademicas.uniceub.br/face/issue/view/72. Acesso em: 8 de out. de 2021.

GASPARINI, Sandra Maria.; BARRETO, Sandhi Maria.; ASSUNÇÃO, Ada Ávila. O


professor, as condições de trabalho e os efeitos sobre sua saúde. Educação e Pesquisa, São
Paulo, v. 31, n. 2, p. 189-199, maio/ago. 2005a. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/ep/a/GdZKH9CHs99Qd3vzY5zfmnw/?lang=pt&format=pdf. Acesso em 06
de out de 2021.

GASPARINI, Sandra Maria.; BARRETO, Sandhi Maria.; ASSUNÇÃO, Ada Ávila.


Prevalência de transtornos mentais comuns em professores da rede municipal de Belo
Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Cad. Saúde Pública. 22 (12), 2006b. Disponível em:
https://doi.org/10.1590/S0102-311X2006001200017. Acesso em 01 de mar. de 2022.

GATTI, Bernadete A. Reconhecimento social e as políticas de carreira na educação básica.


Cadernos de Pesquisa, São Paulo, v. 42, n. 145, p. 88-111, jan./abr. 2012. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/cp/a/TBZ9snxf4ZCYGfkrzDv43Zz/?format=pdf&lang=pt. Acesso em 17 de
fev. de 2022.

GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. São Paulo: Atlas, 1999.

GOMES, Valdete Aparecida Fernandes Moutinho.; NUNES, Célia Maria Fernandes.; PÁDUA,
Karla Cunha. Condições de trabalho e valorização docente: um diálogo com professoras do
ensino fundamental. Rev. bras. Estud. pedagog., Brasília, v. 100, n. 255, p. 277-296,
maio/ago. 2019. Disponível em: http://dx.doi.org/10.24109/2176-6681.rbep.100i255.4146.
Acesso em 16 de fev. 2022.

GONÇALVES, Peres, Josiane. O perfil profissional e representações de bem-estar docente


e gênero em homens que tiveram carreiras bem-sucedidas no magistério. Tese
(Doutorado). Porto Alegre, RS: PUC-RS, 2009.

GOTTMAN, John.; De CLAIRE, Joan. Inteligência emocional. 7ª edição. Editora: Objetiva.


Rio de Janeiro, 1997.
222

GOUVÊA, Leda Aparecida Vanelli Nabuco de. As condições de trabalho e o adoecimento de


professores na agenda de uma entidade sindical. Saúde Debate. Rio de Janeiro, v. 40, n. 111,
p. 206-219, out-dez, 2016. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/sdeb/a/csTLDPyFBWXLBtCnSn6R8qp/?format=pdf&lang=pt. Acesso em 17
de jan. 2022.

GOULART. Daniel Magalhães. Saúde Mental. Desenvolvimento e subjetividade: da


patologização à ética do sujeito. São Paulo: Cortez, 2019.

GUIMARÃES. Thaís de Andrade Alves.; ROSA, Lucia Cristina dos Santos. A


remanicomialização do cuidado em saúde mental no Brasil no período de 2010-2019: análise
de uma conjuntura antirreformista. O Social em Questão, v. 22, n. 44, maio-ago, 2019. ISSN:
2238-9091 (Online). Disponível em: http://osocialemquestao.ser.puc-
rio.br/media/OSQ_44_art5.pdf. Acesso em: 13 de mar. de 2021.

GOVERNO DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL. Secretaria de Estado de Meio


Ambiente e Desenvolvimento Econômico. Estudo da Dimensão Territorial do Estado de
Mato Grosso do Sul: Regiões de Planejamento. Grande Campo Janeiro de 2015. Disponível
em: http://www.semagro.ms.gov.br/wp-
content/uploads/2017/06/estudo_dimensao_territorial_2015.pdf. Acesso em 30 de mar. de 2020.

HASHIZUME, Cristina Miyuki. O trabalho docente na rede estadual e impactos na docência:


ensaio a partir de experiências de campo no estado de São Paulo. In: FACCI, Marilda Gonçalves
Dias.; URT, Sonia da Cunha. Quando os professores adoecem [recurso eletrônico]: demandas
para a psicologia e a educação. Campo Grande, MS: Ed. UFMS, 2020.

HEINSFELD, Bruna Damiana.; PINTO, Breno Laerte Pacífico. “A vida não pode parar”:
desafios da população periférica no desenvolvimento de comunidades remotas de ensino-
aprendizagem. In: INSFRAN, Fernanda Fochi Nogueira et al. (Orgs). Fraturas expostas pela
pandemia: escritos e experiências em educação. Encontrografia, Campos dos Goytacazes (RJ),
p. 320, 2020.

HERNANDES, Linccon Fricks.; ROZÁRIO, Jefferson Diório do. Tempos de pandemia e


educação: um olhar para a saúde mental dos professores universitários. Pensar Acadêmico,
Manhuaçu, v. 19, n. 5, p. 1359-1368, 2021. ISSN on-line 2674-7499. Disponível em:
https://doi.org/10.21576/pa.2021v19i5.3070. Acesso em 02 de mar. de 2022.

HIRDES, Alice. A Reforma Psiquiátrica no Brasil: uma (re) visão. Ciências & Saúde Coletiva.
14 (1) 297-305, 2009. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/csc/v14n1/a36v14n1.pdf.
Acesso em: 15 de mar. de 2020.

JACKSON FILHO, José. Marçal. et al. A saúde do trabalhador e o enfrentamento da COVID-


19. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional. ISSN: 2317-6369 (online). Disponível em:
https://doi.org/10.1590/2317-6369ED0000120. Acesso em: 20 de jul. de 2020.

LADEIRA, Thalles Azevedo. Vida e morte na pandemia: não sairemos da mesma forma que
entramos. In: INSFRAN, Fernanda Fochi Nogueira et al. (Orgs). Fraturas expostas pela
pandemia: escritos e experiências em educação. Encontrografia, Campos dos Goytacazes
(RJ), p. 320, 2020.
223

LAPO, Flavinês; REBOLO.; BUENO, Belmira Oliveira. Professores, desencanto com a


profissão e abandono do magistério. Cadernos de Pesquisa, n. 118, março/ 2003. Disponível
em: https://www.scielo.br/j/cp/a/yYkBtnYbQ5SXvYrypXvswzh/?lang=pt&format=pdf. Acesso em 15
de jun. de 2021.

LEÃO, Inara Barbosa et al. Implicações Psicossociais do Desemprego para a Consciência


Individual: Manifestações no Pensamento e Emoção. Pesquisas e Práticas Psicossociais, v. 1,
n. 2, São João del-Rei, dez. 2006. Disponível em: https://www.ufsj.edu.br/portal2-
repositorio/File/revistalapip/InaraLeao.pdf. Acesso em 14 de julho de 2021.

LEÃO, Inara Barbosa. Professores universitários são felizes quando o poder político permite
que se emocionem. In: FACCI, Marilda Gonçalves Dias.; URT, Sonia da Cunha. Quando os
professores adoecem [recurso eletrônico]: demandas para a psicologia e a educação. Campo
Grande, MS: Ed. UFMS, 2020.

LEITE, Hilusca Alves.; SILVA Renata da.; TULESKI, Silvana Calvo. A emoção como função
superior. Interfaces da Educ., Paranaíba, v. 3, n. 7, p.37-48, 2013. ISSN2177-7691.
file:///C:/Users/55679/Downloads/570-806-1-PB.pdf. Acesso em 12 de jul. de 2021.

LEITE, Carla Alessandra Ruiz.; LEITE, Elaine Campos Ruiz.; PRANDI, Luiz Roberto. A
aprendizagem na concepção histórico cultural. Akrópolis Umuarama, v. 17, n. 4, p. 203- 210,
out./dez. 2009. Disponível em:
https://revistas.unipar.br/index.php/akropolis/article/viewFile/2900/2135. Acesso em 16 de fev. de
2022.

LEONTIEV, Aleksei N. Atividade Consciência Personalidade. Tradução de Priscila


Marques. Bauru, SP: Mireveja, 2021, p. 256.

LINHARES, Renata.; FACCI Marilda Gonçalves Dias. O desenvolvimento das funções


psíquicas superiores: rompendo com a dicotomia entre o natural e o histórico-cultural. In:
FIRBIDA, Fabiola Gomes Batista; FACCI, Marilda Gomes Dias; BARROCO, Sonia Mari
Shima (Orgs.). O desenvolvimento das funções psicológicas superiores na psicologia
histórico-cultural: contribuições à psicologia e à educação. ISBN: 978-65-86678-97-0. DOI:
10.29388/978-65-86678-97-0. Uberlândia: Navegando Publicações, 2021.

LURIA, Alexander Romanovich. O Cérebro Humano e a Atividade Consciente. In: Vigotski,


Lev. Semenovich. Linguagem, Desenvolvimento e Aprendizagem. 11ª edição - São Paulo:
ícone, 2010.

MACHADO, Letícia Vier.; FACCI Marilda Gonçalves Dias.; BARROCO, Sonia Mari Shima
Teoria das emoções em Vigotski Psicol. estud. v. 16, n. 4, oct./dec. 2011.
https://doi.org/10.1590/S1413-73722011000400015. Acesso em 02 de set. de 2020.

MARINO FILHO, Armando. Atividade, significação e sentido: bases do sofrimento


psicológico e a especificidade do adoecimento do professor. In: FACCI, Marilda Gonçalves
Dias.; URT, Sonia da Cunha. Quando os professores adoecem [recurso eletrônico]:
demandas para a psicologia e a educação. Campo Grande, MS: Ed. UFMS, 2020.

MARQUES, R. M.; ASSIS, N. P. de.; GOMIDE, U. de S. Educação em tempos de pandemia e


crise do capital. Trabalho &amp; Educação, [S. l.], v. 29, n. 1, p. 7–13, 2020. Disponível em:
https://periodicos.ufmg.br/index.php/trabedu/article/view/20987. Acesso em: 18 ago. 2021.
224

MARTINEZ, Maria Carmen. As relações entre a satisfação com aspectos psicossociais no


trabalho e a saúde do trabalhador. 2002. Dissertação (Mestrado em Saúde Ambiental) -
Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2002.
doi:10.11606/D.6.2002.tde-07112006-210400. Acesso em: 06 de jun. de 2022.

MARTINS, Lígia Márcia. O desenvolvimento do psiquismo e a educação escolar:


contribuições à luz da psicologia histórico-cultural e da pedagogia histórico-critica. Campinas,
SP: Autores Associados, 2015a.

MARTINS, Lígia Márcia. A Natureza Histórico-Social da Personalidade. Cad. Cedes,


Campinas, v. 24, n. 62, p. 82-99, abril, 2004. Disponível em: http://www.cedes.unicamp.br.
Acesso em 04 de mar. de 2021.

MARTINS, Lígia Márcia. A constituição histórico-social da subjetividade humana:


contribuições para a formação de professores. In: MILLER, Stela; BARBOSA, Maria Valéria;
MENDONÇA, Sueli Guadalupe de Lima (orgs). Educação e Humanização: as perspectivas
da teoria histórico-cultural. Jundaí. Paco Editorial: 2014.

MARTINS, Lígia Márcia. A formação social da personalidade do professor: um enfoque


vigotskiano. 2 ed. Campinas, SP: Autores Associados, 2015b.

MARTINS, Lígia Márcia. Psicologia sócio histórica: o fazer científico. In: ABRANTES, A.A.;
SILVA, N.R.; MARTINS, L. M. (Org.). Método histórico social na psicologia social.
Petrópolis, RJ: Vozes, 2005. p.118-138.
MEDEIROS, Jucélia Linhares Granemann de; AZEVEDO, Renan Ramires de. Educação de
pessoas com deficiências frente à pandemia. Humanidades & Inovação, v. 9, n. 5, p. 303-308,
2022.
MELO Pamella Beserra de.; BRITO, Mariana Aguiar Alcântara.; AQUINO, Cássio Adriano
Braz. Et al. Contribuições da psicologia histórico-cultural para o poder de agir do
trabalhador. Revista De Psicologia, 9(2), 96-106, 2018. Recuperado de
http://www.periodicos.ufc.br/psicologiaufc/article/view/19296. Acesso em 27 de ago. de 2021.

MELLO, Elisângela de Fátima Fernandes de.; TEIXEIRA, Adriano Canabarro. A interação


social descrita por Vigotski e a sua possível ligação com a aprendizagem colaborativa através
das tecnologias de rede. IX ANPED SUL. Seminário de Pesquisa em Educação da região
Sul. Disponível em:
http://www.ucs.br/etc/conferencias/index.php/anpedsul/9anpedsul/paper/viewFile/6/871. Acesso
em 04 de out. de 2021.
MENDONÇA, Sueli Guadelupe de Lima.; PENITENTE, Luciana Aparecida Araújo.; MILLER
Stela (organizadores). A Questão do método e a teoria histórico-cultural: bases teóricas e
implicações pedagógicas. Marília: Oficina Universitária; São Paulo: Cultura Acadêmica, p.
170, 2017.
MESQUITA, Afonso Mancuso de.; BATISTA, Jéssica Bispo.; SILVA, Márcio Magalhães da.
O desenvolvimento de emoções e sentimentos e a formação de valores. Obutchénie: R. de
Didat. e Psic. Pedag. Uberlândia, MG, v. 3, n. 3, p. 1-25, set./dez. 2019. ISSN: 2526-7647.
Disponível em: https://doi.org/10.14393/OBv3n3.a2019-51695. Acesso em 20 de set. de 2021.
225

MORAIS, Joelson de Sousa. Ser professor/a iniciante diante das políticas curriculares atuais.
Revista Teias v. 20, n. 57, abr./jun. 2019. Pesquisa em Educação em múltiplos contextos.
Disponível em: doi.org/10.12957/teias.2019.38584. Acesso em: 11 de out. de 2021.
MORIN Estelle. M. Os sentidos do trabalho. RAE - Revista de Administração de Empresas,
São Paulo, v. 41 n. 3 p. 8-19, 2001. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/rae/v41n3/v41n3a02. Acesso em: 06 de jun. de 2022.

MOREIRA, Daniela Zanoni; RODRIGUES, Maria Beatriz. Saúde mental e trabalho docente.
Estudos de Psicologia, 23(3), julho a setembro de 2018, p. 236-247. Disponível em:
http://dx.doi.org/10.22491/1678-4669.20180023. Acesso em 16 de jan. de 2022.

MORETTI, Vanessa Dias.; MOURA, Manoel Oriosvaldo. A formação docente na perspectiva


histórico-cultural: em busca da superação da competência individual. Psicologia Política, v.
10, n. 20, p. 345-361, jul. – dez. 2010. Acesso em 04 de jun. de 2021.
MORETTINI, Marly Teixeira.; URT, Sonia da Cunha. A Psicologia e os desafios da prática
educativa. In: MORETTINI, Marly Teixeira e URT, Sonia da Cunha. Um estudo sobre a
escola e o professor na ótica da psicologia histórico-cultural. Campo Grande, MS: Ed.
UFMS, 2005.
MOTA, Rosália Monteiro. O trabalho docente: impactos e desafios frente ao cenário
educacional atual. Ponto-e-vírgula, v. 11, p. 22-37, 2012. Disponível em:
file:///C:/Users/55679/Downloads/13878-Texto%20do%20Artigo-33479-1-10-20130314%20(2).pdf.
Acesso em 08 de out. de 2021.
NETA, Abília Ana de Castro.; CARDOSO Berta Leni Costa.; NUNES, Claudio Pinto. O
adoecimento docente: um produto do capitalismo. LES – Linguagem, Educação, Sociedade.
Teresina, v. 25, n. 46, set./dez. 2020. ISSN 2526-8449 (Eletrônico) 1518-0743 (Impresso)
https://revistas.ufpi.br/index.php/lingedusoc/article/view/11083/pdf. Acesso em: 19 de julho de
2021.
NETO, Hélio da Silva Messeder.; PIRES, Izadora dos Santos. Ensino (para o controle) remoto:
quase um episódio de Black Mirror. In: INSFRAN, Fernanda Fochi Nogueira et al. (Orgs).
Fraturas expostas pela pandemia: escritos e experiências em educação. Encontrografia,
Campos dos Goytacazes (RJ), p. 320, 2020.
NÓVOA, Antônio. Profissão: Professor. Reflexões Históricas e Sociológicas. Análise
Psicológica (1989), 1-2-3 (VII): 435-456. Disponível em:
https://core.ac.uk/download/pdf/80521177.pdf. Acesso em 04 de jun. de 2021.

NÓVOA, Antônio. Profissão Professor. Porto Editora, 2ª edição, 2003.

NÓVOA, Antônio. Professores Imagens do futuro presente. EDUCA. Lisboa, 2009.

OLIVEIRA, Betty. A dialética do singular-particular-universal. In: ABRANTES, A. A.;


RENILDES, N. S.; MARTINS, S. T. F. Método histórico-social na psicologia social.
Petrópolis: Vozes, 2005.

OLIVEIRA, Erik Cunha de.; SANTOS, Vera Maria dos. Adoecimento mental em professores
brasileiros. ANAIS do SIMEDUC. 10º Simpósio Internacional de Educação e Comunicação.
24 a 26 de março de 2021. ISSN: 2179-4901. Disponível em:
https://eventos.set.edu.br/simeduc/article/view/14868. Acesso em: 16 de fev. de 2022.
226

ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO (OIT). Meeting of experts on


updating the list of occupational diseases, Geneva. 2005.

Organização Mundial da Saúde (OMS), Organização Pan-americana da saúde (OPAS). Folha


informativa - COVID-19 (doença causada pelo novo coronavírus) 2020 abr [acessado 2020
Abr 17]. [cerca de 10 p.]. Disponível em:
https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=6101:covid
19&Itemid=875. Acesso em 18 de ago. de 2021.

OLIVEIRA, Ivana Campos.; VASQUES-MENEZES, Ione. Revisão de literatura: o conceito


de gestão escolar. Cadernos de pesquisa, v. 48, n. 169, p. 876-900, jul./set. 2018. Disponível
em: https://doi.org/10.1590/198053145341. Acesso em 25 de fev. de 2022.

OLIVEIRA, Erik Cunha de.; SANTOS, Vera Maria dos. Adoecimento mental docente em
tempos de pandemia. Brazilian Journal of Development, Curitiba, v. 7, n. 4, p. 39193-39199,
2021. Disponível em: DOI:10.34117/bjdv7n4-399. Acesso em: 02 de mar. de 2022.

PALUDO, Elias Festa. Os desafios da docência em tempos de pandemia Em Tese,


Florianópolis, v. 17, n. 2, p. 44-53, jul/dez., 2020. ISSN 1806-5023. DOI:
https://doi.org/10.5007/1806-5023.2020v17n2p44. Acesso em 24 de ago. de 2021.

PASQUALINI, Juliana Campregher.; EIDT, Nádia Mara. A relação professor-aluno à luz de


diferentes abordagens da psicologia. Horizontes – Revista de Educação, Dourados, v. 1, n. 1,
2013. Disponível em: file:///C:/Users/55679/Downloads/tairo,+ART+2+-+JULIANA.pdf. Acesso em
16 de fev. de 2022.

PASQUALINI, Juliana Campregher.; MARTINS, Lígia Márcia. Dialética singular-particular-


universal: implicações do método materialista dialético para a psicologia. Psicologia &
Sociedade, v. 27, n. 2, 2015, p. 362-371. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/psoc/a/WFbvK78sX75wDNqbcZHqcPj/?format=pdf&lang=pt. Acesso em 04
de mar. de 2022.

PEIXOTO, Reginaldo.; MATOS, Joaquim. Donizete. De.; SILVA, Edna. Pereira. Causas e
consequências dos afastamentos de professores no município de Aparecida do Taboado -
MS. Revista Profissão Docente, v. 20, n. 44, p. 01–16, 2020. DOI: 10.31496/rpd. v20i44.1345.
Disponível em: https://revistas.uniube.br/index.php/rpd/article/view/1345. Acesso em: 11 dez.
2021.

PEREIRA, Marcio Donizeti.; BARROS, Edjane Angelo de. A educação e a escola em tempos
de Corona Vírus. Scientia Vitae, v. 9, n. 28, abril/jun. 2020.

PESSOA PEREIRA, Hortência.; VIANA SANTOS, Fábio.; AGUIAR MANENTI, Mariana.


Saúde mental de docentes em tempos de pandemia: os impactos das atividades
remotas. Boletim de Conjuntura (BOCA), Boa Vista, v. 3, n. 9, p. 26-32, aug. 2020. ISSN
2675-1488. Disponível em: <https://revista.ufrr.br/boca/article/view/Pereiraetal>. Acesso em:
02 mar. 2022.

PESSOA, Claudia. Turati. & quot; Ser professora: Obutchénie. Revista de Didática e
Psicologia Pedagógica, v. 3, n. 2, p. 1-8, 14 nov. 2019. Disponível em:
https://doi.org/10.14393/OBv3n2.a2019-51566. Acesso em 20 de set. de 2021.
227

PESSOA, Camila Turati.; LEONARDO, Nilza Sanches Tessaro. Sentido pessoal e atividade
docente pela Psicologia Histórico-Cultural. Rev. educ. PUC-Camp., Campinas, 25, 2020.
Disponível em: http://periodicos.puc-
campinas.edu.br/seer/index.php/reveducacao/article/view/4611/3023. Acesso em 09 de jun. de
2021.

PIATTE, Celia Beatriz. A leitura na escola e a leitura da escola: linguagem, cultura e prática
social. Interfaces da Educ., Paranaíba, v. 9, n. 25, p.110-128, 2018. ISSN 2177-7691.
Disponível em: https://doi.org/10.26514/inter.v9i25.2495. Acesso em 10 de mar. de 2022.

PIATTE, Celia Beatriz. Formação continuada: questões que suscitam. RPD – Revista
Profissão Docente, Uberaba, v. 6, n. 14, p. 89-98, out/dez. 2006 – ISSN 1519-0919. Disponível
em: https://doi.org/10.31496/rpd.v6i14.265. Acesso em 10 de mar. de 2022.

PINHO, Maria José Souza; FERREIRA, Claudia Suely Barreto; PINA, Tatiane. As influências
de gênero nas condições de trabalho e saúde docente. GÊNERO, Niterói. v. 18, n. 1, p. 200-
211, 2017.

PIRES, Marília Freitas Campos. O materialismo histórico-dialético e a Educação. Interface —


Comunicação, Saúde, Educação, v. 1, n. 1, 1997. Disponível em:
https://doi.org/10.1590/S1414-32831997000200006. Acesso em 16 de mar. de 2022.

PIZZINI, Ana Amélia.; TURECK, Lucia Terezinha Zanato. As contribuições da Psicologia


Histórico-Cultural na busca de mediações para com os alunos que apresentam dificuldades de
aprendizagem. In: Governo do Estado. Secretaria de Educação. Os desafios da escola pública
paranaense na perspectiva do professor PDE. Cadernos PDE. Volume 1, 2013. Disponível
em:
http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/cadernospde/pdebusca/producoes_pde/2013/2013_
unioeste_edespecial_artigo_ana_amelia_pizzini.pdf. Acesso em 16 de fev. 2022.

POMPEI, Luciano de Melo. Descritores ou palavras-chave nas bases de dados de artigos


científicos. Femina, v. 38, n. 5. 2010. Disponível em: http://files.bvs.br/upload/S/0100-
7254/2010/v38n5/a001.pdf. Acesso em 27 de ago. de 2021.

PONTES, Eliane Cristina.; GUARALDO, Luciana de Araújo Nascimento. O processo ensino-


aprendizagem na perspectiva histórico-cultural. In: Governo do Estado. Secretaria de Educação.
Os desafios da escola pública paranaense na perspectiva do professor PDE. Artigos.
Versão Online ISBN 978-85-8015-080-3 Cadernos PDE. Volume 1. 2014. Disponível em:
http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/cadernospde/pdebusca/producoes_pde/2014/2014_
unespar-paranavai_ped_artigo_eliane_cristina_pontes.pdf. Acesso em: 20 de jul. de 2021.

PONTES, Fernanda Rodrigues.; ROSTAS, Márcia Helena Sauaia Guimarães. Precarização do


trabalho do docente e adoecimento: COVID-19 e as transformações no mundo do trabalho, um
recorte investigativo. Revista Thema. v. 18, 2020, p.278-300. Disponível em: DOI:
http://dx.doi.org/10.15536/thema.V18.Especial.2020.278-300.1923. Acesso em 24 de ago. de 2021.

PRADO, Paulo Afonso do.; LADEIRA, Thalles Azevedo.; SENTINELI, Tiago Afonso
Sociedade enlutada: lutas e lutos de uma sociedade na busca por educação. In: INSFRAN,
Fernanda Fochi Nogueira et al. (Orgs). Fraturas expostas pela pandemia: escritos e
experiências em educação. Encontrografia, Campos dos Goytacazes (RJ), p. 320, 2020.
228

PREFEITURA MUNICIPAL DE CORUMBÁ. Decreto Nº 2.266, de 19 de março de 2020.


Dispõe sobre a jornada especial e temporária de trabalho nas repartições do Município de
Corumbá, como medida de combate ao novo Coronavírus COVID-19 e dá outras providências.
DioCorumbá. Ed. Nº 1875, 19 mar. 2020.

PREFEITURA MUNICIPAL DE CORUMBÁ. Plano Municipal de Educação. Corumbá, 2015.


Disponível em:
http://leis.camaracorumba.ms.gov.br/uploads/attachment/archive/2696/PME_CORUMB%C3%81_2
015_-_ANEXO_LEI_24842015.pdf Acesso em 01 de abr. de 2020.

QUEIROZ, Vanderlei Braulino. Possibilidades de enfrentamento ao adoecimento do


professor universitário. Dissertação. (Mestrado em Educação). Universidade Federal de Mato
Grosso do sul. Campo Grande, 2021.

RAMOS, et al. Satisfação no trabalho docente: Uma análise a partir do modelo social cognitivo
de satisfação no trabalho e da eficácia coletiva docente. Psicologia Social do Trabalho, Estud.
psicol. (Natal) 21 (2), Apr-Jun, 2016. Disponível em: https://doi.org/10.5935/1678-
4669.20160018. Acesso em: 06 de dez. de 2021.

REBOLO, Flavinês. Caminhos para o bem-estar docente: as estratégias de enfrentamento


utilizadas pelos professores frente às adversidades do trabalho docente na contemporaneidade.
Quaestio (UNISO), v. 14, p. 115-131. 2012.

REBOLO, Flavinês.; DIAS, Alcione Ribeiro.; QUEIROZ, Vanderlei Braulino.; FREIRE, Silvia
Segovia Araujo. Saúde e adoecimento dos professores no brasil: uma análise a partir das
produções acadêmicas. In: FACCI, Marilda Gonçalves Dias.; URT, Sonia da Cunha. Quando
os professores adoecem [recurso eletrônico]: demandas para a psicologia e a educação.
Campo Grande, MS: Ed. UFMS, 2020.

REBOLO, Flavines.; BUENO, Belmira Oliveira. O bem-estar docente: limites e possibilidades


para a felicidade do professor no trabalho. Acta Scientiarum. Education, v. 36, n. 2, p. 323-
331, 7 jul. 2014. Disponível em: <https://doi.org/10.4025/actascieduc.v36i2.21222>. Acesso
em: 13/07/2021.

REGO, Teresa Cristina. Uma perspectiva histórico cultural da educação. Editora vozes, 25ª
edição, Petrópolis, RJ, 2014.

RESENDE, Marina Silveira de.; PONTES, Samira.; CALAZANS, Roberto. O DSM-5 e suas
implicações no processo de medicalização da existência. Psicologia em Revista, Belo
Horizonte, v. 21, n. 3, p. 534-546, dez. 2015. Disponível em:
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/per/v21n3/v21n3a08.pdf. Acesso em 23 de abr. de 2021.

ROMANELLI, Nancy. A questão metodológica na produção vigotskiana e dialética marxista.


Psicologia em Estudo, Maringá v. 16 n. 2, p. 199-208. abr/jun, 2011. Disponível em:
https://www.scielo.br/pdf/pe/v16n2/a03v16n2.pdf. Acesso em: 05 de dez.2020.

ROTELLI Franco.; OTA Leonardis.; MAURI, Diana. Desinstitucionalização. São Paulo:


Hucitec; 1990.

SANTOS, Lívia Gomes dos.; LEÃO, Inara Barbosa. O inconsciente sócio-histórico:


aproximações de um conceito. Psicologia & Sociedade, 26(n. spe. 2), 38-47. Disponível em:
229

https://www.scielo.br/j/psoc/a/Nbk37wJBPcqB3XBD53qrPKN/?format=pdf&lang=pt. Acesso em 13
de jul. de 2021.

SANTOS, Luciana Marques dos.; URT, Sônia da Cunha.; VITAL, Soraya Cunha Couto.
Readaptação docente: qual o sentido atribuído pelo professor? In: FACCI, Marilda Gonçalves
Dias.; URT, Sonia da Cunha. Precarização do trabalho, adoecimento e sofrimento do
professor (Orgs). EDUFPI, Teresina, p. 236, 2017.

SANTOS, Geórgia Maria Ricardo Félix dos.; SILVA, Maria Elaine da.; BELMONTE,
Bernardo do Rego. COVID-19: ensino remoto emergencial e saúde mental de docentes
universitários. Rev. Bras. Saúde Matern. Infant., Recife, 21 (Supl. 1), fev., 2021. Disponível
em: https://doi.org/10.1590/1806-9304202100S100013. Acesso em 02 de mar. de 2022.

SILVA, Renata da. A biologização das emoções e a medicalização da vida: contribuições da


psicologia histórico-cultural para compreensão da sociedade contemporânea. Dissertação
(Mestrado em Psicologia) Universidade Estadual de Maringá, 2011.

SILVA, Claudia Lopes da. Concepção histórico-cultural do cérebro na obra de Vigotski.


Tese (Doutorado) Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. Programa de Pós-
Graduação em Educação. Área de Concentração: Psicologia e Educação. São Paulo, 2012.

SILVA, Flavia Gonçalves da. Inconsciente e adoecimento psíquico na psicologia histórico-


cultural: estudo a partir da atividade docente In: FACCI, Marilda Gonçalves Dias.; URT, Sonia
da Cunha. Quando os professores adoecem [recurso eletrônico]: demandas para a psicologia
e a educação. Campo Grande, MS: Ed. UFMS, 2020.

SILVA, Flavia Gonçalves da. O Adoecimento Psíquico na Psicologia Histórico-Cultural: A


Patopsicologia. Interação em Psicologia. v. 25, n 2, 2021. Disponível em:
https://revistas.ufpr.br/psicologia/article/view/71721/44737. Acesso em 15 de mar. de 2022.

SILVA, Thiago Loreto Garcia da.; BRUNNET, Alice Einloft.; LINDERN, Daniele.; et al. O
normal e o patológico: contribuições para a discussão sobre o estudo da psicopatologia.
Aletheia 32, maio/ago. 2010. Disponível em:
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/aletheia/n32/n32a16.pdf. Acesso em: 13 de mar. de 2021.

SILVA, Maria Aparecida Santiago da.; TULESKI, Silvana Calvo. Patopsicologia


Experimental: Abordagem histórico-cultural para o entendimento do sofrimento mental.
Estudos de Psicologia, 20(4), outubro a dezembro de 2015a, 207-216. Disponível em:
https://doi.org/10.5935/1678-4669.20150022. Acesso em: 21 de mai. de 2021
SILVA, Maria Aparecida Santiago da. Compreensão do adoecimento psíquico de L. S.
Vigotski à Psicopatologia Experimental de Bluma V. Zeigarnik. Mestrado (dissertação).
Universidade Estadual de Maringa, Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Programa de
Pós-Graduação em Psicologia. Maringá PR. 256 f. 2014b
SILVA, Guilherme Leonardo Freitas Silva.; ROSSO, Ademir José. As condições do trabalho
docente dos professores das escolas públicas de Ponta Grossa – PR. Congresso nacional de
educação, EDUCERE. 2008. Disponível em:
https://educere.bruc.com.br/arquivo/pdf2008/495_536.pdf. Acesso em 06 de out de 2021.

SILVA, Elza Fagundes da.; VIEIRA, Alboni Marisa Dudeque Pianovski. Adoecimento docente
nas escolas públicas do estado do Paraná. Revista Humanidades e Inovação v.8, n.59, 2021.
230

Disponível em: file:///C:/Users/55679/Downloads/2273-Texto%20do%20artigo-22039-1-10-


20220214.pdf. Acesso em 25 de fev. de 2022.

SILVA, Laianny de Fátima Simões da. Gestão educacional: análise do mal-estar docente
nas escolas do distrito administrativo de Mosqueiro. Mestrado (Dissertação). Universidade
Lusófona de Humanidades e Tecnologias, Escola de Ciências Económicas e das Organizações.
Lisboa, 104 f. 2016. Disponível em:
https://recil.ensinolusofona.pt/jspui/bitstream/10437/8748/1/Laianny%20Silva.pdf. Acesso em 25
de fev. 2022.

SILVA, Maria José Sousa da.; SILVA, Raniele Marques da. Educação e ensino remoto em
tempos de pandemia: desafios e desencontros. E-book VII CONEDU (Conedu em Casa) -
Vol 03. Campina Grande: Realize Editora, 2021. p. 827-841. Disponível em:
<https://editorarealize.com.br/artigo/visualizar/74287>. Acesso em: 01/03/2022.

SILVA, Joelci Mora.; PIATTI, Célia Beatriz. FORMAÇÃO E ENSINO REMOTO NO


"NOVO NORMAL": e o/a docente como vai? REVELLI, v. 13, 2021. Dossiê novo normal
(?): artes e diversidades em isolamento ISSN 1984-6576. Disponível em:
DOI: https://doi.org/10.51913/revelli.v13i0.12101. Acesso em: 10 de mar. de 2022.

SILVEIRA, Luhilda Ribeiro.; NASCIMENTO Geraldo Melônio do. Normal, anormal e


patológico nas teses sobre a sanidade e a loucura em O Alienista de Machado de Assis. Nau
Literária: crítica e teoria de literaturas, v. 11, n. 1 – 2015. Disponível em:
file:///C:/Users/55679/Downloads/53572-232092-2-PB%20(1).pdf. Acesso em: 15 de mar. de 2020.

SOARES, Valéria Antônia Benevides Solano.; MARTINS, Lígia Márcia. Relações entre
sofrimento/adoecimento do professor e formação docente. In: FACCI, Marilda Gonçalves
Dias.; URT, Sonia da Cunha. Precarização do trabalho, adoecimento e sofrimento do
professor (Orgs). EDUFPI, Teresina, p. 236, 2017.

SOUZA, Terezinha Martins dos Santos. Efeitos da precarização do trabalho na vida dos/as
professores/as: assédio moral e adoecimento. In: FACCI, Marilda Gonçalves Dias.; URT, Sonia
da Cunha. Precarização do trabalho, adoecimento e sofrimento do professor (Orgs).
EDUFPI, Teresina, p. 236, 2017.

SOUZA, Kátia Reis. et al. Trabalho remoto, saúde docente e greve virtual em cenário de
pandemia. Trabalho, Educação e Saúde, v. 19, 2021, DOI: 10.1590/1981-7746-sol00309.
Acesso em 24 de ago. de 2021.

SOUZA, Jackeline Maria.; DELL'AGLI, Betânia Alves Veiga.; COSTA, Rodney Querino
Ferreira da.; et al. Docência na pandemia: saúde mental e percepções sobre o trabalho on-line.
Teoria e Prática da Educação. v. 24, n. 2, p. 142-159, maio/agosto 2021. Disponível em:
https://doi.org/10.4025/tpe.v24i2.59047. Acesso em: 17 de ago. de 2022.

SOUZA, Edna Maria Rodrigues de.; COUTINHO, Diógenes José Gusmão. Adoecimento das
professoras das primeiras letras em Olinda: sintomas, queixas e diagnósticos. Educação em
Revista Belo Horizonte, v. 34, e188055, 2018. Disponível em: DOI:
http://dx.doi.org/10.1590/0102-4698188055. Acesso em: 25 de fev. de 2022.

SOUZA, Farney Vinícios Pinto. Adoecimento mental e o trabalho do professor: um estudo de


caso na rede pública de ensino. Cadernos de Psicologia Social do Trabalho, v. 21, n. 2, p.
103-117, 2018 – DOI: 10.11606/issn.1981-0490.v21i2p103-117. Disponível em:
231

http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-37172018000200001. Acesso
em: 25 de fev. de 2022.
TEIXEIRA, Anelise Lusser. Educação, saúde mental e pandemia: algumas considerações. In:
INSFRAN, Fernanda Fochi Nogueira et al. (Orgs). Fraturas expostas pela pandemia:
escritos e experiências em educação. Encontrografia, Campos dos Goytacazes (RJ), p. 320,
2020.

TOSTES, Maiza Vaz; ALBUQUERQUE, Guilherme Souza Cavalcanti de; SOUZA E SILVA
Marcelo José de; PETTERLE, Ricardo Rasmussen. Sofrimento mental de professores do
ensino público. Saúde debate 42 (116), Jan-Mar, 2018. Disponível em:
https://doi.org/10.1590/0103-1104201811607. Acesso em: 27 de jan. de 2023.

TOZATTO, Alessandra. Professora em época de pandemia. In: INSFRAN, Fernanda Fochi


Nogueira et al. (Orgs). Fraturas expostas pela pandemia: escritos e experiências em
educação. Encontrografia, Campos dos Goytacazes (RJ), p. 320, 2020.

TULESKI, S. C. A Unidade do Psiquismo Humano para Vigotski e a Desagregação desta na


Esquizofrenia. Psicologia: Teoria e Pesquisa, Maringá, v. 35, 2019. Disponível em:
https://doi.org/10.1590/0102.3772e35424. Acesso em 24 de ago. de 2022.

TUNES, Elizabeth.; TACCA Maria Carmen V. R.; JÚNIOR, Roberto dos Santos Bartholo. O
professor e o ato de ensinar. Cadernos de Pesquisa, v. 35, n. 126, p. 689-698, set./dez. 2005.
Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/S0100-15742005000300008. Acesso em 07 de jun. de
2020.

URT, Sonia da. A constituição do sujeito por meio da apropriação da cultura e daeducação: o
foco na atividade docente. In: URT. S. da C; CINTRA, R. C. G. G. (Org) Identidade,
Formação e Processos Educativos. Campo Grande, MS: Life, 2012.

URT, Sonia. da Cunha. A produção científica e a constituição de grupos de pesquisa na


universidade: apenas um sonho? In: URT, S.C.; MORETTINI, M.T. (Orgs.). A psicologia e os
desafios da prática educativa. Campo Grande: Ed. UFMS, 2005. p. 43-62.

VIANA, Claúdia Pereira. O sexo e o gênero da docência* Cadernos pagu (17/18) 2001/02:
pp.81-103. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/cpa/a/hQFDykQmWnPvj4TYTWYmKZb/?format=pdf&lang=pt. Acesso em
20 de set. de 2021.

VIEIRA, Sofia Lerche.; VIDAL, Eloísa Maia. Perfil e Formação de Gestores Escolares no
Brasil. Dialogia, São Paulo, n. 19, p. 47-66, jan./jun. 2014. Disponível em:
e:///C:/Users/55679/Downloads/4984-28432-2-PB%20(1).pdf. Acesso em: 25 de fev. de 2022.

VIGOTSKI, Lev Semenovich. A formação social da mente. Livraria Martins Fontes Ltda. 4ª
edição brasileira. São Paulo - SP 1991.

VIGOTSKI, Lev. Semenovich; LURIA, Alexander Romanovich. Estudos sobre a história do


comportamento: símios, homem primitivo e criança. Porto Alegre. Artes Médicas, 1996.

VYGOTSKY, L. Lev S. Vygotsky: manuscrito de 1929. Educação & Sociedade, Traduzido


do original russo, publicado no Boletim da Universidade de Moscou, Série 14, Psicologia, 1986,
No. 1, por A. A. Puzirei e gentilmente cedido pela filha de Vigotski, G. L. Vigotskaia. Tradução:
232

Alexandra Marenitch; assistente de tradução: Luís Carlos de Freitas; revisão técnica: Angel
Pino. 2000.

VYGOTSKY, Lev. Semenovich. Obras Escogidas V Fundamentos de defectología. Editorial


Pedagógica, Moscú 1983.

VIGOTSKI, Lev. Semenovich. A construção do pensamento e da linguagem. Tradução:


PAULO BEZERRA. São Paulo: Martins Fontes, 2001.

VIGOTSKI, Lev. Semenovich. (1930/1996). Sobre os sistemas psicológicos. In L. S. Vigotski.


(1996). Teoria e método em psicologia (pp.103-135). São Paulo: Martins Fontes.

VIGOTSKI, Lev. Semenovich. Psicologia Pedagógica Edição Comentada. trad. Claudia


Schilling - Porto Alegre: Artmed, 2003.

VIGOTSKI, Lev. Semenovich. Psicologia Pedagógica (1896/1934). 2ªedição. Editora: Martins


Fontes. 2004.

VIGOTSKI, L. S. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2008.

VIGOTSKI, L. S. (Lev Semionovich), 1896-1934 Sete aulas de L.S. Vigotski sobre os


fundamentos da pedologia / L. S. Vigotski; organização [e tradução] Zoia Prestes, Elizabeth
Tunes; tradução Cláudia da Costa Guimarães Santana. - 1. ed. - Rio de Janeiro: EPapers, 2018.

VITAL, Soraya Cunha Couto.; URT, Sonia da Cunha. A atividade humana e a constituição
docente na educação integral. In: URT, Sonia da Cunha (Org). Políticas Educacionais e
formação: produção, projetos e ações em Educação. Editora: Oeste. Campo Grande, 2017

VITAL, Soraya Cunha Couto.; URT, Sonia da Cunha. Constituição docente na educação
integral: um olhar a partir da teoria da atividade. Anais eletrônicos da III Jornada Brasileira
de Educação e Linguagem/ III Encontro dos Programas de Mestrado Profissionais em
Educação e Letras e XII Jornada de Educação de Mato Grosso do Sul, 2018. Disponível
em: file:///C:/Users/55679/Downloads/4903-10600-1-SM%20(1).pdf. Acesso em 16 de jul. de
2021.

VITAL, Soraya Cunha Couto.; URT, Sonia da Cunha Formação de professores e educação
integral: palavras docentes acerca de suas concepções Braz. J. of Develop., Curitiba, v. 5, n. 9,
2019. ISSN 2525-8761. Disponível em: https://doi.org/10.34117/bjdv5n9-217. Acesso em 15 de
jul. de 2021.

VITAL, Soraya Cunha Couto.; FREIRE, Silvia Segovia Araujo.; URT, Sonia da Cunha.
Formação continuada e os fundamentos da didática histórico-crítica: pensando possibilidades
de enfrentamento ao adoecimento docente. XX ENDIPE – Encontro Nacional de Didática e
Prática de Ensino / Rio 2020 – Fazeres-saberes pedagógicos: Diálogos, insurgências e
políticas. Disponível em: https://drive.google.com/file/d/10-7rqjCV1tqt4735bqhEJf6LNLr-
fTzL/view. Acesso em: 20 de julho de 2021.

WEBBER, Deise Vilma.; VERGANI, Vanessa. A profissão de professor na sociedade de risco


e a urgência por descanso, dinheiro e respeito no meio ambiente laboral. Anais do XIX
Encontro Nacional do CONPEDI. Fortaleza - CE. Junho de 2010. Disponível em:
http://www.publicadireito.com.br/conpedi/manaus/arquivos/anais/fortaleza/3122.pdf. Acesso em
11 de out. de 2021.
233

YASUI, Silvio. Rupturas e encontros: desafios da Reforma Psiquiátrica Brasileira. Tese


(Doutorado em Ciências na área de Saúde.) Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação
Oswaldo Cruz. Rio de Janeiro, 2006.

YOSHIDA, Elisa Medici Pizão. Validade da Versão em Português da Toronto Alexithymia


Scale-TAS em Amostra Clínica. Psicologia: Reflexão e Crítica, 20(3), 2007. 389-396.
Disponível em: www.scielo.br/prc. Acesso em 12 de jul. de 2021.

ZAIDAN, Junia. Mattos.; GALVÃO, Ana. Carolina. “COVID19 e os abutres do setor


educacional: a superexploração da força de trabalho escancarada”. In: AUGUSTO, C. B.;
SANTOS, R. D. (orgs.). Pandemias e pandemônio no Brasil. São Paulo: Instituto Defesa da
Classe Trabalhadora, 2020.

ZANELLA, Andréa Vieira.; REIS, Alice Casanova dos.; TITON, Andréia Piana.; et al.
Questões de método em textos de Vigotski: contribuições à pesquisa em psicologia. Psicologia
& sociedade; 19 (2): 25-33, 2007. ISSN 1807-0310. https://doi.org/10.1590/S0102-
71822007000200004. Acesso em: 05 de dez. 2020.

ZANELATO, Eliete.; COUTO, Soraya Cunha.; URT, Sonia da Cunha. A formação docente e
a atividade de trabalho com adolescentes: diálogos possíveis. Dialogia, São Paulo, 37, p. 1-14,
e18235, jan./ab 2021. Disponível em: https://doi.org/10.5585/dialogia.n37.18235. Acesso em 15
de jul. de 2021.

ZANDAVALLI, Carla Busato.; SILVA, Marize Aparecida Leite Siqueira. O trabalho docente
em tempos de covid-19: percepções na produção científica brasileira. CIET- congresso
Internacional de Educação e Tecnologias. Encontro de Pesquisadores em Educação a
Distância. 24 a 28/08 de 2020. Disponível em: file:///C:/Users/55679/Downloads/1222-31-4737-
1-10-20210127.pdf. Acesso em 24 de ago. de 2021.

ZEIGARNIK, B. V. Psicopatologia. Madrid: Akal Editor, 1976/1981


234

APÊNDICE A – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

( ) Declaro que fui devidamente esclarecido e CONCORDO em participar voluntariamente


desta pesquisa.
235

APENDICE B –SOLICITAÇÃO E AUTORIZAÇÃO PARA COLETA DE DADOS DA


SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE CORUMBÁ MS.
236

APÊNDICE C - QUESTIONÁRIO APLICADO PARA COLETA DE DADOS DOS


PROFESSORES

Dados de Identificação
Com qual sexo você se identifica?
( ) Feminino
( ) Masculino
( ) Outros
Idade
( ) Menos de 20 anos
( ) 20 a 30 anos
( ) 31 a 40 anos
( ) 41 a 50 anos
( ) 51 anos ou mais
Estado Civil
( ) Casado
( ) Solteiro
( ) Divorciado
( ) União estável
Formação em nível de Graduação: 1 Curso: 2 Instituição: 3 Ano:
Formação em nível de Pós-Graduação: 1 Curso: 2 Instituição: 3 Ano:

II Questões sobre o Trabalho Docente:


1.Como você se sente em relação ao seu trabalho?
( ) extremamente satisfeito
( ) Muito satisfeito
( ) Satisfeito
( ) Razoavelmente satisfeito
( ) Pouco satisfeito
( ) Insatisfeito
( ) Indiferente
2. Em relação às condições de trabalho, cite até três que mais o agradam.
3.Em relação às condições de trabalho, cite até três que mais o desagradam.

4. Quais as atividades realizadas no seu trabalho que você considera prazerosas? Cite até três.
5. Quais as atividades realizadas no seu trabalho que você considera desprazerosas? Cite até
três.
6. Você gosta do seu trabalho? Justifique sua resposta.
7. Se pudesse mudaria de profissão?
( ) Sim
( ) Não
Caso sua resposta for sim, para qual profissão? Por que?
III Questões sobre adoecimento
1.Você tem algum problema de saúde?
( ) Sim
( ) não
Caso tenha respondido Sim, qual?
2. Seu problema de saúde é anterior ou posterior ao início da sua atividade profissional?
( ) anterior
( ) posterior
( ) não se aplica
237

3. Você tem alguma hipótese sobre os motivos do seu adoecimento? Quais? Caso tenha
respondido que tem algum problema de saúde
4. Há situações específicas em que sua doença se manifesta? Quais? Caso tenha respondido
que tem algum problema de saúde
5. Você solicitou afastamento de seu trabalho por razões de saúde nos últimos 12 meses?
( ) sim
( ) não
Caso tenha respondido Sim, quantas vezes nos últimos 12 meses?
Se sim, por quanto tempo ficou afastado?
6.Você toma ou tomou algum medicamento nos últimos 12 meses?
( ) sim
( ) não
Caso tenha respondido Sim, quais?
7.Que efeitos positivos você considera que o medicamento proporciona a você?
8. Que efeitos negativos você considera que o medicamento proporciona a você?
9.Você considera que os problemas de saúde enfrentados causam prejuízo na sua atividade
profissional?
( ) Sim
( ) Não
Caso tenha respondido Sim, descreva a situação.
10.Você considera que a atividade docente pode ter provocado seu problema de saúde?
( ) sim
( ) não
Caso tenha respondido Sim, do seu ponto de vista, de que forma isso ocorreu?
IV - Questões sobre Trabalho Docente na Pandemia
1.Em tempo de pandemia o quanto você considera que o trabalho remoto prejudicou sua
saúde?
( ) Não prejudicou
( ) Prejudicou levemente
( ) Prejudicou moderadamente
( ) Prejudicou gravemente
1.1 Caso tenha prejudicado você considera que prejudicou de que forma?
( ) Saúde física
( ) Saúde psíquica
( ) Ambas
( ) Não prejudicou

2. Você teve dificuldade de exercer seu trabalho em tempo de pandemia?


( ) sim
( ) Não
Caso tenha respondido Sim, qual?
3. Foram disponibilizados os recursos tecnológicos para o desempenho das atividades
docente?
( ) sim
( ) Não
Caso tenha respondido Sim, quais?
4.Em caso de disponibilização de recursos tecnológicos, foram ofertados formação para a
utilização?
( ) sim
( ) Não
Caso tenha respondido Sim, qual?
238

5.Você considera que o trabalho remoto devido a pandemia prejudicou a qualidade do seu
trabalho?
( ) sim
( ) Não
Caso tenha respondido Sim, de que forma? Exemplifique

V. Questões sobre ações para o enfrentamento docente


1.Relate alguma experiência ou projeto de enfrentamento que você conhece ou participou para
situações emergenciais de adoecimento?
2.Quais medidas/ações de enfrentamento poderiam ser realizadas para minimizar o
adoecimento do(a) professor(a)? Descreva neste espaço.
3. Como você pensa que os professores gostariam de ser acolhidos pela escola quando sentem
dificuldades?
4.Informações que considere importantes acrescentar:

OBRIGADA!!!!
239

APÊNDICE D - QUESTIONÁRIO APLICADO PARA COLETA DE DADOS DOS


GESTORES

I Dados de Identificação
1.Qual sexo você se identifica?
( ) Feminino
( ) Masculino
( ) Outros
2.Idade
( ) Menos de 20 anos
( ) 20 a 30 anos
( ) 31 a 40 anos
( ) 41 a 50 anos
( ) 51 anos ou mais
3.Estado Civil
( ) Casado
( ) Solteiro
( ) Divorciado
( ) União estável
4.Formação em nível de Graduação: 1 Curso: 2 Instituição: 3 Ano:
5.Formação em nível de Pós-Graduação: 1 Curso: 2 Instituição: 3 Ano:
6.Vinculo empregatício
( ) Estatutário
( ) Contratado
( ) Comissionado
7.Qual seu cargo Atual?
8.Qual função desempenha?

II Questões sobre Projetos realizados para o Bem Estar Docente:


1. Existe algum Programa, Ação, Projeto para prevenção do adoecimento docente no município
de Corumbá MS?
( ) Sim
( ) Não
Se sim, Qual?
Se não, porque?
2.Na sua opinião, quais temáticas e tipos de Programas seriam necessários para prevenção do
adoecimento docente?
3.Com qual frequência considera que seja importante existir Programas, Ações ou Projetos, que
possam proporcionar o Bem Estar Docente?
4.Atualmente tem conhecimento das principais causas de afastamento para tratamento de saúde
dos docentes?
( ) Sim
( ) Não
Se sim, quais são?

III Questões sobre o processo de Trabalho Docente em tempo de pandemia


1.Foram disponibilizados os recursos tecnológicos para o desempenho das atividades docente?
( ) Sim
( ) Não
Se sim, quais?
240

2.Em caso de disponibilização de recursos tecnológicos, foram disponibilizado formação para


os Docentes utiliza-los?
( ) Sim
( ) Não
Se sim, qual?
3.Quais ações considera importante para contribuir com o Trabalho Docente caso persista o
trabalho remoto?
4.Quais ações considera importante para contribuir com o Bem Estar Docente caso persista o
trabalho remoto?
5.Houve afastamento de Docentes por problemas de ordem psíquica no período de pandemia?
( ) Sim
( ) Não
Se sim, saberia descrever quais?
6.Informações que considere importantes acrescentar

OBRIGADA!!!
241

ANEXO A – APROVAÇÃO DO PROJETO DE PESQUISA PELO COLEGIADO DOS


CURSOS DE MESTRADO E DOUTORADO EM EDUCAÇÃO
242

ANEXO B – APROVAÇÃO E AUTORIZAÇÃO DA PESQUISA - COMITÊ DE


ÉTICA
243
244
245
246
247
248
249

ANEXO C – RESPOSTA E DISPONIBILIZAÇÃO À SOLICITAÇÃO DE


INFORMAÇÕES DA SUPERINTENDENCIA DE RECURSOS HUMANOS
250

ANEXO D – ESCALA SELF-REPORTING QUESTIONNAIRE – SRQ-20


251

ANEXO E - QUESTIONÁRIO DE estresse NOS PROFESSORES: ENSINO BÁSICO E


SECUNDÁRIO (QSPEBS)
252

Você também pode gostar