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RESENHA

Símbolos religiosos em controvérsias

GIUMBELLI, Emerson. Símbolos religiosos em con-


trovérsias. São Paulo: Terceiro Nome, 2014. 244p.

Jacimara Sarges Abreu


Universidade Federal do Maranhão, Brasil
jacimarasarges@gmail.com

A obra Símbolos religiosos em controvérsias, escrita pelo antropó-


logo Emerson Giumbelli, tem como pano de fundo a separação entre
Igreja e Estado – estabelecida com o advento da República no Brasil
–, que ocorreu a partir da vigência da Constituição de 1891, quando o
catolicismo perdeu o estatuto de religião oficial do país. Trata-se de
uma obra que se estrutura em dez capítulos, resultantes de pesquisas
empreendidas pelo autor, em que agrega um conjunto de textos publi-
cados em livros e periódicos, brasileiros e estrangeiros, entre 2008 e
2013.
Giumbelli, que atualmente é professor do Departamento de Antro-
pologia e do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social, da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, é autor de outras obras: O
fim da religião: dilemas da liberdade religiosa no Brasil e na França

Revista de Ciências Sociais. Fortaleza, v. 50, n. 2, jul./out.,2019, p. 437–450.


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(2002), O cuidado dos mortos: uma história da condenação e legiti-


mação do espiritismo (1997). Ele também coorganizou os seguintes
livros: Secularisms in a postsecular age? Religiosities and subjectivi-
ties in comparative perspective (2017), Religiões e temas de pesquisa
contemporâneos: diálogos antropológicos (2015), Religión, Cultura
y Política en las Sociedades del Siglo XXI (2013) e A religião no es-
paço público (2012). Inclusive, essas obras publicadas, de maneira
geral, situam-se dentro dos estudos da Antropologia da Religião, com
debates acerca das relações entre religião e espaço público.
A questão central de Símbolos religiosos em controvérsias rela-
ciona-se com a configuração das controvérsias sobre a presença da
religião na sociedade, especificamente dos símbolos religiosos em es-
paços públicos. Giumbelli toma esses símbolos como uma das moda-
lidades de como a religião se torna pública; isto porque eles “são parte
dos dispositivos e dos processos em função dos quais se define o que
seja o religioso em suas fronteiras com outras esferas sociais, em suas
manifestações em algum domínio da realidade e em sua presença em
espaços públicos” ( p. 13).
Em relação ao aspecto metodológico, a obra foi produzida e funda-
mentada em fontes diversificadas, como a pesquisa bibliográfica no
âmbito internacional e brasileiro, pesquisa documental, como jornais,
revistas, documentos oficiais, documentários, pinturas, vídeos etc., e
a pesquisa etnográfica. Esta última foi empregada como um dos prin-
cipais instrumentos de análise e, de certa forma, marcando o “lugar
de fala” do autor enquanto antropólogo.
Com aportes teórico-metodológicos definidos e selecionados, ao
introduzir a obra na discussão sobre a religião no espaço público,
Giumbelli toma como ponto de partida o quadro A Pátria, de Pedro
Bruno, e a obra A formação das Almas – O Imaginário da República

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no Brasil, do historiador José Murilo de Carvalho, explorando e apon-


tando como as referências religiosas participaram da composição dos
símbolos da República. Com base na pintura e no livro, o autor mos-
tra de que forma foi construída a imagem de José Joaquim da Silva
Xavier – o Tiradentes – como herói cívico, em que adquiriu elemen-
tos associados a Jesus Cristo, inclusive em seus traços físicos. Aponta
também que os feriados religiosos no calendário nacional, estadual ou
local – Nossa Senhora Aparecida, Dia do Evangélico, São Pedro, São
Sebastião, São Jorge etc. – são exemplos que remetem a uma associ-
ação entre religioso e político, ou ainda, de um ataque ao princípio
de laicidade; noção que adquire importância com a separação Estado-
Igreja e, segundo Mariano,

Refere-se, histórica e normativamente, à emancipação do Estado e


do ensino público dos poderes eclesiásticos e de toda referência e
legitimação religiosa, à neutralidade confessional das instituições
políticas e estatais, à autonomia dos poderes político e religioso, à
neutralidade do Estado em matéria religiosa (ou a concessão de tra-
tamento estatal isonômico às diferentes agremiações religiosas), à
tolerância religiosa e às liberdades de consciência, de religião (in-
cluindo a de escolher não ter religião) e de culto. (MARIANO, 2011,
p. 244).

Outra emblemática referência religiosa, discutida com detalhes,


trata-se da estátua do Cristo Redentor, situada no alto do morro do
Corcovado, cidade do Rio de Janeiro, que foi uma iniciativa da Igreja
Católica, em 1921, em razão das comemorações do centenário da in-
dependência política do país. Esse projeto do catolicismo – com con-
cepção, construção e inauguração da estátua com um significado não
mais que religioso – estava incorporado dentro duma lógica de disputa
religiosa que se estabeleceu com a separação Igreja-Estado, em que
se rompeu o “monopólio católico, abrindo caminho para que outros

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grupos religiosos pudessem ingressar e se formar no país, disputar e


conquistar novos espaços na sociedade, adquirir legitimidade social
e consolidar sua presença institucional” (MARIANO, 2003, p. 112).
Noutras palavras, o catolicismo procurava retomar o lugar na vida da
sociedade, dado que perdeu o aparato estatal que assegurava repro-
dução e exclusividade como no Período Colonial e Período Imperial,
isto é, como religião legitimamente aceita e sem liberdade religiosa
no Brasil.
Giumbelli afirma que, mesmo com as resistências iniciais, inclu-
sive evangélicas sobre a construção do Cristo Redentor, a estátua ga-
nhou financiamento parcial do Estado e foi inaugurada, em 1931, em
uma cerimônia que reuniu autoridades eclesiásticas e civis. Essas opo-
sições tinham relação com o fato da Igreja Católica, com a construção
da estátua, ter uma simbologia no espaço público e, de certa forma,
evidenciar certa falta de neutralidade do Estado. De acordo com o
autor, a oficialização de uma data no calendário nacional dedicada a
Nossa Senhora Aparecida (Rainha e Padroeira do Brasil) foi uma es-
tratégia de luta antirrepublicana do catolicismo, mas, não só. Junto e
acrescentando a edificação do Cristo Redentor, ambos foram apresen-
tados como representantes da nação: “Se o Estado recusara a religião,
diziam os intelectuais católicos, tratava-se então de relembrar que a
nação, por sua história e por seu povo, estava imersa no cristianismo”
(p. 50).
Contudo, a Igreja Católica acionou discursos que se associavam
à modernidade a cada fase que resultou na construção do Cristo Re-
dentor. Segundo o antropólogo, essa estátua representa um emblema
da modernidade religiosa porque, esta última, se manifestou em di-
ferentes aspectos: na liberdade religiosa, quando a Igreja Católica a
apoiou, reivindicando para si uma representação nacional com a está-

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tua, de unidade e totalidade, isto é, para expressar o reconhecimento


de que o país era essencialmente católico; na marca da contemporanei-
dade que se instalou na vanguarda religiosa, artística e tecnológica da
estátua; e nas iniciativas católicas que buscaram recuperar o sentido
religioso do monumento, especialmente católico, já que a imagem foi
sendo investida de sentidos que não estavam previstos na concepção
original, como tentativa de garantir a presença de um símbolo católico
em lugar privilegiado no espaço público.
Um aspecto central, destacado ainda, tem a ver com a brasilidade
associada ao Cristo Redentor, que se articulou com elementos, referên-
cias e perspectivas estrangeiras. Para tal discussão, Giumbelli tomou
como fonte de análise a repercussão do documentário de Bel Noronha
– Christo Redemptor, de 2005 –, que construiu uma imagem de bra-
silidade associada ao Cristo Redentor distinta daquela imagem religi-
osa que acompanhou sua concepção e inauguração. Sendo mais claro:
no passado, o monumento estava atrelado ao projeto de um “Brasil
cristão” e, no presente, a estátua sugere a imagem de “um Cristo bra-
sileiro”. E, embora o sentido dessa brasilidade tenha se reconfigurado,
a presença do estrangeiro se manteve. Com detalhes, o autor da obra
explica:

Na época da sua concepção e inauguração, a imagem do Cristo Re-


dentor expressa uma visão que insiste em colocar a Europa no centro
da cristandade e da modernidade, e o que está em jogo é a inserção
do Brasil nesse espaço. Eis porque a ideia de um “Brasil cristão”
permite e mesmo estimula as inspirações, as colaborações e as re-
ferências estrangeiras, nutrindo-se as esperanças de que a América
pudesse realizar melhor um ideal que já dera sinais de fracassos na
Europa. No momento atual, captado com a análise do documentá-
rio de Bel Noronha, seus desdobramentos e suas repercussões, a ên-
fase está posta em uma brasilidade a ser contraposta ao estrangeiro,
que se sintetiza na imagem de um “Cristo brasileiro”, capaz de jun-

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tar interpretações tanto sobre o passado (da concepção e construção


do monumento), quanto sobre o presente (a constatação da estátua
como ícone cultural da nacionalidade). O estrangeiro, no entanto,
não desparece; desloca-se, sendo um dos elementos constituintes do
olhar que produz esse ícone cultural. Afinal, se o Cristo Redentor do
Corcovado foi capaz de produzir tantas emulações pelo país, é so-
bretudo ao estrangeiro que ele faz seu convite de visita como atração
carioca (p. 92-3).

Outra preocupação presente diz respeito às transformações históri-


cas e às ressignificações de sentidos da estátua do Cristo do Redentor
produzidos pela sociedade. Isso foi explicado a partir de uma análise
cuidadosa de cinco livros sobre monumentos no Rio de Janeiro, publi-
cados entre 1946-1981. Giumbelli constatou a ênfase e a relevância
colocadas na história e na dimensão artística da estátua, bem como na
variedade de posições: evoca religiosidade e provoca um sentimento
de civismo e nacionalidade; ou mais, na sua forma e suas dimensões,
seu valor artístico e sua posição no cenário urbano que o tornam parte
da paisagem da cidade.
Soma-se ainda a isso a análise dos conteúdos nos jornais cariocas
(O Globo e Extra) que noticiaram a inclusão do Cristo Redentor entre
as novas sete maravilhadas do mundo, em 2007, no qual se verificou
que a dimensão religiosa pouco esteve presente durante a campanha e
as manifestações para que o monumento fosse reconhecido como tal.
Mas, por outro lado, é mencionado que essa dimensão religiosa, sobre-
tudo católica, se fez presente nos desdobramentos acerca da eleição
que envolveu a proposta do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e
dos Recursos Naturais sobre o esquema de acesso ao monumento.
Inclusive, para entender essas diferentes imagens construídas
acerca do Cristo Redentor, Giumbelli buscou apoio teórico na ideia la-
touriana do iconoclash. Pois, segundo ele, o vínculo da imagem com
o catolicismo que o inspirou não é mais certo, visto que a estátua foi

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um expressivo projeto da neocristandade e, posteriormente, também


inaugurou um processo irreversível de polissemia e polivalência.
Ele interpretou ainda o episódio da pichação do Cristo Redentor
com a ajuda do conceito de desfiguração proposta por Michael Taus-
sig, pois este autor fundamenta-se em um aspecto crucial da definição
durkheimiana, que diz respeito à proibição como indício da presença
do sagrado. Ele considera, assim, a pichação como uma transgressão
que revela a lógica no qual circula o monumento, ou melhor, as situ-
ações nas quais a imagem da estátua serve de tela e o local do monu-
mento serve de palco para manifestações variadas.
Além das reflexões sobre o Cristo Redentor, que se fazem pre-
sente na maior parte da obra, Giumbelli analisa os argumentos acio-
nados nas controvérsias acerca da presença de crucifixos em recintos
estatais, sobretudo em salas de plenárias de tribunais e parlamentos. A
partir de vários casos e das decisões judiciais sobre a retirada de cruci-
fixos, ele constatou que a laicidade foi acionada como um dos pontos
centrais nas argumentações dos pró-crucifixos e anticrucifixos, ou me-
lhor, dos grupos religiosos e grupos laicos, como denomina Mariano
(2011). O autor – inspirado pelas ideias de alguns estudiosos como Al-
fred Gell, David Freedberg, W. J. T. Mitchel e Nicolas Howe – explica
como os dois lados dessas controvérsias reconheceram nos crucifixos
algo relacionado ao tema da “agência de imagens”.
Para os que defendem a retirada dos crucifixos, “a agência do ob-
jeto atua sobre todos, julgados e julgadores, e compromete a própria
Justiça” e, ainda, “corresponde ao polo ativo do constrangimento que
seria sentido diante do crucifixo por todos aqueles que não se identi-
ficam com a fé religiosa a que se vincula” (p. 142). Do lado dos que
defendem a presença dos crucifixos, a atribuição da agência ocorre
em outras dimensões, pois os argumentos deles apontaram para um

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deslizamento de sentidos atribuídos aos crucifixos que extrapolam a


identidade confessional do objeto, isto é, “é atribuída uma série de
forças (respeito, advertência, alento, alavanca moral), com ação be-
névola sobre julgadores e julgados, independentemente de suas reli-
giões” (p. 143).
E ao caracterizar os lados dessas controvérsias, Giumbelli recorreu
às indicações de Bruno Latour sobre o conceito de iconaclash para se
referir aos defensores da retirada dos crucifixos, visto que ocupam a
posição de iconoclastas. Não só. Ele fundamentou-se ainda nos tra-
balhos de Michael Taussig acerca da noção de segredo público, que
envolve em sua constituição, jogos de ocultação e de revelação; pois
a sacralidade dos crucifixos depende de sua invisibilidade ativa, isto
é, atuam melhor por não serem vistos.
Seguindo a trilha dessa argumentação, o autor faz uma relação en-
tre a estátua do Cristo Redentor e os crucifixos em recintos estatais.
Para ele, o Cristo Redentor caracteriza-se como uma imagem histó-
rica, em que a polissemia e a visibilidade se tornaram características
centrais. Já os crucifixos consistem em objetos com atributos diferen-
tes: sentidos fixos e invisibilidade; isto é, têm dimensões pequenas
em relação aos ambientes em que se encontram. Mas, apesar das dife-
renças e contrastes, a estátua e os crucifixos projetam-se em espaços
públicos e “efetivam relações distintas com o ambiente em que se si-
tuam e colocam possibilidades distintas de intervenção e apropriação
– consequentemente, ocupam posições distintas na sociedade que os
reconhece” ( p. 159).
De igual modo, nas disputas que se estabeleceram sobre a clas-
sificação desses objetos como “religiosos”, evidenciou-se outro con-
traste; pois enquanto algumas posições os definiram como “religio-
sos”, outras argumentaram de modo a negar tal atributo ou caracterizá-

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los de forma a remeter para outras esferas sociais. Mais especifica-


mente, os defensores da presença dos crucifixos enfatizaram que não
se trata de objeto religioso, mas de um símbolo tradicional que remete
à formação histórico-cultural cristã ou que atua em nome de princí-
pios éticos. Os favoráveis à retirada dos crucifixos argumentam que
são emblemas com conotações religiosas, que os associam a uma con-
fissão ou tradição específicas, que ferem o princípio de laicidade. Já
a respeito do Cristo Redentor há várias iniciativas da Igreja Católica
(por meio da Arquidiocese da Cidade do Rio de Janeiro) que contes-
tam usos e apropriações da imagem, com o intuito de recuperar o “sen-
tido religioso” do monumento.
Giumbelli tratou ainda dos espaços religiosos, chamados comu-
mente de “espaços ecumênicos” ou “capelas ecumênicas”, em insti-
tuições públicas na cidade de Porto Alegre, priorizando uma polê-
mica acerca do Hospital de Clínicas daquela cidade, em que a dire-
ção propôs a mudança de uma “capela católica” para um “Espaço de
Espiritualidade”, onde procurava uma conciliação satisfatória entre
igualdade e diversidade. Todavia, essa situação gerou um impasse: de
um lado, a direção e os apoiadores da proposta apareciam com argu-
mentos cujo principal fundamento era os princípios da laicidade; de
outro, as autoridades católicas assumiam uma posição hegemônica,
que entendia como necessária a presença de símbolos católicos em
instituições públicas.
A partir desse caso, foram citados outros “espaços inter-religiosos”
ou “espaços ecumênicos” que se desenvolvem na cidade, sobretudo
em hospitais, universidades, aeroportos e órgãos estatais como fóruns
e parlamentos. E, assim, explica que “todas essas experiências estão
comprometidas com algum esforço de descatolização e que procuram
entrar em sintonia com alguma concepção de laicidade ou diversidade

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religiosa” (p. 185).


Ademais, outro aspecto não menos importante discutido pelo au-
tor foi a presença dos evangélicos na vida pública que, mesmo sendo
minoria em termos de fiéis, mostram-se mais evidentes que os católi-
cos na política partidária, sobretudo com a “bancada evangélica”, nas
comunidades pobres em muitas metrópoles e nas produções culturais:
fílmicas e musicais. Dentro dessa perspectiva ainda, pode-se utilizar
as palavras de Pierucci para acrescentar e explicar que

A presença protestante cada vez mais contundente no cenário reli-


gioso brasileiro, bem como sua participação ostensiva na esfera pú-
blica (tanto política quanto midiática), foram fatores decisivos na
proeza, para todos os efeitos histórica, de pôr em xeque pela pri-
meira vez, mas já de forma categórica e inapelável, a tradicional as-
sociação entre catolicismo e identidade nacional. (PIERUCCI, 2011,
p. 477).

Nesse sentido, o autor considera também que se a presença do ca-


tolicismo na sociedade assumiu o formato de uma “cultura nacional”,
as religiões afro-brasileiras de uma “cultura étnica”, os evangélicos,
por sua vez, mostraram-se com uma forma de “cultura pública”. Essa
“cultura pública” é caracterizada com os modos de presença dos evan-
gélicos na sociedade, que são os seguintes: visibilidade na mídia com
vários programas religiosos; manifestações no âmbito esportivo com
a atuação dos Atletas de Cristo, estendendo-se em orações coletivas,
mensagens inscritas no corpo dos jogadores, camisetas com mensa-
gens e gestos corporais religiosos; evento da Marcha para Jesus; artis-
tas gospel em programas e eventos não religiosos; favelas e prisões;
práticas de orações e rituais religiosos em terrenos elevados e trens;
monumentos públicos assumindo formas de livros bíblicos e frases
deles extraídas; construção de enormes templos nas capitais; e exem-
plares da Bíblia em estabelecimentos públicos, sobretudo em parla-

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mentos.
Isso aí tem relação com o ponto de vista de que com a separa-
ção Estado-Igreja, “a religião passou a comportar-se pela necessidade
de atuar no espaço público demarcando sua visibilidade, seu discurso,
suas estratégias e suas práticas”; pois além do espaço público ter se tor-
nado plural e democrático, as “instituições religiosas procuram situar-
se construindo seus próprios discursos e visibilidade social, em dis-
putas pelas posições e hegemonias no campo religioso” (SANTOS,
2011, p. 24).
Teoricamente, a obra trata de questões sobre laicidade e seculari-
zação. E, ao passar em revista, em um capítulo específico, os estudos
internacionais recentes e gerais sobre essas duas temáticas, Giumbelli
argumenta que esses termos são insuficientes como instrumentos heu-
rísticos. No lugar dos conceitos de laicidade e de secularização, pro-
põe a noção regulação do religioso, destacando as realidades de paí-
ses como Brasil, Estados Unidos e França, como ilustração da abor-
dagem. Este último conceito “busca abarcar o conjunto dos mecanis-
mos e dispositivos que atingem os vários grupos religiosos nas suas
transformações ao longo de um regime secularista, remetendo para
planos de análise que não são contemplados por modelos e princípios
[do secularismo e da laicidade]” (p. 221). Em outras palavras, o autor
pretende captar as formas históricas (modos, processos, canais e re-
sultados) pelas quais a religião é socialmente definida e administrada
em distintas articulações com processos de modernizações.
Os aspectos aqui destacados mostram que a obra de Giumbelli
está inserida no contexto de produção das Ciências Sociais contem-
porâneas, especificamente das Ciências Sociais da Religião, pois as
questões analisadas e problematizadas terminam por colocá-la no rol
de discussões mais gerais sobre secularização e laicidade, isto é, con-

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tribuindo para o avanço das reflexões de um dos temas mais contro-


versos e complexos desta área de pesquisa e estudo que é a religião
no espaço público.
Além disto, a leitura da obra torna-se fundamental para os cientis-
tas sociais, pois ela permite compreender alguns modos de como a re-
ligião se tornou pública após a separação entre Estado-Igreja. Nela, so-
bretudo os símbolos religiosos foram apresentados e discutidos como
modalidades da existência, presença e persistência da religião no es-
paço público. Não só. Esses símbolos foram apontados ou tomados
como exemplos de uma “história de laicidade traída” (p. 39).
No entanto, como a obra não tem um objeto único, por assim di-
zer, algumas questões não foram bem exploradas e tratadas, como foi
o caso da presença dos evangélicos no espaço público contemporâneo,
bem como o conceito de regulação do religioso que propôs no final
do livro. Já outros pontos foram bem discutidos e contextualizados,
embora determinadas informações estejam repetidas entre os capítu-
los, como ocorreu com as análises sobre a estátua do Cristo Redentor.
Mas, isso aí, não compromete a qualidade da obra e todos os esfor-
ços científicos enveredados na elaboração, visto que tem importância
como um estudo que poderá contribuir e delinear elementos que per-
mitam abrir outras possibilidades de análise e novas questões sobre a
presença da religião no espaço público.
Por fim, o livro Símbolos Religiosos em Controvérsias mostra-se
atual, uma fonte que pode contribuir para refletir o contexto do nosso
país, com intensas, controversas e complexas relações entre religioso
e político; ou ainda, como uma obra com discussões que se coadunam
também com a perspectiva de que separação Estado-Igreja “jamais
resultou na privatização do religioso no Brasil, nem muito menos na
exclusão mútua entre religião e política” (MARIANO, 2011, p. 254).

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Referências

MARIANO, Ricardo. Laicidade à brasileira: católicos, pentecostais e laicos


em disputa na esfera pública. Revista Civitas, Porto Alegre, v. 11, n. 2, p. 238-
58 maio/ago. 2011. Disponível em: revistaseletronicas.pucrs.br. Acesso em:
08 jan. 2013.
_____. Efeitos da secularização do Estado, do pluralismo e do mercado re-
ligiosos sobre as igrejas pentecostais. Revista Civitas, Porto Alegre, v. 3, n.
1, p. 111-25, jun. 2003. Disponível em: revistaseletronicas.pucrs.br. Acesso
em: 01 maio 2014.
PIERUCCI, Antônio Flávio. Religiões no Brasil. In: BOTELHO, André;
SCHWARCZ, Lilia Moritz (Orgs.). Agenda brasileira: temas de uma socie-
dade em mudança. São Paulo: Cia. das Letras, 2011. p. 471- 79.
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lise da presença da religião evangélica no espaço público maranhense (1960-
2010). In: CARREIRO, Gamaliel da Silva; SANTOS, Lyndon de Araújo;
FERRETTI, Sérgio Figueiredo. (Orgs.). Religião & religiosidades no Mara-
nhão. São Luís: EDUFMA, 2011. p. 17-37.

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Resumo:
Resenha de: GIUMBELLI, Emerson. Símbolos Religiosos em
Controvérsias. São Paulo: Terceiro Nome, 2014. 244p.

Palavras-chave: Religião; Espaço público; Modernidade; Lai-


cidade.

Abstract:
Review of: GIUMBELLI, Emerson. Símbolos Religiosos em
Controvérsias. São Paulo: Terceiro Nome, 2014. 244p.

Keywords: Religion; Public space; Modernity; Laicity.

Recebido para publicação em 26/02/2019.


Aceito em 07/03/2019.

Revista de Ciências Sociais. Fortaleza, v. 50, n. 2, jul./out.,2019, p. 437–450.

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