Compreendendo o Consumidor
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Resumo
Palavras-chave
Introdução
Nessa pesquisa, abordamos a publicidade na intersecção entre o mercado e a academia,
com a proposta de revelar pistas para a compreensão do receptor, ou consumidor.
A publicidade, como sabemos, dedica-se à divulgação de produtos e serviços, o que é
explicado por Neusa Gomes (1998, p.240-242). No entanto, cabe ainda entender essa
forma de comunicação como um processo - envolvendo receptores, produtores e
anúncios - caracterizado como multidimensional, ambíguo e contraditório (PIEDRAS,
2005).
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Trabalho apresentado ao Núcleo de Pesquisa Publicidade e Propaganda do VI Encontro dos Núcleos de Pesquisa da
Intercom.
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Professora da Escola de Comunicação Social da Universidade Católica de Pelotas. Doutoranda no Programa de Pós-
Graduação em Comunicação da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Mestre em Comunicação e
Informação na Universidade Federal do Rio Grande do Sul 2005, bolsista da CAPES. Graduada em Comunicação
Social/Publicidade e Propaganda, pela Universidade Católica de Pelotas, 2002, bolsista do CNPq. Graduada em Artes
Visuais/Design Gráfico, pela Universidade Federal de Pelotas, 2003. Bolsista da AECI para Intercâmbio na
Universidad de Extremadura / Espanha, 2002. E-mail: elisapiedras@hotmail.com
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Discussão desenvolvida na dissertação de mestrado intitulada “A articulação da publicidade com o mundo social: a
constituição do fluxo publicitário nas práticas de produção e de recepção”, de autoria de Elisa Piedras sob a
orientação de Nilda Jacks / Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Informação da UFRGS, defendida em
março de 2005, Porto Alegre.
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Maria Immacolata Lopes (2001, p.52) situa na década de 50 as primeiras pesquisas brasileiras na área da
comunicação, quando a maior influência teórica era o funcionalismo e os métodos eram quantitativos, dedicados à
análises de conteúdo, de audiências e de efeitos.
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Gomes (2003, p.97-99) comenta que a primeira agência brasileira data de 1913, sendo que em 1919 já havia cinco
agências. Posteriormente, em 1929, se instalou no Brasil a agência norte-americana Walter Thompson. E, na década
de 30 se constituiu a Associação Brasileira de Propaganda. Assim, já na década de 50, com o crescimento da indústria
nacional, a popularização do rádio, as revistas nacionais e a emergência da televisão, as agências publicitárias
nacionais e estrangeiras, abandonavam experimentalismos e se consolidavam no Brasil.
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Aqui cabe retomar a discussão de Gomes (2003, p.87-92) sobre as técnicas e teorias da
publicidade, envolvendo as “três interpretações principais 6 que, independentemente das
novas correntes doutrinárias, influíram na morfogênese sistêmica da publicidade”.
O primeiro modelo provém da “Teoria clássica ou condutivismo”, inspirada em teorias
psicológicas norte-americanas dos anos 60, que propõe que o anúncio deve despertar no
público sucessivamente atenção, interesse, desejo e ação. Depois, o modelo da
“Interpretação motivacional”, decorrente da proposta psicanalítica dos anos 50,
propunha que o desejo do público de expressar sua personalidade orienta a escolha dos
produtos. Por fim, a perspectiva da “Interpretação semiótica”, herdeira da semiologia,
sugeria a análise da expressão do conteúdo da mensagem através da imagem.
Além destas “três interpretações”, Gomes (2003, p.210-213) aponta outros modelos
teóricos7 que foram apropriados de outras áreas pela publicidade, visando o sucesso do
lançamento de um produto no mercado. Entre eles, a autora destaca a “Teoria dos
estados mentais”, a “Teoria AIDA”, a “Teoria dos estados mentais com relação às
marcas”, a “Teoria dos motivos inconscientes racionalizados” e a “Teoria das
associações favoráveis”.
Modelos experimentais também “foram criados pelos próprios publicitários numa
tentativa de chegar a normatizar anúncios criativos que deram certo como estimuladores
de compra”, complementa a pesquisadora (GOMES, 2003, p.213).
Como vemos, todas estas teorias e concepções das agências sobre a publicidade se
assemelham a fórmulas. Segundo esses modelos, o comportamento do receptor, ou
consumidor, é previsível e altamente manipulável. Trata-se de um “público-alvo”, ou
seja, o “grupo de consumidores ou de prospects aos quais é dirigida, prioritariamente,
uma peça ou campanha de propaganda, bem como qualquer outra ação de comunicação
ou marketing” (SAMPAIO, 1997, p. 265). Esse “público-alvo” é “estudado e
selecionado pelas pesquisas realizadas, (...) para ser persuadido e informado sobre o
quanto aquele produto ou serviço lhe será útil, sob vários pontos de vista” (GOMES,
2003, p.47). Assim, é possível pensar que, desde que as fórmulas sejam repetidas, os
anúncios terão êxito junto ao consumidor, divulgando os produtos, serviços e marcas, e
também aumentando as vendas.
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Nos deteremos a essas três teorias eleitas por Gomes como as principais, visto que são as mesmas que aparecem na
bibliografia dos outros autores provenientes do mercado publicitário, como Armando Sant’Anna e Rafael Sampaio.
7
Gomes (2003, p.204-210) expõe modelos provenientes da Economia (Marshall, Adam Smith e Bentham), da
Fisiologia (Palvov), da Psicologia (Freud) e da Psicologia Social (Abahan Maslow e Vebeln).
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Estes, segundo Leal (1995, p.116-117), são muito usados pelo seu baixo custo e simplicidade, visto que têm “como
universo da pesquisa um grupo que é montado para ouvir, assistir e discutir determinada mensagem”. A autora
comenta que os grupos de discussão também são trabalhados na academia, em estudos de recepção, mas que, “não
tomando as pessoas em seu local de vivência, [deixa] de resgatar a cotidianidade da própria recepção”.
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Destacamos que não nos propomos aqui a realizar um estudo de recepção da publicidade, nem tampouco uma
análise etnográfica das rotinas de produção publicitária. Como foi explicitado, trata-se de uma aproximação
qualitativa com nosso objeto de estudo, marcada pelo caráter experimental e intuitivo, mas que nem por isso foge à
proposta de uma discussão científica.
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A restrição da coleta de dados junto a apenas um entrevistado justifica-se pelo caráter exploratório dessa inserção
empírica.
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A coleta de dados junto ao entrevistado se deu através de uma conversa realizada em seu local de trabalho - a
agência publicitária DCS -, registrada pelo gravador de voz e posteriormente transcrita.
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O termo “case” é, de acordo com Rafael Sampaio (1997, p.231), uma abreviação de case history, ou seja, “uma
história, geralmente de sucesso, vivida por uma empresa ou marca”.
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Informações extraídas do site da agência DCS na internet (http://www.dcsnet.com.br)
14
Segundo o site do Grupo de Planejamento (http://www.grupodeplanejamento.com.br), tal atividade publicitária
“busca inspiração no conhecimento das mecânicas de mercado, de construção de marcas, do comportamento de
compra e do consumidor, bem como da dinâmica dos processos de comunicação”.
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agência deve-se ao fato de que ela optou por um novo posicionamento na área de
planejamento - em que este publicitário atua -, adotando a idéia de “planejamento
criativo”, que sintetiza uma nova postura desses profissionais 15 com relação à
abordagem do consumidor, a pesquisa e apresentação de dados sobre ele, marcada pela
emergência do viés qualitativo.
Trata-se, segundo DP, de uma “alternativa à pesquisa de marketing ‘engessada’
(contratada de um fornecedor e apresentada em uma massa de textos e números), de
difícil compreensão para o anunciante”. A proposta do “planejamento criativo” é a
“desconstrução da pesquisa através de um trabalho conjunto da agência e do anunciante;
o mapeamento do mercado e do consumidor buscando informações que são mais
compreensíveis para o anunciante”, como informa DP.
2.1.O receptor para o publicitário: uma idéia de “consumidor” para além do ato de
comprar
Começamos o diálogo com o publicitário introduzindo a questão do receptor: “O que é
o receptor para o publicitário - neste caso o profissional do planejamento? Como o
publicitário vê o receptor?”. Segundo DP comenta, “o consumidor, o público, a
terminologia é indiferente”. Para o publicitário, “consumidor na verdade é o cara que
compra, o cara que influencia, o cara que forma opinião. Tudo isso é um pouco de
consumidor. A gente pensa em tudo isso, tem as pessoas que ditam as tendências, ou
sites que ditam o que vai rolar...”. DP afirma ainda que, “tudo isso, não é só o ato de
comprar, começa muito antes, desde o desinteresse do consumidor pelo produto, até a
re-compra, e esse ciclo todo a gente fica mapeando continuamente”.
Nessa percepção sobre o consumidor explicitada pelo entrevistado, inicia o diálogo
entre o mercado e a academia, aqui representada por Maffesoli (1998b, p.30), que
aborda a “lógica contraditorial”, ou seja, a união complementar dos contrários que
permeia a vida social. Pois para o publicitário, o receptor é nomeado como alguém
ligado ao consumo - o “consumidor” -, mas compreendido como alguém que supera
esse ato. Além disso, o receptor ou consumidor também é percebido como aquele que,
paradoxalmente, produz e divulga tendências.
2.2. O publicitário conhecendo o receptor: o qualitativo no acesso e apresentação dos
dados
15
O profissional entrevistado relata que segundo observa nos encontros do Grupo de Planejamento, as demais
agências da cidade de Porto Alegre não trabalham segundo o “planejamento criativo”, e que esta idéia foi introduzida
na DCS graças ao contato com a experiência de agências dos Estados Unidos e Europa que tinham esse
posicionamento.
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Como informa o site do IBOPE/ Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (http://www.ibope.com.br), o
“Target Group Index é um estudo ‘single source’ sobre o consumo de produtos, serviços e mídia, estilo de vida e
características sociodemográficas. (...) É possível realizar análises detalhadas com as combinações das diferentes
variáveis existentes na pesquisa. O software de análise de dados do Target Group Index permite gerar mais de 1
bilhão de combinações de informações.” O TDI é um produto do Instituto, que pode ser adquirido através do IBOPE
Mídia.
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O Informa Brasil é um site (http://www.informabrasil.com.br) que divulga “pesquisa em conteúdo qualificado (...)
as notícias publicadas nos principais jornais e revistas do Brasil, além de publicações especializadas”.
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Trata-se da publicidade não-convencional, alternativa ou inovadora. Classificada por Armand Mattelart (1991,
p.30-32) como “publicidade below the line”, que compreende qualquer atividade que não se enquadre dentre àqueles
tradicionais usos das mídias massivas, mas inclui a promoção de vendas, a promoção no ponto-de-venda, o marketing
direto, etc.
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Os indícios sobre o consumidor comentados pelo publicitário, assim como sua hipótese
sobre a função lúdica dessa forma de comunicação têm plena sintonia com o universo
acadêmico e as idéias de Maffesoli (1995, p.42), que aponta para a resistência do
emotivo e do lúdico na socialidade contemporânea, situando a pub licidade como uma
forma de re- investir o simbólico no cotidiano, através de um jogo em que “perde-se e
ganha-se” (MAFFESOLI, 2004a, p.31; 2004b).
2.4. A agência de publicidade relatando seus “cases” de “planejamento criativo”:
abordagem qualitativa do consumidor para uma comunicação que venda
Dentre os 12 cases de planejamento e campanha publicitária desenvolvidos por DP e
seus colegas na agência DCS premiados no 31º Salão da Propaganda ARP 2005,
tivemos acesso a cinco histórias de sucesso, apresentadas em relatório interno da
agência, fornecido pelo publicitário entrevistado via e- mail. Tais cases são os seguintes,
assim denominados no relatório: “Funny conquista as tweens”, “Magazine Luiza,
conquistando a mulher gaúcha com carinho”, “Tramontina e Bob Esponja. Sucesso com
as mães e com a criançada”, “Facas Tramontina Century. Comunicação afiada e afinada
com o gourmet”.
A simples leitura dos nomes dos cases traz indícios da relação entre a marca do produto
/ serviço anunciante (Funny, Magazine Luiza, Tramontina e Bob Esponja, Tramontina
Century), seu público consumidor identificado como um segmento (tweens, mulher
gaúcha, mães e criançada, gourmets) e apelos que comunicam estes dois âmbitos através
da sedução, do êxito e da eficiência (conquista, conquistando com carinho, sucesso,
comunicação afiada e afinada).
O relatório descreve, em cada case, a situação de mercado, as estratégias de
conhecimento do segmento 21 de consumidores, o posicionamento decorrente do acesso
a essas informações, e os resultados, permitindo a visualização da produção publicitária
e da importância do receptor nesse processo.
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Como define a Wikipédia / enciclopédia livre (http://pt.wikipedia.org/wiki/Marketing_Viral), “o marketing viral e a
publicidade viral referem-se a técnicas de marketing que tentam explorar redes sociais pré-existentes para produzir
aumentos exponenciais em conhecimento de marca, com processos similares a extensão de uma epidemia”.
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Estas ações alcançaram o status de ter uma categoria especial do Festival de Publicidade de Cannes, a Titanium
Lions, “uma seção para idéias grandes e audaciosas. Idéias que transcendem as regras e desafiam a forma como
pretendemos levar nossa mensagem ao nosso público alvo. Elas viram as expectativas de ponta cabeça. Elas geram
um pensamento criativo entre múltiplos canais, com uma idéia principal que cresce organicamente, subverte, conecta
e se transforma em algo radicalmente novo que irá levar a publicidade e o negócio da comunicação em direção a
territórios novos e inexplorados”, como vemos no site (http://www.canneslions.com/entrants /downloads/titanium
_rules06_por.pdf).
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No mercado publicitário, o termo segmento remete ao “grupo de consumidores com perfil e comportamento de
compra idêntico”. A segmentação é “técnica de dividir o mercado em unidades geográficas ou – principalmente – em
grupos de consumidores com interesses e comportamentos semelhantes” (SAMPAIO, 1997, p.270).
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Referências bibliográficas
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do receptor / Mauro Wilton de Souza (organizador). São Paulo: Brasiliense, 1995.
LOPES, Maria Immacolata V. Pesquisa em Comunicação. São Paulo: Edições Loyola, 2001.
SANT’ANNA, Armando. Propaganda: teoria, técnica e prática. São Paulo: Pioneira, 1999.
SOUZA, Mauro W. Recepção e comunicação: a busca do sujeito. In: Sujeito, o lado oculto do
receptor / Mauro Wilton de Souza (organizador). São Paulo: Brasiliense, 1995.
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