Aula 18 - Nietzsche e A Filosofia Do Martelo

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Aula 18 – NIETZSCHE E A FILOSOFIA DO

MARTELO
ASPECTOS GERAIS DA FILOSOFIA NIETZSCHIANA com a guerra e a vitória, têm domínio sobre outros instintos, por
exemplo, sobre o da ‘felicidade’. O homem que se tornou livre, e
• Nietzsche pode ser considerado um dos filósofos mais ainda mais o espírito que se tornou livre, calca sob os pés a
importantes do mundo contemporâneo, sendo o grande desprezível espécie de bem-estar com que sonham os cristãos,
responsável pela “crise da modernidade”. vacas, mulheres, ingleses e outros democratas. O homem livre é um
• Nasceu na Prússia, estudou filologia em Bonn e Leipzig, guerreiro.” (NIETZSCHE, 1974, p.348-9)
tornou-se professor de filologia clássica na Universidade de • Nietzsche procurava denunciar a moral que dominava o mundo,
Basiléia, na Suíça, em 1869. propondo uma transvaloração de todos dos valores, onde
• Foi influenciado pela filosofia de Schopenhauer e tornou-se deveríamos, por seu método genealógico, investigar a origem dos
amigo do músico Richard Wagner, com quem depois rompeu valores antes de simplesmente aceitá-los.
relações. • Nietzsche denunciava também os erros da ciência moderna que
• Nietzsche foi um crítico mordaz dos valores do racionalismo ficou presa em sua “própria teia”, numa busca desenfreada atrás de
iluminista e dos valores morais e religiosos de sua época. verdades absolutas, termo essa também muito criticado por
• Ele constatou que noções como verdade, justiça, razão, bem, Nietzsche pois constatou a sua impossibilidade.
mal, virtude, Deus foram relativizados no mundo moderno como • Nietzsche acredita que o pensamento humano acabou sendo
consequência do progresso técnico e científico. decidido na opção que foi feita pela filosofia tradicional de
• Dessa forma, ele “dedicou sua vida a realizar três tarefas: Parmênides ao invés de Heráclito, a quem acredita ser o maior
compreender a lógica desse movimento contraditório ao longo pensador pré-socrático e até certo ponto um predecessor seu.
do qual o progresso do conhecimento leva à perda de • A ideia da eterna mutabilidade das verdades está contida em
consistência dos valores absolutos; a partir daí, denunciar todas Heráclito, conforme foi demonstrado no capítulo 1. Nietzsche em sua
as formas de mistificação pelas quais o homem moderno A Filosofia na Época Trágica dos Gregos, de 1873, credita a
oblitera sua visão dos perigos de sua condição; por fim, Heráclito a primeira negação de dualidades física e metafísica de
destruídos os falsos ídolos – e esses são os valores mais mundos.
venerados pelo homem moderno -, assumir corajosamente o • A filosofia trágica dionisíaca de Nietzsche está em oposição, em luta
risco de pensar novos valores, abrir novos horizontes para a contra a filosofia racional, em especial a filosofia de Sócrates/Platão
experiência humana na história.” (Giacóia, 2000, p.17). e de Kant.

A CRÍTICA À RAZÃO O ESPÍRITO APOLÍNEO E O DIONISÍACO (A FILOSOFIA NA ERA


• Nietzsche é considerado o filósofo dos instintos e da vontade de TRÁGICA DOS GREGOS)
potência, sendo inimigo do “amolecimento moderno dos sentimentos”
e condenando o homem moral, fraco e religioso. • Nietzsche buscou dos gregos dois deuses para criar dois conceitos:
• Ele se propôs a si mesmo fazer uma crítica dos valores morais, o Apolíneo, que seria a ordem, a medida, o belo, a aparência, e
colocando em questão o próprio valor desses valores. Dionisíaco que consistiria na desmedida, no caos, na integração com
• Com isso, identificou a razão e a racionalidade com a decadência e o o que há de mais natural, mais primitivo e arrebatador no homem, o
ódio aos instintos. universo como um “monstro” de forças.
• A racionalidade desde o nascimento da filosofia tornou a razão • Sobre o que ocorria nos tempos da arte trágica grega, Nietzsche
(logos) o paradigma para o mundo ocidental, fundamentado nas escreve sobre a filosofia pré-socrática: “Estes dois instintos
categorias éticas que têm orientado os homens ao longo da história, impulsivos andam lado a lado e na maior parte do tempo em guerra
reprimindo os instintos de vida celebrados pela tragédia grega, em aberta, mutuamente se desafiando e excitando para darem origem a
nome de uma vida ética e consciente. criações novas, cada vez mais robustas”. (NIETZSCHE, 1996, p.19)
• O “logos” subjugou os instintos criadores. • A tragédia grega seria essa união entre o Apolíneo e o Dionisíaco,
• O homem de rapina que age guiado pelos instintos foi substituído seria a arte superior por excelência, já que ao contrário do que
pelo homem racional. A vida foi subjugada pela razão. ocorre nas artes plásticas, também chamadas Apolíneas, e a arte
• A filosofia de Nietzsche é uma filosofia dos afetos, das paixões e sem formas, a música, ou dita Dionisíaca, a tragédia Ática “abraça”
desejos, que contempla o individualismo, a força, a abundância e os os dois elementos, possui dentro dela os dois mundos.
instintos de vida. • “A evolução progressiva da arte resulta do duplo caráter de “espírito
• Para ele filosofar não era uma atitude teórica e contemplativa, mas Apolíneo” e no “espírito Dionisíaco”, tal como a dualidade dos sexos
uma atitude prática que se enraíza na vida, um ato de libertação de gera a vida no meio de lutas que são perpetuas e por aproximações
toda subjugação, de toda moral, de toda deformação e de tudo que são periódicas” (NIETZSCHE, 1996, p.18)
aquilo que nos prende a religiões, grupos e ideologias. • Ao estado Apolíneo, criador de formas, da aparência, do belo, se
• Em “Crepúsculo dos Ídolos” Nietzsche afirma que o homem livre é contrapõe o Dionisíaco, como fim de toda individuação, como um
um guerreiro. estado de êxtase onde o homem se encontra com a natureza, se
• “Pois o que é a liberdade? Ter a vontade de responsabilidade identifica com ela.
própria. Manter firme a distância que nos separa. Tornar-se • Como para Nietzsche não é mais possível procurar o ideal de um
indiferente a cansaço, dureza, privação, e mesmo à vida. Estar conhecimento verdadeiro como fizeram os filósofos antigos e
pronto a sacrificar à sua causa seres humanos, sem excluir a si medievais, é necessário agora encontrar, ou melhor, reencontrar a
próprio. Liberdade significa que os instintos viris, que se alegram
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vida, desmascarar, tirar os véus que encobrem a humanidade há • O outro princípio da dualidade estabelecida por Nietzsche é o
dois mil anos, os véus da religião. Dionisíaco.
• Nietzsche encontra na tragédia, com seus dois elementos, Apolo e • Este ultrapassa o mundo do sofrimento pelo mergulho à unidade do
Dionísio, a representação da vida, da aceitação da vida em sua próprio universo, uma experiência mística, levando ao inconsciente.
totalidade. • Dionísio é o deus do vinho, liga-se a música e a arte não-figurada.
• Mas para Nietzsche o “objetivo” da tragédia não era o de libertar-se • A experiência dionisíaca rompe com o princípio de individualização –
do temor e da piedade, nem purificar-se de uma paixão perigosa – Apolo.
como queria Aristóteles – mas sim o de ter a alegria do porvir, a • É a perda de si mesmo, de sua individualização, e essa ideia de
alegria do criar e também do destruir. Seria isso, para Nietzsche, o perda de si nos remete à de terror.
contrario de um pessimismo. • Essa experiência vai selar o laço que une pessoa a pessoa,
• “Nesse sentido, tenho o direito de considerar-me o primeiro filósofo eliminando todas as diferentes individualizações.
trágico, isto é, a perfeita antítese de um filósofo pessimista”. • Portanto, temos a unidade do Apolíneo com o Dionisíaco, juntos
(NIETZSCHE, 2002, p.79). formando o devir, a vida.
• Nietzsche considera essa sua percepção do trágico, de seu • Desse modo, Nietzsche parte do princípio de que o universo
significado ao ser transferido do campo artístico para a vida, o humano é constituído de forças conflitantes, sendo que cada força é
diferencial em relação aos outros filósofos. em princípio um centro explosivo tentando uma síntese precária que
• O estado Dionisíaco é para Nietzsche em excedente de vida, uma tende a dominar as demais, incorporá-las, crescer às expensas
exuberância, um querer inesgotável. delas.
• Por isso ele encontra na arte a salvação, por ela conseguir enxergar
através do sonho, da aparência Apolínea, a sabedoria Dionisíaca, a (...) “A seus dois deuses da arte, Apolo e Dionísio, vincula-se a nossa
afirmação da vida em todas as suas possibilidades. cognição de que no mundo helênico existe uma enorme contraposição,
quanto a origens e objetivos, entre a arte do figurador plástico, a apolínea,
• “Eu anuncio o advento de uma era trágica: a arte mais sublime na
e a arte não-figurada da música, a de Dionísio : ambos os impulsos, tão
afirmação da vida, a tragédia, renascerá quando a humanidade, sem diversos, caminham lado a lado, na maioria das vezes em discórdia aberta
sofrimento, terá atrás de si a consciência de ter sustentado as e incitando-se mutuamente a produções sempre novas, para perpetuar
guerras mais rudes e mais necessárias.” (Nietzsche, 2002, p.80) nelas a luta daquela contraposição sobre a qual palavra comum “arte”
• Os gregos teriam criado os deuses olímpicos para tornar a vida mais lançava
desejável, já que por serem mais sensíveis ao sofrimento e por apenas aparentemente a ponte; até que, por fim, através de um
possuírem uma incrível sensibilidade artística, existia o perigo de miraculoso ato metafísico da “vontade” helênica, apareceram
emparelhados um com o outro, e nesse emparelhamento tanto a obra de
caírem, num profundo pessimismo, numa negação da própria arte dionisíaca quanto a apolínea geraram a tragédia Ática (...).”
existência. (NIETZSCHE, 1996, p. 27).
• Mostrando a relação intensa entre o Apolíneo e o Dionisíaco na
tragédia, Nietzsche mostra que o surgimento da arte Apolínea seria A MORAL DO REBANHO E A MORAL DO SENHOR (ALÉM DO BEM E
como um antídoto contra o pessimismo, a negação da vida. DO MAL / O ANTICRISTO – MALDIÇÃO CONTRA O CRISTIANISMO)
• A arte Apolínea e a arte da beleza, e se os deuses gregos não se
“Todos os esgotados amaldiçoam o sol; para eles, o valor das árvores
caracterizam por serem necessariamente bons, eles eram belos. está...na sombra! A decisão cristã de considerar o mundo feio e mau
Beleza para os gregos também tinha o significado de calma, transformou o mundo em feio e mau". (NIETZSCHE)
serenidade e liberdade com relação as emoções.
• Antes de se chegar a um estado Dionisíaco, o grego, contra a dor e o • Para Nietzsche, o homem pode assumir atitudes variáveis, porém
sofrimento diviniza o mundo criando a beleza. nada lhe tira o direito de adquirir maneiras naturais e próprias através
• Portanto, beleza é para o grego, aparência. Para Nietzsche, o grego de uma genialidade para obter sua felicidade.
criou o mundo da beleza para ao invés de mostrar a verdade • Nietzsche projeta a obra “Além do Bem e do Mal” de forma irônica e
mascarar, encobrir a essência do mundo. poética. Nela o autor combate duramente a vertente religiosa “cristã”
• Não é pelo belo que as coisas belas são belas. Quando se diz que e a vertente filosófica.
algo é belo apenas se diz que tem uma bela aparência, sem nada se • Segundo o autor, a religião é a precursora de toda inversão de
enunciar sobre sua essência. valores, fazendo do homem um ser passivo, fraco, cheio de
• Mascarando a essência, a vontade, a verdadeira realidade, a beleza ressentimento e incapaz de construir, ou seja, que não teria uma
é uma intensificação das forças da vida que aumenta o prazer de vontade própria, ou seja, vontade de poder (ou vontade de potência).
existir. • Esta vontade de poder só é dada aos homens fortes, criativos, que
• Como foi dito antes, Apolo é o deus do Sol, liga-se a arte plástica sabem como usar sua natureza e como direcionar sua genialidade.
devido a sua afinidade com a visão, tornando-se o deus da imagem, • Deparamo-nos então, com a transmutação de valores que Nietzsche
obtendo uma arte figurada. expressa em vários dos seus escritos: um homem decadente,
• Ele reina nas belas aparências do mundo da fantasia, pois todo pessimista, que, na perspectiva de sentido, perde seu centro de
homem produz imagens por meio do sonho e da realidade. gravidade, pois os valores “naturais” passam a ser questionados pelo
• E assim como o sonho tem um efeito sanatório e reparador, o metafísico, pela história, pela filosofia e pela religião.
Apolíneo se contrapõe a realidade cotidiana. • Depois de ter contato com estas esferas o homem começa a agir de
• Há um prazer em produzir imagens, em sair do fundo, que é próprio forma antinatural, ficando inserido em um mundo criado e organizado
do Apolíneo. por “Deus”, pelo comportamento da sociedade e pela organização do
• Este é um afirmador da vida, sejam as imagens boas ou não. A estado.
experiência apolínea é cúmplice da produção da vida, esta • Ao verificar o que são os valores naturais para o homem, Nietzsche
experimentada esteticamente é o mundo superior. afirma que, se privarmos o homem dos valores morais, da perda de

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sentido da existência humana em um aspecto religioso, enfim, ao • “É preciso invocar prodigiosas forças contrárias, para fazer frente a
privar o homem das medidas divinas, estaríamos decretando a morte esse natural, muitíssimo natural progressus in símile, à evolução do
de Deus. homem rumo ao semelhante, costumeiro, mediano, gregário – rumo
• Percorrendo as numerosas morais que predominam sobre a terra, ao vulgar!” (NIETZSCHE)
Nietzsche encontrou nelas certos traços que retornam regularmente • A sociedade de rebanho é o sintoma de um problema ainda mais
(ETERNO RETORNO/ HISTÓRIA CÍCLICA) e permitem, assim, fundamental: o instinto de conservação. Aqui as linhas descritas por
distinguir dois tipos fundamentais: a moral do senhor e a moral do Nietzsche encontram em Kant um inimigo perfeito.
escravo. • Trata-se da moral ascética e altruísta que, sob a máscara da
• A primeira figura que Nietzsche aponta nas origens da moral é a do igualdade e justiça, exige dos homens atitudes irretocáveis e
senhor ou aristocrata primitivo. Seu caráter principal seria o de ser inexequíveis com o propósito de assegurar – numa espécie de
um criador de valores: uma energia criativa que brota de uma contrato social – a vida em comum.
orgulhosa consciência de si mesmo e vem acompanhada de um • O medo, que poderia corroer a vida social, precisa ser vencido; para
sentimento de plenitude que não pode deixar de transbordar. tanto, requer-se uma moral capaz de castrar e, portanto, de civilizar a
• Não seria privilégio cultural ou social, mas “sim” uma decorrência besta humana
natural da força de origem dos aristocratas: sadios de corpo e de • O medo é aqui, diz Nietzsche, o pai da moral.
espírito, eles seriam inteiramente potência encarnada, que os faria • Nietzsche parece estar de acordo com Hobbes no que concerne à
crescer e se estender, abarcando, conquistando a preponderância compreensão da sociedade como um pacto regido pelo medo,
não por quaisquer morais ou imorais, mas porque eles vivem a vida e menos por considerar a sociedade fruto de um cálculo racional (cuja
a vida é vontade de poder. equação indica um apaziguamento dos conflitos por meio da vida
• Neste sentido, a influência da religião, assim como da metafísica e social) do que por creditar a ela uma reunião de pessoas fracas e
da filosofia seria uma alienação que condiciona somente o homem interessadas apenas em suas respectivas sobrevivências.
fraco. • A moral de rebanho esconde a perversão humana, a natureza
• Para Nietzsche, analisar a perversão moral significa procurar sua individual e egoísta do homem.
origem tanto no indivíduo quanto na história ou, para usar a • Ela funciona como espécie de entorpecente que tranquiliza os
expressão nietzschiana, significa fazer sua genealogia em busca do instintos para que todos possam viver harmonicamente, ainda que
além do bem e do mal. haja sempre um grupo que invariavelmente domine outro.
• A vontade de potência é natural a todos os homens, mas como • Por isso, a religião é uma base ideológica que embriaga os homens
somos homens carentes, limitados, fracos, sem perspectiva de vida, e os condena a viverem sempre sob a tutela de alguém ou de
sem uma identidade, temos a necessidade de criar máscaras para alguns. A abnegação religiosa é hipócrita porque aqueles que o
suportar a própria vida. fazem alimentam-se de seus próprios interesses.” O homem religioso
• Porque a consideramos amarga, a mesma sempre nos convida a pensa apenas em si”, sentencia Nietzsche
renovar nossa conduta através de um código ético, no qual
deveríamos agir instintivamente, nos ajudando a encontrar a ” A concepção cristã de Deus – Deus o como protetor dos doentes, o
verdadeira identidade. Deus que tece teias de aranha, o Deus na forma de espírito – é uma das
concepções mais corruptas que jamais apareceram no mundo:
• Esta vontade de potência o situa muito além do bem e do mal e faz o
provavelmente representa o nível mais ínfero da declinante evolução do
homem desprender-se de todos os produtos de uma cultura tipo divino. Um Deus que se degenerou em uma contradição da vida. Em
decadente. vez de ser sua própria glória e eterna afirmação! Nele declara-se guerra à
• Para Nietzsche, quando falamos em prática caridosa, piedade, amor vida, à natureza, à vontade de viver! Deus transforma-se na fórmula para
a Deus e ao próximo são valores que fragmentam o homem, fazem todas calúnias contra o “aqui e agora” e para cada mentira sobre “além”!
do mesmo um ser decaído e constituído de valores inferiores. Nele o nada é divinizado e a vontade do nada se faz sagrada!”
• Segundo o autor a “virtú” renascentista é uma demonstração de
“Farei uma pequena regressão para explicar a autêntica história do
homens que agirão segundo a sua genialidade, segundo seus cristianismo. – A própria palavra “cristianismo” é um mal-entendido – no
instintos. fundo só existiu um cristão, e ele morreu na cruz. O “Evangelho” morreu
• Temos através dos renascentistas uma moral de senhores, a moral na cruz. O que, desse momento em diante, chamou-se de “Evangelho”
além do homem que é oposta à moral do escravo. era exatamente o oposto do que ele viveu: “más novas”, um Dysangelium.
• A moral do escravo é a moral dos fracos, a “moral do rebanho”, que É um erro elevado à estupidez ver na “fé”, e particularmente na fé na
salvação através de Cristo, o sinal distintivo do cristão: apenas a prática
nega a vida em toda sua brutalidade e aleatoriedade.
cristã, a vida vivida por aquele que morreu na cruz, é cristã...”
• A moral termina por aprisionar os homens num tempo que não existe
e lhes exige uma abnegação compatível apenas com a de anjos, Sobre causa e efeito e os erros da humanidade, Nietzsche afirma:
cuja assepsia é capaz de desdenhar das nossas paixões mais vis. É
o caso da moral kantiana. “… A maioria de nossos sentimentos universais – todo e qualquer tipo de
• As exigências feitas por Kant para que uma moral fosse inscrita num inibição, pressão, tensão, explosão no jogo de ação e reação dos órgãos,
assim como em particular o estado do nervo simpático –excita nosso
patamar de universalidade, e portanto fosse legítima, coincidem,
impulso causal: queremos um motivo para nos sentirmos dispostos de tal
para Nietzsche, com os preceitos de uma religião que guarda uma ou tal modo, para nos sentirmos mal ou bem dispostos. Nunca é suficiente
prévia compreensão da natureza do homem e tenta, com um para nós constatar o fato de nos sentirmos dispostos de tal ou tal modo:
controle total das paixões, homogeneizar os homens. só aceitamos esse fato – só tomamos consciência dele quando lhe
• A individualidade é diluída no meio do rebanho: os homens mais entregamos um tipo de motivação. Reconduzir algo desconhecido a algo
semelhantes, mais costumeiros, estiveram e sempre estarão em conhecido alivia, tranquiliza, satisfaz e dá, além disso, um sentimento de
potência. Junto com o desconhecido é dado o perigo, a inquietude, a
vantagem; os mais seletos, mais sutis, mais raros, mais difíceis de
preocupação – o primeiro instinto aponta para a eliminação destes
compreender, esses ficam facilmente sós, em seu isolamento
sucumbem aos reveses, e dificilmente se propagam.
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estados penosos. Primeiro princípio: qualquer explicação é melhor do que • Perceberiam que ela não é causada pelo mundo, mas é uma dor
explicação nenhuma.” pessoal causada pela insatisfação, causada pelo desejo de viver,
causada pelo desejo de liberdade.
“A moral e a religião pertencem completamente à psicologia do erro: • Não percebem que é seu destino que reclama dentro de seus
em todos os casos particulares, a causa e o efeito são confundidos; corações. Os homens sufocam seu destino e é na dor que o destino
ou bem a verdade é confundida com o efeito do que se crê como grita por socorro. É o destino em nossos corações que reclama à vida
verdadeiro; ou bem um estado de consciência com a causalidade • Zaratustra nos ensina que falta obstinação ao homem. Falta
desse estado”. (NIETZSCHE) personalidade. Temos que viver conforme o nosso coração. A verdade
está em nós mesmos.
A FILOSOFIA COMO LIBERTAÇÃO (ASSIM FALOU ZARATUSTRA) • Não devemos seguir o rebanho. Temos que deixar de ser gregários.
Temos que adquirir perspectivas pessoais. Temos que ser frios e
“"O que é bom? Tudo que eleve no homem o sentimento de potência, a corajosos.
vontade de potência, a própria potência."(NIETZSCHE) • Tudo que existe possui um destino. O destino do pássaro é voar. O
destino do peixe é nadar. O destino do homem é realizar seu sentido
• A filosofia como libertação se personifica em um dos seus interno.
personagens: Zaratustra. • Temos que descobrir o nosso sentido interno, a nossa natureza. Só
• Zaratustra é aquele que nos ensina o caminho da liberdade, ensina- assim nos tornamos um espírito livre.
nos como devemos ser senhor de si mesmo. • Temos que voltar a ser crianças, pois “a criança é a inocência, e o
• Publicado entre 1883 e 1885, “Assim falou Zaratustra”, é considerado esquecimento, um novo começar, um brinquedo, uma roda que gira
um dos seus principais livros. sobre si, um movimento, uma santa afirmação” (Nietzsche, 2004,
• Neste livro, de forma poética, está condensado toda sua filosofia. p.36)
• Através de Zaratustra Nietzsche criticou os valores morais de sua • A criança é um espírito livre. Ela segue seu sentido interno. Ela é pura
época, desconstruiu a metafísica, denunciou o atraso da educação e espontaneidade, necessidade, liberdade, não sente culpa, não tem
cultura alemã, criticou o estado e a política. malicia, é inocência e sua vida consiste em brincar.
• Mas o que nos interessa em Zaratustra são seus ensinamentos. • Já o adulto é consciente de seus atos, sabe que para viver em
• Ele nos ensina que a dor e o sofrimento são parte integral da vida e sociedade deve abandonar uma grande parte de seus sonhos e
que viver é um processo contínuo de libertação. desejos, pois deve se adaptar as exigências da vida social.
• Zaratustra é o além do homem (Übermensch/Super-homem), pois ele • O homem civilizado vive uma vida inautêntica. É um ser não-livre,
viu muitas coisas, sofreu muito, amou, odiou, foi guerreiro, moral, que sente culpa e remorso pelos seus atos.
experimentou a morte, comemorou a vida. • Para Zaratustra o destino do homem é crescer enquanto indivíduo.
• Em seu caminho cheio de pedras ele superou a si mesmo. • O sentido interno do homem está ligado a sua vontade de potência, a
• Em sua Odisseia ele superou muitos monstros, muitos dragões até sua vontade de crescimento. O que importa é a nossa força interna, a
tornar-se ele próprio, até tornar-se Zaratustra. força vital.
• O que Zaratustra nos ensina é tornar-se a “si mesmo”. Essa é sua • O importante é cumprir o nosso destino individual. Enquanto seres
principal sabedoria. gregários não temos individualidade.
• É isso que devemos aprender com ele, devemos aprender a ser nós • A individualidade é algo que temos que adquirir através do nosso
mesmos. destino pessoal. Temos que viver autenticamente a vida. Temos que
• Não devemos seguir ninguém, não devemos seguir ídolos, nem ser nós mesmos.
mesmo a Zaratustra. • O indivíduo só se torna o que se é por suas próprias forças, ou seja,
• Ele nos exorta a comer muito sal, a aprender com a pedra, que ela é por sua vontade de potência. “E onde há sacrifício, serviço e olhar de
dura, a saber que na dor há esperança e que o destino somos nós que amor há também vontade de ser senhor. Por caminhos secretos
fazemos. desliza o mais fraco até a fortaleza, e até mesmo ao coração do mais
• Quem nunca sentiu dor não sabe o que é a vida. Todos nós temos poderoso, para roubar o poder. E a própria vida me confiou este
Zaratustra dentro do coração, mas também temos um dragão que segredo. ‘Olha – disse – eu sou o que deve ser superior a si
impera com suas regras e normas. mesmo’”.(Nietzsche, 2004,p.96-7)
• Para fazer surgir uma estrela que dance devemos quebrar muitas • O que Zaratustra nos ensina é ser senhor de si mesmo, pois aquele
tábuas de leis. Quem quiser nadar que entre na água. Quem quer, que é senhor de si mesmo é senhor do mundo.
mas não age, apenas deseja e sofre.
• Foi muito difícil a Zaratustra tornar-se si mesmo, foi preciso muita
coragem, foi preciso engolir muito sal. Ele soube reconhecer seu
destino. Ele soube viver sua vida.
• A maior parte dos homens não vive sua vida, não cumpre seu destino.
• Temos que aprender a coisa mais difícil desse mundo: aprender a
viver.
• Viver é saber qual é o nosso destino.
• O destino não pode ser imposto de fora, ele deve ser puro como o
mais fino brilhante, ele vem de dentro de nossos corações, devemos
identificá-lo.
• Quem reconheceu seu destino quer cumpri-lo. Quem deseja amar,
que ame. Quem deseja a liberdade, que se liberte.
• No destino há dor, mas também há esperança. É na dor que
aprendemos qual é o nosso destino. A dor nos ensina a viver.
• Devemos respeitá-la e amá-la como algo necessário.
• Muitos indivíduos não respeitam sua dor, não aprendem nada com
ela. Estão sempre se lamentando e maldizendo a vida. Muitos nem ao
menos sabem por que sofrem.
• Acham que a dor é causada pela falta de dinheiro, falta de amor, falta
de emprego. Se tentassem entender a dor, tudo seria mais fácil.

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