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https://doi.org/10.21747/27073130/ori5a1
Do saber ao ensinar:
contributos teóricos para o ensino do Português Língua Estrangeira
Para ensinar um língua, tenha ela o estatuto que tiver no contexto em que for
ensinada, é necessário que o docente a conheça a fundo, possua um conjunto bem
alicerçado de saberes sólidos sobre ela, em múltiplas áreas. Também é certo que não basta
ter esses conhecimentos aprofundados para se ser capaz de ensinar bem, com eficácia.
Mas, sem possuir os saberes necessários, podemos garantir que não é possível o professor
ensinar adequadamente uma língua. Não se trata de obter conhecimentos teóricos seguros
para os aplicar, depois, nas aulas, transpondo-os, geralmente de forma simplificada,
demasiado simplificada até, mas antes de saber sempre mais e mais solidamente, porque
de uma mais completa e abrangente formação teórica nascem soluções pedagógicas
geralmente mais certeiras e eficientes.
Para um professor poder ensinar eficazmente uma Língua Estrangeira (LE), terá
então de mobilizar um conjunto de saberes seguramente fundamentados. Uns serão,
obviamente, da área das Ciências da Educação, mas hoje, depois da experiência por que
passamos aquando da pandemia e do ensino remoto de emergência, alguns deverão
mesmo consistir em saberes técnicos específicos, ligados às tecnologias de informação.
Mas estes saberes, por mais afinados e mais atualizados que sejam, de pouco valerão se
o docente não conhecer de forma competente a língua que ensina. Quer dizer: pode
fornecer um QRcode aos estudantes, pode propor-lhes tarefas no kahout, pode sugerir-
lhes que as respostas sejam expostas no Padlet, mas o exercício ou a tarefa que lhes
disponibiliza têm de estar corretos, de ser bem pensados e eficazes para a sua
aprendizagem ou então o recurso à tecnologia será pouco útil. A tecnologia ao serviço do
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ensino da língua não serve se o docente não conhecer bem a língua, as suas variedades e
as suas estruturas e regras, se não perceber como é que ela se adquire ou se aprende, com
que outras línguas podemos relacioná-la e de que modo, se não conhecer a(s) cultura(s) e
as literaturas do(s) país (es) em que essa língua se fala.
Neste número da revista Orientes do Português, reunimos um conjunto de reflexões
que têm por objetivo problematizar questões teóricas com repercursões práticas no ensino
de línguas estrangeiras, concretamente, neste caso, do português. Não quisemos limitar-
nos a reflexões sobre o ensino e o estudo da língua propriamente dita, mas alargámos a
consideração do seu ensino à cultura e à literatura, porque, como Weinrich (1983),
defendemos o seu uso na aula de Língua Estrangeira.
Por meio das reflexões sobre a ideia “do saber ao ensinar” que várias especialistas
fizeram e aqui apresentamos, pretendemos reforçar a capacidade de atuação consciente
dos professores, como Fernanda Irene Fonseca propôs, em 2001: “No caso do professor
de língua, é [essencial] assegurar a aquisição de conhecimentos e de uma capacidade de
reflexão sobre a língua que ficam disponíveis para a construção individual de relações
fecundas entre a teoria e a prática.” (Fonseca, 2021: 22). Algumas inspirações vieram-
nos da área da Linguística Pedagógica (Hudson 2020) que visa encontrar soluções para
problemas práticos e pretende ultrapassar a distinção entre linguística teórica e linguística
aplicada, propondo o estabelecimento de uma relação direta entre a linguística e a prática
educativa. Como continua a autora atrás citada, “É que “[...]suscitar a consciência das
dimensões de aplicabilidade [dos conhecimentos] é algo muito diferente de indicar
“modos de aplicação” ou dar “instruções de uso” (Fonseca, 2001: 23), remédios para um
qualquer mal-estar, como se estivéssemos perante instruções para uma máquina pronta a
funcionar.
Este número reúne, pois, um conjunto de artigos que problematizam a aplicabilidade
de diversos campos teóricos da área da Linguística e da Literatura / Cultura ao ensino do
português como língua estrangeira, que passamos a apresentar rapidamente.
No texto “Um olhar psicolinguístico para a LE, também L1, decorrente de uma
abordagem plural à língua(gem) e ao pensamento”, Maria da Graça Pinto, Professora
Catedrática Emérita da Universidade do Porto, olha para a aprendizagem de uma LE de
um ponto de vista psicolinguístico. A autora começa por se debruçar sobre as relações
entre linguagem e pensamento para, a partir dessa discussão, pensar no que se passa com
a aprendizagem de línguas estrangeiras. A exigência de abstração que implica ensinar
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uma língua é essencial para dela termos a distância necessária que nos permita conhecê-
la e ensiná-la. O texto, de leitura exigente, incita a problematizar o ensino de uma LE,
levantando questões que nem sempre são respondidas porque, como diz a autora, “talvez
importe menos a resposta às perguntas deixadas do que o que possam suscitar de
reflexão”. Neste caso, as perguntas deixadas são muito instigantes e motivadoras e o
artigo adianta sustentação teórica para procurarmos refletir sobre elas.
Numa perspetiva que decorre da plasmada no texto anterior, o artigo de Ângela Filipe
Lopes, Doutora em Ciências da Linguagem, na área da Psicolinguística e membro do
Centro de Linguística da Universidade do Porto, intitulado “Ensino-aprendizagem de uma
L2: uma perspetiva processual”, discute alguns conceitos centrais para o tópico, a saber,
aquisição e aprendizagem, processamento procedimental ou declarativo, memória
operatória ou memória de longo prazo, que contribuem para a construção permanente de
uma visão ampla sobre o ensino-aprendizagem de uma L2. O seu objetivo é munir os
docentes ou futuros docentes de L2 de alguns conceitos úteis da área da Psicolinguística,
numa perspetiva pedagógica, problematizando-os.
Maria Aldina Marques, Professora Associada com Agregação da Universidade do
Minho, enquadra a sua reflexão, “Marcas de subjetividade enunciativa e ensino de PLE”,
numa outra abordagem, de tipo enunciativo. Chama a atenção para o facto de que
aprender uma LE é aprender como se interage nessa língua. No artigo, a autora mostra de
que modo “as categorias linguístico-discursivas pelas quais o locutor constrói a sua
(inter)subjetividade podem ser aplicadas ao ensino do PLE”. Para exemplificar as suas
propostas, Maria Aldina Marques analisa as formas de tratamento num conjunto de
mensagens de aniversário. Através dessa análise, a autora sublinha “a importância da
relação entre linguística e ensino da língua, através da relação do conceito de
subjetividade, central na linguística do uso, e um dos mecanismos que a constroem no
discurso, as formas de tratamento”.
No texto “Literatura - Competência (inter)cultural – (P)LE: revendo argumentos,
encurtando distâncias entre os saberes e as práticas”, Micaela Ramon, docente também
da Universidade do Minho, defende a inclusão de textos literários em aulas de LE, apesar
das resistências que essa opção continua a levantar. Experiências recentes bem-sucedidas
aconselham a que se encare “o texto como um instrumento privilegiado de acesso a uma
dada língua-cultura”, dentro de uma abordagem intercultural cujas vantagens são
incontestáveis. Tendo em conta o caráter pluricêntrico da língua portuguesa, o recurso ao
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Referências
WEINRICH, Harald (1983). "En torno el aburrimiento de las clases de lenguas". Anuario
De Letras Modernas, 1: 165-183.
https://doi.org/10.22201/ffyl.01860526p.1983.1.1052
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