Professor Leitor 2

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A FORMAÇÃO DO PROFESSOR LEITOR E SUAS CONTRIBUIÇÕES

PARA A PRÁTICA DO ENSINO DA LEITURA

Daniele Maurina do Nascimento1 - UNESP


Elianeth Dias Kanthack Hernandes2 - UNESP
Camila Sílvia dos Santos3 - UNESP

Grupo de trabalho: Políticas Públicas em leitura


Agência Financiadora: Não contou com financiamento

Resumo

Este trabalho tem como tema a formação do professor leitor e decorre de uma pesquisa mais
ampla que em sua versão final pretende proceder a análise da formação leitora e da prática
decorrente dessa formação, no que diz respeito aos professores alfabetizadores e aos
professores de Língua, egressos de cursos presenciais de Pedagogia e Letras da Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP, campi de Assis e de Presidente
Prudente). Este trabalho investigativo se vincula a um programa de cooperação Acadêmica da
CAPES, e está vinculado a um projeto denominado Leitura nas licenciaturas: espaços,
materialidades e contextos na formação docente. Este texto é resultado dos estudos iniciais
desenvolvidos com a intenção de proceder ao levantamento bibliográfico dos conhecimentos
existentes nas áreas da formação de professores e na área do ensino da leitura. A pesquisa que
dá origem ao trabalho está sendo realizada numa abordagem quali-quantitativa, com análise
bibliográfica e referencial, tendo a finalidade de articular os conhecimentos teóricos já
produzidos com as práticas de ensino de leitura que ocorrem nas séries iniciais da educação
básica. Como procedimentos de pesquisa, utilizamos o levantamento das teses e dissertações
produzidas nos últimos cinco anos que tratam da formação do professor leitor e sua prática.
Os dados levantados foram analisados de acordo com fundamentos teóricos que dão
sustentação ao projeto: concepções sobre a leitura e maneiras de ler como prática cultural
(CHARTIER), a linguagem como instrumento de mediação (VIGOTSKY) e como processo
de enunciação (BAKHTIN). Com este trabalho pretendemos colaborar no desenvolvimento
de um plano de ações para qualificar a formação de leitores.

Palavras-chave: Formação de professores leitores. Leitura. Prática docente na formação de


leitores.

1
Cursa o 4º ano do Curso de Pedagogia na Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – UNESP –
Campi de Marília-SP. Políticas Públicas em leitura. E-mail: daniele.mnascimento@hotmail.com
2
Professora Doutora na Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – UNESP –Campi de Marília-SP
– Departamento de Administração e Supervisão Escolar. Políticas Públicas em leitura. E-mail:
netezeu@gmail.com
3
Cursa o 4º ano do Curso de Pedagogia na Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – UNESP –
Campi de Marília-SP. Políticas Públicas em leitura. E-mail: camilasílvia_92@hotmail.com

ISSN 2176-1396
1791

Introdução

Iniciamos esse texto explicitando que optamos por tomar como objeto de pesquisa a
leitura e a formação e a prática do professor leitor, porque temos a concepção de que a leitura
é prática social essencial à vida contemporânea e meio fundamental de acesso à cultura
letrada e aos conhecimentos produzidos pela humanidade. A pesquisa que dá sustentação a
esse trabalho está sendo realizada como parte do programa de iniciação científica na
Universidade Estadual Paulista – Júlio de Mesquita Filho – UNESP, campus de Marília, onde
a pesquisadora frequenta o último ano da Faculdade de Pedagogia.
Este texto registra uma parte de uma pesquisa mais ampla denominada Leitura nas
licenciaturas: espaços, materialidades e contextos na formação docente, cuja finalidade é
analisar o perfil leitor de universitários ingressantes nas licenciaturas de Letras e Pedagogia,
de quatro universidades brasileiras, apontando princípios, conhecimentos e ações pedagógicas
para a formação de leitores na universidade como espaço privilegiado de mediação da leitura
e de circulação de práticas de leitura. Na versão total do projeto, serão sujeitos da pesquisa
alunos ingressantes e egressos de ambas licenciaturas, em razão de constituírem-se
professores da Educação Básica, que ensinam a leitura e suas práticas.
É importante esclarecer que a aproximação destas pesquisadoras com o tema da
formação do leitor aconteceu nas atividades de ensino, pesquisa e extensão no curso de
Pedagogia. Essas atividades, ao serem realizadas, contribuíram com o delineamento deste
texto que, como dissemos, pretende contemplar as temáticas – da formação de professores
alfabetizadores e de Língua Portuguesa nas séries iniciais do Ensino Fundamental, os efeitos
dessas formações na constituição do professor leitor e as práticas de ensino da leitura,
decorrentes desses processos formativos.
Partimos da concepção de que o tema do ensino da leitura pressupõe pensar na
formação do professor leitor, pois, a leitura é fator essencial no desenvolvimento da
identidade profissional do docente e constitui um instrumento fundamental de sua prática. Isto
porque, a expectativa é a de que o professor seja um mediador no desenvolvimento de
capacidades leitoras, no processo de aprendizagem do aluno, como está explicito nos
Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa – PCNLP - para o ensino
fundamental:
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É tarefa de todo professor, portanto, independentemente da área, ensinar, também,


os procedimentos de que o aluno precisa dispor para acessar os conteúdos da
disciplina que estuda. [...] Muito do fracasso dos objetivos relacionados à formação
de leitores e usuários competentes da escrita é atribuído à omissão da escola e da
sociedade diante de questão tão sensível à cidadania (BRASIL, 1998. p. 32).

O documento citado acima indica que é responsabilidade do professor, tanto o


planejar, como implementar e organizar as atividades didáticas, “com o objetivo de
desencadear, apoiar e orientar o esforço de ação e reflexão do aluno, procurando garantir
aprendizagem efetiva”. Nos PCNLP, é também destinado ao professor o “papel de informante
e de interlocutor privilegiado, que tematiza aspectos prioritários em função das necessidades
dos alunos e de suas possibilidades de aprendizagem” (BRASIL, 1998, p.22).
Outro tema de igual alcance e importância na atualidade é o da “formação do
professor”. Falar sobre a formação de professores no Brasil é fazer uma reflexão do seu papel
no contexto atual da escola. Nas últimas décadas, o tema da formação de professores tornou-
se central no cenário acadêmico brasileiro e na mídia em geral. O cenário atual aponta a
necessidade de, além de pensar a formação de forma crítica e reflexiva (SHÖN, 1997;
NÓVOA, 1997; PIMENTA, 2006; LIBÂNEO, 2006; TARDIF, 2002; SAVIANI, 2008)
organizada a partir de uma formação inicial que apresente um olhar mais cuidadoso e
analítico para a recomposição do espaço acadêmico, articulando-o ao debate sociopolítico da
educação. Sobre a importância de articular a formação dos profissionais com as instituições
formadoras e os espaços de atuação profissional fica evidenciado no discurso de Nóvoa
(1997, p. 28):

[...] da mesma maneira que a formação não se pode dissociar da produção de saber,
também não se pode alhear de uma intervenção no terreno profissional. As escolas
não podem mudar sem o empenho dos professores; e estes não podem mudar sem
uma transformação das instituições em que trabalham. O desenvolvimento
profissional dos professores tem de estar articulado com as escolas e os seus
projetos.

Quando optamos por estudar o tema da “formação do professor leitor e suas


contribuições para a prática do ensino da leitura”, fomos pesquisar no banco de teses e
dissertações da CAPES, os trabalhos que tinham como foco esta temática. O que
encontramos, ou deixamos de encontrar, já justificaria a pertinência deste trabalho. Dos
trabalhos encontrados tendo como referência a categoria “o professor leitor e sua prática”,
identificamos 44 registros, sendo que em apenas 2 deles havia uma preocupação explícita em
articular a formação do professor leitor e a sua prática docente que objetiva a formação de
novos leitores.
1793

Optamos por utilizar neste trabalho investigativo procedimentos de pesquisa de caráter


quali-quantitativos, com a finalidade de articular as nossas intenções às diretrizes propostas
no projeto do qual decorre. O estudo, em sua totalidade, pretende dar visibilidade a essas
práticas de ensino da leitura, cotejando-as com as ementas dos Planos de Ensino dos cursos de
formação de professores e com as experiências de leituras vivenciadas e declaradas por esses
sujeitos, nos espaços acadêmicos em que cursaram a licenciatura. Como procedimentos de
pesquisa estão sendo utilizados: 1) a aplicação de um questionário aos universitários
ingressantes no ano letivo de 2015; 2) Análise das ementas dos Planos de Ensino dos
professores dos cursos de Letras e Pedagogia; 3) Encontros de estudo com os sujeitos da
pesquisa nos moldes de grupos de discussão (WELLER, 2006).
Os dados levantados foram analisados de acordo com fundamentos teóricos que dão
sustentação ao projeto: concepções sobre a leitura e maneiras de ler como prática cultural
(Chartier), a linguagem como instrumento de mediação (Vigotsky) e como processo de
enunciação (Bakhtin). Concordamos que professores e alunos devem ter assegurado o direito
ao exercício de práticas sociais significativas de leitura, para ampliar suas competências como
leitores e produtores de textos de diferentes gêneros. Não qualquer leitura, mas uma leitura
aberta e crítica, não imposta e obrigatória, mas vinculada a situações sociais reais.
Evidenciamos aqui que é função das escolas a formação de leitores plenos, portanto,
professores e alunos precisam ler, escrever, pensar criticamente, ter condições de realizar
atividades de leitura, não só em sala de aula, mas também em múltiplos espaços culturais que
a escola e a sociedade oferecem.
O entendimento da relevância do papel do ensino da leitura e da constituição do
professor leitor, para que esse ensino ocorra de forma plena, é que provocou o desejo e firmou
a nossa intenção de focar esse trabalho de investigação científica sobre o lugar da leitura e do
professor leitor na ação política mais atual e abrangente.
Partimos do princípio que estamos lidando com sujeitos de diferentes formações e
histórias profissionais, inseridos em contextos múltiplos de investigação, evidenciando a
necessidade de que a pesquisa nos mobilize e faça sentido para o contexto sócio, histórico e
cultural em que estamos inseridos. Por isso, a metodologia empregada utiliza a revisão
teórico-bibliográfica, pesquisa exploratório-descritiva, de caráter investigativo que nos
forneceram elementos para a construção dos conceitos de leitura e formação do professor
leitor.
1794

O conceito de leitura assumido neste trabalho

Ao focarmos nossos estudos sobre a importância do professor para a formação de


leitores proficientes, não desejamos atribuir somente a ele a responsabilidade de garantir aos
alunos o desenvolvimento das capacidades de leitura. Temos clareza que esse é um problema
relacionado com as desigualdades sociais, com as oportunidades de acesso aos livros e à
cultura letrada, como um todo. Consequentemente, é fato sabido que a maioria dos alunos das
escolas públicas tem os primeiros contatos com um acervo de livros e textos de qualidades
minimamente reconhecidas, apenas ao entrar na escola de ensino fundamental. Esse fato torna
ainda mais significativo o papel de mediação que é conferido aos professores desse nível de
ensino.
Da mesma forma que constatamos a realidade acima descrita, percebemos também,
nos programas de extensão voltados para a formação continuada de educadores que temos
tido oportunidade de participar - como professor responsável pela formação ou como aluno
bolsista -, o pouco contato dos professores com as atividades de leitura de livros. Por
exemplo, podemos detectar nos encontros oportunizados por nossa ação extensionista, que
raramente, o professor alfabetizador ou mesmo o de Língua Portuguesa consegue recordar do
último livro literário que leu na íntegra. Apesar de isso ser surpreendente, não devemos nos
esquecer de que “o ato de ler é um processo trabalhoso que exige, como salienta Ricardo
Azevedo “esforço, treino, capacitação e acumulação” (Apud, SOUZA, 2004, p. 23).
A concepção de leitura para Freire (1994) pressupõe o entendimento de que o ato de
ler se distancia dos tradicionais entendimentos do termo como decodificação de grafemas em
fonemas e a sonorização de um texto escrito. Esse teórico defende que a leitura começa na
compreensão do contexto do leitor e que a leitura da palavra é precedida da leitura de mundo
e que a compreensão do texto acontece por intermédio de uma leitura crítica que demanda
estabelecer relações entre o texto e o contexto.
Kleiman (1989) afirma que a concepção de leitura numa visão interacionista assume
que o sentido não é algo dado somente pelo texto, mas é produzido pelo leitor a partir dos
conhecimentos prévios que traz para essa atividade interativa, de suas finalidades ao proceder
a leitura e de sua ação sobre a materialidade linguística presente no texto. Essa concepção
permite que o aluno e o professor concebam a leitura como processo de construção do sentido
entre o leitor (sujeito individual e social), o texto (determinado histórica e socialmente) e o
autor (sujeito histórico e datado) e as práticas sociais onde ocorrem essas interlocuções.
1795

Já para Foucambert (1994) a leitura significa questionar o mundo e construir novas


respostas a partir do texto lido, integrando as novas informações às existentes anteriormente.
Aproximando sua concepção à de Freire (1982) Resende (1993) entende a leitura como
abertura ao mundo que permite reinaugurar o que já era sabido.
Jouve (2002) traz várias definições do tema:

[...] a leitura apresenta-se [...] como uma atividade de antecipação, de estruturação e


de interpretação (p. 18). O sentido que se tira da leitura [...] vai se instalar
imediatamente no contexto cultural onde cada leitor evolui. Toda leitura interage
com a cultura e os esquemas dominantes de um meio e de uma época (p. 22).

Tendo esses autores como referência e com a finalidade de analisar como os cursos de
formação de professores trabalham a leitura em seus currículos e, como é ensinado ao
professor os encaminhamentos que deve dar à sua prática para melhor ensinar seus alunos a
lerem com proficiência, em um primeiro momento deste trabalho, fomos aplicar um
questionário aos alunos ingressantes dos cursos de Pedagogia questionando sobre o repertório
de cultura letrada e as práticas de leitura que possuem ao iniciar seu processo de formação
inicial.

A coleta de dados: O questionário

No início do ano letivo de 2015, um grupo de pesquisadores do Programa Nacional de


Cooperação Acadêmica interinstitucional - PROCAD, vinculado à Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. CAPES, elaborou um questionário piloto para
ser aplicado aos alunos ingressantes dos cursos de Pedagogia e Letras, que tinha a finalidade
de servir como referência para a formatação do questionário a ser aplicado junto aos alunos
ingressantes e concluintes desses cursos, em algumas universidades parceiras no PROCAD,
para o desenvolvimento de uma pesquisa que estuda o tema: Leitura nas licenciaturas:
espaços, materialidades e contextos na formação docente.
Ao estudarmos o tema da formação do professor leitor e suas contribuições para a
prática do ensino da leitura, e estando diretamente vinculadas ao PROCAD, começamos nossa
coleta de dados junto aos sujeitos de pesquisa – ingressantes, concluintes e egressos dos
cursos de licenciatura em Pedagogia e Letras – analisando as respostas dadas por esses
sujeitos ao se colocarem na condição de respondentes do questionário piloto.
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O questionário foi elaborado de forma interativa e processual, envolvendo os


pesquisadores de quatro universidades envolvidas no projeto e contou com oitenta e sete
questões organizadas da forma exposta no quadro a seguir:
Quadro I - Número de questões por tema no questionário aplicado
Nº de questões por
Tema das questões
tema
Perfil pessoal 13 questões
Informações sobre escolaridade 09 questões
Leituras realizadas habitualmente 16 questões
Suporte, frequência e tempo de leitura 12 questões
Espaços e disposições físicas de leitura 07 questões
Preferências de leitura 03 questões
Papel das instituições e mediadores de leitura 04 questões
Táticas e estratégias de leitura 22 questões
Fonte: Dados organizados por pesquisadores do Programa Nacional de Cooperação Acadêmica interinstitucional
- PROCAD, vinculado à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, com base nos
questionários aplicados nos cursos de Pedagogia e Letras.

Para dar maior significação aos dados que conseguimos coletar, é importante informar
que foi cinquenta e oito o total de sujeitos respondentes. Todos eles são alunos ingressantes
do curso de Pedagogia de uma universidade pública estadual do Estado de São Paulo, e alguns
são alunos que frequentam esse curso no período vespertino e outros no período noturno.
Diante do volume de dados coletados, optamos, nos limites deste texto, por fazer
alguns recortes que estão mais voltados para as preocupações assumidas por nós, na
realização deste trabalho de pesquisa. Com esta intenção, selecionamos como categoria de
análise o item o “papel das instituições e mediadores de leitura”, que, no nosso entender,
ajuda a pensar a temática sobre a qual nos dedicamos neste estudo. A questão que escolhemos
para refletir foi a seguinte: “Cite algum fato, sujeito, objeto, espaço, prática, experiência ou
rotina que tenha sido relevante para a sua história de leitor” Com essa proposta, tínhamos a
intenção de buscar identificar quais os espaços e/ou os sujeitos que foram responsáveis pela
mediação da leitura para esses futuros professores. É interessante destacar que dos cinquenta
e oito licenciandos ingressantes do curso de Pedagogia que responderam ao questionário,
trinta e nove deles não tiveram o que indicar nesse item, ou seja, não reconheceram as
instituições escolares pelas quais passaram e nem os sujeitos com os quais conviveram nesses
espaços, como mediadores nas suas trajetórias de formação leitora.
Na perspectiva defendida por Vygostky (1989) a mediação a que nos referimos
aqui, é vista como um processo interativo e sócio histórico, ou seja, na concepção desse
1797

teórico que também assumimos, é na interação com o outro, um sujeito social mais
experiente que o homem se constitui como tal e constrói conhecimentos, Assim, a
participação do grupo social (mediadores) é fundamental porque esse processo de mediação
se dá a partir das relações interpessoais entre os sujeitos. Para o autor:

O aprendizado desperta vários processos internos de desenvolvimento, que são


capazes de operar somente quando a criança interage com pessoas em seu ambiente
e quando em cooperação com seus companheiros. Uma vez internalizados, esses
processos tornam-se parte do desenvolvimento independente da criança (1989, p.
101).

A importância da figura do mediador fica evidenciada quando Revoredo


(2010) afirma que esse sujeito é aquele que vai se configurando à medida que forma outros
leitores, sendo portador de uma função muito necessária na constituição de leitores
proficientes. Da mesma forma, os espaços e instituições escolares, como as salas de aula e
as bibliotecas escolares, deveriam ser locais destinados ao desenvolvimento das
capacidades de leitura, espaços de mediação na formação de sujeitos leitores. Sendo assim,
o fato de mais de 67% dos futuros professores não terem reconhecido na sua trajetória
acadêmica nenhum fato, sujeito, objeto, espaço, prática, experiência ou rotina que tenha
sido relevante para a sua história de leitor.

Talvez isso possa ser explicado no fato de que professores e instituições escolares
ensinam a ler, mas não propõem tarefas que envolvam práticas sociais reais de leitura e
escrita, para que os alunos pratiquem e desenvolvam a competência leitora. Infelizmente,
mesmo com toda a produção teórica na área do ensino da leitura, ainda muitos docentes
consideram que esse conhecimento é uma habilidade que é adquirida em processos mecânicos
e individuais, em que a decodificação de grafemas em fonemas é a base da aquisição dessa
competência.
Consideramos que é fundamental que os futuros professores vivenciem práticas reais
de leitura durante sua formação inicial, para que ela seja significativa e consequente para uma
profissionalização, resultante de escolhas didáticas coerentes com as necessidades de leitura
dos seus alunos. Não qualquer leitura, mas aquela que traz como consequência a emancipação
e autonomia e é defendida por Silva (1998) quando afirma: “dessa forma a leitura crítica,
aquela que desvela, mostra e exige posicionamentos, pode colaborar significativamente na
mudança de rumos, na saída do mundo da opressão e, consequentemente, na busca de uma
vida mais feliz e produtiva em sociedade” (1998, p. 73).
1798

Temos como pressuposto que a formação do professor envolve mais elementos do que
aqueles contidos no espaço-tempo de formação e de atuação: a escola e a educação formal.
Evidentemente esse processo de formação inicia-se antes da escola, mas se prolonga além da
escola, mas esse fato não retira da formação inicial a responsabilidade por ampliar a cultura
letrada e por oportunizar aos licenciandos a vivência de práticas sociais reais de leitura de
textos de diferentes gêneros e variados propósitos.
Concordamos com os teóricos que têm defendido a necessidade de focar os aspectos
que estão relacionados com a formação de professores para buscar alternativas de qualificação
docente (Tardif, 2002; Freire, 2001; Guimarães, 2004: Gatti, 2010). Defendemos a ideia de
que a formação plena como leitor é um dos aspectos fundamentais para se obter a qualificação
docente defendida por esses e outros teóricos. A falta de oportunidade de ampliar a cultura
letrada por intermédio de mediações que deveriam ser proporcionadas nos espaços escolares,
pode explicar, no nosso entender, os resultados obtidos em outra questão constante no
instrumento de pesquisa, que analisaremos a seguir
Ao serem indagados sobre a frequência com que leem, quando o objeto de leitura são
outros textos que não os das leituras necessárias para atividades escolares/acadêmicas, apenas
32% dos respondentes afirmaram que o fazem diariamente. Já cerca de 20% leem, nessas
circunstâncias, semanalmente. O que mais surpreende é o fato de 32% dos futuros professores
admitirem que nunca leem ou só o fazem só raramente quando não precisam atender as
demandas acadêmicas.

Conclusões parciais

Este trabalho teve como objeto de estudo o tema da formação do professor leitor está
vinculado a uma pesquisa mais ampla que em sua versão final pretende proceder à análise da
formação leitora e da prática decorrente dessa formação. Este texto é resultado dos estudos
iniciais desenvolvidos com a intenção de proceder ao levantamento bibliográfico dos
conhecimentos existentes nas áreas da formação de professores e na área do ensino da leitura.
Numa abordagem quali-quantitativa e com análise bibliográfica e referencial,
procuramos articular os resultados obtidos na aplicação de um questionário que tinha o
objetivo de levantar o perfil de leitura de alunos ingressantes no curso de Pedagogia, com os
conhecimentos teóricos/científicos produzidos na área da formação do leitor e do ensino da
leitura. Desse cotejamento, ficou evidenciado que a maioria dos futuros professores não
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reconhece na escola e nem nos educadores o papel de mediação no ensino da leitura que
julgamos ser inerente desses espaços e sujeitos.
Ao assumirmos que é responsabilidade do professor tanto o planejar, como
implementar e organizar as atividades didáticas, com o objetivo de desencadear, apoiar e
orientar o esforço de ação e reflexão do aluno sobre os muitos textos que circulam nesses e
em outros espaços sociais, com vistas a garantir aprendizagens efetivas das capacidades
leitoras. Assumimos também ser responsabilidade da escola garantir objetivamente que isso
ocorra. Por isso, entendemos que existe um caminho longo, mas inquestionável na revisão dos
currículos e encaminhamentos dos cursos de formação inicial de professores responsáveis
pelo ensino da leitura na educação básica, para que isso ocorra.

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