DINÂMICA ESPELEOLOGICO DA SINCLINAL CARSTICA DE ITUAÇU

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 22

DINÂMICA ESPELEOLOGICA DA SINCLINAL CÁRSTICA DE

ITUAÇU - BA

Speleological Dynamics of the Sinclinal Cárstica de Ituaçu, Bahia

Nei Alves Gondim Junior;


Grupo Araras de Espeleologia. Geófago (UNEB); Graduado em tecnologia de administração de
pequenas e médias empresas (UNOPAR); Especialista em gestão ambiental (FTC);
nei.junior.ituacu@hotmail.com.

Manoel Alves de Oliveira;


Professor Adjunto do curso de Geografia da UNEB, coordenador do grupo de pesquisa Geografia e
transformações contemporâneas, coordenador dos laboratórios de Estudos ambientais e de Audiovisual do Campus VI
mano.geografia@gmail.com

RESUMO

O estudo analisa a dinâmica espeleologia da sinclinal cárstica do município de Ituaçu, Bahia, com vista a compreender a
influência da ação antrópica nesse ambiente, partindo da hipótese de que as operações de lavra de indústrias cimenteiras
potencializam os riscos geotécnicos no sistema endocárstico. Foi utilizado o método hipotético dedutivo, com dados de campo,
produção de mapas, perfis topográficos, processamentos de imagens de satélite e radar, com geoprocessamento. Os dados foram
correlacionando, tendo como suporte os teórico que tratam sobre tema. A relevância do estudo se consubstancia em poder sugerir
um modelo para a gestão mais adequada do sistema cárstico, além da aplicação de práticas menos invasivas para a extração do
calcário no município de Ituaçu.

Palavras-chave: Carste. Empreendimentos Cimenteiros. Espeleologia. Cavernas.

ABSTRACT

Keywords: Karst. Cement enterprises. Caving. Caves.

INTRODUÇÃO

Pensar na existência do planeta como abrigo para tantas espécies de vida é salutar, sobretudo, como o
ser humano ao longo de sua trajetória vem relacionando-se com a natureza, e como esta “nova sociedade”
tem causado danos irreparáveis devido aos padrões de desenvolvimento econômicos idealizados, e a
inconsequência no uso dos recursos naturais, principalmente no que concerne à exploração do solo e
subsolo, como as que ocorrem em áreas cársticas, através de atividades minerárias.
A zona do carste, onde incluem-se os condutos subterrâneos, encontra-se paisagens únicas do
modelado terrestre, relevos ruiniformes produzidos por atuação da água sobre rochas solúveis,
configurando-se de relevante importância geológica, além do notável valor científico e cultural, por abrigar
em suas cavidades naturais um dos mais ricos acervos arqueológicos e paleontológicos do planeta. Trata-se
de uma área de grande fragilidade, que com a operação de lavras pode deflagrar processos que induzem os
riscos geotécnicos, como colapso de solo e rocha, subsidências, poluição dos aquíferos, dentre outros.
Nesse contexto, insere-se o município de Ituaçu, marcado por vale de dissolução cárstica, em que a
geomorfologia local abriga diversas cavidades naturais constituídas ao longo de milhões de anos, que vem se
transformando e compondo paisagens de importância espeleológica. Por possuir significativas jazidas
calcárias, de onde se extrai a matéria prima fundamental à indústria de construção civil, o município atrai
empreendimentos cimenteiros.
Baseado nessas premissas, partiu-se da hipótese de que operações de lavra de indústrias cimenteiras
poderão potencializar riscos geotécnicos no sistema endocárstico de Ituaçu. Assim, a pesquisa apresenta o
objetivo de compreender a dinâmica espeleológico da sinclinal cárstica ituacuense. Para tanto, buscou-se
realizar o levantamento de condutos e cavidades prospectáveis da sinclinal cárstica; Investigar ocorrência de
processos de dolinamento e colapso nas adjacências dos empreendimentos cimenteiros; a caracterização das
áreas de fragilidade do ambiente cárstico através da produção de mapas e perfis; correlacionando os dados
de campo com os teóricos que tratam sobre as fragilidade do ambiente carste, tendo a paisagem como
categoria de análise.
As principais contribuições teóricas foram sobre o modelado terrestre, a morfologia cárstica,
materiais constituintes, dinâmica e evolução, ciclo da água subterrânea e sua ação geológica em ambientes
cársticos, assim como, os fatores que influenciam na modelagem desse relevo, como o potencial de
infiltração, precipitação, topografia geologia e solos frente às mudanças ambientais, os processos que afetam
a gênese e o desenvolvimento das cavernas como as atividades minerárias, como subsídios para a geografia
ambiental aplicada e elaboração de planos de manejo de áreas cársticas.

LOCALIZAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO

O Município de Ituaçu está localizado na microrregião homogênea de Brumado, Região de


planejamento Serra Geral, região administrativa (019), situado no centro sul baiano (Mapa 1). Apresenta
uma área de 1216,15 Km2, tendo como coordenadas - 41.29º de longitude e –13.81º de latitude, (IBGE,
2008). Integrando a região econômica da Serra Geral, a sede está situada a 495 km da capital do Estado.
Compondo o semiárido, tem como municípios confrontantes: Barra da Estiva, Contendas do Sincorá,
Tanhaçu, Jussiape, Rio de Contas e Brumado. O clima predominante segundo a classificação de Kopller, é
o Bsh, no qual são distintas duas estações anuais: uma seca normalmente prolongada, e outra chuvosa, mais
curta e regular. A temperatura média anual é de 22,6º C. As médias pluviométricas oscilam entre a mínima
de 232 mm e a máxima de 1.585mm o que resulta numa média de 688 mm.
A área de estudo compreende o vale de dissolução cárstica, nas imediações das instalações dos
empreendimentos cimenteiros, Itaguarana S/A, Companhia Baiana de Cimento (CBC) e Votorantin,
abrangendo uma área aproximada de 698.574 m², localizada na porção central do vale no município de
Ituaçu, estando entre as coordenadas, (S 13º 48.560’ - W 041º 17.225’) Norte e (S 13º 55.889’ - W 041º
17.194’) Sul.
Mapa 1 – Bahia: Localização do município de Ituaçu.
Fonte: SEI-BA, 2012

De acordo com Santos (1998), a paisagem cárstica estudada insere-se na extremidade sul-sudeste da
Chapada Diamantina, no sinclinal com eixo orientado na direção N-S conhecido como sinclinal de Ituaçu,
situado no sub-domínio da Chapada, constituída predominantemente por um conjunto de rochas sedimentares
que foram depositadas durante o Proterozóico Médio Superior. Segundo o autor a geologia local é
caracterizada por rochas carbonáticas do supergrupo São Francisco grupo Bambuí, encontrando-se este
edificado por calcarenitos horizontalizados, cinza, com lâminas irregulares de calcita. Soares (op. cit)
destaca que a geomorfologia regional caracteriza-se por serras com formações de grande valor cênico
pertencente ao domínio das bacias e coberturas sedimentares, região do Bambuí e unidade geomorfológica
dos pediplanos carstificados onde o modelo de dissolução é uma combinação de carste em exumação e
carste coberto. Ainda com relação à geomorfologia destaca que temos um relevo colinoso com calcários
esculpidos formando nuanças paisagísticas, que sustentam inúmeras cavidades naturais, evidenciando seu
grande potencial espeleológico conforme a Fotografia 1 da paisagem local.

Fotografia 1: Vale de dissolução cárstica (Sinclinal de Ituaçu). Fonte: Trabalho de campo, 2013.
O exocarste é caracterizado pela presença de dolinas, paredões rochosos, sumidouros, cones, lapiás 1
e vales cegos. O endocarste está associado a um grande número de cavernas de pequeno, médio e grande porte,
destacando-se aquelas localizadas na Serra das Araras (Icó, Lapa do Bode, Parafuso, Cortinas e Coroás), Morro
dos Peitos (Pé do Morro, Angicos, Cainana), Serra da Mangabeira (Gruta do Mandacaru e Gruta da Mangabeira,
considerada uma das importantes cavernas do Patrimônio Espeleológico Nacional). (SOARES, 1998).
No que concerne à vegetação, encontra-se no domínio da Savana Estéptica, conhecida popularmente
como Caatinga. Este tipo de cobertura vegetal, devido à seca excessiva (na atualidade), está associado a
plantas com adaptações biológicas à extrema aridez
Com relação à hidrografia destaca-se o rio Mato Grosso pertencente a bacia do rio das Contas. O mesmo,
meandra por toda sinclinal, recebendo vários riachos tributários com destaque para os riachos Tamanduá, Sarapião
e Sussuarana. Vale ressaltar que nesta região cárstica a litologia apresenta rochas com alto grau de solubilidade
assim a hidrologia tem uma variável que não existente em outros sistemas, que é o transporte da água em condutos.

MATERIAIS E MÉTODOS

Os métodos utilizados foram o hipotético dedutivo, o estatístico e o comparativo, destinados à análise de


dados empíricos, mapas, perfis topográficos e fotografias que retratam como se comporta a paisagem cárstica da
área estudada. O método hipotético-dedutivo proporcionou o norteamento necessário ao estudo, pois viabilizou
uma abordagem que busca a eliminação de erros da hipótese formulada, contribuindo com a comprovação
teórica através de aplicações empíricas das conclusões deduzidas.
Com base nesse método, a pesquisa passou pelas etapas de levantamento de campo, com teçicas de
observação in loco. Quanto ao método de procedimentos optou-se pelo comparativo, buscando estudar as
diferenças e semelhanças com vista a explicação das divergências. Segundo Lakatos (2005), os procedimentos
(comparativo) busca a explicação dos fenômenos, permitindo, assim, uma análise concreta dos dados,
possibilitando dedução de elementos constantes, abstratos e gerais. Esses procedimentos foram realizados
mediante controle rigoroso, onde os resultados proporcionaram o estabelecimento de alto nível de generalização.

Procedimentos metodológicos

Para a realização do levantamento das áreas de ocorrência de cavernas na região cárstica de Ituaçu,
remeteu-se a uma estrutura metodológica de pesquisa que combinou estudos de campo e de escritório.
Assim, nos processos de caminhamentos e prospecções em campo, foram realizadas técnicas, tais como as
de pesquisa espeleológica e as verticais pelas características da paisagem cárstica. No campo, foram
utilizados os equipamentos: aparelho de sistema de posicionamento global (GPS - Garmin ETREX
VENTURE HC), para obtenção das coordenadas geográficas e altitude; equipamentos específicos de

1
Caneluras ou regos paralelos que entalham a superfície das rochas. São mais comuns e bem estruturados nas rochas solúveis
como o calcário.
espeleologia (carbureteiras, lâmpadas, capacetes, equipamentos de rapel com ascensão, bússola de
irradiação, clinômetro, trena e câmara fotográfica, facão, etc.); no escritório, edição de texto no Word da
Microsoft Windows.
No início do trabalho de campo foi feito o levantamento de informações existentes, com pesquisas
em diversas fontes que possuem informações sobre o conjunto espeleológico que já fora reconhecido na área
estudada. Essas informações foram consultadas junto aos cadastros do Centro Nacional de Pesquisas e
Conservação de Cavernas (CECAV), Sociedade Brasileira de Espeleologia e o Cadastro Nacional de
Cavernas (CODEX) da Redespeleo Brasil. Com base nesses dados, foram coletadas informações em fontes
secundárias com moradores da região. A escolha das amostras seguiu o critério de conhecimento do lugar,
assim foram realizados contatos com pessoas mais antigas, mateiros, caçadores, guias de turismo e
trabalhadores de pedreiras. As entrevistas tornaram-se uma importante fonte de informação, pois ao tempo
em que eram realizadas, surgiam mais informações sobre o objeto de estudo.
Após essa etapa realizou-se o levantamento cartográfico, que envolveu pesquisas em cartas
topográficas, mapa geológico, mapa geomorfológico e imagens de satélite. Esses instrumentos foram
importantes tanto para o reconhecimento da paisagem das áreas diretamente afetadas e as de influência
direta dos empreendimentos minerários em questão, quanto para o reconhecimento de feições geológicas e
geomorfológicas que tenham o potencial para ocorrência de cavernas. As imagens de satélite foram
essenciais para distinguir na área as classes de vegetação, cultivo, solo exposto, urbanização e a hidrografia,
configurando-se como importante instrumento para definirmos as estratégias de prospecção.
A partir da pesquisa bibliográfica e das informações sobre o conjunto espeleológico da área, a foi
realizada a avaliação do potencial de cavernamento, que combinou informações referentes a registros
espeleológicos, trabalhos científicos e estudos ambientais anteriores, mapas geológicos, mapas
geomorfológicos e imagens de satélite. Baseando-se nesses dados, a área delimitada em zonas de alto, médio
e baixo potencial de ocorrência de cavernas.
Com a delimitação, as informações foram cruzadas com a situação contextual dos empreendimentos
minerários, onde a estratégia do levantamento concentrou nas áreas diretamente afetadas, nas proximidades
das áreas de lavra. Para tanto, na área delimitada do estudo foi criada uma malha de prospecção mais densa
para as diretamente afetadas com 100 metros e uma menos densa para as de influência direta com 200
metros, buscando identificar o maior número possível de ocorrências espeleológicas, em trabalho de
caminhamento um caráter exaustivo.
A malha tomou proporções variáveis, em decorrência das anomalias da paisagem (características
morfológicas), e de visualização em decorrência das dificuldades de caminhamento e encobrimento por
vegetação. Nas áreas de mata fechada fez-se um caminhamento com malha mais densa e, nas de campo
aberto, que tem maior facilidade de visualização, uma malha menos densa, com quadrantes maiores. Para
tanto nessa fase da pesquisa, foi fundamental a elaboração de uma ficha-cadastro utilizada para registrar
cada cavidade encontrada.
A documentação do trabalho de campo, constituiu em uma tabela, contendo os seguintes dados:
registro de coordenadas geográficas das cavernas encontradas, pelo sistema de posicionamento global,
obtidas com aparelho de GPS, em graus, minutos e segundos decimais, utilizando a configuração datum
WGS 84, com sinais de um mínimo de 4 satélites, nos pontos da base topográfica das entradas
endocarsticas; denominação do local em que a cavidade esta inserida; descrição das entradas e suas formas
de acesso; altitude; e registro fotográfico.
Concluída a fase de levantamento, os dados obtidos forma tratados com vista a uma exposição lógica
do trabalho. Nessa organização, além da utilização das informações disponíveis, foi importante a utilização
da base de representação cartográfica adequada e compatível com os objetivos propostos. Por ser uma área
relativamente pequena, para a apresentação dos resultados foram elaborados mapas e perfis de acordo com a
proposta. No laboratório, as análises realizadas com uso de sensoriamento remoto e SIG, com o Sistema de
Processamento de Informações Georreferenciadas (SPRING) do Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE),
versão 5.2.5 para Windows.
Com o uso do SPRING, inicialmente foi formado um banco de dados, definido o projeto com o
retângulo de estudo, projeções cartográficas e datum, assim como categorias com os seus respectivos
modelos (Imagem, MNT, Temático). No banco de dados também se criou os Planos de Informações (PI’s),
de acordo com a natureza da informação, sendo que, para a categoria temática foram definidas as classes
temáticas, tendo com critérios características do local e a representação da realidade no sistema. Dados
como importação e exportação de arquivos, geração e fatiamento da hipsometria, perfis, extração automática
da rede de drenagem, digitalização de arquivos vetoriais e matriciais e pontos de coletas do GPS, dentre
outros, processados no modulo principal do SPRING, sendo que a representação final das cartas geradas no
modulo SCARTA, do mesmo sistema.
Nesse levantamento, gerou-se mapas da área delimitada para o estudo com categoria de relevo,
hipsometria, rede de drenagem, amostras das principais cavernas e mapa 3 D da sinclinal cástica de Ituaçu.
Para uma melhor leitura e interpretação dos mapas, foram criados perfis topográficos entre as principais
cavernas e áreas de lavra. Ao final, os dados analisados e interpretados de forma a verificar as inter-relações.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

A prospecção espeleológica foi parte fundamental do estudo, consistiu na procura de cavernas


existentes da sinclinal cártica de Ituaçu, identificando, explorando e georeferenciando tais cavidades. Para
tanto, fez-se necessária a aplicação de técnicas: campo e laboratório. Na foto 1, indicam-se técnicas de
prospecção aplicadas no campo (na Serra das Araras, em Ituaçu).
Foto 1: Ituaçu – BA: Prospecção da Gruta das Cortinas - 2014

Prospecção na gruta das cortinas.Abismo com 50 mts de


desnível, onde só pode ser acessado utilizando-se de
técnicas verticais aplicadas à espelologia.

Fonte: Trabalho de campo – Nei Gondim (2014)

Foram identificadas e catalogadas 67 cavidades naturais, que foram organizados em uma tabela de
forma a proporcionar futuros cadastramentos junto a base de dados da Sociedade Brasileira de Espeleologia
(SBE) e o Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Cavernas (CECAV).
Parte dessas cavernas encontra-se em áreas ainda pouco exploradas como na Serra das Araras, dentre
as quais dezessete foram prospectadas: Lapa do Bode, Gruta do Parafuso, Gruta das Cortinas, Gruta dos
Coroás, Lapa do Icó, Gruta das Barrigudas, Gruta da Figueira, Gruta dos Inchus, Gruta do Mandacaru e
Cauãn na Serra da Mangabeira, Lapa das Onças na área de licença DNPM - Itaguarana S/A; Caverna Pé do
Morro, Cainana e Angicos no Morro dos Peitos, licença DNPM - Companhia Baiana de Cimento (CBC);
Lapa do Guerreiro na Serra do Riacho, licença DNPM Votorantim S/A e a Gruta da Mangabeira. Ainda
merece ser citada a descoberta da Gruta de Dona Senhora (Amostra 11, Mapa 1), uma caverna em formação
que tem a sua entrada no fundo de uma dolina de colapso, situada na comunidade Bonito.
O mapa 1 mostra a hipsometria com a rede de drenagem da Sinclinal cárstica de Ituaçu, e o registro
das mais significativas cavernas, evidenciando também as futuras áreas de lavra dos empreendimentos
cimenteiros. Nesse mapa exibe a distribuição local das principais direções de fluxo onde a drenagem flui
para a bacia do rio Mato Grosso que corta a Sinclinal no sentido norte sul.
Mapa 1: Ituaçu – BA: Sinclinal Cárstica de Ituaçu, hipsometria, drenagem e pontos de amostras - 2014

Tratando-se de uma região com embasamento de rochas carbonáticas, favoráveis à intensa


carstificação, entendem-se que tal modelado se configura como domínio paisagístico de grande fragilidade. Piló
(2000), considera este relevo com características peculiares por possuir elementos que os diferenciam no contexto
de uma análise ambiental, vez que, para melhor entender este ambiente, em primeiro lugar é preciso compreender o
aspecto hidrológico, pois quando ocorre um maior nível de desenvolvimento, a rede de drenagem superficial
diminui de maneira considerável, e em certos casos deixa de existir, correndo em subsuperfície através de condutos.
Assim, as águas superficiais passam para aquíferos que integram uma rede subterrânea onde a água flui de forma
livre e rápida, proporcionando a erosão mecânica e o alargamento de condutos.
Nesta conjuntura, também há de se destacar esse diferencial, onde no circuito subterrâneo pode
potencializar a propagação de poluentes e possivelmente atingir o aquífero. Suguio (2008) ressalta que as rochas
mais carstificáveis são as carbonáticas, como os calcários e dolomitos sedimentados na sinclinal de Ituaçu, iniciam
como pequenas cavidades ao longo de planos de falha das rochas sob o lençol freático, e vai gradativamente
aumentando sua dimensão ao longo de milhares de anos, criando sistemas de cavernas conectados.
Como se pode notar ainda no mapa 1, existe na sinclinal uma complexa rede hidrológica, onde
deduz-se possuir também uma complexa rede de cavernamento ao nível do lençol freático. Conforme
Suguio (2008), entendem-se que ao acontecer o rebaixamento do lençol a água subterrânea será drenada,
mesmo que o processo de alargamento possa continuar pela invasão de águas correntes superficiais,
acompanhada de colapso de rochas do teto.
Na geomorfologia da paisagem foi possível identificar o processo erosivo que ocorreu e vem sendo
submetida, comprovadamente pelas cavernas com grandes redes de condutos e salões, que acompanham o
vale de dissolução meandrado pelo rio Mato Grosso, estando mais aparente no carste exumado.
A relação entre as amostras identificadas no Mapa 1, a rede de drenagem e as imagens corroboram
com as argumentações teóricas sobre a ação física e química provocada pelas águas no relevo cárstico,
promovendo a evolução do endocarste como evidencia a foto 2.

Foto 2: Ituaçu – BA: Lapa do Bode na Serra das Araras - 2014

Imagem do salão grande, localizado em uma das


seções de condutos da Lapa do Bode com mais de
30 metros de altura. Trata-se de umas das maiores
cavernas do município de Ituaçu, possuindo
grandes salões e rico material paleontológico.

Fonte: Solon Almeida (2018)

A tabela 1, apresenta registro das coordenadas geográficas entre as áreas de lavra dos empreendimentos
cimenteiros e as cavernas significativas que se encontram mais próximas. Com esses dados, foram elaborados
perfis topográficos entre os pontos registrados.
Tabela1: Localização das Grutas e Cavernas próximas a áreas de Mineradoras.

LOCAL ID COORDENADAS LOCAL ID COORDENADAS


2 S 13°50’10,3’’ S 13° 53’9,6”
Lapa do Bode Lavra Itaguarana 1
W 41°17’05,7’’ - lt: 595 W 041°16’53,94” - Alt: 533
S 13° 49’28,38” S 13° 51’54,18”
Gruta da Mangabeira 3 Lapa do Guerreiro 4
W 41°19’42,3” - Alt: 562 W 041° 18’55,26” - Alt: 607
(DNPM Votorantim)
S 13° 54’24,72” S 13° 53’9,6”
Caverna da Cainana 5 Lavra Itaguarana 1
W 041°17’30,96” - Alt: 542 W 041° 16’53,94” - Alt: 533

S 13° 55’31,26” S 13º 55’30,3”


Caverna Pé do Morro Lavra CBC 7
6 W 041°16’54,72” - Alt: 617 W 041° 17’25,26” - Alt: 601

S 13º 53’26,4” S 13° 53’9,6”


Gruta das Onças Lavra da Itaguarana 1
8 W 041º16’28,02” - Alt: 521 W 041° 16’53,94” - Alt: 533
Fonte: Veiga A. J. P. (2014)

Na escolha dos perfis, levaram-se em consideração o grau de relevância espeleológica das cavernas e
probabilidade de acidentes geotécnicos, o que possibilitou caracterizar e analisar a paisagem, bem como estabelecer
relação com possíveis alterações ambientais promovidas pela atividade minerária.
O Perfil 1 apresenta a topografia da Serra das Araras caracterizada pela dissolução das rochas calcárias
apresentando pleno desenvolvimento do modelado.

Perfil 1: Ituaçu – BA: Perfil Lapa do Bode x Lavra Itaguarana - 2014

Fonte: Veiga A. J. P. (2014)

No perfil 1 foi possível identificar a Caverna Lapa do Bode com 5.500 metros de distância da lavra
Itaguarana S/A, tendo a serra como cota mais alta 620 m. de altitude e geomorfologia mergulhando no
sentido da lavra, chegando a uma cota de 520 m. Cabe destacar na topografia, a Lapa do Icó com 538 m. a
Dolina (Caverna de D. Senhora) com 545 m. e Povoado do Bonito com 515 metros.
A foto 3, expõe a ação física das águas do rio Mato Grosso (tempos pretéritos), na configuração da
paisagem endocárstica da serra que é margeada pelo mesmo em sua porção oeste.
Foto 3 – Ituaçu – BA: Serra das Araras e suas principais cavernas - 2014

Fonte: Nei Gondim (2014)

O riacho do Bonito, afluente do rio Mato Grosso, flui pelo povoado homônimo na cota de 480
metros. Analisando o perfil 2, percebe-se que suas águas já trabalharam a paisagem da comunidade, pois
tratando-se de rochas carbonáticas com alto poder de solubilidade, o gradiente hidráulico adquire papel
fundamental e marcante na geomorfologia. Também há de se considerar que as águas da bacia de drenagem,
continuam atuando em nível freático promovendo a castificação.
Ainda nesta linha de considerações, pode-se notar no perfil 2 o processo erosivo a que o carste
Ituaçuense vem sendo submetido, tendo na depressão central a calha do rio Mato Grosso a 800 metros da
Caverna Cainana.

Perfil 2 - Ituaçu – BA:: Caverna da Cainana x Lavra Itaguarana - 2014

Fonte: Veiga A. J. P. (2014)

Piló e Auler (2011) consideram a ausência de rios superficiais como uma peculiaridade em regiões
cársticas, pois a maior parte do gradiente hidráulico corre pela drenagem subterrânea, onde a água ácida gera
feições paisagísticas marcantes como as cavernas.
As cavernas são ornamentadas por diversos espeleotemas, onde a cavidade demonstra valor científico,
sendo primordial para compreensão da drenagem subterrânea do rio Mato Grosso, pois, conforme os estudos
de Cristofoletti (1980), as cavernas podem apresentar um ou mais níveis. É possível que possa esteja ocupada
por rios, sendo a hidrologia subterrânea o fator principal na dinâmica do sistema endocárstico.
Os precipitados químicos que prendem do teto da caverna Cainana (Foto 4) demonstra a ação da
água meteórica que penetra no maciço calcário através dos planos de falha. Ao percolar a rocha, a água
reage quimicamente dissolvendo-a formando variados espeleotemas tais como as estalactites.

Foto 4 - Ituaçu – BA: Estalactites na caverna Cainana – 2014

Precipitados químicos na caverna Cainana, onde a


viajem da água pelos planos de falha agregou
minerais, formando uma linha de estalactites.

Nei Gondim (2014)

A Caverna Pé do Morro apresenta situação de preocupação do ponto de vista geotécnico. O perfil 3


traçou a topografia entre a sua entrada e a lavra da Companhia Baiana de Cimento (CBC), e o resultado
demonstrou que estão na mesma cota (580 m.), ou seja, no mesmo plano do empacotamento sedimentar.
Tem-se como agravante o fator de distância, sendo que a lavra está a 900 metros da caverna.

Perfil 3 – Ituaçu - BA: Caverna Pé do Morro x Lavra CBC - 2014

Fonte: Veiga A. J. P. (2014)


A cavidade da referida caverna tem aproximadamente 300 metros de desenvolvimento horizontal
com direcionamento para a mina. Entendem-se que esse fator de proximidade pode gerar alterações
ambientais irreversíveis ao patrimônio espeleológico da paisagem local.
Em estudos sobre riscos geotécnicos em áreas cársticas Oliveira (1997), destaca que a utilização de
explosivos na lavra pode provocar desmoronamentos. As vibrações difundem-se pelas ondas elásticas em
subsuperfície e podem desestabilizar tetos de cavernas ou cavernas ocultas, além de acarretar avarias ás
moradias das comunidades que se encontrem próximas. Vale ressaltar a importância científica da Caverna
com gênese e espeleotemas notadamente de valor espeleológico (Foto 5).

Foto 5: Salão principal da Caverna Pé do Morro

Salão principal da caverna pé do morro, que evidencia


grandes represas de travertinos, (hoje secos)
demonstrando um clima pretérito diferente do atual.

Fonte: Solon Almeida (2015)

Situação idêntica encontra-se a Gruta das Onças, que está na mesma cota de altitude (520 m.) e
apenas 900 m. de distância da Lavra Itaguarana SA.

Perfil 4: Ituaçu – BA: Gruta das Onças x Lavra da Itaguarana - 2014

Fonte: Veiga A. J. P. (2014)

Analisando o contexto de fragilidade e área de influência do processo de extração, têm-se uma


situação que não precisa de maiores investigações para deduzir a evidência do impacto que será causado à
caverna. A lavra irá operar a céu aberto e a geomorfologia local não apresenta nenhuma barreira física que
impeça a propagação de ondas elásticas provocadas pelas detonações para desmonte de rochas. A foto 6
demonstram o processo espeleogenético da cavidade, seu valor cênico e científico.

Foto 6: Ituaçu – BA: Formação de Cortinas na Gruta das Onças – 2014

Agregação de minerais no plano de falha do maciço calcário,


formando uma cortina, predominantemente de carbonato de
cálcio e calcita.

Fonte: Nei Gondim (2014)

O perfil 5 estabelece a relação entre as cavernas da Serra Mangabeira e a área requerida pelo grupo
Votorantim junto ao Departamento Nacional de Pesquisa Mineral (DNPM).

Perfil 5: Ituaçu – BA: Gruta da Mangabeira x Lapa do Guerreiro - 2014

Fonte: Veiga A. J. P. (2014)

A caverna Gruta da Mangabeira possivelmente teve sua gênese e evolução associada ao rio do
Tamanduá participante da bacia hidrográfica do Mato Grosso. Tem a abertura inicial na cota 550 m. e final
no povoado da Gruta, cota 513 m (ressurgência), tendo um percurso de 3,5 km, com desnível de 37 metros.
Observado o Perfil 5, observa-se o povoado próximo a Gruta da Mangabeira a 2.750 metros de distância
da área requerida para lavra, tendo um desnível de 47 metros. Entre esses dois pontos, foram catalogadas sete
cavidades tipo (abismo), e registrados dois colapsos de solo, o que demonstra ser uma área de fragilidade geológica
com probabilidade de cavernas ocultas.
Segundo Suguio (2010), os planos de acamamento e fraturas em rochas de imersão suave, provocam
movimentos laterais das águas ao longo de suas intersecções favorecendo a criação de condutos e galerias. Como
evidenciado nessa região, as intersecções de conjuntos de diáclases verticais ao concentrarem entrada de águas
descendentes, proporcionou o desenvolvimento desses condutos, localmente conhecidos como “sumidouros”.
Outras importantes feições endocarsticas da Serra Mangabeira são: Gruta do Guerreiro, Cauãn, Lapinha,
Piau e Mandacaru, esta última ornamentada por estalactites, estalagmites, helictites, cortinas, colunas e
depósitos minerais ainda totalmente preservados, configurando-se em uma paisagem de relevante beleza
cênica e riqueza espeleológica.
A foto 7 mostra espeleogênese e depósitos químicos, complexo de estalagmites e estalactites na Gruta
da Mangabeira.

Foto 7 – Ituaçu - BA: Salão dos Coqueiros mortos na Gruta da Mangabeira – 2015

No salão dos coqueiros mortos, Gruta da Mangabeira


ocorre um dos maiores complexos de estalactites e
estalagmites das cavernas da Chapada Diamantina. Um
verdadeiro laboratório para pesquisas geológicas
mostrando o grande potencial científico,
sobremaneira no que envolve a evolução geológica
destas feições.

Fonte: Solon Almeida (2015)

Consideram-se que seja relevante compreender o conjunto de processos responsáveis pela origem e
formação de cavernas (espeleogênese). Nesse sentido, o estudo de cavernas adquire ampla importância na
análise ambiental, pois, entendendo esses processos, pode-se elaborar um planejamento adequado dessas
paisagens e corrigir eventuais problemas relacionados à falta de manejo.

Ocorrência de processos de dolinamento e colapso nas adjacências dos empreendimentos cimenteiros

A paisagem cárstica é um domínio frágil, que apresenta elementos diferenciados como os processos de
abatimentos, subsidiências e gradiente hidráulico. Na investigação dos processos de dolinamento e colapsos de
solo, na área de estudo foram identificadas nove ocorrências, sendo seis dolinas e três colapsos (Tabela 3).
Tabela 3: Ituaçu – BA: Ocorrências de dolinamento e colapsos de solo - 2014
LOCAL COORDENADAS

Dolina Senhora - Povoado Bonito S 13º 51.903’ - W 041º 17.226’


Dolina – Gruta dos Coroás S 13º 50.160’ - W 041º 16.965’
Dolina – Gruta do Parafuso S 13º 50.167’ - W 041º 16.922’
Dolina – Morro do Coração S 13° 48’56.24” - W 041° 21’17.39”
Dolina – Gruta das Barriguds S 13° 50.864’ - W 041° 16.897’
Dolina - aeroporto S 13º 49’56” - W 041º 18’02.3”
Colapso de solo - Povoado da Mangabeira S 13°51’14.9” - W 041° 18’40.0”

Colapso de solo - Povoado Formosa S 13° 52’16.2” - W 041° 17’40.7”


Colapso de solo - Aeroporto S 13º 49’51.7” - W 041º18’13.6”
Fonte: Trabalho de Campo Fonte: Veiga A. J. P. (2014)

Para uma melhor compreensão e análise destas formas no contexto ambiental e geotécnico, foi
elaborado mapa temático com a rede de drenagem, indicação das cavernas com alto grau de relevância e os
processos de dolinamento e colapso (Mapa 2).

Mapa 2: Ituaçu BA: Drenagem, amostras, lavras, cavernas, dolinamentos e colapso de solo - 2014
As dolinas apresentam-se como depressões fechadas ou circulares, de poucos a centenas de metros
de profundidade, que se formam em função da dissolução subsuperficial das rochas. Piló e Auler (2011),
consideram como formas cársticas mais comuns criadas por abatimento às vezes suave ou abrupto.
Conforme o mapa 2, a amostra 11 indica a Dolina de Dona Senhora localizada no povoado do Bonito
a 2.200 m. de distância da Lavra Itaguarana S/A. Trata-se de um colapso mecânico que gerou acesso à
caverna. Esses eventos são descritos por Suguio (2010), como processos que acontecem de baixo para cima
a partir de uma cavidade de dissolução prévia. O autor destaca que também são denominados incasão, e,
frequentemente altera os condutos subterrâneos, gerando grandes salões. A evidência de ser uma feição
cárstica recente está na própria caverna, em todo seu piso apresenta blocos abatidos e ausência de
espeleotemas, tanto nas paredes como no teto conforme pode ser notado na foto 8.
Neste caso predominou a hipogenia, descrita por Piló e Auler (2011) como gênese que ocorre de
dentro para fora pelo processo de dissolução química muito comum em rochas carbonáticas do grupo
Bambuí Una, com sua entrada criada por um abatimento acidental devido à interrupção de algum conduto
precedente quando do rebaixamento natural da superfície. Outros aspectos levantados é que esses tipos de
cavernas podem permanecer à margem de achados espelológicos, pois geralmente não possuem entradas,
sendo essas geradas a partir de colapsos mecânicos.

Foto 8 – Ituaçu - BA: Salão principal da Gruta de Senhora - 2014


Caverna formada por processo de colapso, também
denominado incasão, frequentemente altera os
condutos subterrâneos, gerando grandes salões. Os
planos de acamamento e as diacleses, em rochas de
imersão suave, causam a movimentação lateral das
águas ao longo de suas intersecções e favorecem a
criação de galerias. A fotografia mostra que as
diacleses verticais concentraram fluxos
descendentes de águas, proporcionando o
desenvolvimento do poço, usualmente conhecidos
como abismos.

Fonte: Nei Gondim (2014)

O perfil topográfico 1 entre a Lapa do Bode, situada na Serra das Araras, e a região de lavra da
Itaguarana S/A, mostra que o fundo da dolina está no mesmo plano de sedimentação com a cota de 520 m.
de altitude. Também se faz notar no referido perfil o Povoado do Bonito, a 1,5 Km de distância da lavra,
estando na cota 500 m. com desnível de 20 m. em relação à lavra. Esta região é meandrada pelo riacho do
Bonito que está na depressão mostrada no Perfil 1, cota 480.
Para Piló e Auler (2011), as áreas cársticas por possuir complexa rede de cavernamento, são muito
suscetíveis a processos de abatimentos, a que se denomina “dolinamento de colapso”, que estão associados a
desmoronamentos de paredes e tetos de cavernas. Essa situação está ligada ao processo de dissolução da rocha
e a evolução do endocarste, gerando riscos geotécnicos quando em áreas de ocupação industrial e humana.
Tais argumentos são corroborados com o fato ocorrido em Ituaçu – BA, no povoado da formosa, no ano de
2008, quando aconteceu um colapso de solo formando uma cratera com acesso a cavernamento. Fica
localizada ao lado da rodovia Ba 142 nas coordenadas S 13°52’16.2”- W 41°17’40.7” com altitude de 516 m.

A paisagem Cárstica da Sinclinal de Ituaçu - BA

O relevo no contexto da paisagem estudada e a ocorrência de cavernas com maior grau de


desenvolvimento foi análise a partir da carta hiposmétrica (Mapa 3), constituiu uma base importantes para
compreensão da geomorfologia cárstica e o funcionamento do aqüífero, tornando-se ferramenta essencial
para efetuar comparações posteriores de métodos ou técnicas de prospecção aplicadas em pesquisas sobre as
modificações paisagísticas que venham ocorrer no carste ituaçuense.

Mapa 3 – Ituaçu – BA: Hipsometria, Drenagem e caracterização de áreas - 2014

O mapa 3 possibilita visualização da direção dos fluxos superficiais, permitindo a identificação das zonas
de recarga e descarga, e consequentemente o desenvolvimento do sistema endocárstico. Observando as áreas que
estão circundadas, percebe-se um relevo de menor altimetria enclausurado por relevo de maior altitude, como
uma dolina, onde o sistema de drenagem superficial escorre em direção a prováveis cavernas ocultas. Também
pode ser verificado na altimetria, que o desnível entre as áreas de recarga e descarga foi de 540 m., comprovando
o efeito erosivo na sinclinal, que se caracteriza como uma planície de corrosão denominado poljé.
De acordo com Karmann (2007), estas formas negativas podem alcançar vários quilômetros,
apresentam fundo plano atravessado por fluxos de água, que em algum ponto pode ser confinado por
sumidouro. Complementa ainda ao afirmar que muitos poljés abrigam lagoas temporárias como a que foi
identificada na Gruta da Mangabeira e Formosa, que estão alojadas na região central da sinclinal de Ituaçu.
No trabalho de campo realizado nesta paisagem cárstica, catalogou-se 68 cavidades (mapa 3). As
áreas que detém o registro das feições espeleológicas mais significativas são a Serra da Mangabeira com
8%, Serra das Araras com 15% e Morro dos Peitos com 7%. A Serra da Mangabeira tem a maior caverna do
município com 3,5 km de desenvolvimento linear, que é a Gruta Mangabeira, reconhecida dentro da
legislação como cavidade de alto grau de relevância. Já as outras catalogadas até o momento são de menor
porte, contudo com espeleogênese evoluída.
A Serra das Araras abriga o maior complexo endocárstico evidenciado até o momento, com cavernas
de significativa importância espeleológica e arqueológica. Vale destacar, que a paisagem natural do local
vem evoluindo sem perturbações antrópicas que signifiquem ameaça ao desenvolvimento do carste. O Morro
dos Peitos com 3 cavernas significativas compõe, junto às outras citadas, o patrimônio espeleológico da
sinclinal cárstica de Ituaçu, que necessitam de preservação e conservação. Ao longo dos anos, está paisagem
vem sofrendo com as intervenções humanas, sobretudo a exploração mineral do calcário.
Na análise da paisagem, tendo como base a configuração do relevo, as significativas ocorrências
endocarsticas, foram classificadas seis áreas de relevância espeleológica: Serra da Mangabeira, Serra das
Araras, Povoado Mangabeira, Povoado formosa, Morro dos Peitos e Morro das Veredas representado na
modelagem em 3D da sinclinal cárstica ituaçuense com as seis áreas classificadas (Figura 1).

Figura 1: Ituaçu – BA: Bloco de diagrama em 3D da Sinclinal cárstica - 2014

Fonte: Veiga A. J. P. (2014)


Na indicação na figura 1, o número um e dois correspondem Serras da Mangabeira e das Araras,
respectivamente, classificadas como de alto potencial espeleológico. O número três (Povoado Mangabeira) e
o quatro (Povoado Formosa – Bonito) indicam as áreas consideradas como de fragilidade do ponto de vista
geotécnico, devido ao registro de cavidades, dolinamentos e colapsos recentes. Já o número seis (Morro da
vereda) com um percentual de 12% dos registros na grande maioria formados de cavernas tipo abismos, aqui
chamados sumidouros, evidencia o desenvolvimento do sistema endocárstico que se estende pela sinclinal,
tendo como testemunho as cavernas do Morro dos peitos.
Estas cavidades com espeleogênese evoluída finaliza o presente estudo, com acervo espeleológico
das paisagens endocársticas da sinclinal ituaçuense que atualmente está acessível a sociedade. Sabe-se que o
desenvolvimento das paisagens cársticas leva milhões de anos e que o processo de evolução dessas caminha
para a dissolução total. Nesse entendimento, conclui-se que outras cavernas estão em processo de formação,
e futuramente se mostrarão, deixando registros do tempo na atualidade.

CONCLUSÕES

As paisagens cársticas possuem histórico de milhões de anos de evolução e incógnitas, sobre esse
processo podem ser respondidas através de seus estudos. Sabe-se que essas paisagens são possuidoras de
importantes jazidas minerais como o calcário e o dolomito, essenciais para a fabricação do cimento,
contudo, as suas explorações para suprir as necessidades humanas de forma desorganizada e predatória, sem
critérios adequados, transformam-se em ação extremamente nociva. Devido à fragilidade do carste, a
retirada desses recursos naturais não renovável de sua forma original, pode deflagrar acidentes geológicos,
destruir cavernas e comprometerem os aquíferos.
As áreas de lavras requeridas pelos empreendimentos (Itaguarana S/A, CBC, Votorantim), junto ao
(DNPM), por abrigarem cavernas de relevância espeleológica, necessita-se ações menos degradantes, pois,
são laboratórios in loco e guardam significativas informações de tempos pretéritos. Tais ações
desconsideram as características físicas do ambiente cárstico e os problemas geotécnicos que especificam
essas paisagens. Ocupá-las indevidamente com atividade mineradora pode comprometer a possibilidades do
desenvolvimento de pesquisas científicas voltadas à Espeleologia, Paleontologia, Paleoclimas, Arqueologia,
ao turismo espeleológico, dentre outros. Também, há de se considerar problemas ambientais que poderão
ocorrer no patrimônio espeleológico de Ituaçu, devido à instalação de indústrias cimenteiras.
Com base no exposto, consideram-se que a hipótese para o estudo foi confirmada. Seguindo essa
premissa, de acordo com análises teóricas e a pesquisa de campo, foi constatado que nos ambientes que abrigam
cavernas próximas às áreas de lavra, devido ao processo de extração mineral, haverá alteração na paisagem que
influenciará riscos geotécnicos, com processos de dolinamentos e colapsos de solo, levando-nos a concluir que
essas áreas são propícias a tais riscos em decorrência da estrutura e da composição do ambiente cárstico.
Em razão das características especificas das regiões cársticas como a de Ituaçu, torna-se fundamental
o monitoramento de impactos que serão causados. Desse modo, poderá ser dimensionada a magnitude e
criar medidas mitigadoras ou mesmo a modificação do projeto. Nesse contexto, torna-se necessário a
implementação de um amplo programa de monitoramento espeleológico, coordenado por profissionais
habilitados e independentes dos empreendedores.
Diante a fragilidade das rochas carbonáticas e da evidência de relevantes feições endocársticas e
comunidades próximas às áreas de lavra, recomenda-se o emprego de novas tecnologias para a extração do
mineral que não utilize explosivos, de forma a compatibilizar as atividades de lavra com a conservação das
estruturas espeleológicas.
Devido aos impactos ambientais irreversíveis à paisagem cárstica da sinclinal ituaçuense pelas
operações de lavra das mineradoras, sugere-se como medida compensatória e de preservação estratégica, a
criação de duas áreas de proteção ambiental (APAs), uma na Serra da Mangabeira, agregando a Gruta
Mangabeira, Lapinha, Gruta do Mandacaru, Cauan e a Lagoa da Gruta, outra na Serra das Araras onde
ocorre um complexo de relevantes cavernas e painéis com pinturas rupestres. Neste estudo, estas áreas
foram consideradas como de influência direta pela proximidade dos empreendimentos. Por fim, a
necessidade de novos estudos, prospecções e monitoramento dessas áreas nas fases de implantação e
funcionamento das atividades minerarias.

REFERENCIAS

AULER, Augusto. Espeleologia no Brasil: uma abordagem histórica. Espeleotema. Monte Sião, v. 18, p.
23-30, 1997.

AULER, A; RUBIOLI, E. L.; CARDOSO, J. A. 1996. Breve síntese sobre o carste subterrânneo da
Bahia. Tecbahia Revista Baiana de Tecnologia, v. 11(3): 153-163.

AULER, A., ZOGBI, L. Espeleologia: noções básicas. São Paulo: Redespeleo Brasil, 2005.

Christofoletti A. Geomorfologia. 2. ed. São Paulo: Edgard Blucher, 1980.

Lakatos EM, Marconi MA. Fundamentos de metodologia científica. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2005.

KARMANN, Ivo. Ciclo da água: água subterrânea e sua ação geológica. In: TEIXEIRA, Wilson (Org.).
Decifrando a terra. São Paulo: Oficina de Texto, 2001. p. 116-166.

Karman I, Sallun F, W. Paisagens subterrâneas do Brasil. Ciência Hoje, São Paulo, v.40, n. 235, p.18-25,
2007.

Oliveira LMA. Gestão de Riscos Geológicos Urbanos em Áreas de Carste. Curitiba: 1997. Monografia de
Especialista em Gestão Técnica do Meio Urbano (PUC-PR).

PILÓ, Luis Beethoven. Revisão de literatura: Geomorfologia cárstica. Revista brasileira de


geomorfologia. Volume 1. nº 1 p.88-102 2000.

Piló LB, Auler AS. Introdução à Espeleologia. In: Curso de Espeleologia e Licenciamento Ambiental.
Belo Horizonte: Instituto Terra Brasilis, 2011. Cap. 1, p. 7-23. Disponível em:
<http://www.icmbio.gov.br/cecav/nucleo-de-informacoes-espeleologicas/publicacoes/curso-de-espeleologia-
e-licenciamento-ambiental.html>. Acesso em: 12 jun. 2012.
SOARES, Binael. Biologia e Topografia das grutas dos angicos e Pé do Morro. (Estudo Cientifico).
ONG Ambientalista Pura Natura, Ituaçu 2005 23 p.

SPRING: Integrating remote sensing and GIS by object-oriented data modeling. Camara G.; Souza R.C.M.;
Freitas U. M.; Garrido J. Computers & Graphics, v. 20, n.3. p. 395-403, 1996.

SUGUIO K. Mudanças Ambientais da Terra. 1. ed. São Paulo: Instituto Geológico, 2008. Disponível
em:< http://www.igeologico.sp.gov.br/downloads/livros/suguio2008.pdf>acesso em 20 nov. 2013.

____. Geologia do quaternário e mudanças ambientais. 10 ed. São Paulo: Oficina de Textos, 2010.

UNITED STATES GEOLOGICAL SURVEY – USGS. SRTM: Imagem de modelo digital de elevação.
Grid de 30 metros. GEOTIFF. Disponível em <http://earthexplorer.usgs.gov/>. Acessado em 31/03/2015.

____. Imagem do satélite LANDSAT 8. METI/NASA, 2013. 4 Cenas. Canais 4, 5, 6. Resolução espacial de 30
metros. GEOTIFF. Disponível em Disponível em <http://earthexplorer.usgs.gov/>. Acessado em 31/03/2015.

Você também pode gostar