Resumo Castro (1)

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Resumo Castro- Sete Ensaios sobre a Economia Brasileira

Castro (1980) começa com a abordagem que nos meados do século XIX, o mundo estava
testemunhando uma vigorosa expansão do comércio internacional, resultante de transformações
profundas na economia global. Nesta época, as nações do mundo começaram a ser classificadas
em cinco grandes grupos, cada um desempenhando papeis específicos na economia internacional
em formação. Nisso, o primeiro grupo consistia nas nações europeias centro-ocidentais, que
estavam passando por movimentos intensos de transformação em suas estruturas econômicas e
sociais. Essas transformações resultaram no surgimento dessas nações como grandes centros
industriais, sendo pioneiras no processo de industrialização e urbanização. Essa dinâmica era
impulsionada pela Revolução Industrial, que promoveu a mecanização da produção e o uso de
novas fontes de energia, ampliando significativamente a capacidade produtiva e o comércio.

Já o segundo grupo incluía as demais nações europeias que não conseguiram superar
completamente as características feudal-camponesas de suas economias, o que atrasou o seu
processo de industrialização e urbanização. No entanto, a abertura progressiva de suas
agriculturas permitiu um intercâmbio comercial crescente com as nações líderes no processo de
industrialização. Essas nações, embora não tivessem uma industrialização acelerada, ainda
participaram ativamente do comércio internacional, beneficiando-se do crescimento econômico
global. O terceiro grupo era composto por nações e impérios com passados antigos e, em
muitos casos, brilhantes, como a Índia, Indonésia e Egito, que estavam relativamente
estagnados ou em declínio no século XIX. Essas regiões tinham densidades populacionais
elevadas, instituições políticas próprias e tradições culturais profundas. No entanto, algumas
delas foram militarmente dominadas pelas potências comerciais europeias, que impuseram
práticas comerciais favoráveis aos conquistadores, muitas vezes recolhendo tributos substanciais.

As colônias conquistadas pelos europeus no Novo Mundo e na África formavam o quarto grupo,
em que nessas regiões, após a submissão, expulsão ou extermínio dos povos nativos, atividades
econômicas voltadas para a extração de produtos de alto valor, como ouro, açúcar e outros bens,
foram desenvolvidas em grande escala, muitas vezes utilizando o trabalho escravo em
plantações. O quinto e último grupo era constituído pelas regiões desabitadas ou pouco
povoadas, que eram utilizadas como colônias de povoamento, como os Estados Unidos, Canadá
e Austrália. Nessas áreas, a abundância de terras e a escassez de mão-de-obra permitiram o
desenvolvimento de uma agricultura extensiva e a rápida inserção no comércio internacional.

Essas transformações só foram possíveis graças à revolução nos transportes, especialmente, com
a introdução dos barcos metálicos e, posteriormente, a vapor, que reduziram drasticamente os
custos de transporte de mercadorias, permitindo que matérias-primas e alimentos fossem
enviados de regiões distantes para os centros industriais da Europa. A construção de ferrovias
também desempenhou um papel crucial ao integrar áreas rurais e de difícil acesso às economias
litorâneas, ampliando ainda mais a especialização produtiva e o comércio mundial.
Nisso, podemos trazer uma análise para o crescimento brasileiro, em que o contexto
latino-americano, levando em conta as semelhanças estruturais e históricas dos países da região.
O modelo latino-americano de desenvolvimento econômico, caracterizado pelo processo de
substituição de importações e pela dependência histórica de exportações de produtos primários,
reflete muitos dos desafios observados no caso brasileiro, com algumas particularidades
regionais.

A colonização europeia na América Latina desempenhou um papel fundamental na formação das


estruturas sociais e econômicas que ainda hoje moldam os países da região. Assim como
mencionado no trecho, as regiões periféricas enfrentam um quadro de estagnação econômica,
resultado de um processo histórico de exploração e concentração de terras, especialmente nas
áreas de colonização antiga. O latifúndio, uma característica marcante do modelo agrário
latino-americano, cria uma rigidez estrutural que dificulta a absorção produtiva da mão-de-obra e
perpetua a desigualdade social e econômica.

O êxodo rural, em busca de melhores condições de vida nas cidades ou em regiões pioneiras, é
um fenômeno comum em vários países latino-americanos, especialmente durante os períodos de
industrialização acelerada. No entanto, como o texto aponta, o setor industrial muitas vezes não
tem capacidade de absorver plenamente o fluxo de trabalhadores, seja devido ao avanço
tecnológico poupador de mão-de-obra, seja pela própria transição das indústrias para um modelo
mais capitalista e menos intensivo em trabalho.

No contexto latino-americano, esse problema é agravado pela proliferação de economias


informais nas áreas urbanas, que muitas vezes oferecem apenas empregos precários e de baixa
produtividade. Isso resulta em uma crescente marginalização da população trabalhadora, que não
consegue acessar o mercado formal de trabalho nem se beneficiar dos avanços econômicos
gerados pela industrialização. A formação de "bolsões" de subemprego e a dependência de
setores terciários de baixa produtividade tornam-se evidentes em muitos países da região,
replicando o cenário descrito no caso brasileiro.

Além disso, a integração dos mercados regionais ao mercado nacional, outro ponto destacado no
trecho, foi um desafio enfrentado por diversos países latino-americanos, especialmente no
contexto da formação de economias nacionais após a independência. A centralização do
crescimento em polos industriais urbanos, enquanto as regiões periféricas permanecem
estagnadas ou dependentes de atividades primárias de baixa produtividade, é um padrão
recorrente na história da América Latina.

A maturidade industrial alcançada por algumas economias latino-americanas, como o Brasil, a


Argentina e o México, também trouxe à tona a necessidade de reavaliar o modelo de
crescimento. À medida que esses países avançavam no processo de substituição de importações e
se aproximavam dos limites de seus mercados internos, a questão de como continuar o
crescimento sem aumentar ainda mais as desigualdades regionais e sociais tornou-se premente.
No entanto, como o texto menciona, o avanço para uma nova fase de desenvolvimento exige
mais do que simplesmente continuar com o processo de industrialização. Exige uma
reestruturação das bases sociais e econômicas, com uma clara definição da direção em que se
deseja conduzir o sistema. Esse processo, por sua vez, é complicado pelos interesses conflitantes
e pelas tensões políticas que surgem quando se trata de alterar as estruturas de poder e riqueza
historicamente estabelecidas. Em muitos países latino-americanos, o Estado se vê pressionado a
desempenhar um papel mais interventor e redistributivo, ao mesmo tempo em que enfrenta
resistências dos grupos econômicos estabelecidos e das elites políticas.

Assim, o modelo latino-americano, tal como o brasileiro, encontra-se em um ponto de inflexão


ao atingir a maturidade industrial. As desigualdades sociais, regionais e setoriais, agravadas ao
longo do processo de crescimento excludente, precisam ser enfrentadas de forma decidida para
que um desenvolvimento mais inclusivo e abrangente possa ser alcançado. A questão central,
portanto, não é apenas manter um certo ritmo de crescimento, mas redefinir as bases do sistema
econômico e social para garantir um progresso mais equilibrado e sustentável.

No contexto da atividade econômica, é crucial distinguir entre as diversas formas de produção,


especialmente as atividades de extração mineral e agroindústria. As atividades de extração
mineral exigem um investimento substancial em equipamentos, know-how e recursos
financeiros, enquanto a agroindústria abrange uma gama de operações que vão desde a utilização
de ferramentas simples e de aprovisionamento local até a adoção de tecnologias mais complexas
e capital-intensivas. Além disso, há atividades que dependem significativamente de estoques,
como rebanhos e cafezais, que requerem considerável capital acumulado.

Analisando as interações entre a macrofunção da produção exportadora e a realidade dos


recursos naturais, podemos entender melhor as origens e a evolução dos desequilíbrios setoriais,
espaciais e sociais nas nações latino-americanas. A dotação de recursos naturais de cada região
atua como um fator inicial que molda o tipo de atividade a ser desenvolvida. A produtividade no
setor exportador tende a aumentar conforme a quantidade de capital disponível por trabalhador
cresce, com destaque para atividades de exploração mineral e pecuária, que demonstram alta
acumulação de capital.

Por outro lado, a produtividade em atividades menos capitalizadas, mas que empregam
intensivamente mão-de-obra, como a cultura do café, apresenta resultados intermediários. Além
do setor exportador, é importante considerar as atividades que, de maneira direta ou indireta,
dependem das exportações, como comércio e finanças, que não apenas canalizam produtos para
o exterior, mas também promovem a distribuição interna das mercadorias importadas. Essas
atividades são essenciais para a subsistência da força de trabalho e justificam o surgimento de
atividades voltadas para o mercado interno.

Dessa forma, as disparidades setoriais na economia primário-exportadora tendem a se


intensificar, especialmente em regiões que enfrentam atividades mineradoras ou que ainda são
influenciadas por práticas agrárias tradicionais. As desigualdades são menos acentuadas em
contextos onde a economia natural não se destaca e onde não existem atividades exportadoras
altamente capitalizadas.

Por fim, ao observar as implicações espaciais das diferentes atividades exportadoras, notamos
que a exportação mineral, sendo altamente produtiva e frequentemente isolada de outras
atividades econômicas, tende a se desvincular do restante da economia local. Em contrapartida,
atividades pecuárias extensivas tendem a se espalhar de forma concêntrica, promovendo uma
uniformidade espacial, que, no entanto, pode ser interrompida por barreiras naturais, como
florestas ou zonas semiáridas. Essas dinâmicas revelam como as atividades econômicas moldam
não apenas a estrutura produtiva, mas também a configuração territorial das nações
latino-americanas.

A complexidade da estrutura espacial nas economias latino-americanas se acentua quando a


atividade exportadora é intensiva em mão-de-obra, mas não contribui para a alimentação da força
de trabalho. Nesse cenário, surge a necessidade de desenvolver atividades voltadas para o
mercado interno, que geralmente se estabelecem próximas às culturas de exportação,
aproveitando os solos mais férteis e as áreas mais acessíveis. Nas atividades mineradoras e na
pecuária, esse fenômeno não se verifica da mesma forma. Na mineração, o número reduzido de
trabalhadores e a necessidade de importar alimentos para sustentar a mão-de-obra criam um
padrão diferente. Já na pecuária, a escassez de mão-de-obra e a disponibilidade local de carne,
couro e lã atendem ao consumo dos trabalhadores.

As economias primário-exportadoras que empregam muita mão-de-obra também incentivam o


surgimento de atividades artesanais e industriais, como a produção de materiais de construção e
tecidos, que se dispersam, mas tendem a se concentrar em torno de grandes núcleos
populacionais rurais e centros urbanos em crescimento. Os centros urbanos desempenham um
papel crucial, abrigando atividades terciárias vinculadas às exportações e a administração do
Estado. Nos casos em que a exportação é capitalizada, os centros urbanos não se desenvolvem
tão rapidamente, ao contrário do que ocorre quando a pecuária é a atividade principal, gerando
um excedente que atrai população rural para as cidades.

A análise da estrutura social e seus desequilíbrios deve considerar a macrofunção da produção na


atividade exportadora, observando a quantidade de capital empregada por trabalhador e a
presença de populações não integradas ao mercado. Explorações que utilizam capital em grande
escala, como rebanhos e plantações perenes, favorecem a formação de aristocracias rurais,
enquanto os trabalhadores do campo não formam estratos intermediários. Camadas de classe
média emergem gradualmente com o fortalecimento do comércio e das pequenas atividades
manufatureiras voltadas para o mercado interno.

As atividades exportadoras de capital intensivo, muitas vezes de propriedade estrangeira, tendem


a empregar uma mão-de-obra homogênea e enfrentam condições laborais difíceis, o que pode
levar à formação de organizações de classe. A alta produtividade dessas atividades permite
atender a algumas demandas por melhores condições de trabalho. Em contraste, as
agroindústrias, que surgem em contextos de acumulação local ou como investimentos
estrangeiros em economias frágeis, podem dar origem a grandes fortunas rurais e promover
padrões de comportamento capitalistas.

Por fim, a simples dicotomia entre grandes proprietários e trabalhadores rurais é insuficiente para
entender a complexidade das relações sociais. É necessário considerar a existência de populações
indígenas e de excedentes demográficos que, mesmo isoladas, podem influenciar o mercado de
trabalho. A presença de atividades de autoconsumo ao redor das produções de exportação pode
resultar em níveis de remuneração baixos nos dois setores. O surgimento de classes médias varia
conforme a propriedade das atividades exportadoras e a intensidade da utilização de
mão-de-obra, com o Estado desempenhando um papel central na sustentação dessas camadas
sociais em contextos de propriedade estrangeira.

Evolução da Tendência do modelo

A demanda externa, fundamental para o desenvolvimento das economias primário-exportadoras,


historicamente passou por fases de expansão e retração, afetando diretamente as economias
locais. Essas economias reagiam de acordo com sua estrutura interna, mas atividades altamente
capitalizadas e de propriedade estrangeira mostravam-se incapazes de difundir suas crises. A
renda gerada nessas atividades muitas vezes não se refletia no restante da economia, sendo
amortecida pela elevada concentração de propriedade. Assim, as mudanças na demanda externa
impactavam principalmente a arrecadação fiscal e a contratação de mão de obra, enquanto a
ameaça de substituição tecnológica e novas fontes de aprovisionamento aumentava.

As regiões pecuárias, por outro lado, experimentavam uma ocupação gradual do território,
independente das flutuações do comércio internacional. Essa expansão era impulsionada pela
reprodução dos rebanhos e pelo crescimento populacional, o que favorecia a criação de centros
urbanos que dependiam das exportações. O aumento das exportações não apenas ampliava a
capacidade de importação, mas também exigia uma melhoria na infraestrutura de transporte,
frequentemente financiada por capitais estrangeiros. Apesar de a pecuária fornecer alimentos
tanto para a população rural quanto urbana, sua vulnerabilidade a crises externas era
relativamente baixa.

A longo prazo, a crescente demanda alimentava uma maior integração do território nacional e
possibilitava a formação de grandes centros urbanos. Esse crescimento, embora consolidasse a
divisão entre proprietários e trabalhadores, poderia reforçar as camadas ligadas ao comércio e
pressionar o Estado a expandir seus serviços urbanos. Regiões voltadas para a agricultura de
exportação altamente empregadora enfrentavam desafios relacionados à oferta de mão de obra,
levando a importações de africanos e, posteriormente, de imigrantes europeus, como forma de
suprir a demanda por trabalhadores.
A dinâmica entre atividades exportadoras e mercados internos é complexa. Durante crises, parte
do setor exportador poderia retornar à produção de alimentos, enquanto nas expansões, o setor
externo predominava, empurrando a economia de autoconsumo para áreas mais remotas. As
culturas de ciclo anual mostravam-se mais adaptáveis às oscilações da demanda externa do que
as perenes, que dependiam fortemente do mercado internacional. Lucros reinvestidos e
empréstimos externos ampliavam a atividade exportadora, mas a dependência de mão de obra
dos "reservatórios" internos e a utilização de escravos limitavam a evolução do mercado interno
e a industrialização.

O apelo à imigração europeia, diante da escassez de mão de obra, trouxe uma nova dinâmica,
permitindo uma leve diversificação do mercado de manufaturas de consumo. Entretanto, a
demanda por bens de qualidade das camadas mais altas da sociedade continuava a exigir um
aumento constante na capacidade de importação.

O despertar do setor manufatureiro

O atendimento do mercado interno na América Latina levou à formação de uma agricultura


comercial de alimentos e a pequenas indústrias que, inicialmente, não podiam competir no
comércio internacional devido ao baixo custo dos seus produtos. Desde cedo, essas indústrias
surgiram em regiões primário-exportadoras, evoluindo de atividades domiciliares para uma
maior proteção comercial, principalmente em condições locais adequadas. A urbanização
facilitou a expansão do mercado, permitindo que as manufaturas, que antes atendiam apenas a
mercados rurais, começassem a crescer.

Entretanto, a trajetória da industrialização nas economias primário-exportadoras é marcada por


instabilidade. Crises no mercado internacional frequentemente impulsionam a industrialização, à
medida que os proprietários rurais pressionam o Estado a adotar medidas que possam compensar
as perdas externas. Mecanismos como a desvalorização cambial e a compra de excedentes são
utilizados para proteger a renda do setor exportador durante essas crises. Isso resulta em um
aumento relativo dos preços dos produtos importados, estimulando a demanda por produtos
locais e favorecendo a expansão das atividades manufatureiras.

À medida que a indústria emergente se fortalece, ela começa a atender a um mercado interno
mais exigente e diversificado. No entanto, sua expansão permanece vulnerável às flutuações do
comércio externo. O crescimento das indústrias locais traz uma reestruturação significativa na
demanda, gerando diferentes dinâmicas de produtividade entre as atividades exportadoras e as
manufaturas. As indústrias que surgem em resposta a crises externas podem se consolidar se
conseguiram tornar-se competitivas, mas sua sobrevivência depende de fatores como a duração
das crises e a saúde do comércio externo.

As diferenças de produtividade entre setores industrial e agrícola refletem a estrutura econômica


subjacente. Em economias baseadas na exportação, a agricultura e a produção de alimentos
frequentemente coexistem, mas podem criar desequilíbrios estruturais significativos. Quando a
agricultura é altamente capitalizada, pode haver uma produtividade superior em comparação com
setores que empregam muita mão-de-obra, o que leva a um contraste entre os altos e baixos
padrões de vida.

As economias mineradoras, por sua vez, revelam uma dualidade acentuada, com atividades
exportadoras que não necessariamente se traduzem em benefícios diretos para a população local.
A marginalização de populações autóctones e a dependência de atividades rurais pouco
diversificadas perpetuam um quadro de desigualdade social. O surgimento de uma nova classe
média e uma incipiente burguesia, impulsionadas pela industrialização, cria um contraste com as
condições de vida das populações rurais, que permanecem em situações precárias e subalternas.

Assim, a estrutura social dessas economias revela tensões entre diferentes grupos de interesse,
onde as vozes dos novos operários e pequenos industriais começam a se fazer ouvir em um
contexto marcado pela luta entre os interesses dos proprietários rurais e os emergentes setores
urbanos.

Economias Continentais

A economia de uma nação subdesenvolvida, que se baseia em um único complexo


primário-exportador, apresenta características estruturais bem definidas. No entanto, algumas
nações desse tipo possuem múltiplas células primário-exportadoras, formando economias
regionais intercaladas por áreas ainda não desenvolvidas ou com população escassa, dedicadas a
atividades de autoconsumo. Chamamos essas nações de "economias continentais". Cada célula se
organiza em função do produto básico que exporta, e a demanda por esses bens, embora mova-se
paralelamente no curto e médio prazo, apresenta comportamentos distintos ao longo do tempo.

Assim, uma nação com diversas unidades primário-exportadoras terá partes que evoluem com
trajetórias próprias, sujeitas a grandes ciclos históricos que afetam a demanda internacional. Isso
resulta em uma estrutura econômica com patamares variáveis de importância relativa, onde
regiões prósperas coexistem com áreas decadentes. Esse fenômeno provoca migrações internas
em busca de oportunidades econômicas, mas não há motivação para uma articulação interna
eficaz entre as diferentes regiões.

Essas considerações são fundamentais para entender as desigualdades regionais em economias


latino-americanas, como Brasil, México e Colômbia, cujas estruturas internas revelam legados da
fase primário-exportadora. Uma análise setorial mostra que atividades exportadoras variam em
produtividade conforme suas funções de produção e o ciclo de demanda externa. Muitas regiões
podem estar estagnadas, com atividades de exportação substituídas por cultivos de subsistência,
evidenciando a fragilidade do crescimento baseado em exportações primárias.
Além disso, as capitais regionais desenvolvem atividades comerciais e industrialização
incipiente. Nesse contexto, observa-se a dispersão de atividades de autoconsumo e produção
simples, além de empreendimentos comerciais nas capitais. Economias continentais também
incluem regiões em diferentes estágios de desenvolvimento, desde juvenis a decadentes, o que
reduz a abertura externa global da nação. Regiões em decadência aumentam a economia natural
e podem gerar um isolamento que tende à feudalização. No entanto, mesmo essas áreas inertes
podem contribuir para um modesto processo de industrialização.

Socialmente, destaca-se a competição entre elites regionais que, ao longo do tempo, se alternam
na influência sobre o poder central. A insatisfação com as demandas regionais, muitas vezes
conflitantes, pode levar a movimentos separatistas, que buscam maior autonomia política para
regiões que se sentem negligenciadas.

O esgotamento do modelo agro-exportador

Uma questão crucial para o futuro das economias primário-exportadoras é como elas superam
seu modelo de crescimento. Em alguns casos, inovações ou a descoberta de novas fontes de
suprimento podem levar a um colapso abrupto da demanda externa por produtos primários,
resultando em crises severas e retrocessos econômicos. Outro fator que pode interromper o
crescimento é o esgotamento de recursos naturais, que pode ocorrer pela diminuição da
produtividade das jazidas minerais ou pela total ocupação de pastagens naturais. Neste último
cenário, busca-se aumentar a produtividade por meio de métodos mais eficientes de uso do solo,
o que pode impulsionar o crescimento de centros urbanos que já deveriam ser maiores.

Quando a renda per capita se mantém alta, mas o excedente exportável estagna, surgem
incentivos para a industrialização. Atividades mais intensivas em recursos, expansão
manufatureira e o aumento dos serviços, incluindo os estatais, são algumas das saídas para essa
crise. Com o crescimento do setor manufatureiro e dos serviços, o mercado interno se fortalece,
gerando mais consumo e bloqueando o excedente exportável, o que pode estimular alternativas
locais para o poder aquisitivo reprimido. No entanto, melhorias na produtividade do setor
exportador e aumentos nos preços internacionais podem contrariar essas tendências.

Além disso, a saturação da demanda internacional pode limitar a expansão das regiões
produtoras de bens primários, levando a uma deterioração das relações de troca e à compressão
da capacidade de importação. Isso pode resultar em estagnação econômica e migrações internas
de mão-de-obra e capitais. Mesmo assim, a instalação de novas atividades manufatureiras ainda
pode ocorrer, apesar da queda nos preços das exportações.

As oscilações conjunturais do comércio internacional também impactam as economias reflexas.


Os movimentos de expansão reforçam as características das economias exportadoras, mas as
reações à crise variam conforme o tipo de região primário-exportadora. Fatores como o
surgimento de mercados rurais e a expansão de mercados urbanos são essenciais para fomentar a
industrialização. No entanto, regiões com atividades primárias altamente capitalizadas podem ter
uma industrialização tardia, já que seus rendimentos muitas vezes são remetidos para o exterior.

Por fim, as economias continentais tendem a ter mais opções para enfrentar crises do que as
regiões exportadoras de produtos primários. Durante momentos de crescimento, as indústrias
nacionais podem ter uma posição privilegiada em relação ao setor exportador, mas as tensões
políticas e sociais emergem quando o sistema cresce com suas características tradicionais. O
antagonismo entre os interesses industriais e exportadores, aliado à fragilidade externa, impede
que as nações latino-americanas transcendam o modelo primário-exportador.

A consolidação de um setor manufatureiro

Nessa parte, Castro se concentra muito na longa fase da Grande Depressão e a II Guerra
Mundial, possuíam um mercado interno capaz de fomentar o desenvolvimento de um parque
manufatureiro em crescimento. O aumento abrupto dos preços relativos dos produtos das nações
industriais, em conjunto com a queda da capacidade de importação, criou condições excepcionais
de rentabilidade para as empresas já estabelecidas, resultando em uma acumulação de lucros que
incentivou a expansão e a criação de novas empresas. Os recursos necessários para esse
crescimento industrial não apenas provinham dos lucros do setor manufatureiro, mas também de
interesses vinculados às exportações em crise.

O crescimento econômico, sustentado pela atividade agrícola e impulsionado pela expansão


industrial, aumentou a demanda por importações. No entanto, a contínua compressão das
importações, devido à depressão e à guerra, fez com que a renda adicional fosse direcionada para
o mercado interno. O aumento da produção interna resultou em uma maior necessidade de
importação de materiais e equipamentos, intensificando a pressão sobre a limitada capacidade de
importar. Essa situação levou à eliminação de certos bens da pauta de importações, o que não
esvaziou a demanda, mas, pelo contrário, refletiu o dinamismo tecnológico e o enriquecimento
nas grandes áreas industriais.

A instalação de indústrias que produzem bens de consumo mais complexos, como


eletrodomésticos, reforçou a necessidade de importar insumos e bens de capital, ampliando os
estímulos à produção interna de produtos intermediários. Esse movimento indicava um progresso
em direção à autossuficiência na produção, com o setor industrial se deslocando da produção de
bens finais simples para a de produtos mais complexos. À medida que esse processo avançava, a
demanda interna aumentava, o que incentivava a diversificação da estrutura industrial e a busca
por recursos primários.

O setor público também desempenhou um papel crucial na industrialização, especialmente no


que diz respeito à criação de uma infraestrutura adequada para atender às demandas de
matérias-primas e energia. À medida que a industrialização avançava, a necessidade de revisões
na infraestrutura se tornava evidente, já que o setor privado muitas vezes não tinha a capacidade
técnica e financeira necessária para atender à crescente demanda. Os investimentos do Estado
aumentaram em resposta a essa necessidade, buscando não apenas conter a retração da renda,
mas também impulsionar o crescimento industrial em um contexto de estrangulamento externo.

O crescimento conjunto de investimentos públicos e privados foi fundamental para impulsionar a


economia no novo modelo de expansão baseado na substituição de importações. Essa dinâmica
não apenas respondia às oportunidades imediatas, mas também considerava os efeitos de longo
prazo das novas unidades industriais e a reestruturação da infraestrutura econômica. As
transformações em curso na industrialização exigem uma análise cuidadosa, especialmente no
que diz respeito às suas crises estruturais futuras.

A emergência de uma nova estruturação espacial

Castro traz que uma queda generalizada no comércio internacional impacta de forma
diferenciada as regiões de uma economia continental, variando conforme as elasticidades da
demanda externa por seus produtos exportados. Durante crises prolongadas, como a de 1929 a
1945, as regiões dependentes do comércio internacional sofrem um efeito inicial mais acentuado,
mas a superação desses desafios está atrelada à capacidade de adaptação. As regiões que já
possuíam uma estrutura industrial estabelecida antes da crise, devido a um período de
crescimento anterior, tendem a se tornar os centros das respostas internas para lidar com a
situação. Nesses casos, o foco está na tentativa de compensar a queda das importações, o que
empurra essas regiões para a centralidade econômica do país.

Essas regiões mais preparadas não são apenas caracterizadas por um parque industrial já
estabelecido, mas também por uma combinação de fatores que sustentam a renda interna. Entre
esses fatores estão a presença de um mercado significativo, serviços básicos já em operação, e a
existência de empresários e mão-de-obra qualificada. Esses elementos tornam essas regiões mais
aptas a enfrentar os desafios da crise e mais resilientes à queda do comércio externo. Além disso,
a localização de indústrias nessas áreas passa a ser mais determinada pela disponibilidade desses
fatores do que pela proximidade a matérias-primas, como seria esperado em condições normais.

Durante essa fase inicial de crise, as elites regionais desempenham um papel crucial ao tentar
mobilizar o apoio dos poderes públicos para lidar com os problemas locais. As regiões que
estavam no auge de seu desenvolvimento antes da crise têm mais chances de reivindicar, com
sucesso, a atenção e os recursos do governo central. Esse poder de pressão, exercido de forma
mais eficaz pelas áreas economicamente prósperas, contribui para o fortalecimento e expansão
do setor industrial nessas regiões, enquanto outras áreas menos favorecidas têm maior
dificuldade de se defender diante da queda na demanda externa por seus produtos.

Com a consolidação de um pólo industrial em determinadas regiões, há um processo de


concentração de capital e mão-de-obra. Pessoas jovens e ambiciosas, assim como os
proprietários rurais mais dinâmicos, migram em busca de oportunidades econômicas nos centros
em expansão. Esse fluxo de recursos humanos e financeiros das regiões periféricas para o centro
industrial cria um ciclo cumulativo, onde o crescimento de uma área ocorre às custas do declínio
de outra. Esse processo é reforçado pelas políticas públicas, que favorecem o pólo industrial
emergente por meio de investimentos em infraestrutura, controle de importações e incentivos à
concentração de recursos, intensificando ainda mais as desigualdades regionais. Na medida que a
crise externa é superada e as exportações são retomadas, o centro industrial já consolidado se
aproveita de sua nova força econômica para dominar o mercado interno, antes dependente de
produtos importados. Esse domínio se expande ainda mais com a integração das regiões ao
mercado nacional, facilitada por investimentos em infraestrutura, como transportes, que
conectam as áreas mais distantes ao centro. Esse processo acaba por desmantelar os pequenos
empreendimentos industriais regionais, que não conseguem competir com o poderio do pólo
industrial, agravando ainda mais a estagnação das regiões periféricas.

O novo modelo de crescimento econômico que surge após a crise é fundamentado na expansão
das atividades industriais e de serviços nas regiões mais desenvolvidas. Esse modelo contrasta
com o anterior, que era baseado na exportação de produtos primários. O pólo industrial
consolidado não apenas lidera a expansão interna, mas também influencia o desenvolvimento de
atividades primárias nas áreas próximas, criando um "complexo dinâmico" que abrange tanto a
produção manufatureira quanto a modernização de certos setores agrícolas, resultando em um
processo de crescimento concentrado e cumulativo. Nisso, o surgimento de um pólo industrial
resulta em um processo de concentração de capital e mão-de-obra em áreas urbanas, que são
caracterizadas por uma maior disponibilidade de oportunidades econômicas e uma estrutura
produtiva mais avançada. Esse fenômeno não ocorre de maneira isolada, mas provoca uma
verdadeira drenagem de recursos das regiões mais afetadas pela crise econômica. Nessas áreas
periféricas, o declínio das exportações e a perda de competitividade resultam em um
esvaziamento tanto de investimentos quanto de talentos. A migração de pessoas em busca de
trabalho e a transferência de capital para as áreas industrializadas geram um fluxo que intensifica
as desigualdades regionais, levando a uma concentração ainda maior de riqueza e infraestrutura
no centro em crescimento.

Tal fluxo contínuo de recursos humanos e financeiros cria um ciclo cumulativo que favorece o
desenvolvimento das áreas industrializadas em detrimento das regiões mais periféricas. Quanto
mais capital e mão-de-obra migram para o pólo industrial, maior é a capacidade desse centro de
expandir sua produção e inovação, o que, por sua vez, atrai ainda mais recursos e investimentos.
Esse círculo virtuoso para o centro, porém, significa um agravamento das dificuldades para as
regiões periféricas, que se veem privadas dos meios necessários para o desenvolvimento
econômico. A incapacidade dessas áreas de reter ou atrair investimentos perpetua um estado de
estagnação e marginalização econômica. Ademais, o Estado desempenha um papel fundamental
nesse processo ao direcionar políticas públicas e investimentos de forma a favorecer a
industrialização nas regiões mais desenvolvidas. Grandes investimentos em infraestrutura, como
estradas, ferrovias e instalações portuárias, são concentrados nos centros industriais, facilitando o
escoamento da produção e reforçando a competitividade dessas regiões. Ao mesmo tempo, o
controle das divisas e de outras políticas econômicas, como tarifas protecionistas e incentivos
fiscais, são estruturados de maneira a apoiar o crescimento industrial, mas pouco fazem para
estimular o desenvolvimento nas áreas periféricas. Dessa forma, o Estado não apenas contribui
para a centralização da atividade econômica, como também aprofunda as disparidades regionais.

Com a superação da crise econômica e a recuperação das exportações, o centro industrial, que já
consolidou sua estrutura produtiva durante os anos de dificuldade, se fortalece ainda mais. Esse
centro não só domina o mercado externo, mas também consolida seu controle sobre o mercado
interno, que antes era amplamente dependente de importações. A recuperação econômica global
oferece uma nova oportunidade de crescimento para o setor industrial, que se encontra em uma
posição vantajosa para expandir sua influência tanto em nível nacional quanto internacional. Já a
integração do mercado nacional, por sua vez, exige investimentos maciços em infraestrutura
para conectar as diversas regiões do país. No entanto, essa integração acaba por beneficiar
principalmente o pólo industrial, reforçando ainda mais sua centralização. Ao passo que as áreas
periféricas continuam estagnadas, as melhorias em infraestrutura, como redes de transporte e
comunicações, facilitam o fluxo de mercadorias e capitais entre o centro industrial e o restante do
país, mas não promovem um desenvolvimento equitativo. Enquanto o pólo se moderniza e se
torna mais competitivo, as regiões periféricas permanecem marginalizadas, sem os recursos
necessários para reverter seu declínio econômico.

A estrutura do mercado interno e o avanço da industrialização

Durante a análise da evolução do mercado consumidor interno brasileiro no contexto da


industrialização, sendo possível observar que esse processo se desenrolou de forma gradual e
segmentada, seguindo a divisão em diferentes fases. Na fase primário-exportadora, o mercado
interno de bens industrializados era altamente dependente da dinâmica do setor exportador, que
desempenhava um papel central na economia brasileira da época. As classes proprietárias,
constituídas pelas elites agrárias, estavam profundamente vinculadas a essa estrutura, uma vez
que sua renda era proveniente da exportação de produtos primários, como o café e a borracha.
Esse grupo de elite, com alto poder aquisitivo, direcionava suas preferências de consumo para
produtos de origem importada, aproveitando seu capital acumulado nas atividades exportadoras.
Isso refletia uma dependência externa significativa, na medida em que os bens de luxo e de
maior valor agregado eram adquiridos do exterior, mantendo o mercado interno de bens
sofisticados ainda incipiente.

Enquanto isso, as classes média e baixa, concentradas principalmente nas capitais regionais,
apresentavam um comportamento de consumo mais diversificado. Diferente das elites, esse
grupo dividia seu consumo entre produtos importados e manufaturas locais. Isso se devia, em
parte, ao fato de que as indústrias nacionais, embora ainda em fase inicial, começavam a surgir
para atender a uma demanda mais ampla por produtos de uso cotidiano. Contudo, essa
capacidade industrial era limitada e não supria todas as necessidades de consumo, especialmente
as relacionadas a bens de maior valor ou tecnologia. Nesse contexto, as elites mantinham sua
preferência por importações, enquanto as classes de renda mais baixa consumiam
predominantemente produtos de fabricação local ou mais simples. Nas regiões economicamente
mais dinâmicas, em que a produção agrícola era orientada para o mercado externo, os
trabalhadores rurais representavam um mercado consumidor para manufaturas simples. Esse
grupo de consumidores tinha acesso limitado a bens industrializados e seu consumo se restringia
a itens básicos de uso diário. Já nas regiões menos desenvolvidas e voltadas para a agricultura de
subsistência, o poder de compra era praticamente inexistente.

Nessas áreas, as condições econômicas desfavoráveis não permitiram que os trabalhadores rurais
tivessem acesso a produtos manufaturados, limitando a capacidade de expansão do mercado
interno de bens industrializados durante essa fase. Com o avanço do processo de
industrialização, especialmente a partir da década de 1930, o Brasil passou por uma significativa
transformação em sua estrutura produtiva, o que teve impactos diretos sobre o mercado
consumidor interno. A expansão desse mercado foi impulsionada pelo aumento da massa salarial
dos trabalhadores urbanos e pelo crescimento da classe média. O crescimento da demanda por
bens de consumo básicos, como roupas, alimentos e produtos de higiene, forneceu uma base
sólida para o desenvolvimento industrial. Contudo, as classes proprietárias, ainda concentradas
nas elites tradicionais, mantiveram suas preferências por produtos importados. As indústrias
locais, embora em crescimento, ainda não eram capazes de atender às exigências desse segmento
mais abastado da população, que continuava a consumir bens de maior valor, principalmente
provenientes da Europa e dos Estados Unidos.

Com isso, o crescimento industrial brasileiro durante esse período que Castro abordou foi,
portanto, sustentado pela demanda das classes de menor poder aquisitivo, que consumiam
manufaturas simples e produtos tradicionais. A crescente urbanização e o desenvolvimento de
novas áreas industriais criaram uma base de consumidores que buscava atender suas
necessidades com os produtos produzidos localmente. Isso proporcionou à indústria nacional a
oportunidade de crescer e diversificar sua produção, embora o mercado consumidor ainda
estivesse longe de ser homogêneo ou totalmente integrado. Esse processo gradual de expansão
do mercado interno foi um fator crucial para a consolidação da indústria nacional, que, com o
tempo, passou a ter maior capacidade de atender tanto à demanda interna quanto, em menor
medida, ao mercado internacional.

Na fase seguinte da industrialização brasileira, ocorreu o desenvolvimento de indústrias mais


complexas, o que trouxe profundas transformações ao mercado de trabalho. Inicialmente, as
grandes cidades enfrentavam uma escassez de mão de obra, uma vez que a maior parte da
população ainda se concentrava nas áreas rurais. No entanto, à medida que o êxodo rural se
intensificou, impulsionado pela modernização dos transportes e pela decadência econômica de
várias regiões agrícolas, a força de trabalho nos centros urbanos tornou-se mais abundante. Esse
movimento de migração em massa, principalmente de trabalhadores rurais em busca de melhores
condições de vida e emprego nas cidades, provocou um aumento significativo na oferta de mão
de obra nas áreas urbanas. Paralelamente, o o avanço tecnológico e a introdução de novos ramos
industriais impactaram diretamente a absorção dessa nova força de trabalho. As indústrias
começaram a incorporar tecnologias que aumentavam a eficiência produtiva, mas que também
reduziam a necessidade de grandes contingentes de trabalhadores. Isso resultou em uma
diminuição na participação dos salários na renda industrial, uma vez que o número de empregos
gerados não acompanhava o ritmo do crescimento da produção.

O aumento da produtividade, combinado com a redução da necessidade de mão de obra, gerou


uma pressão sobre os salários, que passaram a representar uma fatia menor da renda total da
indústria, afetando, assim, o poder de compra de uma parte significativa da população. Apesar
das dificuldades enfrentadas para expandir o mercado consumidor interno, algumas forças
compensatórias ajudaram a manter o processo de industrialização em curso. O crescimento das
atividades estatais, com investimentos em setores estratégicos e a criação de políticas públicas
voltadas para o desenvolvimento econômico, foi fundamental nesse sentido. Além disso, a
melhoria das infraestruturas de transporte, como a construção de estradas e ferrovias, facilitou o
escoamento da produção industrial e permitiu que os produtos alcançassem mercados regionais
mais amplos. Esse processo de expansão logística e a integração de novas regiões ao mercado
consumidor possibilitaram à indústria nacional capturar novos mercados e aumentar sua
produção, mesmo diante das limitações de consumo da população de menor renda.

Com a entrada do Brasil na produção de bens de consumo mais complexos, novos desafios
surgiram. Produtos de alto valor unitário, como eletrodomésticos, automóveis e eletrônicos, eram
inacessíveis para a maior parte da população, especialmente para as classes mais baixas. O
mercado para esses bens se restringia, portanto, às classes mais abastadas, que possuíam maior
poder de compra. Isso limitava o potencial de expansão do mercado consumidor de produtos
sofisticados, uma vez que a maioria da população ainda estava concentrada em atividades de
baixa renda e com acesso restrito a bens de maior valor. No entanto, a introdução de novas
indústrias e a diversificação do parque industrial geraram um efeito positivo sobre o restante da
economia. Esse fenômeno, conhecido como efeito "para trás", envolvia o estímulo à produção de
peças, componentes e acessórios necessários para a fabricação dos bens mais complexos. A
diversificação industrial, portanto, não apenas expandia o setor de bens de consumo, mas
também criava novas oportunidades de crescimento para o setor de equipamentos e insumos
industriais. Com isso, o mercado interno foi ampliado, não apenas para os produtos finais, mas
também para os insumos industriais e componentes necessários à sua produção. Esse ciclo de
estímulo à produção industrial, gerado pela introdução de novas indústrias, contribuiu para o
fortalecimento da base industrial do país e para a sua capacidade de atender a um mercado
interno em crescimento, ainda que de forma desigual.

Por fim, a expansão do mercado e a industrialização levaram à integração vertical e horizontal do


parque industrial, exigindo grandes investimentos em tecnologia e infraestrutura, com crescente
participação do capital estrangeiro. Ao mesmo tempo, o setor público desempenhava um papel
crucial ao garantir os insumos necessários para a continuidade do crescimento industrial, ainda
que suas ações estivessem subordinadas às demandas do processo em curso.

Considerações finais de Castro

Castro traz a integração dos mercados regionais no contexto nacional, evidenciando as


disparidades crescentes entre o polo industrial, localizado principalmente nas áreas mais
desenvolvidas, e as regiões periféricas, menos desenvolvidas. Inicialmente, os interesses
nacionais pareciam convergir com as necessidades do polo industrial em expansão. À medida
que o processo de industrialização avançava, no entanto, tornou-se claro que era necessário
enfrentar questões estruturais que se aprofundavam nas regiões mais afastadas. A integração
econômica entre essas regiões e o centro industrial revelou a precariedade em que muitas áreas
periféricas se encontravam, especialmente aquelas com uma população rural significativa e um
sistema agrário pouco dinâmico.

Nas regiões periféricas, um dos problemas centrais era o crescimento demográfico acelerado, que
tornava ainda mais desafiadora a absorção da mão-de-obra pela economia local. O sistema
agrário, rígido e dominado por grandes latifúndios, mostrava-se incapaz de gerar oportunidades
de emprego suficientes para a população rural, que crescia rapidamente. Como consequência,
muitos trabalhadores foram forçados a migrar em busca de melhores condições de vida, seja nas
capitais regionais, no polo industrial ou em áreas pioneiras, onde esperavam encontrar novas
oportunidades de trabalho. Essa migração resultava em uma superabundância de mão-de-obra
nos centros urbanos. A modernização da agricultura e a mecanização de certos processos
reduziam ainda mais a necessidade de trabalhadores rurais, e, nos centros urbanos, a indústria e
os serviços também não conseguiam absorver toda a mão-de-obra disponível. A evolução
tecnológica, que promovia o uso de técnicas que poupam mão-de-obra, agrava a situação,
gerando um excesso de trabalhadores desocupados ou subempregados.

Já nos centros urbanos, esses trabalhadores excedentes, sem qualificações ou oportunidades de


emprego, acabavam por se inserir em atividades marginais no setor terciário, em que
predominavam o subemprego. A proliferação dessas atividades marginais não apenas mantinha
essas populações em condições de vida precárias, como também pressionava para baixo os
salários de outros setores produtivos. Além disso, essa população, com baixo poder aquisitivo,
não contribuía significativamente para o crescimento da demanda por produtos manufaturados,
concentrando sua capacidade de consumo em bens de subsistência, como alimentos, o que
limitava o mercado interno e reduzia as oportunidades de crescimento industrial. Nisso, a
presentação dessa população marginalizada nos centros urbanos gerava um conjunto de
problemas sociais. O aumento da demanda por serviços públicos essenciais, como moradia,
saúde e educação, não era acompanhado pela expansão adequada dessas infraestruturas, o que
resultava em deterioração das condições de vida, agravamento de questões de saúde pública e
surgimento de tensões sociais. A falta de políticas públicas para enfrentar esses desafios
contribuía para o aumento da desigualdade social e para a manutenção de uma estrutura
econômica excludente.

Com isso, Castro chega ao ponto do amadurecimento do polo industrial, que, ao integrar os
mercados regionais, esgotava as possibilidades de expansão horizontal de seus mercados
internos. A partir desse ponto, o crescimento econômico do polo industrial não poderia mais se
basear na expansão de sua base de mercado, tornando-se necessário enfrentar os problemas de
estagnação das regiões periféricas. Essa situação exigia políticas corretivas que pudessem
redistribuir as oportunidades de desenvolvimento de maneira mais equitativa entre as diferentes
regiões do país. Nesse contexto, o papel do Estado se torna central. O processo de
industrialização, que inicialmente foi impulsionado por uma resposta à crise global e às tensões
internas, atingia um ponto de maturidade em que novas decisões precisavam ser tomadas. O
Estado, que até então havia atuado principalmente como "Estado-serviços", agora precisava
assumir um papel mais ativo e decisivo como "Estado-poder", capaz de enfrentar os desafios
estruturais e direcionar o desenvolvimento futuro de maneira a incluir as regiões periféricas no
progresso econômico.

Dessa maneira, o excesso de mão-de-obra gerado pelo crescimento demográfico acelerado e pela
incapacidade das indústrias e do setor agrário de absorver essa força de trabalho resultava na
migração em massa para os centros urbanos. Nesses centros, a mão-de-obra excedente buscava
se inserir no mercado de trabalho por meio de atividades marginais, muitas vezes no setor
terciário, que oferecia empregos de baixa qualificação e remuneração. Esses subempregos não
atendiam às necessidades básicas das populações, levando à formação de um "reservatório" de
trabalhadores mal remunerados. Esse cenário acabava por exercer pressão sobre os salários nos
setores produtivos, especialmente para aqueles com baixa qualificação, ao mesmo tempo que
restringia o poder de compra dessas populações.

Já a concentração dessas camadas marginalizadas nas cidades gerava uma série de problemas
sociais, que se manifestavam na crescente demanda por serviços públicos essenciais, como
saúde, educação e habitação. No entanto, a oferta desses serviços era insuficiente para atender às
necessidades da população em rápido crescimento. Isso resultava em uma deterioração das
condições de vida nas áreas urbanas, com o agravamento de questões relacionadas à higiene,
saúde pública e outras demandas sociais. A ausência de políticas públicas eficazes para lidar com
esses problemas contribuía para aprofundar as desigualdades sociais, criando um ciclo de
marginalização e pobreza que perpetuava a exclusão das populações mais vulneráveis. Além
disso, o polo industrial, ao integrar os mercados regionais, atingiu um ponto de maturidade em
que não era mais possível continuar a expandir sua base de mercado internamente. A
industrialização já havia esgotado as oportunidades de expansão horizontal, e as regiões
periféricas, que continuavam estagnadas, enfrentavam dificuldades para gerar empregos
produtivos para suas populações crescentes. Isso exigia a implementação de políticas corretivas e
decisivas, que visassem reverter o quadro de estagnação e promover o desenvolvimento dessas
regiões. A industrialização, que inicialmente avançou sem uma direção política clara, agora
chegava a um ponto crítico em que era necessário definir os rumos futuros do desenvolvimento
nacional.

Assim, o papel do Estado se tornava central. Anteriormente, o Estado havia desempenhado um


papel mais passivo, atuando principalmente como um "Estado-serviços", focado em fornecer
infraestrutura e serviços básicos. No entanto, diante dos desequilíbrios regionais, sociais e
setoriais, o Estado precisava se reposicionar e assumir um papel mais ativo, como
"Estado-poder". Esse novo papel exigia que o Estado tomasse decisões estratégicas para lidar
com as desigualdades e desequilíbrios que haviam se agravado ao longo do processo de
industrialização. O desenvolvimento futuro dependia, não apenas de manter um certo ritmo de
crescimento econômico, mas também de escolher uma direção clara e inclusiva para enfrentar os
desafios estruturais e promover um progresso que fosse mais abrangente e sustentável para todas
as regiões do país.

Agricultura e desenvolvimento do Brasil

Castro começa abordando que a análise da agricultura brasileira é um tema de grande


complexidade, dado o contexto socioeconômico multifacetado do país. Nesse cenário, a
diversidade de perspectivas sobre a agricultura e seus impactos no desenvolvimento é evidente.
Inicialmente, os autores concordam que o Brasil abriga diferentes sistemas econômico-sociais, o
que implica a necessidade de uma abordagem cuidadosa e multifocalizada para compreender a
agricultura em suas múltiplas dimensões. Tal análise multifacetada leva a um debate
significativo. De um lado, há aqueles que percebem a agricultura como um entrave ao
desenvolvimento. Essa visão se baseia na ideia de que práticas agrícolas tradicionais e pouco
produtivas contribuem para a manutenção de desigualdades e limitam o potencial de crescimento
econômico. Do outro lado, existem os que argumentam que a agricultura possui uma capacidade
intrínseca de adaptação às exigências do crescimento econômico, evidenciando o potencial do
setor para se transformar e contribuir significativamente para a economia nacional.

A discussão é aprofundada pela citação de Jacques Lambert, que aponta a "dualidade"


econômica e social que caracteriza o Brasil. Essa dualidade se manifesta na coexistência de duas
sociedades, cada uma com seus próprios ritmos e estruturas. Esse fenômeno é visto como um
mecanismo que favorece a acumulação de capital, onde as elites econômicas se beneficiam das
disparidades existentes. Essa concentração de riqueza e poder em determinadas regiões ou
grupos pode resultar em um sistema agrícola que perpetua desigualdades e impede um
desenvolvimento mais inclusivo. Com isso, contrapondo-se a essa perspectiva, Castro traz
autores como Alberto Passos Guimarães que argumentam que as relações de produção na
agricultura brasileira são heranças de um sistema feudal, o que limita o progresso do setor.
Guimarães aponta para a necessidade de uma reforma agrária como uma medida essencial para
modernizar a agricultura e, ao mesmo tempo, melhorar as condições de vida no campo. A
proposta de reforma agrária sugere que a redistribuição da terra e a promoção de formas mais
justas de produção poderiam contribuir para um desenvolvimento rural mais equilibrado,
rompendo com as estruturas arcaicas que ainda persistem.

Ademais, a visão de Guimarães ressalta a interconexão entre as condições sociais dos


trabalhadores rurais e a produtividade agrícola. A modernização do setor agrícola, segundo essa
perspectiva, não pode ser alcançada apenas através de inovações tecnológicas ou investimentos,
mas deve também incluir a transformação das relações sociais e produtivas. A reforma agrária,
nesse contexto, aparece como um caminho para proporcionar melhores condições de trabalho e
promover uma maior equidade social. Dessa forma, a análise das diversas perspectivas sobre a
agricultura brasileira não apenas ilumina os desafios enfrentados pelo setor, mas também aponta
para as possíveis soluções que podem ser implementadas. A discussão sobre a necessidade de
reformas estruturais na agricultura é crucial para garantir que o setor não apenas contribua para o
desenvolvimento econômico do país, mas também promova a inclusão social e a justiça
econômica. Portanto, entender essas dinâmicas é fundamental para elaborar políticas que possam
efetivamente transformar a agricultura em um motor de desenvolvimento sustentável e equitativo
no Brasil.

Nisso, tem um debate crucial sobre a natureza da agricultura brasileira e suas implicações para o
desenvolvimento econômico do país, trazendo à tona críticas ao modelo feudalista tradicional
que é frequentemente associado à estrutura agrária nacional. O primeiro ponto vem de Caio
Prado Júnior, que contesta a ideia de que a grande propriedade rural brasileira possui uma
natureza feudal. Segundo Prado Júnior, essa perspectiva é reducionista e ignora as raízes mais
complexas da propriedade rural no Brasil, que estão ligadas a uma exploração comercial intensa,
em vez da exploração camponesa tradicional que caracteriza as sociedades feudais. Ele
argumenta que as grandes propriedades rurais surgiram não apenas como resultado de um
sistema feudal, mas também como parte de um processo de acumulação de capital que se
distingue pela sua ligação com o comércio e a exportação. Isso sugere que a dinâmica agrícola
brasileira é moldada por interesses comerciais e financeiros, refletindo uma estrutura que busca
maximizar lucros em um contexto global, ao invés de se basear na exploração da mão de obra
camponesa.

Já Ignácio Rangel, por sua vez, tenta encontrar um meio-termo nessa discussão ao reconhecer
que a agricultura brasileira, apesar de suas características arcaicas e desigualdades, também
possui um lado moderno. Rangel salienta que há segmentos da agricultura que estão integrados
ao mercado e que operam em uma lógica capitalista. Essa dualidade evidencia um setor que,
embora enfrente limitações estruturais, também tem potencial para se modernizar e se adaptar às
novas demandas do mercado. Rangel sugere que essa modernidade não deve ser ignorada, pois
pode ser a chave para transformar a agricultura e sua relação com outros setores da economia.

Celso Furtado e Werner Baer complementam essa discussão ao enfatizar a inadequação da


estrutura agrária atual para atender às demandas de um desenvolvimento econômico que busca
ser inclusivo e sustentável. Eles argumentam que a reforma agrária é essencial não apenas para
aumentar a produção agrícola, mas também para melhorar o poder de compra das populações
rurais. Essa melhoria permitiria uma maior integração entre os setores agrícola e industrial,
essencial para o desenvolvimento econômico do Brasil. Furtado, em particular, destaca a
necessidade de uma estrutura agrária que não apenas suporte a produção, mas que também
fomente uma relação simétrica entre o campo e a cidade, contribuindo para um desenvolvimento
mais equilibrado e justo.

Assim, essa análise das diferentes perspectivas sobre a agricultura brasileira revela um debate
complexo e multifacetado. Esse debate destaca tanto as limitações impostas por relações de
produção arcaicas e desiguais quanto a potencialidade de transformação do setor por meio de
reformas significativas. Reconhecer essa complexidade é fundamental para compreender os
desafios que a agricultura enfrenta no contexto do desenvolvimento econômico brasileiro e para
formular políticas que realmente atendam às necessidades do setor e de suas populações. A
intersecção entre tradição e modernidade, exploração e potencial de transformação, é um tema
central que continuará a influenciar a discussão sobre o futuro da agricultura no Brasil.

Com isso, o subdesenvolvimento no Brasil revela uma relação intrínseca entre desenvolvimento
e subdesenvolvimento, ambos resultantes da estrutura do capitalismo. Esse fenômeno é evidente
ao observar que o subdesenvolvimento do Nordeste é influenciado pelo capitalismo da mesma
forma que o desenvolvimento de São Paulo. Assim, a compreensão da economia brasileira
requer uma visão que não atribua o subdesenvolvimento unicamente ao "feudalismo", pois isso
simplifica a complexidade da natureza capitalista do país e pode levar a erros nas políticas
públicas. Nisso, André Frank critica a visão de que São Paulo é a locomotiva do Brasil,
ressaltando que os demais estados também desempenham um papel vital ao fornecerem o
"combustível" econômico. A dinâmica entre a metrópole e os satélites econômicos pode ser
analisada sob diversos aspectos, como a deterioração dos termos de intercâmbio interno e a
transferência de recursos financeiros e humanos, evidenciando uma relação de dependência que
perpetua a desigualdade entre regiões.

Frank destaa que a miséria rural não é consequência do feudalismo, mas sim das interações
desiguais no capitalismo, as quais se assemelham à relação entre países subdesenvolvidos e
nações altamente industrializadas. A agricultura brasileira é frequentemente vista como um setor
retrógrado que impede o progresso, sendo responsabilizada pela insuficiência de crescimento
econômico. A Política de Ação Econômica do Governo (PAEG) exemplifica essa visão,
sugerindo que a falta de uma política agrícola adequada limitou a expansão harmoniosa da
economia. Ademais, o debate sobre o atraso agrícola frequentemente atribui a culpa a práticas
rudimentares e à falta de uma estratégia coerente por parte do Ministério da Agricultura. Alguns
autores, como Delfim Netto, contestam essa visão, afirmando que a agricultura brasileira tem
crescido e se diversificado em resposta ao desenvolvimento econômico global.

Já Ruy Miller Paiva, por sua vez, argumenta que a análise da agricultura deve considerar suas
interações com outros setores da economia. Ele destaca que a limitação do mercado consumidor
é um fator crucial que não foi suficientemente abordado nas discussões anteriores. Essa
perspectiva amplia a compreensão dos desafios enfrentados pela agricultura e sugere que, ao
invés de ser um obstáculo, ela pode ser um componente vital para o desenvolvimento econômico.

Chegando ao ponto de que há controvérsias sobre o papel da agricultura no desenvolvimento


brasilerio se refletem em debates mais amplos sobre a transição do feudalismo para o capitalismo
e os desafios estruturais do subdesenvolvimento. As dificuldades encontradas na análise
econômica agrária apontam para a necessidade de um entendimento mais profundo e crítico
sobre as dinâmicas que moldam a economia, considerando as interconexões entre diferentes
setores e regiões do Brasil.

As funções da agricultura no desenvolvimento brasileiro

A geração de um excedente de alimentos e matérias-primas é considerada uma condição


fundamental para o desenvolvimento econômico de qualquer comunidade. Essa produção
excedente vai além da mera satisfação das necessidades básicas da população, permitindo a
formação de um núcleo econômico que favorece o crescimento e a diversificação das atividades.
Para que uma comunidade inicie um processo de diferenciação de atividades e promova a vida
urbana, é essencial que a população dedicada à agricultura consiga produzir não apenas para seu
próprio consumo, mas também para abastecer mercados e outras necessidades da sociedade.

Nisso, tamanha capacidade de produzir um excedente não apenas viabiliza a especialização das
funções dentro da sociedade, mas também resulta na divisão social do trabalho e na
intensificação das trocas econômicas. Inicialmente, essa divisão se estabelece entre o campo e a
cidade, onde a produção agrícola se torna a base para o crescimento das atividades urbanas. As
cidades, por sua vez, se tornam centros de consumo e de serviços, gerando uma demanda
contínua por produtos agrícolas, que precisa ser atendida por uma agricultura eficiente e
produtiva. Com o aumento das taxas de crescimento demográfico e a crescente necessidade de
expandir a produção agrícola, novos desafios emergem. A modernização da agricultura, muitas
vezes exigindo profundas transformações tecnológicas, sociais e políticas, torna-se crucial para
garantir o excedente necessário ao desenvolvimento urbano-industrial. Essa modernização pode
envolver a adoção de novas técnicas de cultivo, a mecanização do trabalho agrícola e o uso de
insumos mais eficientes. Tais mudanças não apenas aumentam a produtividade, mas também têm
o potencial de melhorar as condições de vida dos agricultores, incentivando uma maior
mobilidade social.

Kautsky e Lênin destacam a importância de uma agricultura produtiva para a formação de um


mercado interno robusto. Eles argumentam que transformações significativas na estrutura agrária
são acompanhadas pelo surgimento do capitalismo, um sistema que se alimenta da eficiência
produtiva e da maximização do excedente. Essa dinâmica resulta em uma interdependência
crescente entre as áreas rural e urbana, onde a prosperidade de uma está intimamente ligada à
saúde econômica da outra. Assim, a evolução da agricultura não é apenas uma questão de
produtividade, mas um elemento central para a estruturação de uma economia mais ampla, que
busca não apenas a sobrevivência, mas o desenvolvimento sustentável e inclusivo.

Ademais, historicamente, até as primeiras décadas do século XIX, as nações enfrentavam a


dificuldade de romper com a inércia do agrarismo para gerar o excedente necessário. A
agricultura, em sua forma tradicional, limitava o potencial de desenvolvimento econômico, visto
que a produção era majoritariamente voltada para o consumo familiar ou local, sem uma lógica
de excedente que pudesse ser reinvestido em outros setores. Este cenário começou a mudar com
a ativação do comércio internacional, que, a partir do século XIX, proporcionou novas
oportunidades. O comércio global não apenas ampliou os mercados para os produtos agrícolas,
mas também facilitou o acesso a insumos e tecnologias que permitiram um aumento significativo
na produtividade. Esse novo panorama permitiu que o excedente agrícola não fosse mais
condicionante rígido para o desenvolvimento das atividades industriais. As nações passaram a se
especializar na produção de bens que podiam ser comercializados em larga escala, resultando na
formação de economias que, mesmo sem uma industrialização significativa, eram capazes de
gerar um amplo excedente. Essa especialização não apenas diversificou a base econômica, mas
também criou uma nova dinâmica de interdependência entre as economias rurais e urbanas.

Nesse sentido, nos países que se dedicaram à exportação de produtos agrícolas, surgiram novas
realidades sociais e econômicas. A divisão interna do trabalho se transformou, mas não
necessariamente se traduziu em um crescimento urbano-industrial proporcional. A coexistência
da agricultura voltada para o mercado interno com a produção destinada à exportação tornou-se
essencial para o desenvolvimento equilibrado das economias. Isso implica que o processo de
industrialização e urbanização não pode ser visto apenas como um resultado do aumento no
excedente agrícola; é preciso considerar também o remanejamento dos fatores produtivos, ou
seja, a alocação eficiente de recursos entre os setores. A reconversão da agricultura de
exportação para atender o mercado interno foi um fenômeno particularmente evidente no Brasil,
especialmente após a Segunda parte da grande guerra. O país, que já era um dos principais
produtores de café, enfrentou uma demanda crescente por esse e outros produtos, levando a uma
expansão significativa da produção agrícola. No entanto, essa expansão também gerou disputas
internas, uma vez que os setores voltados para a exportação frequentemente entravam em
conflito com aqueles destinados ao mercado interno. Essa tensão ressalta a complexidade das
relações econômicas internas, onde o aumento da produção agrícola se tornava crucial para
sustentar o crescimento industrial.

Além disso, a capacidade da agricultura brasileira de aumentar a produção para o mercado


interno teve um papel fundamental durante o processo de industrialização. O governo incentivou
a modernização do setor agrícola por meio de políticas públicas, o que, aliado à crescente
demanda interna, resultou em uma produção mais eficiente e diversificada. Essa transformação
não apenas garantiu alimentos para a população em crescimento, mas também forneceu os
recursos necessários para financiar a industrialização, estabelecendo um ciclo virtuoso de
crescimento.
Por fim, a história brasileira revela que a combinação de novos fatores, como a disponibilidade
de terras férteis e o crescimento demográfico, contribuiu para um ritmo elevado de crescimento
agrícola. Durante o período de industrialização, as taxas de crescimento da agricultura, embora
variáveis, mantiveram-se superiores ao crescimento demográfico. Isso demonstra a relevância da
agricultura não apenas como um setor econômico, mas também como um alicerce essencial no
processo de desenvolvimento econômico do Brasil, influenciando as estruturas sociais, políticas
e econômicas de forma profunda e duradoura. Assim, o excedente agrícola se consolidou como
um motor de transformação, evidenciando a interdependência entre os diferentes setores da
economia e a importância de uma abordagem integrada para o desenvolvimento econômico.

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