Acordao-2024 18814
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PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
RMB
Nº 70085742955 (Nº CNJ: 0001395-17.2023.8.21.7000)
2023/CRIME
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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
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ACÓRDÃO
RELATÓRIO
DES.ª ROSAURA MARQUES BORBA (RELATORA)
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É o relatório.
VOTOS
DES.ª ROSAURA MARQUES BORBA (RELATORA)
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No mesmo sentido:
APELAÇÃO DOS RÉUS CESAR E VALDOIR. TRIBUNAL
DO JÚRI. HOMICÍDIO QUALIFICADO. NULIDADE
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E mesmo nas mais sutis flutuações em torno da espécie de dolo, direto ou eventual, a
postura do Primeiro Grupo Criminal tem sido a mesma, por exemplo: Embargos Infringentes
e de Nulidade, Nº 70085419844, Primeiro Grupo de Câmaras Criminais, Tribunal de Justiça
do RS, Relator: José Antônio Cidade Pitrez, Redator: Jayme Weingartner Neto, Julgado em:
10-12-2021) .
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BADARÓ, p. 763.
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Manter o acusado algemado, sem periculosidade previamente demonstrada, “significa
colocar a defesa, antecipadamente, em patamar inferior, não bastasse a situação de todo
degradante. O julgamento do júri é procedido por pessoas leigas, que tiram as mais
variadas ilações do quadro verificado. A permanência do réu algemado indica, à primeira
visão, cuidar-se de criminoso da mais alta periculosidade, desequilibrando o julgamento a
ocorrer, ficando os jurados sugestionados” – STF, HC 91.952/SP, rel. Min. Marco Aurélio,
Pleno, j. 07/8/2008
4
BADARÓ, p. 817. No nota de rodapé 275, cita Tourinho Filho, que preconizava fossem
corteses, nada impedindo certa dose de humor, “sem resvalar para aqueles que produzem
hilaridade circense”.
5
BADARÓ, pp. 817-8 e nota de rodapé 276.
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BADARÓ, p. 818 e nota de rodapé 278.
7
BADARÓ, p. 820-1. Por exemplo, a leitura da “folha de antecedentes”, que induz o jurado
a erro pela propensão de julgar quem já delinquiu como se tivesse, no fato concreto em
exame, também delinquido. No sistema da common law existe a regra de caráter (character
rule), “que proíbe a admissão de prova desabonadora do caráter do acusado” (foi por
influência do júri que a doutrina criou as exclusionaires rules, profiláticas). Reitera-se que a
vedação do artigo 478 “não é quando à prova dos fatos, mas quanto ao argumento utilizado
para persuadir os jurados”.
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Veja-se trecho da ementa dos Embargos Infringentes (reconheci também ofensa ao direito
ao silêncio do réu, o que não foi acolhido no processado, mas sim o segundo ponto, em
suma, a impossibilidade de um debate heterotópico: “Contudo, no caso presente, não se
está diante de perguntas, senão que frente a verdadeira argumentação que, deduzida por
ocasião do interrogatório, nem sequer pode ser contraditada pela defesa que, percebendo o
sibilino propósito do promotor de justiça, tentou se opor à conduta por esse observada, sem
sucesso. Inafastável, assim a conclusão de que houve quebra da paridade de armas, pois
não teve a defesa a oportunidade de se contrapor à argumentação que não poderia ser
deduzida por ocasião do ato processual que se realizava, afigurando-se evidente o prejuízo
suportado pelo réu, com a utilização do interrogatório para antecipação da acusação, sem
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jurados e vamos ver quem eu sou e quem o senhor é”; MP – “Que beleza”;
D – “Vamos ver, eu lhe desafio, eu lhe desafio”; MP – “Eu aceito o
desafio”; Juíza Presidente (2ª) – “Doutores, o que está sendo levado a
julgamento não são os senhores... É o réu”; D – “Pois é, mas foi o
promotor...; Juíza Presidente (2ª) – “E cabe ao senhor e ao promotor
atuarem de acordo com o mérito do processo”. No trecho final, mais uma
troca de frases [a defesa diz (em tom interrogativo) que, por ter defendido
este ou aquele, o advogado não tem que ser condenado; o promotor de
justiça diz que o advogado ofende a família, que não respeita o luto...],
gerando a terceira intervenção da Juíza Presidente (3ª) – “Doutor, a defesa
está com a palavra, precisa desenvolver o trabalho da defesa...”,
intercaladas por três frases das partes (MP – “É proibido, imagina aquele
negrinho andar na rua do réu...”; D – “Doutora, eu vou desertar do
plenário se continuar assim”; MP – “De novo?”) e encerrado pela Juíza
Presidente – “Doutor, o senhor está com a palavra, o Ministério Público
tem que, quando quiser um aparte, pedir e deixar a defesa desenvolver o
trabalho e fazer a defesa do réu, o senhor está com a palavra”.
As citações demonstram, ad nauseam, o clima de duelo instalado – aliás, a
defesa inclusive afirma que a desinteligência vem de longe, “chateado” o
Promotor de Justiça Dr. Amorim porque no [longínquo] 11/6/2019 o
advogado Dr. Rodrigo obteve a absolvição de um réu que fora declarado
inimigo capital do Promotor de Justiça pela Terceira Câmara do TJRS (pp.
3.112-4).11 E, sim, procede o argumento recursal: “O réu não deve ser
condenado ou absolvido pela boa ou má fama do seu defensor [ou do
acusador, acrescento]. Quem está em julgamento é o acusado, e os fatos a
ele imputados”. Apenas que a assertiva é biunívoca, vale para ambos os
profissionais. Não tenho, aqui, nem deveria, que estabelecer se houve
injusta provocação ou retorsão imediata, inclusive pelo regime de
imunidade, a priori, das ofensas irrogadas em juízo, na discussão da causa,
pelas partes/procuradores (problema eventual das respectivas
corregedorias). Basta-me a constatação de que houve argumentação ad
hominem por ambos os profissionais, pelo que, no caso concreto, deixo de
reconhecer qualquer nulidade, lamentando pelos jurados, que certamente
foram distraídos da sua grave missão. Reitero que não cabe ao Judiciário
interferir na autonomia das partes quanto às escolhas estratégicas, menos
ainda ditar regras de estilo para os debates. Mas há uma dupla tarefa
jurisdicional, indeclinável: a de primeiro grau, já minuciosamente descrita;
e, em segundo grau, aferir, olhos no caso concreto, se o comportamento de
qualquer profissional, enveredando pela atipicidade processual e causando
prejuízo, merece a consequência da nulidade estampada no art. 593, III,
“a”, do CPP.
Chego ao ponto (iv), a inovação acusatória em prejuízo do réu, pela qual,
já adiantei, reconheço a nulidade. A questão já se insinuara na penúltima
11
A animosidade perpassou os debates, como se vê, também, da consignação na Ata, item
7 dos incidentes, a pedido do Ministério Público: “que poucas vezes viu um ato de tamanha
deslealdade por parte da defesa, e ainda que posteriormente aos 45min da tréplica foi
chamado de criminoso pela defesa”.
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LIMA. Renato Brasileiro. Código de Processo Penal Comentado. 7. ed. - São Paulo :
Editora JusPodivm, 2022. p. 1.389
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7º Quesito: O crime foi praticado por motivo torpe, haja vista a intolerância
do denunciado com o grupo de jovens que se reunia com a vítima nas
proximidades de sua casa, o que o incomodava, tendo manifestado várias
vezes insurgência com relação a isso, bem como em face do sentimento de
inveja e frustração de não impor o bastante sua condição de policial à
vítima, que tinha projeção nacional dentro do esporte que praticava (boxe).
Tais sentimentos afloraram com o fato de a vítima não ter atendido seu
chamado, e, em represália, sentindo-se ultrajado e desprezado, efetuou
contra esta os disparos fatais.
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CPP, que assim dispõe: “Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade
não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa”.
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agregados nesta esfera pela nobre Desembargadora Rosaura Marques Borba, não cogito de
eiva no julgamento do Tribunal do Júri.
Da mesma forma, rejeito o reconhecimento da atenuante genérica, malgrado
os ponderáveis argumentos expostos no voto dissidente, pois perfilho do posicionamento
proclamado no voto condutor do acórdão no julgamento da Apelação.
Adentrando ao exame do pleito de reconhecimento da confissão espontânea,
aqui o objeto da divergência parcial, saliento que até pouco tempo vinha me posicionando
contrariamente ao reconhecimento da aludida atenuante, quando a confissão se mostrasse
qualificada, pois defendia que a confissão só se erigia à condição de atenuante quando fosse
completa ou, em outras palavras, quando o acusado admitisse integralmente o crime que lhe
foi imputado na denúncia.
Dubruçando-me sobre a questão, todavia, entendo por rever meu
posicionamento, em atenção à Recomendação nº 134/2022 do Conselho Nacional de Justiça,
que instituiu uma concepção de jurisdição baseada no conceito de uniformização de
jurisprudência, de modo a garantir que os precedentes sejam respeitados, como forma de
garantir a isonomia e o equilibrio entre as pertes, em atenção ao necessário cumprimento do
direito material.
Neste aspecto, saliento que o sistema de precedentes brasileiro exige intensa
integração entre as instâncias do Poder Judiciário, sendo dever dos Tribunais locais aplicar
os precedentes formados pelas Cortes Superiores no julgamento dos temas repetitivos e na
sistemática da repercussão geral.
Quanto ao ponto, inclusive, entendo relevante pontuar excerto do voto
proferido pela eminente Ministra Nancy Andrighi no julgamento da Reclamação nº
36.476/SP, no qual assentou que a razão de ser da observância dos precedentes concentra-se
"na racionalização da prestação jurisdicional do Tribunal, como forma de viabilizar o
cumprimento de sua função constitucional de manter a uniformidade da aplicação da lei
federal. Nesse panorama, o STJ se desincumbe de seu múnus definindo, por uma vez, a
interpretação da lei que deve obrigatoriamente ser observada pelos demais juízes e
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RCL nº 36.476/SP, Corte Especial do STJ, Relatora Ministra Nancy Andrighi, publicado no
DJe de 06/03/2020.
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Além disso, saliento a existência da Súmula 545 do STJ, cujo teor diz que:
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confissão espontânea, aplico a redução da pena no patamar de 1/12 (um doze avos),
atingindo 16 (dezesseis) anos e 06 (seis) meses de reclusão, patamar que torno definitivo,
em razão da ausência de outras causas modificadoras.
Por tais fundamentos, divergindo em parte da eminente Relatora, acolho
parcialmente os embargos infringentes, para fazer prevalecer o voto dissidente tão
somente em relação ao reconhecimento da atenuante da confissão e, assim, em menor
extensão, redimensionar a reprimeda do acusado ao patamar de 16 (dezesseis) anos e 06
(seis) meses de reclusão.
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