Legítima Defesa

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atingido, pois, se o foi, não se deve decretar a ineficácia caracterização. Legítima defesa putativa.

Circunstâncias
do ato. que não autorizavam ao réu crer que estaria agindo
A esta altura, à luz do sistema da nulidade dos atos amparado pela excludente. Inexigibilidade de conduta
processuais, é de se indagar se a sentença condenatória, diversa. Hipótese não configurada. Resultado previsível.
na qual se invoca o silêncio dos réus como um dos Minorante prevista no art. 129, § 4º, do Código Penal.
fundamentos para a condenação, pode alcançar a sua Revide perpetrado cerca de meia hora após a injusta
finalidade, isto é, se está apto a dar a resposta penal ao provocação. Impossibilidade de aplicação. Condenação
infrator da norma que tutela juridicamente um bem? mantida. Recurso conhecido, e não provido.
Entendo, s.m.j., que sim, se a condenação se
vale, como in casu, de outros elementos de prova para - Se o agente agrediu a vítima quando ela estava de
fundamentar o reconhecimento da autoria delitiva. costas, é óbvio que a agressão injusta já havia cessado,
Mencione-se, por exemplo, conforme se extrai da sentença inexistindo atualidade ou iminência que justificasse a
de f. 872/889, o depoimento da testemunha M.S.R. (f. 64), reação do recorrente.
a confissão e delação do segundo apelante (f. 226/229)
e o auto de reconhecimento de f. 761, provas que - Como a vítima foi agredida pelas costas, não há como
informaram o convencimento do Julgador e que serviram crer que o apelante imaginava estar agindo em legítima
de fundamento para a condenação, a demonstrar que o defesa, pois as circunstâncias não o autorizavam a acre-
fim da sanção penal foi, em tese, alcançado. ditar em tal sentido.
A anulação do ato, em hipóteses tais, resultaria
inócua, pois não há dúvida de que, a despeito da - Não há falar ainda em inexigibilidade de conduta
interpretação do silêncio dos réus, o convencimento do diversa, pois, mesmo estando cansados, assim como
Julgador quanto à autoria do delito já se formou em torno o acusado, os demais indivíduos que participavam da
das provas angariadas aos autos. festa não agrediram o ofendido, embora também por
Assim, diante da apontada nulidade, basta que este ele provocados.
Tribunal, em sede recursal, privilegiando os princípios
processuais alhures mencionados, desconsidere o - Tendo em vista que o golpe foi desferido contra ponto
silêncio dos réus e avalie a procedência ou não do juízo vital do corpo do ofendido, quando este se encontrava de
condenatório em face das demais provas invocadas costas, perfeitamente previsível que o golpe fosse capaz
na sentença, o que é também mais condizente com o de causar a morte da vítima.
princípio da economia processual.
A anulação de um processo, mesmo de um ato, - Não se vislumbrando ter sido o crime praticado logo em
implica sempre transtornos de toda ordem na prestação seguida à injusta provocação realizada pela vítima, inca-
jurisdicional, não sendo razoável, assim, a sua declaração bível a incidência da causa de diminuição, prevista no
quando se é possível vislumbrar, como in casu, o art. 129, § 4º, do Código Penal.
aproveitamento do ato e a ausência de prejuízo às partes.
Do exposto, rogando redobrada vênia, rejeito a Recurso não provido.
preliminar suscitada, para que se prossiga no exame dos
recursos. APELAÇÃO CRIMINAL Nº 1.0604.12.001886-5/001 -
É como voto. Comarca de Santo Antônio do Monte - Apelante: C.R.L.
- Apelado: Ministério Público do Estado de Minas Gerais
DES. CORRÊA CAMARGO - De acordo com - Vítima: D.J.V. - Relator: DES. CORRÊA CAMARGO
o Relator.
Acórdão
Súmula - ACOLHERAM A PRELIMINAR PARA
Vistos etc., acorda, em Turma, a 4ª Câmara
DECLARAR NULA A SENTENÇA, VENCIDO O REVISOR.
Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Minas
Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em
...
NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.
Lesão corporal seguida de morte - Legítima Belo Horizonte, 12 de fevereiro de 2014. - Corrêa
Camargo - Relator.
defesa - Legítima defesa putativa - Inexigibilidade
de conduta diversa - Previsibilidade do resultado Notas taquigráficas
morte - Causa de diminuição de pena - Injusta DES. CORRÊA CAMARGO - Trata-se de apelação
provocação - Relevante valor moral criminal interposta por C.R.L., já que irresignado com
a r. sentença de f. 130-136, que julgou procedente
Ementa: Apelação criminal. Lesão corporal seguida a pretensão exordial e o condenou como incurso nas
de morte. Excludente de ilicitude. Legítima defesa. Não sanções do art. 129, § 3º, do Código Penal, à pena de
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4 (quatro) anos de reclusão, em regime aberto, vedada a O apelado, por seu turno, apresentou contrarrazões
substituição ou a suspensão da reprimenda. às f. 163-168, rebatendo as teses apresentadas e reque-
A defesa do apelante, em suas razões recursais, rendo o não provimento do recurso aviado.
ofertadas às f. 148-160, inicialmente asseverou não Instada a se manifestar, a d. Procuradoria de Justiça
terem as testemunhas presenciado o momento do revide apresentou parecer às f. 191-192-v., opinando pelo não
perpetrado pelo recorrente, valendo-se de uma garrafa provimento do recurso.
de cerveja, mas apenas as agressões que a vítima contra É o relatório.
ele desferira. Nesse passo, ressaltou que as testemunhas Passa-se à decisão:
teriam sido uníssonas em afirmar haver sido o apelante Recurso próprio e tempestivo, motivo pelo qual
previamente agredido pelo ofendido, sem motivo justo, dele conheço.
inclusive em oportunidades distintas. Na primeira, a Narrou a denúncia que, em 21 de julho de 2012,
vítima teria desferido um pontapé contra o acusado, que por volta as 13h20min, na Rua XX, Bairro Angélica de
nem sequer reagira, haja vista a imensa dor experimen- Castro, na Cidade de Santo Antônio do Monte, após breve
tada em razão do golpe. Em seguida, após deixar o local desentendimento verbal com a vítima D.J.V., o acusado
por um instante, o ofendido teria retornado e arremes- C.R.L., de posse de uma garrafa quebrada, teria desferido
sado cerveja contra o acusado. Ato contínuo, ao virar-se um golpe contra a região cervical do ofendido, produ-
para o lado esquerdo, teria recebido outro chute da zindo-lhe grave lesão vascular que teria evoluído para
vítima na sua nádega direita. Assim, segundo a defesa, óbito. Segundo o Parquet, vítima e acusado, juntamente
no intuito de repelir novas agressões, o apelante teria com outras pessoas, participavam de um adjutório na
golpeado o ofendido com uma garrafa de cerveja que construção da residência de A.S. Ao término do mutirão,

TJMG - Jurisprudência Criminal


segurava, causando-lhe a lesão corporal. Desse modo, quando todos estariam ingerindo cerveja, a vítima teria
arguiu a defesa ter sido a reação do acusado instintiva, agredido o recorrente com um chute. Passados cerca
a fim de repelir novos ataques, baseada em apenas um de trinta minutos, o acusado, em atitude de vingança,
golpe, sem a pretensão de atingir o pescoço ou qual- ter-se-ia apoderado de uma garrafa quebrada e, com
quer outra parte específica do corpo do desafeto. ela, desferido um golpe contra a região cervical esquerda
Enfim, alegando ter sido um revide imediato à agressão do ofendido, provocando-lhe grave lesão. Embora socor-
iminente, moderado, e utilizado como meio necessário, rida, a vítima não teria resistido ao ferimento, ocorrendo
invocou a excludente de ilicitude da legítima defesa para o óbito, no dia seguinte aos fatos, em decorrência de
sustentar a absolvição do acusado. Caso não acolhida hemorragia interna. Mediante tal narrativa, atribuiu o i.
tal pretensão, pleiteou a absolvição fundada na legítima RMP ao apelante prática de infração penal descrita no
defesa putativa, com a exclusão da culpabilidade, defen- art. 129, § 3º, do Código Penal.
dendo que o apelante teria motivos para acreditar que Encerrada a instrução, foi o réu condenado, nos
seria vítima de novas agressões. Nessa mesma senda, termos já relatados.
ainda em busca de um édito absolutório, sustentou a Não havendo preliminares, passa-se à análise
exclusão da culpabilidade com base na inexigibilidade do mérito.
de conduta diversa, haja vista as inúmeras agressões Não há dúvidas de que o acusado, ora apelante,
suportadas pelo acusado, que já se encontrava exausto fora o responsável pelo golpe que levou a óbito o ofen-
após várias horas de serviço braçal. Na hipótese de não dido. A apreciação do presente inconformismo, a prin-
acolhimento de quaisquer das teses acerca da exclusão cípio, cinge-se a aferir se presente alguma causa de
da culpabilidade, requereu a desclassificação do crime excludente de ilicitude ou culpabilidade.
para o de lesão corporal simples, pois o resultado morte Nesse passo, no que tange à alegada legítima
não seria previsível para o acusado, tendo em vista que defesa, tenho não haver ela restado satisfatoriamente
este desferiu apenas um golpe contra a vítima, valendo-se caracterizada.
de garrafa intacta, sem visar região específica do corpo Embora as testemunhas ouvidas em juízo, às
do ofendido. Adiante, invocou a causa de diminuição de f. 66-74, esclareçam que o ofendido adotava compor-
pena, prevista no art. 129, § 4º, do Código Penal, fosse tamentos extremamente inconvenientes na ocasião
porque a conduta teria sido praticada pelo sentenciado dos fatos, agredindo vários dos presentes, dentre eles
em razão de violenta emoção, logo após as agressões o acusado, nenhuma delas presenciou o momento em
perpetradas pela vítima, fosse porque o apelante agira que o acusado desferiu o golpe que culminou na morte
impelido por relevante valor moral. Por fim, ressaltou ser da vítima. Ou seja, a agressão objeto de apuração no
o recorrente pessoa idônea, dedicada ao trabalho, ao presente processo não foi presenciada por quem quer
passo que o ofendido seria usuário de drogas, colecio- que fosse.
nando vários delitos, dentre eles inclusive uma conde- Por outro lado, há um importante elemento, que
nação por homicídio. Em remate, pleteiou a suspensão não pode ser olvidado, a impedir a aplicação da causa
condicional da pena. de excludente da ilicitude da legítima defesa.
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Ao ser indagado pelo i. RMP, em seu interrogatório Penal. Nesse ponto, esclarecedor o depoimento da teste-
às f. 75-76, o acusado esclareceu: munha E.G.O.:
[...] que melhor esclarece que D. estava de costas no momento [...] que, depois que D. chutou as nádegas de C., este não
em que foi golpeado pelo depoente, o que justifica o fato de reagiu; que o depoente não presenciou outras agressões
ter acertado o pescoço do lado esquerdo de D. [...] envolvendo D. e C.; que, entre o chute acima mencionado e
a confusão propriamente dita entre D. e C., decorreram apro-
Ora, nos termos do art. 25 do Código Penal, para ximadamente de vinte a trinta minutos [...] (f. 69).
que esteja caracterizada a causa excludente de ilicitude, é
Para a caracterização da causa de diminuição
necessário que a agressão seja atual ou iminente. Sobre
de pena pretendida, era indispensável a comprovação
tal requisito anota a doutrina:
de que a agressão fora perpetrada pelo acusado logo
Agressão atual: Deve a agressão ser atual ou iminente. Atual em seguida à injusta provocação da vítima. Contudo,
é a que está ocorrendo, ou seja, o efetivo ataque já em curso conforme o relato da testemunha E., somente cerca de
no momento da reação defensiva. Se a agressão for passada, meia hora após a agressão, é que o réu fez o revide.
não haverá legítima defesa, mas vingança (CAPEZ, Fernando. Por conseguinte, não se vislumbrando ter sido o
Código Penal comentado. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2012 -
Comentários ao art. 25 do Código Penal - p. 78).
crime praticado logo em seguida à injusta provocação
da vítima, incabível a incidência da causa de diminuição,
Se o agente agrediu a vítima quando ela estava de prevista no art. 129, § 4º, do Código Penal.
costas, é óbvio que a agressão injusta já havia cessado, Por fim, vale esclarecer que, como não foram
inexistindo atualidade ou iminência que justificasse a acolhidas quaisquer das teses defensivas, sendo mantida
reação do recorrente. a reprimenda do apelante em 4 (quatro) anos de reclusão,
Com isso, cai por terra a tese invocada, não não há falar em substituição da pena ou suspensão condi-
restando caracterizada a legítima defesa no caso em tela. cional da pena, por vedação contida nos arts. 44, I, e 77
Essa mesma constatação impede a aplicação da do Código Penal.
legítima defesa putativa. Sobre tal assunto traz-se à baila Tudo considerado, nego provimento ao recurso,
o magistério de Rogério Greco: mantendo inalterada a bem-lançada sentença recorrida.
Custas, ex lege.
Descriminantes putativas É como voto.
Diz respeito à situação em que o agente, nos termos do § 1º
do art. 20 do Código Penal, por erro plenamente justificado Votaram de acordo com o Relator os DESEM-
pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse,
tornaria a ação legítima. O agente, portanto, atua acredi-
BARGADORES AMAURI PINTO FERREIRA
tando estar agindo justificadamente, ou seja, em legítima (JD CONVOCADO) e EDUARDO BRUM.
defesa, em estado de necessidade, no estrito cumprimento
de dever legal ou no exercício regular de direito quando, Súmula - NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO.
na verdade, a situação que permitiria tal atuação não existe
no mundo real, sendo, tão somente, imaginada por ele. ...
(GRECO, Rogério. Código Penal comentado. 4. ed. Niterói,
RJ: Impetus, 2010, p. 58.)

Como o agente agrediu a vítima pelas costas, não Roubo triplamente majorado - Extorsão mediante
há como se aceitar a tese de que ele imaginava estar
agindo em legítima defesa, pois as circunstâncias não o
sequestro - Consunção - Inépcia da denúncia -
autorizavam a acreditar em tal sentido. Assim, rejeita-se Cerceamento de defesa - Oitiva de testemunha
mais este pleito absolutório formulado pela defesa. sem a presença do réu - Necessidade de
Não há falar ainda em inexigibilidade de conduta demonstração de prejuízo
diversa, pois, mesmo estando cansados, assim como
o acusado, os demais indivíduos que participavam da Ementa: Apelação criminal. Roubo triplamente qualifi-
festa não agrediram o ofendido, embora também por cado e extorsão mediante sequestro. Inépcia da denúncia.
ele provocados. Inocorrência. Nulidade do feito por cerceamento de
Também não prospera o pedido de desclassificação defesa. Inocorrência. Oitiva de testemunhas pelo juízo
do crime ao argumento de que imprevisível o resultado deprecado, sem a presença do réu. Irrelevância. Presença
morte, tendo em vista que o golpe fora desferido contra de defensor nomeado para o ato. Ausência de prejuízo.
ponto vital do corpo do ofendido, quando este se encon- Preliminares rejeitadas. Roubo triplamente qualificado
trava de costas. Dessarte, era perfeitamente previsível que e extorsão mediante sequestro. Absolvição. Impossibi-
o golpe fosse capaz de causar a morte da vítima. lidade. Provas suficientes de autoria e materialidade.
Não há falar ainda em incidência da causa de dimi- Condenação mantida. Absorção do crime de roubo
nuição de pena, prevista no art. 129, § 4º, do Código pelo crime de extorsão mediante sequestro (princípio da
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