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Projecto de Pesquisa - Doutoramento

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PONTÍFICIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

CUSTÓDIO BARRETE CALEMBELA

O TRABALHO INFORMAL EM ANGOLA E AS POLÍTICAS DE


PROTECÇÃO SOCIAL PARA A SUA MITIGAÇÃO. ESTUDO DO
PROGRAMA NACIONAL DE RECONVERSÃO DA ECONOMIA
INFORMAL NO MERCADO DO KICOLO EM CACUACO-LUANDA,
2022

SÃO PAULO – 2023


CUSTÓDIO BARRETE CALEMBELA

O TRABALHO INFORMAL EM ANGOLA E AS POLÍTICAS DE


PROTECÇÃO SOCIAL PARA A SUA MITIGAÇÃO. ESTUDO DO
PROGRAMA NACIONAL DE RECONVERSÃO DA ECONOMIA
INFORMAL NO MERCADO DO KICOLO EM CACUACO-LUANDA,
2022

Projecto de inscrição apresentado ao curso de


pós-graduação (doutorado) em Serviço Social
da Faculdade de Ciências Sociais da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo

SÃO PAULO – 2023

2
SUMÁRIO

1. TEMA 4

2. JUSTIFICATIVA DO ESTUDO 4

3. PROBLEMATIZAÇÃO E REFERENCIAL TEÓRICO 5

3.1. Perspectiva Histórico-Ontológica do Trabalho 10

3.2. Trabalho Informal 14

3.3. Economia Informal 16

3.3.1. Caracterização da Economia Informal em Angola 18

3.3.2. Actividades com maior concentração informal em Angola 20

3.4. Emprego e Desemprego 22

4. PERGUNTA DE PARTIDA 25

5. OBJECTIVO GERAL 25

5.1. OBJECTIVOS ESPECÍFICOS 25

6. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS 25

7. REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO 27

3
1. TEMA

O trabalho Informal em Angola e as políticas de protecção social para a sua mitigação. Estudo
do Programa Nacional de Reconversão da Economia Informal no Mercado do Kicolo em
Cacuaco-Luanda, 2022

2. JUSTIFICATIVA DO ESTUDO

O tema escolhido envolve o trabalho informal e a análise das políticas de protecção


social para a sua mitigação, uma realidade que vai se tornando cada vez maior em Angola,
devido a incapacidade do Estado conceber políticas eficazes de empregabilidade, bem como
o sector privado dar resposta a demanda da falta de emprego formal, levando a que maior
parte da população angolana em idade economicamnete activa enveredam pela prática do
trabalho informal, como meio de sustento próprio e da própria família.

Devido a vulnerabilidade da maior parte dos cidadãos que se dedicam a estas


actividades, pelo nível de pobreza que apresentam e pelas pessimas condições de trabalho
que a actividade informal acarreta, é importante que se faça mais estudos científicos sobre as
políticas e programas existentes, para compreender a ineficicácia dos mesmos na mitigação
ou mesmo erradicação deste fenómeno, que de algum modo periga o futuro da população
envolvida nestas práticas.

Depois de ter participado, como voluntário, no Programa de Reconversão da


Economia Informal (PREI), senti que houve insuficiências na aboradagem do fenómeno e
com este estudo, pretendo apresentar contribuições que refutem ou melhorem os
instrumentos para a protecção social dos trabalhadores informais, fortalecendo assimmas
programas e políticas já existentes que visam o trabalho informal.

Em Angola, existe pouca produção científica relativamente a esta temática (trabalho


informal), num fenómeno que se vai arrastando maioritariamente nos bairros periféricos e
suburbanos das principais cidades de Angola, onde se encontra, com maior predominância a
população pobre, sendo que Luanda a capital de Angola tem maior destaque. Sendo que a
população angolana é bastante jovem, é o trabalho informal que ocupa a população

4
economicamente activa, obrigando a que o Estado tenha atenção as políticas de protecção
social e assistência social para este grupo, sob pena de hipotecar o futuro da Nação.

3. PROBLEMATIZAÇÃO E REFERENCIAL TEÓRICO

O trabalho tem uma relação intrínseca com a pessoa humana, visto que é por ele que
o homem transforma a natureza e também se transforma, tirando dela os elementos
necessários para o seu desenvolvimento. É assim que é dada a qualidade ao homem de um
transformador, ele emprega a sua força física e intelectual para poder usufruir daquilo que a
natureza lhe oferece, é o elemento principal para o desenvolvimento do seu próprio meio,
criando condições que o permitem ter vida digna, próspera, olhando sempre para o presente
e o futuro, ou seja, visa com o trabalho, no presente, construir as bases necessárias ou
fundamentais, que lhe permitam sonhar com um futuro melhor, não apenas para si, mas as
gerações vindouras.

Angola, descoberta a mais de 500 anos pela antiga colónia portuguesa (até 1975),
durante muito tempo, teve no trabalho árduo dos seus autóctones, o desenvolvimento de outra
geografia, no caso, Portugal e viu muitos dos seus filhos serem deportados como escravos e
logicamente não beneficiando da capacidade e do desenvolvimento da mão-de-obra dos
mesmos.

Não houve uma simbiose entre a formação académica e a oferta de mão-de-obra


qualificada para sustentar o mercado de trabalho que se verificou depois da independência
(1975), conforme afirma Myrian Matsuo (2009, p.85): “os indivíduos que não possuíam as
qualificações exigidas pelo mercado eram jogados para fora dos “circuitos de trocas
produtivas” e se tornavam inúteis na perspectiva de uma sociedade que se articulava pela
interdependência funcional entre os seus membros”, desta feita, sem mais alguma alternativa
e para a sua sobrevivência, registou-se um grande êxodo aos centros urbanos, locais onde
eram concentrados maior parte da oferta empregadora a procura de melhores condições de
vida e de um futuro melhor.

Segundo estimativas do Instituo Nacional de Estatísticas (INE), Luanda, a capital de


Angola, possui cerca de 10 milhões de habitantes, dos 30 milhões existentes em Angola e
5
não possui estruturas suficientes, combinado com políticas sociais e públicas ineficazes,
desde escolas, hospitais, habitação, oferta de emprego para dar resposta condigna aos anseios
da população, que viu na economia informal uma saída para a sua sobrevivência, ou seja,
encontram no trabalho informal um meio de por a disposição da sociedade a sua capacidade
física e intelectual, mesmo que fora dos circuitos económicos formais.

O Município de Cacuaco, situado no litoral norte da província de Luanda, capital da


República de Angola, com uma densidade populacional de mais ou menos 1.200.000
habitantes, segundo projecções do Instituto Nacional de Estatísticas em 2019, e é marcado
por um comércio informal muito acentuado, onde por insuficiência de oportunidades de
emprego, muitos jovens enveredam por este tipo de actividades informais por longos anos e
sem nenhuma garantia de protecção social, quer seja a de base, por estarem numa condição
de cidadãos em situação de vulnerabilidade, na maioria dos casos da actividade informal,
bem como a obrigatória, visto que não iniciaram nenhuma carreira contributiva, devido a sua
condição de trabalhador informal e muitas nem beneficiam dos programas de assistência
social em Angola.

Os conflitos pós-independência de 1975 e os confrontos pós-eleitorais de 1992 foram


uma realidade atroz e cruel para o povo angolano, razão pela qual houve desintegração
familiar e no modo de vida da população, culminando com o êxodo populacional para a
capital do país, no caso, a província de Luanda, o que de alguma forma veio agudizar a
ineficácia das políticas sociais e públicas, bem como a incapacidade das infra-estruturas
educativas, de saúde, promoção da empregabilidade, entre outras.

Esta situação veio criar um sufoco no mercado de emprego, visto que a economia do
país ficou fortemente afectada e com isso houve consequências no crescimento económico,
escasseando assim a oferta de empregos e obrigando a população a procurar formas de
sustento, mesmo que até, muitas das ocupações transgredissem a Lei vigente no país.

Fruto do excesso de trabalhadores informais, no município de Cacuaco e a


necessidade da sua assistência ou mesmo protecção social, apresentamos a seguinte temática
de pesquisa, baseada na área de seguridade e assistência social: O trabalho Informal em
Angola e as políticas de protecção social para a sua mitigação. Estudo do Programa Nacional

6
de Reconversão da Economia Informal no Mercado do Kicolo em Cacuaco-Luanda, que pode
ser analisada à luz da Lei de Bases da Protecção Social (Lei Nº 07/04 de 15 de Outubro) e da
Política Nacional da Acção Social formalizada pelo Decreto Presidencial Nº 32/21 de 8 de
Fevereiro.

O estudo será realizado no município de Cacuaco, província de Luanda, onde um


vasto número de pessoas (maioritariamente jovens) ocupam-se de actividades informais para
o sustento próprio e da sua família, uns para cobrir a pouca renda que o trabalho formal dá,
outros por ser a única via encontrada para ter alguma utilidade social.

Escolhemos o Mercado do Kicolo por ser o local, em Cacuaco, onde foi realizado o
projecto piloto do Programa de Reconversão da Economia Informal e por ser uns dos mais
antigos mercados informais em Luanda, contendo trabalhadores informais de diferentes
localidades de Angola e de diferentes extractos sociais, o que ajudará a perceber o
conhecimento que possuem sobre os instrumentos da política nacional da Acção Social, bem
como da Protecção Social.

O Censo de 2014 mostrou que temos uma população maioritariamente jovem, e é


nesta franja populacional onde reside a maior prevalência de desemprego, sendo o emprego
informal uma das saídas encontradas para a sobrevivência de muitos jovens, onde se auto
realizam com o trabalho que prestam a sociedade, ou seja, mesmo na informalidade, podemos
afirmar pelo trabalho informal produzem e criam alguma utilidade social.

Os resultados apurados pelo Inquérito sobre as Despesas e Receitas dos Agregados


Familiares [INE 2000] permitiram concluir que a proporção de indivíduos cujas actividades
principais são de natureza informal correspondia, em média, a 62,8% da população
economicamente activa [Lopes, 2014, p.3]. Este dado é bastante relevante, permite-nos
verificar qua as políticas sociais e públicas gizadas para a conversão dessa realidade não têm
surtido o efeito desejado, sendo uma solução cada vez mais usada pela população jovem do
país, visto que não encontram formas de contrariar a hegemonia do capitalismo, que visa
obter maior lucro na produção com o menor custo, sacrificando, no caso, os direitos dos
trabalhadores, o que não é reivindicado no trabalho informal.

7
Nesta perspectiva é que o Plano Nacional de Desenvolvimento 2018-2022, aponta
que:

A definição de uma política de emprego para os próximos anos deve ter, também, como
objectivo, a redução dos níveis de informalidade da economia angolana e de formalização
progressiva das actividades informais, contribuindo para a promoção do trabalho digno e para
garantir os direitos dos trabalhadores. [PND, 2018-2022, p161]

Assim, os direitos garantidos pelo INSS, tais como a pensão de reforma, Protecção
no desemprego, subsídio de maternidade e outros direitos sonegados aos trabalhadores
informais, que a nosso ver contrasta com os ganhos que os trabalhadores formais vêm
obtendo, fruto da intermediação com a classe burguesa (questão social).

A Política de Protecção Social foi formalizada primeiramente pela Lei Nº 18/90 de


27 de Outubro e posteriormente pela Lei Nº 07/04 de 15 de Outubro, que evidenciam as bases
para a protecção social de todos os trabalhadores, tanto dependentes de uma relação jurídico–
laboral (conta de outrem), bem como aqueles que desenvolvem actividades por conta própria,
ou seja, visam proteger os trabalhadores e seus familiares em momentos de infortúnios vindos
do próprio trabalho, desemprego, velhice e sobrevivência dos familiares directos em caso de
morte do trabalhador.

A Política Nacional de Acção Social formalizada pelo Decreto Presidencial Nº 32/21


de 8 de Agosto, considera que, nos momentos de conflito e catástrofe, a intervenção social
do Estado foi essencialmente de cariz humanitário, assistencialista e de emergência, em
resposta às necessidades de sobrevivência.

Tendo em conta que, no actual contexto do desenvolvimento sócio-económico de


Angola, um dos principais desafios do Estado consiste na redução da vulnerabilidade
estrutural da parte mais pobre da população, bem como em assegurar sua participação
efectiva no processo de crescimento económico, através de Programas Integrados de Acção
Social, que promovam a inclusão social e produtiva das famílias e das comunidades e que
fortaleçam a coesão social.

8
Tendo em atenção que os desafios actuais requerem do Executivo uma mudança de
paradigma de intervenção, assente na perspectiva de desenvolvimento integral do indivíduo,
numa visão holística através de medidas de política de prevenção, protecção, promoção de
acções em favor das pessoas que se encontrem em situação de pobreza e vulnerabilidade
acentuada.

Considerando que a Política Nacional de Acção Social está alinhada com a Agenda -
2030, sobre os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações
Unidas, a Agenda - 2063 da União Africana, os principais documentos programáticos do
Sistema Nacional do Planeamento do País, bem como com os demais instrumentos nacionais
relativos à garantia de direitos e condições dignas de vida para todos os cidadãos.

Interessa – nos compreender que mesmo com estes instrumentos e programas, existe
um número crescente da população que se dedicam a esta prática de trabalho informal, num
crescimento vertiginoso que periga a estabilidade económica, financeira e social.

Desde as origens, o homem sentiu a necessidade de dominar o meio que o rodeia e


encontrou no trabalho a forma mais viável, não só para atender as necessidades primárias de
que depende a sua sobrevivência, tais como: habitação, alimentação, vestuário entre outras,
bem como para o desenvolvimento do que hoje definimos como sociedade, tal como
corrobora VARGAS (2016), o trabalho tem sido habitualmente concebido como uma
actividade através da qual o ser humano estabelece uma relação metabólica com a natureza
e o mundo social, a fim de assegurar a reprodução de suas condições materiais de existência.

Segundo Albornoz, vê no trabalho muitas definições, que podem oscilar segundo o


contexto em que a mesma se insere, assim:

O trabalho, às vezes, carregada de emoção, lembra dor, tortura, suor do rosto, fadiga. Noutras,
mais que aflição e fardo, designa a operação humana de transformação da matéria natural em
objecto de cultura. O homem em acção para sobreviver e realizar-se, criando instrumentos, e
com esses, todo um novo universo cujas vinculações com a natureza, embora inegáveis, se
tornam opacas. [Albornoz, 1998, p.8]

Para abordagem da categoria trabalho, tivemos em conta a perspectiva histórico-


ontológica.

9
3.1. Perspectiva Histórico-Ontológica do Trabalho

Desde os primórdios, o homem sentiu a necessidade de mudar o meio a sua volta e o


trabalho tem sido a ferramenta principal para atingir este desiderato, segundo os estudos de
Lukács citado por Xavier (2014, p.6) o trabalho é uma actividade humana que transforma a
natureza nos bens necessários à reprodução social, isto é, a transformação da matéria que
advém da natureza em bens úteis por meio da práxis. Considerando o trabalho como a única
forma de materializar os bens para atender as necessidades oriundas das relações dos homens
entre si, é correcto afirmar que o Trabalho é objecto fundante do mundo dos homens.

Um novo modo de conceber o trabalho desenvolveu-se na época moderna: Ele não é mais
considerado como imitação da natureza, mas sim como expressão da livre iniciativa humana.
Com o trabalho, o homem quer fugir das fatalidades, que, de tempos imemoriais, tinha
aprendido a considerar como invencíveis, na medida em que o homem afirma a sua
autonomia, o trabalho assume um significado subtilmente antropológico: serve para formar e
aperfeiçoar o homem [Strefling, 2006, pp.767-770].

Da afirmação de Strefling, podemos depreender que há uma ligação intrínseca entre


o homem e o trabalho, na medida em que usa da sua ideia, força para transformar a natureza
e criar valor de uso para a satisfação das suas necessidades, corroborando com Lucáks, no
parágrafo anterior, o trabalho é o objecto que funda os homens.

Na história do homem, observa-se que o trabalho é necessário para produzir e manter a sua
própria vida, sendo necessário ajustar a natureza às suas necessidades. Isso significa que não
é possível ao homem viver sem trabalhar, já que o homem não tem sua existência garantida
pela natureza, sem agir sobre ela, transformando-a e adequando-a suas necessidades, sem ela
ele não conseguiria sobreviver [Correia & Souza, 2016, p.130].

10
Os modos de produção evidenciam as relações estabelecidas, desde antiguidade até
os dias de hoje, traremos agora os 3 modos de produção registados, exceptuando o primitivo,
visto que não se encaixa no objectivo da nossa pesquisa:

4. No modo de produção escravocrata, era possível uma enorme produção de excedente e grande
acumulação de riqueza, pois o sistema é baseado na apropriação de um homem por outro, não
havia trabalho assalariado. Por volta do século XVIII a escravatura começou a ser considerada
pouco rentável, devido à nova conjuntura política que nascia junto dos conflitos entre as
potências colonizadoras e a revolução industrial que já dava sinais de eclosão, ainda nesse
período surgiu o movimento iluminista, trazendo consigo o movimento abolicionista, tais
movimentos acrescidos da conjuntura da época, como numa caldeira de contradições” a
abolição da escravatura culminou em 1888 [Xavier, 2014, p.9].

5. Outro modo de produção importante a ser abordado é a servidão feudal, neste sistema assim
como na escravidão há ausência total de liberdade, o servo não é propriedade do senhor
feudal, porém a terra em que produz sua subsistência é, portanto, o trabalhador estava preso
à terra, assim o senhor feudal assegurava a si mesmo a maior renda possível do cultivo,
deixando para o servo apenas o suficiente para sobrevivência. Nesse sistema o dono da terra
era absoluto, isso gerou muitas revoltas camponesas. A sociedade feudal tinha duas classes
básicas: senhores e servos [Idem].

Nos dois modos de produção anteriormente citados, tratava – se de uma relação de


poder, de força, da parte dos detentores dos meios de produção, tal como era considerado
também o homem, sem nenhum direito, sem nenhum valor, considerado como um mero
instrumento de trabalho, com o modo de produção capitalista surge uma nova era de produção
e reprodução social:

6. O Processo capitalista de produção expressa, portanto, uma maneira historicamente


determinada de os homens produzirem as relações sociais através das quais levam a efeito a
produção. Neste processo se reproduzem, concomitantemente, as ideias e representações que
expressam estas relações e as condições materiais em que se produzem, encobrindo o
antagonismo que os permeia. [Iamamoto e Carvalho, 2006, p.30]

11
Na sequência, Iamamoto entende que o capitalismo de modo geral é a maneira que se
organiza sociedade a partir da produção de mercadorias. Entendendo aqui, mercadorias como
tudo aquilo que possui valor de uso e valor de troca. Entende-se valor de uso como a
materialidade da mercadoria que se realiza no consumo de objectos úteis para si ou para quem
adquire, e valor de troca é a venda do produto, para o possuidor da mercadoria, para ele a
única utilidade da mercadoria tê-la como meio de troca, pois o valor das mercadorias só se
expressa na relação de troca.

Segundo as palavras de Samba;

O trabalho constitui uma categoria socialmente construída, com significados determinados e


em diferentes contextos históricos. Na modernidade, apresenta-se como uma dimensão
característica da acção humana, que se estabelece em sua relação com a natureza,
modificando-a e, em simultâneo, modificando-se. O trabalho é ao mesmo tempo, necessidade
vital, obrigação social e dever moral, cuja contrapartida é o status social que confere e a
satisfação pessoal que proporciona [Samba, 2018, p. 74].

Olhando para a definição apresentada por Samba, destaca alguns elementos principais
que ultrapassam a dimensão fisiológica do trabalho, a sua conexão com os animais racionais
e irracionais é intrínseca, sendo que o homem realiza um trabalho teleológico, visando
sobretudo o status social que o mesmo lhe confere.

Na mesma senda, Monteiro, corrobora com Samba, ao evidenciar a teleologia do


trabalho, por intermédio da acção humana.

O trabalho humano caracteriza-se por acções conscientes, com finalidades e objectivos.


Trata-se de resposta aos desafios da natureza na luta pela sobrevivência. O trabalho, ao
mesmo tempo em que transforma a natureza, adaptando-a às necessidades humanas,
transforma o próprio homem, desenvolvendo suas faculdades. Isso significa que, pelo
trabalho, o homem se autoproduz. [Monteiro, 2020, p. 83]

12
Com o avanço tecnológico, o trabalho morto (trabalho realizado pelas máquinas
automatizadas) vai dando lugar ao trabalho vivo, deixando de parte a satisfação ou mesmo a
necessidade vital, a obrigação social e o dever moral que a acção humana subtrai do trabalho,
levando a que muitos sejam sobrantes, desempregados, elevando o nível de pobreza e expô-
los a qualquer tipo de trabalho, em qualquer tipo de condições.

Antunes salienta que:

as máquinas inteligentes não podem substituir os trabalhadores. Ao contrário, a sua


introdução utiliza-se do trabalho intelectual do operário que, ao interagir com a máquina
informatizada, acaba também por transferir parte dos seus novos atributos intelectuais à nova
máquina que resulta deste processo [Antunes, 2020, p. 12].

Para o contexto angolano, devido ao número excessivo de pessoas que não podem ser
absorvidos pelo emprego formal, devido ao nível de escolaridade e o manuseio da máquina
informatizada aumenta o interesse pelo trabalho menos escolarizado, com o menor nível de
exigências técnicas possíveis, encontrando saídas em ocupações esporádicas, de curta
duração, “biscatos” (Trabalhos ocasionais realizados sem nenhum vínculo contratual, sem muita
exigência, com vista a obtenção de valores monetários abaixo dos padrões mínimos).

A mercadoria é a materialização do trabalho humano, essa materialização compõe-se


de três elementos: matéria-prima, instrumentos, e força de trabalho. Porém sem a força de
trabalho seria impossível a transformação da matéria-prima em mercadorias, é a acção do
homem sobre a matéria-prima que imprime valor à mercadoria, ou seja, o trabalho é condição
fundamental para a produção dos bens que atendam as necessidades [Xavier, 2014, p.14]

Posto isto, é oportuno perceber que existem diversos tipos de trabalho, entre os quais,
o trabalho informal, trabalho formal, trabalho por voluntariado, etc. Nesta pesquisa, focar-
nos-emos ao trabalho informal, suas manifestações e repercussões, desenvolvido pelos
trabalhadores prestadores de táxi, que encontram neste tipo de trabalho a sua dignidade,
vendendo a sua força de trabalho para a satisfação não só das necessidades mais prementes,
mas também do seu próprio ego. Assim sendo, passaremos a citar nas sessões seguintes.

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3.2. Trabalho Informal

O Trabalho informal é caracterizado por uma ambiguidade na definição, e ela se


encontra em todo mundo capitalista, incluindo Angola, visto que alguns autores o enquadram
como uma actividade exercida a margem, sem a supervisão do Estado, e outros ainda o
consideram como um “mal necessário”, visto que dele depende a sobrevivência de muitos
cidadãos.

Segundo Samba (2018, p. 77), existem várias formas para se referir às pessoas que
exercem esse tipo de trabalho: sector informal, sector não organizado, economia oculta,
economia subalterna trabalho informal, economia informal.

O termo informalidade assume muitos significados e interpretações dependendo da


conjuntura na qual é abordado, a fim de delimitar seu uso neste trabalho, tal conceito assumirá
a função de diferenciar quando um trabalhador está exercendo suas actividades de forma legal
ou ilegal. Tal diferenciação se faz necessária, pois profissionais liberais, autónomos e mesmo
os proprietários de pequenas estruturas produtivas e económicas já citados anteriormente,
poderiam ser considerados trabalhadores informais numa análise rasa e imediatista, mesmo
quando suas actividades laborais proporcionam renda maior e elevado nível de condições de
trabalho que em comparação aos trabalhadores formais, que desejamos é diferenciá-los do
trabalho informal de vínculo precário, ilegal e desprotegido [Xavier, 2014, p.22].

Independentemente da precariedade que o trabalho informal acarreta, é importante


referir que pode gerar uma renda maior do que muitos trabalhos formais

Na perspectiva de Cacciamalis apud Myriam Matsui olha o conceito de informalidade


do ponto de vista dos anos 70:

que define este sector como representando o conjunto das actividades económicas em que
não há separação nítida entre capital e trabalho. Neste grupo estariam classificados os

14
trabalhadores por conta própria, os prestadores de serviços independentes, os vendedores
autónomos, os pequenos produtores e comerciantes e os ajudantes - familiares ou contratados
[Matsui, 2009, p.38].

E Myrian Matsui 2009, define a informalidade na perspectiva dos anos 90, lançada
pelos países industrializados, como sendo as actividades económicas que fogem da regulação
do Estado, seja esta tributária, trabalhista ou de outro tipo.

Consequentemente, em 2003, a 17.ª Conferência Internacional de Estaticistas do


Trabalho (CIET) definiu estas categorias com base no conceito alargado [OIT, 2014].

 Independentes (trabalhadores por conta própria sem trabalhadores por conta de outrem) nas
suas próprias empresas do sector informal;
 Empregadores (trabalhadores por conta própria com trabalhadores por conta de outrem) nas
suas próprias empresas do sector informal;
 Trabalhadores familiares, independentemente do tipo de empresa;
 Membros de cooperativas informais de produtores (não estabelecidas como entidades
jurídicas);
 Trabalhadores por conta de outrem que têm empregos informais tal como é definido de
acordo com a relação de trabalho (na legislação ou na prática, empregos que não estão sujeitos
à legislação laboral nacional, a impostos sobre rendimentos, à protecção social ou sem
direitos a determinados benefícios relacionados com o emprego – férias anuais remuneradas,
licença remunerada por doença, etc.).
 Trabalhadores independentes, que se ocupam da produção de bens exclusivamente para auto-
consumo do seu domicílio.

Para o contexto angolano, o trabalho informal tem uma ligação directa com a falta de
legalização das actividades económicas e produtivas, uma certa desordem no que toca aos
locais para a prática da actividade económica ou produtiva, gerando transgressões
administrativas e muitas vezes o confronto com a lei vigente no país e o controlo das mesmas
actividades por parte dos órgãos competentes, propiciando deste modo:

15
 Elaboração precária de políticas sociais que atendem a necessidade de
trabalho, visto que muitos não são controlados, nem existe uma estatística real que permita
tal planificação;
 Desestruturação no trabalho por causa do excesso de informalidade, a que
muitos são submetidos por causa do modo de produção capitalista, que precariza o trabalho
informal, buscando maior benefício do capital em detrimento do trabalho;
 Perda excessiva de receitas em impostos que propiciam a implementação de
políticas sociais e de estruturas sociais (escolas, hospitais, saneamento básico), que ajudariam
no melhoramento do bem-estar social.

3.3. Economia Informal

A economia informal entende como o sector da economia onde torna-se quase


invisível a acção do Estado, visto que nela se encontram indivíduos com baixa renda
financeira, com negócios precários, e que muitas vezes, realizam actividades que se
contradizem com a lei, visto que o fim último destas actividades é a sobrevivência.

Algumas definições são importantes para o nosso propósito;

A Organização das Nações Unidas (ONU, 1996) define o sector da economia informal como
um vasto leque de comportamentos económicos, socialmente admissíveis, realizados
fundamentalmente com finalidades de sobrevivência e que escapam quase totalmente ou, pelo
menos, parcialmente ao controlo dos órgãos do poder público local/regional/nacional em
matéria fiscal, laboral, comercial, sanitária ou de registo estatístico [Alexandre Ernesto-
www.osisa.org: p.6].

Segundo a OIT a expressão “economia informal” “Refere-se a todas as actividades


económicas de trabalhadores e unidades económicas que não são abrangidas, em virtude da
legislação ou da prática, por disposições formais. Estas actividades não entram no âmbito de
aplicação da legislação, o que significa que estes trabalhadores e unidades operam à margem

16
da lei; ou então não são abrangidos na prática, o que significa que a legislação não lhes é
aplicada, embora operem no âmbito da lei; ou, ainda, a legislação não é respeitada por ser
inadequada, gravosa ou por impor encargos excessivos” [OIT, 90ª Conferência Internacional
do Trabalho, 2006, pág. 7].

A teoria neomarxista, na objectivação da economia informal e do trabalho informal


tem uma relação mais directa com o enfoque teórico da nossa abordagem, porquanto faz uma
relação directa com a necessidade de manutenção do trabalho informal, ou do exército
industrial de reserva, que na visão de Karl Marx, citado por Monteiro (2012), é o desemprego
estrutural, o excesso da necessidade da produção capitalista, para continuarem a servir como
geradores de mais-valia e uma oferta bastante barata da mão-de-obra, visto que estão
pressionados em satisfazer as questões de sobrevivência e de se sentirem úteis com algum
relevo social, mesmo que desenvolvendo a sua actividade em situação de precariedade.

Ela impulsiona o individuo a necessidade de um auto-emprego, descabido de direitos,


de forma a satisfazer as necessidades básicas de subsistência, que é o caso de muitos
trabalhadores informais, com maior relevância, os prestadores do serviço de táxi.

Protecção social encerra em si vários conceito, significações e intenções, não é


inocente na sua concepção, carregada sempre de uma ideologia. Segundo Pereira,

Esse termo, portanto, não constitui uma categoria teórica, já que não possui um significado
ontologicamente sustentado […] Por isso, o termo protecção social, para ter um mínimo de
inteligibilidade e capacidade comunicativa, deve apresentar-se quase sempre adjectivado:
capitalista, socialista, residual, social-democrata, pública, privada, focalizada, universal,
parcial, total, entre outras qualificações. Para o contexto angolano, adjectiva-se: de base,
obrigatória e complementar (grifo nosso) [Pereira, 2016, pp.338-339]

Parra servir de aporte a nossa abordagem, optamos pela matriz social-democrata,


porque nesta matriz o Estado assume um papel essencial, principal, gerindo-a e
compartilhando a provisão social com o mercado, o que vai de acordo com os diplomas legais
(sobre a protecção social obrigatória) aqui apresentados e aprofundados.

17
3.3.1. Caracterização da Economia Informal em Angola

Para o economista Lopes (2014), a quantificação da extensão da economia informal,


quer em termos do número de pessoas envolvidas nas actividades informais quer no que
respeita ao seu output económico, é uma tarefa complexa e imprecisa.

São várias os contextos que original tal situação: as dificuldades em obter registos e
estatísticas em alguns tipos de actividades, os critérios de pertença e de classificação dos
operadores informais são muito diversos e não conseguem capturar todas as nuances que se
manifestam, os métodos de cálculo são diferenciados, a comparação internacional perde
eficácia, uma vez que são diferentes os critérios de informalidade adoptados por diferentes
países.

Apesar disso, têm existido alguns esforços no sentido de ter uma ideia aproximada
sobre a sua extensão. Um estudo publicado pela OIT (Charmes 2000) referia que 40% do
emprego urbano na América Latina e Caraíbas era emprego informal, relação que subia para
61% em África e que se situava entre os 40% e os 60% na Ásia. Um outro estudo, realizado
sob a égide do Banco Mundial, apresentou uma estimativa média da dimensão da economia
não oficial em 162 países de diferentes regiões, no período entre 1999 e 2007, a qual permite
sustentar a evidência de que o fenómeno é cada vez mais transversal, quer em relação às áreas
geográficas quer em relação aos diferentes estádios de desenvolvimento.

Uma das características marcantes da economia angolana é a predominância do sector


informal, também conhecido como Kandonga (Palavra oriunda da língua nacional Kimbundu,
que significa especular, fora dos procedimentos legais), Angola possui uma das maiores
economias informais do mundo em desenvolvimento.

Schneider (2005, citado pela conferência das nações unidas sobre comércio e
desenvolvimento das nações 2013, p.9) estima que a participação da informalidade no PIB
oficial do país é de aproximadamente 45,2%. A economia informal compreende duas
vertentes distintas, embora interconectadas: Produção rural de subsistência e actividades
rurais informais não agrícolas; e mercado paralelo predominantemente urbano.

18
O sector informal urbano surgiu como consequência do ritmo acelerado da urbanização,
estimulada sobretudo pelo deslocamento de populações rurais que fugiam dos conflitos em
direcção às principais cidades. As ondas migratórias internas exacerbaram ainda mais a
escassez de empregos formais nas áreas urbanas [PNUD 2002, citado pela conferência das
nações unidas sobre comércio e desenvolvimento das nações 2013, p.9].

Além disso, a regulamentação de preços durante um longo período encorajou a


população a operar na informalidade de modo a complementar sua renda, derivada da venda
de produtos controlados no mercado negro [Walther, 2006, citado pela conferência das
nações unidas sobre comércio e desenvolvimento das nações 2013, p.9].

Apesar da carência e desactualização dos dados sobre o tamanho da economia informal, as


informações disponíveis demonstram a relevância socio-económica das actividades informais
como principal meio de subsistência para uma considerável parcela da população angolana.
Cálculos recentes indicam que a informalidade constitui a maior fonte de renda para 93% da
população rural, e que 51% do total da população urbana dependem da economia informal
para viver [Workshop de Desenvolvimento 2009b, citado pela conferência das nações unidas
sobre comércio e desenvolvimento nações 2013, p.9].

Em especial, o sector informal representa a ocupação central de 70% da população


feminina em Angola (BAD 2008), o que deixa patente a necessidade de examinar
especificamente esse sector de modo a avaliar de forma adequada os efeitos do comércio e
das políticas comerciais sobre o género.

Em Angola se destacam três actividades informais, que ocupam em certa medida


maior parte da população e que devido algumas políticas de governação, tem se
metamorfoseado, tendo em conta o contexto económico.

19
3.3.2. Actividades com maior concentração informal em Angola

Segundo o PDN (2018, p. 162), estima-se que o peso da actividade informal seja
superior a 40% do total da economia nacional, o que tem implicações, não só no controlo e
monitorização da economia, como também na receita fiscal. Adicionalmente, os
trabalhadores em regime informal não estão cobertos pela legislação laboral nacional, não
usufruem de segurança social e estão sujeitos a instabilidade salarial.

A quantificação da extensão da economia informal, quer em termos do número de pessoas


envolvidas nas actividades informais quer no que respeita ao seu output económico, é uma
tarefa complexa e imprecisa. Várias situações contribuem para tal: não existem registos nem
estatísticas em alguns tipos de actividades, os critérios de pertença e de classificação dos
operadores informais são muito diversos e não conseguem capturar todas as nuances que se
manifestam, os métodos de cálculo são diferenciados, a comparação internacional perde
eficácia, uma vez que são diferentes os critérios de informalidade adoptados por diferentes
países. [Lopes, 2014, p.2].

É visível o número considerável de vendedores ambulantes, mas conhecidos por


zungueiros, o que a priori, nos dá uma noção da representatividade do número de pessoas
envolvidos nas actividades informais, com maior realce para as mulheres.

Ainda na visão de Lopes (2016, p.4), existem três segmentos informais que
predominam em Luanda:

1) Os mercados informais em Luanda

Os mercados de Luanda constituem, a par da venda ambulante, o espaço onde um


grande número de agentes (um número que deverá exceder consideravelmente a cifra oficial)
encontra ocupação e obtém os rendimentos que contribuem para a sua subsistência e das
respectivas famílias.

2) Kinguilas e Doleiros

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As expressões Kinguilas (Em língua kimbundu, kinguila significa “quem está à
espera...”, designação que entrou no léxico quotidiano luandense a partir do último terço dos
anos 80 do século XX, quando começaram a proliferar pelas esquinas da cidade, nas
ombreiras das entradas dos prédios ou nas imediações dos mercados, grupos de mulheres
envolvidas na troca da moeda nacional por dólares e vice--versa) e Doleiros identificam de
forma genérica os operadores económicos engajados em Luanda no mercado paralelo de
moeda estrangeira, no comércio ilegal de divisas. Comércio que é ilegal porque a legislação
angolana tem restringido o exercício da actividade, numa primeira fase exclusivamente ao
Banco Central, e em fases posteriores e na actualidade, também aos Bancos Comerciais e às
Casas de Câmbio.

3) Candongueiros

Em Luanda, o segmento de mercado dos transportes públicos de passageiros


apresenta um carácter plural, nele operando diferentes agentes institucionais: uma empresa
pública (TCUL); quatro empresas privadas (Macon, Tura, Austral e SGO); várias empresas
de táxis colectivos com contador (por exemplo, AfriTaxis, Rogerius, ALibolense); um
elevado número (dezenas de milhar) de operadores artesanais em minibus, popularmente
designados por candongueiros; milhares de mototaxistas, a operar em áreas periurbanas bem
delimitadas (Funda, Panguila, Cacuaco, Kikolo e Viana); e ainda um número significativo de
operadores “clandestinos”, a operar em viaturas privadas, popularizadas como “gira-
bairros”..

O aparecimento dos operadores não oficiais remonta ao final da década de 70 quando,


em plena vigência do sistema centralizado de regulação administrativa da economia, as
empresas públicas de transportes urbanos deixaram de ter capacidade para assegurar as
necessidades de transporte da população dos centros urbanos. Insuficiências financeiras,
técnicas e de gestão, associadas a dificuldades temporárias no acesso a bens de reposição/
substituição e aos condicionamentos resultantes da subordinação política, originaram uma
política de desinvestimento e de ausência de conservação/manutenção do equipamento
rolante que conduziu, a curto prazo, a uma acentuada escassez de meios de transporte,
crescentemente obsoletos [Lopes 2010].

21
Os hiasses (expressão angolana que designa os Toyotas Hiace, marca predominante
nas viaturas de transporte semi-oficial, usualmente utilizada para designar a generalidade
desses veículos) tornaram-se um elemento omnipresente na paisagem automóvel urbana,
facilmente identificáveis pela ostentação maioritária das cores azul e branca. São os
candongueiros, os mototaxistas e os “gira-bairros” quem oferece aos habitantes dos centros
urbanos o essencial da oferta em termos de transporte, quer de pessoas quer de mercadorias,
entre os locais de residência e os locais de trabalho e de abastecimento (mercados).

3.4. Emprego e Desemprego

Nesta categoria de análise, pretendemos mostrar a relação ente emprego, desemprego


e a informalidade, visto que as políticas sociais destinadas a promoção da empregabilidade
tendem a dar resposta a disponibilidade do indivíduo em oferecer a sua força de trabalho,
para a produção e reprodução social, ser inserido, ter prestígio e se sentir valorizado no seio
social.

O Governo angolano adoptou um Plano de Acção para a Promoção da


Empregabilidade (Decreto Presidencial nº 113/19), coordenado pelo Ministério da
Administração Pública, Trabalho e Segurança Social (MAPTSS) com o propósito de dar
resposta ao PDN 2018-2022. Visa atingir principalmente os desempregados e os jovens que
ingressam pela primeira vez no mercado de trabalho, com um pendor muito forte ao
empreendedorismo:

Plano de Acção para a Promoção da Empregabilidade

Objectivos Público-alvo Resultados esperados

a) Fomentar e apoiar o espirito de a) Jovens desempregados, em a) 12 000 jovens capacitados nos


iniciativa na juventude, desde os particular, a procura do primeiro domínios do empreendedorismo
empreendedores já estabelecidos emprego; e gestão de negócios;
aos emergentes;

b) Formar jovens empreendedores b) Jovens formados com b) 15 000 jovens capacitados em


nos domínios técnico-profissional necessidade de obter cursos de curta duração;
e de gestão de pequenos negócios; equipamentos e ferramentas para

22
o exercício de uma actividade
geradora de emprego e renda;

c) Contribuir para o processo de c) Jovens que exercem uma c) 10 000 micro-créditos


promoção da inclusão financeira, actividade profissional e que concedidos;
fiscal e social dos jovens; precisam de reforço em
equipamentos e ferramentas;

d) Contribuir para a melhoria do d) Jovens que já exercem d) 42 000 kits profissionais


rendimento familiar e como actividade profissional, mas distribuídos aos jovens em
consequência o crescimento e o carecem de aprimoramento diferentes profissões;
desenvolvimento socioeconómico técnico e capacitação no
do Pais; domínio da gestão;

e) Fomentar o cooperativismo e o e) Cidadãos empreendedores e) 3 000 jovens inseridos no


associativismo juvenil; com ideias de negócio que mercado informal, através da
pretendam criar o seu negócio; reconversão de pequenas
actividades geradoras de
ocupação de ocupação e renda;

f) Contribuir para o processo de f) Profissionais que necessitam f) 1 500 jovens formados no


Combate à fome e à pobreza; de um espaço condigno para a nível 3 e 4 de formação
realização das suas actividades; profissional, inseridos em
programas de estágio
profissional.

g) Valorizar o exercício das g) Mulheres das zonas


profissões/ocupações, úteis à periurbanas e urbanas.
sociedade;

h) Contribuir para a bancarização


e educação financeira das
famílias;

i) Contribuir para o processo de


reconversão da economia
informal para a formal;

j) Proceder à entrega de kits de


trabalho para suporte ao auto-
emprego e empreendedorismo.

Fonte: Elaboração própria com base no Decreto Presidencial nº 113/19

O Plano de Acção tem um grande enfoque na juventude, por ser a franja mais afectada
pelo desemprego e no empreendedorismo, por ser a forma que o Governo de Angola gizou
para dar resposta ao desemprego acentuado na juventude.

23
A nossa crítica ao Plano de Acção, vai no sentido de promover o auto-emprego,
situação esta que tem uma relação directa com o nível de informalidade no nosso mercado
de trabalho, ou seja, quanto maior for o nível de empreendedorismo, iniciativas de promoção
do auto-emprego, notamos que, maior é o nível de informalidade na economia do país.

Ao longo do Plano de Acção para da Promoção da Empregabilidade não


vislumbramos um enfoque para a protecção social obrigatória dos jovens trabalhadores, nem
medidas que impulsionam a inscrição ou a continuidade de uma carreira contributiva, que
visem amenizar situações de desemprego da juventude, o que, a nosso ver, seria um
mecanismo de maior inclusão dessa juventude nas políticas de protecção social obrigatória.

É importante definir alguns conceitos, muitas vezes usa – se a palavra Emprego como
sinónimo de Trabalho, há uma relação intrínseca, mas são palavras diferentes, muito embora
o emprego desenvolve – se por meio do trabalho, mas nem toda situação de trabalho podemos
afirmar como emprego.

Empregado é a pessoa singular que presta serviços de natureza não eventual à


empresa sob a dependência deste e mediante salário. É denominado Trabalhador por Conta
de Outrem [Glossário da Segurança Social p.25].

Desta definição, podemos entender que a situação de um indivíduo empregado,


segundo o glossário, parte de uma relação contratual bem definida, mediante um salário, o
que contrasta com a situação do trabalhador informal prestador de serviço de táxi, que além
do motorista e do proprietário da viatura, envolve o cobrador, vulgo gerente, indivíduo com
a responsabilidade de proceder com a cobrança de valores respeitantes a cada viagem ou
percurso do mesmo transporte e o lotador, indivíduo com a responsabilidade de ajudar o
cobrador ou gerente da viatura, a preencher o número de assentos da viatura destinados aos
passageiros.

Todos esses trabalhadores envolvidos não são segurados por um contracto de


prestação de serviço, um salário fixo, declarado, que os consideraria como empregados,
dependentes de uma relação laboral, o que consequente os atira para a condição de
desempregados, mesmo desenvolvendo uma actividade económica.

24
4. PERGUNTA DE PARTIDA

Que políticas ou estratégias o Estado angolano adopta para garantir a protecção social dos
trabalhadores informais em Angola?

5. OBJECTIVO GERAL
Estudar as políticas ou estratégias de protecção social para a mitigação do trabalho inforal
em Angola.

5.1. OBJECTIVOS ESPECÍFICOS:

Analisar comparativamente as políticas de protecção social no trabalho informal entre


Angola e Brasil;

Identificar o perfil socioeconómico dos trabalhadores informais no mercado do Kicolo em


Cacuaco-Luanda;

Caracterizar o programa de reconversão da economia informal, bem como outros programas


que visam a mitigação do trabalho informal.

6. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS;

Para dar corpo ao nosso estudo, usaremos o paradigma qualitativo, para nos ajudar a
descrever as várias realidades do trabalho/trabalhador informal, compreender e buscar os
significados para questões visíveis e invisíveis deste tipo de ocupação. Assim, a revisão
bibliográfica e documental, as entrevistas e o grupo focal farão parte da nossa estratégia
metodológica de trabalho.

Teremos como instrumentos o caça-palavras, o bloco de anotações, bem como nos


serviremos do telemóvel para captar as imagens necessárias, depois de bem explicar o
objectivo da nossa pesquisa e termos o consentimento livre dos participantes a nossa

25
pesquisa, que será realizada no mercado do Kicolo, nos dias úteis da semana, nos locais de
comercialização do nosso grupo alvo, sem, no entanto, interferir com a actividade laboral por
eles realizados, ou seja, faremos uma observação não participante.

Não deixaremos de parte as instituições governamentais que gizam as políticas sociais e


públicas, para dar resposta a esta demanda social de informalidade, estamos a nos referir ao
Instituto Nacional de Segurança Social (INSS), ao Instituto Nacional de Estatística (INE) e
demais instituições públicas, com vista a obter toda documentação e legislação possível que
tratam de alguma forma sobre a extensão do tema em estudo.

26
7. REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

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