Barata-Moura - Filosofia e Filosofar - Hegel X Kant PDF
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H E G E L VERSUS
KANT?
Jos Barata-Moura*
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Immanuel KANT, Reflexionen zur Logik, n. 1629; Ak., vol. XVI, p. 50.
KANT. Vorlesungen Uber Logik. Logik Phippi; Ak., vol. XXIV. 1, p. 321
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KANT, Vorlesungen ber Logik. Logik Busolt; Ak., vol. XXIV.2, p. 615.
Veja-se tambm: KANT, Vorlesungen ber Logik. Wiener Logik; Ak., vol. XXIV.2,
p. 799.
KANT, Vorlesungen ber Logik. Logik Dohna-Wundlacken; Ak., vol. XXIV.2, p. 698.
Veja-se tambm: KANT, Vorlesungen ber philosophische Enzyklopdie; Ak., vol.
XXIX. 1., pp. 6-7.
KANT, Vorlesungen ber Logik. Logik Blomberg; Ak., vol. XXIV. 1, pp. 30-31.
Sobretudo, nenhum filsofo pode ser um wolfiano, etc., porque ele prprio deve
pensar. - berhaupt, kein Philosoph kann ein Wolfianer etc. sein weil er selbst
denken soll., KANT, Vorlesungen ber Logik. Logik Herder; Ak., vol. XXIV. 1, p, 4.
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Winterhalbenjahre
KANT, Vorlesungen ber Logik. Logik Dohna-Wundlacken; Ak., vol. XXIV.2, p. 698.
F. SANCHES, Quod nihil scitur; Tratados Filosficos,
Lisboa, Instituto de Alta Cultura, 1955, voi. I , p. 46.
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KANT, Vorlesungen ber Logik. Wiener Logik; Ak., vol. XXIV.2, p. 797.
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'S KANT, Vorlesungen ber Logik. Logik Philippi; Ak., vol. XXIV. 1, p. 322.
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Cf. Manuel Jos do CARMO FERREIRA, O socratismo de Kant, Kant, dir. Jos
Barata-Moura, Lisboa, Departamento de Filosofia da Faculdade de Letras, 1982,
PP- 1 3 " 3 9 Cf. Jos BARATA-MOURA, Kant e o conceito de Filosofia, Lisboa, Sampedro, 1972;
Oswaldo MARKET, La gran leccin de Kant sobre la naturaleza dei filosofar,
Anales dei Seminrio de Historia de la Filosofia, Madrid, 2 (1981), pp. 13-29;
Leonel RIBEIRO SANTOS, Kant e o ensino da filosofia, Filosofia, Lisboa, 2 (1988),
pp. 166-178.
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Para todo este passo, cf. KANT, Nachricht; Ak., vol. I I , p. 307.
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se formaria segundo uma razo alheia (nach fremder Vernunft), recorrendo a uma faculdade reprodutiva (nachbildendes Vermgen) e no criadora (erzeugendes) .
Possumos indicaes de que no decurso do seu magistrio eram estas
as principais linhas de argumentao adiantadas por Kant.
Nos apontamentos de um auditor de lies sobre Lgica, deparamos
com a seguinte esquematizao: a filosofia no pode ser ensinada porque
1. no h filosofia nenhuma que esteja a como [sendo] de confiana. 2.
Se a filosofia fosse ensinada a algum, e ainda mesmo que ele apreendesse
bem essas proposies, no seria contudo filsofo nenhum quem apenas
molda em si as proposies de outrem. . ainda neste sentido que Kant,
na Crtica da razo pura, trata de lembrar que aquele que apenas aprendeu e conservou o que outros pensaram no passa de uma cpia, ou molde
de gesso, de um homem que vive (ein Gipsabdruck von einem lebenden
Mensch) .
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1. es giebt keine Philosophie die da zuverlssig wre. 2. Wenn jemanden die Philosophie gclchrct wird, und der auch noch so gut diese Stze fassen wrde, so wre das
doch kein Philosoph, der die Stze des andern in sich nur abdrckt., KANT, Vorlesungen ber Logik. Logik Philippi; Ak., vol. X X I V . 1, p. 321.
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KANT, KANT, ber eine Entdeckung, nach der alle neue Kritik der reinen Vernunft
durch eine ltere entbehrlich gemacht werden soll [Streitsschritt gegen Eberhard!;
A k . , v o l . V I I I , p. 219.
33 KANT, Vorlesungen ber Logik. Wiener Logik; Ak., vol. XXIV.2, p. 799.
34 KANT, Logik, Einleitung,
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Cf. Eduardo CHITAS, Hegel e a pensamento das Luzes. Para o estudo da formao
da conscincia moderna, Lisboa, Dissertao de doutoramento em Filosofia apresentada Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 1989.
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No vou, porm, enveredar por estas perspectivas amplas de enquadramento, mas to-s cingir-me a algumas passagens hegelianas onde
directamente mister da putativa oposio entre filosofia e filosofar.
Subjacente a todo o delineamento da posio de Hegel est incontornavelmente a ideia de que faz falta (es tut not) que se volte a fazer do filosofar (aus dem Philosophieren) um assunto srio (ein ernsthaftes
Geschft) .
Precisamente por isso que o pensar por si, o Selbstdenken, no pode
partida ser admitido como dissocivel do prprio pensar.
O que, primeira vista, pode parecer urna postura maximalista por
parte de Hegel, apenas destinada a artificiosamente derrubar pela base
uma distino sem dificuldade magnificvel como mais um achado
(Fund) to ao gosto do so entendimento humano (gesunder Menschenverstand) , adquire, no entanto, traos no despiciendos de relevncia
terica.
Hegel cura meditadamente de sublinhar que a autoria congenital e
estruturante de todo o pensamento: 'O meu pensar prprio' , propriamente, um pleonasmo. Cada um tem de pensar por si; nenhum pode pensar
pelo outro. - 'Mein eigenes Denken' ist eigentlich ein Pleonasmus. Jeder
mu fr sich denken; es kann keiner fr den anderen denken. .
Mais: esta conjuno de Denken e de Selbstdenken, radicalmente
assumida, que inaugura e abre, do ponto de vista subjectivo e do ponto de
vista cultural, o prprio espao da filosofa.
A fonte da verdade no mais o revelado por dispensao divina, o
dado que naturalmente se constata, ou o positivo historicamente instituido.
A filosofia emerge quando a autoria triunfa da autoridade: A este
subministrar de um outro fundamento que no o da autoridade chamou-se
filosofar. - Dies Unterschieben eines anderen Grundes, als den der
Autoritt, hat man Philosophieren genannt. .
Da que Hegel se insurja contra a tendencia, corrente no ensino da
poca, de contrapor Denken e Selbstdenken, em ordem a porventura obter
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Pflicht auf sich, ihm eine konstitutionelle Philosophie zu machen und die Vernunft
des Volks zu verwalten., HEGEL, Notizenblatt. Bayern. Ausbruch der Volksfreude
ber den endlichen Untergang der Philosophie; TW, vol. 2, p. 273.
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HEGEL, Phnomenologie
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HEGEL, Vorlesungen ber die Geschichte der Philosophie; TW, vol. 18, p. 80.
56 HEGEL, Vorlesungen ber die Geschichte der Philosophie; T W , vol. 18, p. 80-81.
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interessantes efeitos de profundidade imediata que, todavia, se desvanecem perante uma anlise mais exigente e aturada.
Trata-se de um preconceito (Vorurteil) grave que assentou arraiais no
estudo da filosofia, e que dissemina perturbaes mais gravosas ainda,
quando adoptado pela pedagogia, em geral, como palavra de ordem.
Repousa no duplo pressuposto (errneo)
a) de que o Selbstdenken independente do material com que lida, e de
que deve (pode) ser exercido e desenvolvido sem o ter em conta,
b) bem como no de que subsiste uma antinomia entre o aprender
(Lernen) e o pensar por si (Selbstdenken),
quando o que acontece que a matria do pensar - tese cara ao idealismo hegeliano - ela prpria j um pensamento (e no um fruto da
imaginao ou uma mera intuio), e que um pensamento no tem outro
modo de ser aprendido seno sendo pensado.
O texto que sumariamente estamos a expor, retirado de um parecer
sobre o ensino da filosofia nas Universidades, de 1816, diz o seguinte:
Tornou-se um preconceito, no s do estudo filosfico, mas tambm da
pedagogia (e aqui ainda com maior alcance), que o pensar por si
(Selbstdenken) deva ser exercido e desenvolvido no sentido de, em primeiro lugar, ele no depender do material (Material) e, em segundo lugar, de
como se o aprender estivesse contraposto ao pensar por si, quando, de
facto, o pensar s pode exercer-se sobre um material, que no nenhuma
paridura (Geburt) e composio (Zusammenstellung) da fantasia, ou
nenhuma intuio (chame-se-lhe sensvel ou intelectual), mas um pensamento (Gedanke), e, alm disso, um pensamento no pode ser aprendido
seno pelo facto de ser ele prprio pensado. .
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Es ist ein Vorurteil nicht allein des philosophischen Studiums, sondern auch der
Pdagogik - und hier noch weitgreifender - geworden, da das Selbstdenken in dem
Sinn entwickelt und gebt werden solle, da es erstlich dabei auf das Material nicht
ankomme und zweitens als ob das Lernen dem Selbstdenken entgegengesetzt sei, da in
der Tat das Denken sich nur an einem solchen Material ben kann, das keine Geburt
und Zusammenstellung der Phantasie oder keine, es heie sinnliche oder
intellektuelle Anschauung, sondern ein Gedanke ist, und ferner ein Gedanke nicht
anders gelernt werden kann als dadurch, da er selbst gedacht wird.. HEGEL, ber
den Vortrag der Philosophie auf Universitten; T W , vol. 4, p. 422.
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HEGEL, ber den Unterricht der Philosophie auf Gymnasien; TW, vol. 11, p. 38.
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HEGEL, Grundlinien
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produktives Genie) nem nenhum [gnio] potico, mas uma cabea vagarosa (langsamer Kopf). Deus d ao gnio durante o sono. O que ele lhe d
durante o sono (im Schlafe) so por isso tambm apenas sonhos
(Trume). .
De facto, para Hegel, a filosofia no um sonambulismo (Somnambulismus), mas a conscincia mais acordada (das wachste Bewutsein)
que pela actividade do pensar trabalha um sucessivo despertar (ein
sukzessives Erwachen) .
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Piaton studierte bei vielen Philosophen, gab sich lange, saure Mhe, machte Reisen,
war wohl kein produktives Genie, auch kein dichterisches, sondern ein langsamer
Kopf. Gott gibt es dem Genie i m Schlafe. Was er ihnen im Schlaf gibt, sind dafr
auch nur trume., HEGEL, Aphorismen aus Hegels Waslebook; T W , vol. 2, p. 560.
Cf. HEGEL, Vorlesungen ber die Geschichte der Philosophie; T W , vol. 18, p. 58 e
vol. 20, p. 505.
HEGEL, Konzept der Rede beim Eintritt
Universitt Berlin; TW, vol. 10, p. 405.
des philosophischen
Lehramtes an der
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O que acabamos de
uma relao pedaggica
Mas h ainda a ter
limite: ontolgico - que,
Nach der modernen Sucht, besonders der Pdagogik, soll man nicht sowohl in dem
Inhalt der Philosophie unterrichtet werden, als da man ohne Inhalt philosophieren
lernen soll; das heit ungefhr: man soll reisen und immer reisen, ohne die Stdte,
Flsse, Lnder, Menschen usf. kennenzulernen., HEGEL, ber den Vortrag der
Philosophie auf Gymnasien; TW, vol 4, p. 410.
HEGEL, ber den Vortrag der Philosophie auf Gymnasien; TW, vol. 4, p. 411.
HEGEL, ber den Vortrag der Philosophie auf Gymnasien; TW, vol. 4, p. 412.
HEGEL, ber den Vortrag der Philosophie auf Gymnasien; TW, vol. 4, p. 410.
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todo este processo se enquadra e, no desenrolar do qual, vir por sua vez a
inscrever-se tambm a mediao pensante.
que o contedo que a filosofia nos dispensa devolve-nos essencialmente a um patrimonio de humanidade e a um pensar da prpria historicidade do ser,
A historia da filosofa no se limita a proporcionar a galera dos
heris da razo pensante (die Galerie der Heroen der denkenden
Vernunft) para efeitos de piedosa reverncia contemplativa; to-pouco
nos propicia um repositrio de atafulhados ramalhetes doxsticos, destinados a adornar selectas conversaes informadas, ou a alimentar uma
bizantina tecelagem de opinies a partir de opinies (Meinungen aus
Meinungen) .
A filosofa, na configurao mltipla de positividade histrica, abre aos
humanos um tesouro (ein Schatz)'- o produto que resulta do trabalho
dos gnios pensantes de todos os tempos - das resultierende Erzeugnis
der Arbeit der denkenden Genies aller Zeiten .
Este patrimnio encontra-se disponvel (vorhanden) para ser apreendido (fassen), a fim de que, pela sua frequentao pensante, com ele nos
cultivemos (anbilden) num escopo, colectivo, de o continuar a desenvolver
(weiterbilden) .
Para Hegel, a filosofa - como sabido - forma um sistema; mas
imperioso no esquecer, sob pena de deturpao grave do seu teor, que ela
constitutivamente: System in der Entwicklung , sistema em desenvolvimento - na tripla acepo de que possui um passado (a ser conhecido
e a fazer frutificar), de que mobiliza um presente de diversificados confrontos com ela, de que aponta a um futuro de tarefas de e em realizao.
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A filosofia, para Hegel, sem dvida filha do seu tempo, elo em toda
a cadeia do desenvolvimento espiritual (Glied in der ganzen Kette der
geistigen Entwicklung) ; uma limitao estrutural que carrega consigo
enquanto penhor e testemunho da sua radical implantao mundana.
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HEGEL, Vorlesungen Uber die Geschichte der Philosophie; TW, vol. 18, p. 20.
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HEGEL, Vorlesungen Uber die Geschichte der Philosophie; TW, vol. 18, p. 30.
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HEGEL, ber den Vortrag der Philosophie auf Gymnasien; TW, vol, 4, p. 412.
3 Ct. HEGEL, Vorlesungen ber die Geschichte der Philosophie; TW, vol. 18, p. 22.
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HEGEL, Vorlesungen ber die Geschichte der Philosophie; TW, vol. 18, p. 47.
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HEGEL, Vorlesungen ber die Geschichte der Philosophie; TW, vol. 18, p. 65.
Veja-se tambm: HEGEL, Grundlinien der Philosophie des Rechts, Vorrede; TW, vol.
7, p. 26.
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Mas a filosofa tambm - no quadro de urna peculiar dialctica hegeliana de entardecer que convida re-coleco e de aurora que anuncia o
raiar de novos sis - die innere Geburtsttte des Geistes, der spter zu
wirklicher Gestaltung hervortreten wird , o sitio interior do espirito que,
mais tarde, h-de adiantar-se em configurao real.
por isso que a tarefa (Aufgab) fundamenta! da filosofa se desenha
como um conceber de aquilo que (das was ist zu begreifen) *: no no
sentido de uma mera conformao positividade do existente, mas no
horizonte de uma perscrutao dialctica (e, no limite: prtica) da sua
racionalidade.
por isso que a aprendizagem filosofante da filosofa no pode despedir a forma e o exerccio de um speculativ denken lernen , de um
aprender a pensar especulativamente, isto , de um compromisso com a
dialecticidade do pensar, no quadro de uma assuno histrica, de urna
mediao prtica, da historicidade do ser.
Resulta altamente esclarecedor, a este respeito, que as formas que
Hegel atribui ao contedo filosfico (philosophischer Inhalt) sejam rigorosamente homlogas daquelas que em seu entender determinam os
momentos dialcticos do lgico, isto , nos termos idealistas da sua
ontologia: do ser .
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6. Remate
tempo, rapidamente, de concluir.
O lugar que o ensino da filosofia ocupa no sistema educativo funo,
explcita e implcita, de uma filosofia de ensino, e da representao que
uma colectividade faz da sua relao com o pensar.
Aprender no importar e repetir; apropriar para desenvolver.
Ensinar, no transferir ficheiros, criar condies e pasto para uma
aprendizagem.
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HEGEL, Vorlesungen ber die Geschichte der Philosophie; TW, vol. 18, p. 75.
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HEGEL, Grundlinien
der Philosophie
? HEGEL, ber den Vortrag der Philosophie auf Gymnasien; TW, vol. 4, p. 416.
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Cf. HEGEL, ber den Vortrag der Philosophie auf Gymnasien; TW, vol. 4, pp. 412
-413 c Enzyklopdie der philosophischen Wissenschaften im Grundrisse, 79; TW,
vol. 8, p. 168.
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ZUSAMMENFASSUNG
P H I L O S O P H I E UND P H I L O S O P H I E R E N . H E G E L VERSUS
KANT?
Wir mssen nicht glauben, die Fragen unseres Bewutseins, die Interessen der
jetzigen Welt bei den Alten beantwortet zu finden., HEGEL, Vorlesungen Uber die
Geschichte der Philosophie; T W , vol. 18, p. 64.
Henri BERGSON, L'Academie Francaise vue de New York par an de ses membres;
Ecrits et Paroles, ed. R.-M. Mosse Bastide, Paris, PUF, 1959, vol. I I I , p. 613.