Christian Dunker abre o livro focando o problema da intolerancia no Brasil desde suas raízes indigenas, para nos levar a pensar como hoje ainda encontramos traços do sincretismo cultural, especialmente elementos que se tornarão comuns na...
moreChristian Dunker abre o livro focando o problema da intolerancia no Brasil desde suas raízes indigenas, para nos levar a pensar como hoje ainda encontramos traços do sincretismo cultural, especialmente elementos que se tornarão comuns na sociedade brasileira, como o 'jeitinho' e a 'cordialidade' brasileira. Neste sentido, Dunker analisa de forma surpreendente como nossa suposta missigenação está eivadas destes traços e podem ocultar aspectos racistas de uma maneira quase original, especialmente as relações entre a historia do Homem Cordial e nossa alegada 'democracia racial', passando por temas correlatos como a xenofobia e o machismo - entre outras formas de intolerância - para mostrar como questões aparentemente diferentes podem estar ligadas historicamente e atender a demanda dos sujeitos até nossos dias.
Ao analisar como se formam os grandes grupos, especialmente como se processa o mecanismo de isolamento/agrupamento nesta formação, Stephen Frosh em Desejo, Demanda e Psicoterapia: Sobre Grandes Grupos e Vizinhos nos oferece um amplo painel de analise historica que atravessa o tempo, atualizando-se nos dias de hoje no chamado pós-moderno, questões como as implicações de dissolução de fronteiras nos grandes grupos, a demanda por autonomia e o papel alteridade na construção da subjetividade. Frosh analisa como a intolerância transita do vizinho para os grandes grupos, evitando psicologizações que reduzem a questão a um 'dentro/fora' perdendo de vista os aspectos sociais e historicos que subjazem ao problema, caminhando desde autores clássicos como Levinas até contemporâneos como Butler e Zizek.
Em Pensamento, Reconhecimento e Alteridade Lisa Baraitser e Stephen Frosh resgatam as questões que fundam as raizes do processo de constituição do sujeito e do outro, isto é, a separação primeira da mãe e o papel do pai neste processo e especialmente como este modelo materno afeta as relações futuras entre reconhecimento e alteridade, no trajeto que funda o sujeito e o outr no laço social. Também são discutidas a mudanças historicas de parametro em relação ao que provocava mal estar na cultura como um deslocamento que passa do social (o que o mundo tinha a oferecer) para o proprio sujeito (um fastio contra si proprio), pois apenas ver o outro como diferente, não é a solução, já isso pode ser uma defesa contra o reconhecimento da relação onde ela existe. Os autores centram esta discussão em parte sobre o conceito de Interrupção, visto em diversas situações sociais, como possiblidade de suspensão temporaria e abertura de mudança, especialmente quanto ao papel do outro na constituição da subjetividade de cada um.
O estudo de Derek Hook discorre sobre os mecanismos subjacentes no racismo, levando em conta não apenas os aspectos psiquicos e superando as discussões mais comuns sobre o tema que versam sobre o deslizamento entre o lugar do invidividuo e do social. Hook parte das teorias de Fanon, mas não somente, para analizar como os estudos pós-coloniais - ao abordarem as longas experiencias de segregação - podem nos ajudar a pensar não apenas o lugar do colonizado mas também os processos de racialização que se processam nos colonizadores. Hook propõe novas abordagem sobre intolerância que avançam as condições históricas atentando para formas de racismo e xenofobia pré-discursivos inclusos nas relações de poder, especialmente como estas relações implicam na construção de gêneros, da heterossexualidade a homossexualidade.
Meu capítulo, A Segregação Imaginária do outro: Políticas de Igualdade e Processos de Racialização, é resultado de pesquisa sobre as políticas de igualdade, especialmente em relação ao sistema de cotas para além das diferenças culturais e políticas entre o Brazil e o Reino Unido. Neste sentido, tenho foco especial sobre a ascensão economica e acesso à universidade de parte da população brasileira nos ultimos anos para avaliar em que medida esta mudança afeta nossa crença na 'democracia racial'. Este estudo também me levou a pensar como este novo estatuto social poderia afetar nossa ideia de nacionalismo historicamente ligada ao nosso longo periodo de ditadura de formar 'uma só país' e como se poderia repensar esta ideia de nação em relação a modelos políticos atuais e seus subprodutos, como o multiculturalismo, para entender a complexidade de definir fronterias raciais, pensando as congruencias e incongruencias no modelo estrangeiro e nacional.
Raízes da Intolerância como um todo pretende demonstrar como a intolerância e os processos de segregação estão intrinsicamente ligados aos processos de subjetivação constituintes na construção do sujeito e como estes processos, fundamentais para o que chamamos 'humano', podem também ser ameaçadores do laço social que funda a civilização.
Entender esta opacidade do sujeito, os processos inconscientes implicados e sua dimensão historica e social no passado e no presente poderia nos ajudar a pensar que tipo de ações politicas poderia ser propospostas no sentido de evitar ou ao menos minimizar os eventos conflitivos entre o sujeito e o outro, seja nas relações com vizinhos, grupos ou nações.
João Angelo Fantini
Organizador