O DIA EM QUE O MORRO DESCER E NÃO FOR CARNAVAL



O dia em que o morro descer e não for carnaval
ninguém vai ficar pra assistir o desfile final
na entrada rajada de fogos pra quem nunca viu
vai ser de escopeta, metralha, granada e fuzil
(é a guerra civil)

No dia em que o morro descer e não for carnaval
não vai nem dar tempo de ter o ensaio geral
e cada uma ala da escola será uma quadrilha
a evolução já vai ser de guerrilha
e a alegoria um tremendo arsenal
o tema do enredo vai ser a cidade partida
no dia em que o couro comer na avenida
se o morro descer e não for carnaval

O povo virá de cortiço, alagado e favela
mostrando a miséria sobre a passarela
sem a fantasia que sai no jornal
vai ser uma única escola, uma só bateria
quem vai ser jurado? Ninguém gostaria
que desfile assim não vai ter nada igual

Não tem órgão oficial, nem governo, nem liga
nem autoridade que compre essa briga
ninguém sabe a força desse pessoal
melhor é o poder devolver a esse povo a alegria
se não todo mundo vai sambar no dia
em que o morro descer e não for carnaval.

Paulo César Pinheiro



DOWNLOAD: FIUME PIRATEIA VOLUME 3 - MR. CATRA
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Participações de Menor do Chapa, G3, Duda do Borel, Sonar Calibrado, Cidinho, Doca, Rafa, Galo, Barriga, G, Edgar, Valério Cara de Porco & Monstro Sabará, dentre outros.
Funk Carioca, Miami Bass, RAP, Ragga, Electrobass, Soul, Reggae: MPB.
Quase todas as músicas gravadas ao vivo.
Tem que respeitar.

O TRABALHADOR E A MÁQUINA




"Maldita máquina!" pragueja o trabalhador, suando gotas grossas, cansado e desanimado. "Maldita máquina, que me obrigas a seguir o teu ritmo infernal, como se eu também fosse feito de aço e movido por um motor! Odeio-te, instrumento de pesadelo, pois fazendo o trabalho de dez, vinte ou trinta trabalhadores, tiras-me o pão da boca - e condenas-me, assim como à minha mulher e meus filhos, a passar fome".

A máquina geme sob os golpes do motor, parecendo assim partilhar a fadiga do seu companheiro de sangue e músculos. Todas as peças que a compõem estão em movimento, e nunca param. Algumas deslizam, outras sobressaltam. Estas oscilam, estas rodopiam, gotejando óleo negro, ganindo, trepidando, cansando a vista do escravo de carne e osso que tem de seguir cuidadosamente todos os movimentos delas e resistir ao embrutecimento que provoquem, para não deixar prender um dedo numa dessas engrenagens de aço, ou perder uma mão, um braço, ou a vida...

"Máquinas infernais!" Deveriam desaparecer todas, sequazes do diabo! Belo trabalho que fazem! Em um dia, sem outra despesa que alguns baldes de carvão para alimentar o motor, despacham cada uma mais trabalho que um homem em um mês, de tal maneira que um trabalhador, que poderia ter trabalho para trinta dias, vê-lo reduzido a um só por vossa causa... nós a morrer deixa-te indiferente! Sem ti, vinte famílias de proletários teriam o pão quotidiano assegurado."

As mil e umas peças da máquina estão em ação. Giram, deslizam em todos os sentidos, juntam-se e afastam-se, suam gorduras repugnantes, trepidam e ganem até a vertigem... a lúgubre máquina não deixa um instante de descanso. Respira ruidosamente como se fosse viva. Parece esperar qualquer momento de distração do escravo humano para morder-lhe um dedo, arrancar-lhe um braço - ou a vida...

Através de um respiradouro, penetra uma pálida luz, carceral e sinistra. O próprio sol recusa-se a iluminar este antro de miséria, de angústia e de fadiga, onde se sacrificam laboriosas existências para o benefício de vidas estéreis. Ruídos de passos vêm do exterior - é o rebanho em marcha! Miasmas espreitam em cada canto da oficina. O trabalhador tosse... tosse! A máquina geme... geme!

"Fazem sete horas que estou ao teu lado e ainda tenho que agüentar três. Tenho vertigens, mas devo resistir. A cabeça pesa-me, mas cuidado com o menor momento de desatenção! Tenho de seguir todos os teus movimentos se não quero que os teus dentes de aço me mordam e que os teus dedos de ferro me encerrem... Mais três longas horas! As minhas orelhas zumbem, uma sede terrível devora-me, tenho febre, a minha cabeça vai rebentar."

Sons felizes chegam de fora: são crianças que passam, travessas. Os risos delas, graciosos e inocentes, afastam por um instante a penumbra em volta, gera uma sensação de frescura tal como o canto de um pássaro num momento de abatimento. A emoção apodera-se do operário. Os próprios filhos dele também gorjeiam assim! É assim que riem! E, sempre a observar o movimento dos mecanismos, começa a pensar. O espírito vai ter com o fruto dos seus amores, que espera por ele em casa. Estremece com a idéia de as crianças dele terem também de vir estourar-se perante uma máquina na penumbra de uma oficina onde pululam os micróbios.

"Maldita máquina! Odeio-te!"

A máquina começa a trepidar com mais vigor, já não geme mais. De todos os seus tendões de ferro, de todas as suas vértebras de aço, dos dentes duros de suas engrenagens, das suas centenas de peças infatigáveis, sai um som rouco cheio de raiva que, traduzido em linguagem humana, significa:

- Cala-te miserável! Pára de queixar-te, covarde! Eu não passo de uma máquina, movida por um motor, mas tu, tu tens um cérebro e não te revoltas, pobre diabo! Pára de lamentar-te sem fim, imbecil! É a tua covardia que é causa da tua desgraça, não eu. Apodera-te de mim, arranca-me das garras desse vampiro que te chupa o sangue, e trabalha para ti e os teus, cretino! Em si, as máquinas são uma bênção. Poupamos esforço ao homem, mas vocês trabalhadores são tão estúpidos que nos deixam nas mãos dos vossos carrascos, embora vocês próprios nos tenham construído. Como conceber maior estupidez? Cala-te e não pies nem uma palavra mais! Se não tens a coragem de romper as tuas correntes, então não te queixes! Vamos, são horas de sair. Foge daqui e pensa!

Com as palavras salutares da máquina, associadas ao ar fresco da rua, surge a consciência à mente do trabalhador. Sente um mundo desmoronar-se no seu espírito: o mundo dos preconceitos, dos interditos e do respeito da ordem estabelecida, das leis e das tradições.

Flores Magón 1916


DOWNLOAD: KENNY BURRELL WITH COLEMAN HAWKINS - BLUESY BURRELL - 1973 - 320 Kbps
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CONTRA O ROUBO DA VIDA - CONTRA O TRABALHO




Boa parte de nossas vidas, de nossas tardes, de nossas manhãs e noites são roubadas pelo trabalho. E na maioria dos casos trabalhamos em lugares que não gostamos, fazendo coisas que não gostamos e tudo isso simplesmente para comprar coisas que na realidade não precisamos.
Bob Black em "A Abolição do Trabalho" afirma que "estamos tão próximos do mundo do trabalho que não conseguimos ver o que ele faz conosco".
O trabalho nos empobrece, arruína nossos espíritos, nos enfraquece como indivíduos capazes de desenvolver as mais diversas habilidades e de enfrentar e experimentar as mais diversas situações.
Ao contrário do que a mídia, o Estado, os partidos e sindicatos, a esquerda e a direita, o clero e a escola afirmam, o trabalho não é sinônimo de atividade humana, trabalho é sinônimo de alienação humana. O trabalho é o roubo de nossa energia criativa para fins que não nos interessam e que geralmente são prejudiciais a nós mesmos e ao planeta. Vamos encarar a realidade, ninguém trabalha porque quer, somos induzidos ao trabalho porque o Estado e o capital trabalham juntos para garantir sua sobrevivência às custas da humanidade e da Terra, e para isso bombardeiam nossas mentes 24 horas por dia com a mentira de que existe somente esta forma de viver (trabalhar e pagar contas), de que não podemos viver de outra maneira. Fora disso é ilusão, loucura!
E quando acreditamos nessa mentira, acabamos com as nossas vidas trabalhando em lugares que não gostamos, fazendo coisas que na realidade não nos interessam.
Desvencilharmo-nos do universo do trabalho através da construção da autonomia é um projeto vital para retomarmos o controle e o significado de nossas vidas.

John Zerzan


DOWNLOAD: JAY-JAY JOHANSON - SELF-PORTRAIT - 2008

DITADURA DO RELÓGIO


Não há nada que diferencie tanto a sociedade ocidental de nossos dias das sociedades mais antigas da Europa e do Oriente do que o conceito de tempo. Tanto para os antigos gregos e chineses quanto para os nômades árabes ou para o peão mexicano de hoje, o tempo é representado pelos processos cíclicos da natureza, pela sucessão de dias e noites, pela passagem das estações. Os nômades e os fazendeiros costumavam medir - e ainda hoje o fazem - seu dia do amanhecer até o crepúsculo e os anos em termos de tempo de plantar e de colher, das folhas que caem e do gelo derretendo nos lagos e rios. O homem do campo trabalhava em harmonia com os elementos, como um artesão, durante tanto tempo quanto julgasse necessário. O tempo era visto como um processo natural de mudança e os homens não se preocupavam em medi-lo com exatidão. Por essa razão, civilizações que eram altamente desenvolvidas sob outros aspectos dispunham de meios bastante primitivos para medir o tempo: a ampulheta cheia que escorria, o relógio de sol inútil num dia sombrio, a vela ou lâmpada para onde o resto de óleo ou cera que permanecia sem queimar indicava as horas. Todos esses dispositivos forneciam medidas aproximadas de tempo e tornavam-se muitas vezes falhos pelas condições do clima ou pela inabilidade daqueles que os manipulavam. Em nenhum lugar do mundo antigo ou da Idade Média havia mais do que uma pequeníssima minoria de homens que se preocupassem realmente em medir o tempo em termos de exatidão matemática.

O homem ocidental civilizado, entretanto, vive num mundo que gira de acordo com os símbolos mecânicos e matemáticos das horas marcadas pelo relógio. É ele que vai determinar seus movimentos e dificultar suas ações. O relógio transformou o tempo, transformando-o de um processo natural em uma mercadoria que pode ser comprada, vendida e medida como um sabonete ou um punhado de passas de uvas. E, pelo simples fato de que, se não houvesse um meio para marcar as horas com exatidão, o capitalismo industrial nunca poderia ter se desenvolvido, nem teria continuado a explorar os trabalhadores, o relógio representa um elemento de ditadura mecânica na vida do homem moderno, mais poderoso do que qualquer outro explorador isolado ou do que qualquer outra máquina.

(...) A princípio, esta nova atitude em relação ao tempo, este novo ritmo imposto à vida foi ordenado pelos patrões, senhores do relógio, e os pobres o recebiam a contragosto. E o escravo da fábrica reagia, nas horas de folga, vivendo na caótica irregularidade que caracterizava os cortiços encharcados de gim dos bairros pobres no início da era industrial do século XIX.

Os homens se refugiavam no mundo sem hora marcada da bebida ou do culto metodista. Mas aos poucos, a idéia de regularidade espalhou-se, chegando aos trabalhadores. A religião e a moral do séc. XIX desempenharam seu papel, ajudando a proclamar que "perder tempo" era um pecado. A introdução dos relógios, fabricados em massa a partir de 1850, difundiu a preocupação com o tempo entre aqueles que antes se haviam limitado a reagir ao estímulo do despertador ou à sirene da fábrica. Na igreja e na escola, nos escritórios e nas fábricas, a pontualidade passou a ser considerada como a maior das virtudes.

E desta dependência servil ao tempo marcado nos relógios, que se espalhou insidiosamente por todas as classes sociais no séc. XIX, surgiu a arregimentação desmoralizante que ainda hoje caracteriza a rotina das fábricas.

O homem que não conseguir ajustar-se deve enfrentar a desaprovação da sociedade e a ruína econômica - a menos que abandone tudo, passando a ser um dissidente para o qual o tempo deixa de ser importante. Refeições feitas às pressas, a disputa de todas as manhãs e de todas as tardes por um lugar nos trens e nos ônibus, a tensão de trabalhar obedecendo horários, tudo isso contribui, pelos distúrbios digestivos e nervosos que provoca, para arruinar a saúde e encurtar a vida dos homens.

Nem se poderia afirmar que a imposição financeira da regularidade de horários tenha contribuído a longo prazo para o aumento da eficiência. Na verdade, a qualidade do produto parece ter até diminuído, pois o empregador que vê o tempo como uma mercadoria pela qual tem de pagar obriga o operário a trabalhar numa velocidade tal que a produção forçosamente será de qualidade inferior. O critério passa a ser de quantidade e não de qualidade e já não há mais o prazer do trabalho pelo trabalho. O trabalhador transforma-se, por sua vez, num especialista em "olhar o relógio", preocupado apenas em saber quando poderá escapar para gozar suas escassas e monótonas formas de lazer que a sociedade industrial lhe proporciona; onde ele, para "matar o tempo", programará tantas atividades mecânicas com tempo marcado, como ir ao cinema, ouvir rádio e ler jornais, quanto permitir o seu salário e o seu cansaço. Só quando se dispõe a viver em harmonia com sua fé ou com sua inteligência é que o homem sem dinheiro consegue deixar de ser um escravo do relógio.

George Woodcock

KRAFTWERK - MINIMUM MAXIMUM - 2005

SURPLUS - TERRORIZED INTO BEING CONSUMERS

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DOWNLOAD FILM TORRENT: SURPLUS - TERRORIZED INTO BEING CONSUMERS -
- ERIK GANDINI & JOHAN SODËRBERG - SUÉCIA - 52 min. - 2003 - DVD - 3.45 Gb -
- LEGENDAS EM PORTUGUÊS E MAIS 5 IDIOMAS -

VISTA CANSADA






Acho que foi o Hemingway quem disse que olhava cada coisa à sua volta como se a visse pela última vez. Pela última ou pela primeira vez? Pela primeira vez foi outro escritor quem disse. Essa idéia de olhar pela última vez tem algo de deprimente. Olhar de despedida, de quem não crê que a vida continua, não admira que o Hemingway tenha acabado como acabou.

Se eu morrer, morre comigo um certo modo de ver, disse o poeta. Um poeta é só isto: um certo modo de ver. O diabo é que, de tanto ver, a gente banaliza o olhar. Vê não-vendo. Experimente ver pela primeira vez o que você vê todo dia, sem ver. Parece fácil, mas não é. O que nos cerca, o que nos é familiar, já não desperta curiosidade. O campo visual da nossa rotina é como um vazio.

Você sai todo dia, por exemplo, pela mesma porta. Se alguém lhe perguntar o que é que você vê no seu caminho, você não sabe. De tanto ver, você não vê. Sei de um profissional que passou 32 anos a fio pelo mesmo hall do prédio do seu escritório. Lá estava sempre, pontualíssimo, o mesmo porteiro. Dava-lhe bom-dia e às vezes lhe passava um recado ou uma correspondência. Um dia o porteiro cometeu a descortesia de falecer.

Como era ele? Sua cara? Sua voz? Como se vestia? Não fazia a mínima idéia. Em 32 anos, nunca o viu. Para ser notado, o porteiro teve que morrer. Se um dia no seu lugar estivesse uma girafa, cumprindo o rito, pode ser também que ninguém desse por sua ausência. O hábito suja os olhos e lhes baixa a voltagem. Mas há sempre o que ver. Gente, coisas, bichos. E vemos? Não, não vemos.

Uma criança vê o que o adulto não vê. Tem olhos atentos e limpos para o espetáculo do mundo. O poeta é capaz de ver pela primeira vez o que, de fato, ninguém vê. Há pai que nunca viu o próprio filho. Marido que nunca viu a própria mulher, isso existe às pampas. Nossos olhos se gastam no dia-a-dia, opacos. É por aí que se instala no coração o monstro da indiferença.


Otto Lara Resende


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BOBBY KALPHAT & PHIL PRATT - ZION HILL DUB - 1977
http://www.mediafire.com/?u36ru1b7nv5m5mn

EXCESSO DE INFORMAÇÃO


1. Perda de produtividade
- a falta de foco e o excesso de opções nos faz pular de um assunto ou detalhe a outro, distraindo-nos de nossas metas e propósitos.

2. Mente inquieta
- este ruído constante de mídia acaba gerando um zumbido constante que obstrui a concentração e a paz interior.

3. Perda de Tempo
- todo o tempo desperdiçado recebendo, deglutindo e repetindo informação inútil é descontado de nossa cota diária de trabalho, diversão, envolvimento e felicidade.

4. Desconexão - quanto mais somos expostos e envolvidos pelo excesso de informação, mais se enfraquece nosso elo interior com nossos valores, sentimentos e metas.

5. Stress e Ansiedade - o zumbido da informação inútil vicia, e cria a ilusão de temos milhares de pequenas coisas a fazer, notícias para ler, tarefas a cumprir. Após meses nessa rotina, a impressão que se tem é a de que se está sempre ocupado, atrasado e devendo.

Think Simple Now



DOWNLOAD: THE FOLK IMPLOSION - TAKE A LOOK INSIDE - 1994

BRASILEIRO CEM-MILHÕES



Telefonei para a maternidade indagando se havia nascido o bebê nº 100.000.000, e não souberam informar-me:
– De zero hora até este momento nasceram oito, mas nenhum foi etiquetado com esse número.
É uma falha do nosso registro civil: as crianças não recebem número ao nascer. Dão-lhes apenas um nome, às vezes surrealista, que as acompanhará por toda vida como pesadelo, quando a numeração pura e simples viria garantir identidade insofismável, poupando ainda o vexame de carregar certos antropônimos. Centenas de milhares nascem João ou José, mas o homem ou a mulher 25.786.439 seria uma única pessoa viva, muito, mas fácil de cadastrar no fichário do Imposto de Renda e nos 10 mil outros fichários com que é policiada a nossa existência.
Passei por baixo do viaduto, onde costumam nascer filhos do vento, e reinava uma paz de latas enferrujadas e grama sem problemas. Ninguém nascera ali depois da meia-noite. O dia 21 de agosto, marcado para advento do brasileiro cem-milhões, transcorria sem que sinal algum, na terra ou no ar, registrasse o acontecimento.
Costumo acreditar nos bancos, principalmente nos oficiais, e se o Banco Nacional de Habitação, através da Serfhau, garantiu que nessa segunda-feira o Brasil atingiria a cifra redonda de 100 milhões de habitantes, é porque uma parturiente adrede orientada estaria de plantão para perfazer esse número.
Verdade seja que o IBGE, pelo Centro Brasileiro de Estudos Demográficos, julgou prematura a declaração, e só para o trimestre de outubro/dezembro nos promete o brasileiro em questão. Não ponho em dúvida sua autoridade técnica, mas um banco é um banco, ainda mais se agência governamental, e a esta hora deve ter recolhido nosso centésimo milionésimo compatrício em berço especial da casa própria, botando-lhe à cabeceira um cofre de caderneta de poupança.
É que me custa admitir o nascimento desse garoto, ou garota, sem o amparo de nossas leis sociais, condenado a ser menos que número - uma dessas crianças mendicantes, que não conhecerão as almofadas da felicidade. Não queria que a televisão lhe desse um carnê e uma viagem à Grécia, nem era preciso que Manchete lhe dedicasse 10 páginas coloridas sob o patrocínio do melhor leite em pó. Mas gostaria que viesse ao mundo com um mínimo de garantia contra as compulsões da miséria e da injustiça, e de algum modo representasse situação idêntica de milhões de outras crianças que recebessem - estou pedindo muito? – não somente o dom da vida, mas oportunidades de vivê-la.
Seria vaidade irrisória proclamar-se ele o 100.000.000º brasileiro, membro eufórico da geração dos 100 milhões, e saber-se apenas mais um marginalizado, que só por artifício de média ganha sua fatia no bolo do Produto Nacional Bruto.
Não desejo herói de monumento nem mártir anônimo. Prefiro vê-lo como um ser capaz de fazer alguma coisa de normal numa sociedade razoavelmente suportável, em que a vida não seja obrigação estúpida, sem pausa para fruir a graça das coisas naturais e o que lhes acrescentou a imaginação humana.
Olho para esse brasileiro cem-milhões, nascido ontem ou por nascer daqui a algumas semanas, como se ele fosse o meu neto... bisneto, talvez. Pois quando me dei conta de mim, isso aí era um país de 20 milhões de pessoas, diluídas num território quase só mistério, que aos poucos se foi desbravando, mantendo ainda bolsões de sombra. Vi crescer a terra e lutarem os homens, entre desajustes e sofrimentos.
Os maiorais que dirigiam o processo lá se foram todos. Vieram outros e outros, e encontro nessa geração o novo rosto da vida, que se interroga. Há muita ingenuidade, também muita coragem, e os problemas se multiplicaram com o crescimento desordenado. Somos mais ricos... e também mais pobres.
Meu querido e desconhecido irmão nº 100.000.000, onde quer que estejas nascendo, fica de olho no futuro, presta atenção nas coisas para que não façam de ti subproduto de consumo, e boa viagem pelo século XXI adentro.

Carlos Drummond de Andrade



JIMMY SMITH & WES MONTGOMERY
JIMMY & WES THE DYNAMIC DUO - 1966

http://www.4shared.com/rar/4N4u2AgD/Wes_Montgomery_-_Jimmy_Smith__.html?

SAMPLER





É uma questão de reunir várias técnicas recortadas a fim de responder à onipresença dos transmissores que nos alimentam com seus discursos obsoletos (meios de comunicação em massa, publicidades, etc.). É uma questão de desacorrentar os códigos - não mais o sujeito - tal que uma coisa arrebente, escape: palavras por trás de palavras, obsessões pessoais. Neste outro tipo de palavra, que escapa ao totalitarismo da mídia, mas retém o seu poder, e volta contra seus velhos mestres.


Critical Art Ensenble







DOWNLOAD: DELTRON 3030 - 2000 - 192 Kbps
http://www.mediafire.com/?1tvwx2rcuhx



ÁFRICA


Em meus lábios grossos fermenta

a farinha do sarcasmo que coloniza minha Mãe África
e meus ouvidos não levam ao coração seco
misturada com o sal dos pensamentos
a sintaxe anglo-latina de novas palavras.

Amam-me com a única verdade dos seus evangelhos
a mística das suas missangas e da sua pólvora
a lógica das suas rajadas de metralhadora
e enchem-me de sons que não sinto
das canções das suas terras
que não conheço.

E dão-me
a única permitida grandeza dos seus heróis
a glória dos seus monumentos de pedra
a sedução dos seus pornográficos Rolls-Royce
e a dádiva quotidiana das suas casas de prostituição.

Ajoelham-me aos pés dos seus deuses de cabelos lisos
e na minha boca diluem o abstrato
sabor da carne de hóstias em milionésimas
circunferências hipóteses católicas de pão.

E em vez dos meus amuletos de garras de leopardo
vendem-me a sua desinfetante bênção
a vergonha de uma certidão de filho de pai incógnito
uma educativa sessão de "strip tease" e meio litro
de vinho tinto com graduação de álcool de branco
exata só para negro
um gramofone de magaíza
um filme de heróis de carabina a vencer traiçoeiros
selvagens armados de penas e flechas
e o ósculo das suas balas e dos seus gases lacrimogêneos
civiliza o mau casto impudor africano.

Efígies de Cristo suspendem ao meu pescoço
em rodelas de latão em vez dos meus autênticos
mutovanas* da chuva e da fecundidade das virgens
do ciúme e da colheita de amendoim novo.
E aprendo que os homens que inventaram
a confortável cadeira elétrica

a técnica de Buchenwald e as bombas V2
acenderam fogos de artifício nas pupilas
de ex-meninos vivos de Varsóvia

criaram Al Capone, Hollywood, Harlem
a seita Klu-Klux-Klan, Cato Mannor e Sharpeville**

e emprenharam o pássaro que fez o choco
sobre os ninhos mornos de Hiroshima e Nagasaki
conheciam o segredo das parábolas de Charlie Chaplin
lêem Platão, Marx, Gandhi, Einstein e Jean-Paul Sartre
e sabem que Garcia Lorca não morreu mas foi assassinado
são os filhos dos santos que descobriram a Inquisição
perverteram de labaredas a cruficifada nudez

da sua Joana D'Arc e agora vêm
arar os meus campos com tratores "made in germany"
mas já não ouvem a sutil voz das árvores
nos ouvidos surdos do espasmo das turbinas
não lêem nos meus livros de nuvens
o sinal das cheias e das secas
e nos seus olhos ofuscados pelos clarões metalúrgicos
extinguiu-se a eloqüente epidérmica beleza de todas
as cores das flores do universo

e já não entendem o gorjeio romântico das aves de casta
instintos de asas em bando nas pistas do éter
infalíveis e simultâneos bicos trespassando sôfregos
a infinita côdea impalpável de um céu que não existe.
E no colo macio das ondas não adivinham os vermelhos
sulcos das quilhas negreiras e não sentem
como eu sinto o prenúncio mágico sob os transatlânticos
da cólera das catanas de ossos nos batuques do mar.
E no coração deles a grandeza do sentimento
é do tamanho cowboy do nimbo dos átomos

desfolhados no duplo rodeio aéreo no Japão.

Mas nos verdes caminhos oníricos do nosso desespero
perdôo-lhes a sua bela civilização à custa do sangue
ouro, marfim, améns
e bíceps do meu povo.

E ao som másculo dos tantãs tribais o eros
do meu grito fecunda o humus dos navios negreiros...
E ergo no equinócio da minha Terra
o moçambicano rubi do nosso mais belo canto xi-ronga
e na insólita brancura dos rins da plena Madrugada
a necessária carícia dos meus dedos selvagens
é a tácita harmonia de azagaias no cio das raças
belas como altivos falos de ouro
eretos no vento nervoso da noite africana.


* Amuletos

** Cato Mannor e Sharpeville: Nomes de lugares onde ocorreram repressões policiais sangrentas na Africa do Sul contra trabalhadores africanos.


José Craveirinha



DOWNLOAD: FIRE TONGUE & CHIEF COOK - WAYO BRING WAR - 2006 - WMA
UNAVAILABLE

SOBRE O HAXIXE

(...) submeter-se à sua ação apenas em ambientes ou circunstâncias favoráveis. Sendo toda alegria e todo bem-estar superabundantes, toda dor e toda angústia são imensamente profundas. Tenha alguns cúmplices cujo talento intelectual se aproxime do seu. Suponho que você teve a precaução de escolher bem o seu momento para esta expedição aventurosa. Você não tem deveres a cumprir que exijam a pontualidade e a exatidão; nenhuma tristeza de família; nenhuma dor de amor. É preciso ter cuidado. Esta infelicidade, esta lembrança de um dever que reclama sua vontade, sua atenção a um momento determinado, envenenarão o seu prazer. A inquietação será transformada em angústia; a tristeza, em tortura. Se observadas todas estas condições preliminares, o tempo estiver bom, se você estiver em um ambiente favorável, como uma paisagem pitoresca ou um apartamento poeticamente decorado e se, além disso, você puder contar com um pouco de música, então tudo é para o melhor (...)

Charles Baudelaire



DOWNLOAD: BELLERUCHE - TURNTABLE SOUL MUSIC - 2007 - VBR






FUGI - MARY, DON'T TAKE ME ON NO BAD TRIP - 1968
http://www.mediafire.com/?0kdp64a8d1wr1j7


Tal como nos é apresentada, a crise planetária das finanças parece-se com um desses maus filmes produzidos pela indústria de sucessos pré-fabricados que chamamos hoje de cinema. Nada falta nele, incluindo mesmo os clarões que provocam terror: é impossível impedir a sexta-feira negra, parece que tudo vai desmoronar, tudo mesmo...

Mas a esperança permanece. Diante do espectáculo, aterrorizados e concentrados como num filme-catástrofe, a pequena quadrilha dos poderosos, os bombeiros do fogo monetário, os Sarkozy, Paulson, Merkel, Brown e outros Trichet, gastam bilhões para encher um buraco central: “Salvar os bancos!”. Esse nobre grito humanista e democrático é lançado por todas as gargantas políticas e midiáticas. Para os atores principais do filme, ou seja, os ricos, como também os seus serventuários, assim como para os seus parasitas e todos aqueles que os incensam, um final feliz é inevitável, diante do que eles, os políticos que o cercam e o mundo são hoje.

Mas voltemo-nos antes para os espectadores desse show, a multidão atônita que ouve como uma algazarra longínqua os gritos alucinantes dos banqueiros, imagina os fins-de-semana cansativos da ilustre equipe de chefes de governo, vê passar diante dos seus olhos estatísticas tão gigantescas quanto obscuras, e compara tudo isso mecanicamente aos recursos com os quais vive, ou mesmo, para uma parte muito considerável da humanidade, a pura e simples falta de recursos que forma o fundo amargo e corajoso de sua vida. Eu digo que aí é que está o real, ao qual não teremos acesso enquanto não nos desviarmos da tela do espectáculo para considerar a massa invisível daqueles para quem o filme-catástrofe, incluindo um inesperado final cor-de-rosa (com Sarkozy abraçando Merkel, e todos chorando de alegria), nunca deixou de ser um teatro de sombras.

Nas últimas semanas, falou-se sistematicamente da “economia real” (a produção de bens). Oposta a ela está a “economia irreal” (a especulação), de onde viria todo o mal, visto que os seus agentes teriam se tornado “irresponsáveis”, “irracionais” e “predadores”. Essa distinção é, evidentemente, absurda. O capitalismo financeiro é, desde há cinco séculos, uma peça central do capitalismo. Quanto aos proprietários e incentivadores desse sistema, eles não são só, por definição, os responsáveis pelos lucros, e a sua “racionalidade” não é apenas medida pelos lucros. De fato, eles são não só os predadores como ainda têm a obrigação de o ser.

Não há, portanto, nada de mais real na produção capitalista que a sua febre mercantil ou a sua pulsão para a especulação. O retorno ao real não é, assim, o movimento que conduz da má especulação “irracional” à saudável produção. Esse retorno é antes o retorno à vida, imediata e refletida, de todos aqueles que habitam esse mundo. É a partir dessa posição que se pode observar sem fraquejar o capitalismo e o filme-catástrofe que ele nos apresenta nestes dias. O real não é o filme, mas a sala.

O que é que vemos? Vemos coisas simples e conhecidas de longa data: o capitalismo não é nada mais que um banditismo, irracional na sua essência e devastador para o futuro. Ele sempre cobrou por algumas curtas décadas de prosperidade selvaticamente desiguais um preço que é traduzido por crises ou pelo desaparecimento de quantidades astronômicas de valores, ou então por expedições punitivas sanguinárias em todas as zonas consideradas por ele como estratégicas ou ameaçadas, ou ainda com guerras mundiais através das quais a sua saúde é refeita.

Deixemos ao filme-crise, assim revisto, a sua força didática. Poderemos ainda assim ousar, face à vida das pessoas que assistem, elogiar um sistema que remete a organização da vida coletiva às pulsões mais baixas, à cobiça, à rivalidade, e ao egoísmo automatizado? Fazer o elogio de uma “democracia” onde os dirigentes são tão impunemente os serventuários da apropriação financeira privada? Será que é possível continuar a afirmar que é impossível tapar com milhões o buraco da segurança social, mas que devemos tapar, com bilhões, o buraco dos bancos?

A única coisa que podemos desejar nesta questão é que descubramos o poder didático nas lições que podem ser tiradas para os povos, e não para os banqueiros, para os governos que os servem e para os jornais que servem aos governantes, em todo esse sombrio espectáculo. Eu vejo dois níveis articulados deste retorno do real. O primeiro é claramente político. Como o filme tem mostrado, o fetiche “democrático” não passa de um serviço solícito aos bancos. O seu verdadeiro nome, o seu nome técnico, como proponho há muito tempo, é: capital-parlamentarismo. Convém, pois, como múltiplas experiências começaram a fazer nos últimos vinte anos, organizar uma política de natureza diferente.

Ela é e estará - por muito tempo ainda, sem dúvida – distante do poder do Estado, mas pouco importa. Ela começa, na base do real, pela aliança prática das pessoas mais imediatamente disponíveis para inventá-la: os novos trabalhadores vindos da África ou de outros lugares, e os intelectuais herdeiros das batalhas políticas das últimas décadas. Ela ampliar-se-á em função do que houver a fazer, ponto por ponto. Ela não manterá nenhuma espécie de relação orgânica com os partidos existentes e o sistema, eleitoral e institucional, que os mantém vivos. Ela inventará a nova disciplina daqueles que não têm nada, a sua capacidade política, a nova idéia do que será sua vitória.

O segundo nível é ideológico. É preciso inverter o velho veredito segundo o qual estaríamos vivendo “o fim das ideologias”. Vemos hoje, muito claramente, que essa pretensão não tem outra realidade do que a expressa pela palavra de ordem “salvemos os bancos”. Nada é mais importante do que reencontrar a paixão das idéias e contrapor ao mundo, visto como uma hipótese geral, a certeza antecipada de um outro curso de acontecimentos totalmente distinto. Ao espectáculo maléfico do capitalismo, nós opomos o real dos povos, a existência de todos no movimento próprio das idéias. A motivação pela emancipação da humanidade não perdeu em nada a sua força.

Alain Badiou


DOWNLOAD: HOT CHOCOLATE - 1971
http://www.mediafire.com/?6ifwb4mt4qy4n9u







O crash mostra que a terra é pequena demais para o progresso, para a velocidade da História. Daí a repetição dos acidentes. Nós vivemos com a convicção de que temos um passado e um futuro. Ora, o passado não passa; ele tornou-se monstruoso, ao ponto de não o tomarmos mais como referência. Quanto ao futuro, ele é limitado pela questão ecológica, o fim programado dos recursos naturais, como o petróleo. Resta, portanto, o presente a habitar. Mas o escritor Octavio Paz dizia: “O instante é inabitável, como o futuro”.



Paul Virilio







MR. BUNGLE - DISCO VOLANTE - 1995









Eu estou cansado de saber disso, mas a maioria não se convence que sem governo é melhor.
Desde criança sinto um eterno zumbido no ouvido de que o governo não presta.
Hoje estou com perto de 50 anos e o zumbido de que o governo não presta aumentou.
Que diabo! Uma coisa que não presta bota-se fora, não se deve aceitar!
Mas aí quem poderia governar-se por si?
Eu!... Eu mesmo podia me governar muito bem. Por que não?
Ora essa! Então não sei me dirigir por mim mesmo?
O governo fornece-me algumas muletas? Faltaria só isso! Não saber me governar! É o que venho fazendo há cinqüenta anos! Pois os animais se governam muito bem por si, quanto mais um de nós que tem mais recursos e mais fácil o pão.
Vamos ser razoáveis. Sempre dispensei e dispensaria perfeitamente o governo.
Nunca o consultei para nada, nem lhe solicitei ou recebi dele qualquer favor ou benefício.
O governo, o Estado, é que não procede reciprocamente comigo.
Mete-se em todos os meus negócios, atrapalha-me de todo jeito, quer saber quanto ganho, o que faço, de que vivo, e tira de mim o lucro do meu trabalho em licenças e impostos, em nome de instituições que eu não conheço, deixando-me só o que preciso para não pedir esmola.
Posso eu sozinho me opor à vontade do governo?? Não!? E por quê?
Impele-me pela força armada. Aí é que está.
Mas não digam que não saberia conduzir-me sem governo. Não sou só eu que não quero, somos todos.
Por que é que se formam partidos políticos de todas as cores? Não é para combater o governo? Aliança Liberal, o Partido Democrático, o Partido Católico, o Partido Socialista, o Partido Comunista e Cia., não são ou foram contra o governo? O governo não presta.
Como vedes não é só o anarquista que não quer governo, somos nós todos. Vamos então ser sinceros: quem é que gosta de ser governado? Além de tudo, o governo é um ente escravo de si mesmo, e quais garantias têm os governantes? As mesmas dos governados. O pau que dá no Chico dá na Joana! O governo é uma coisa tão absurda que não garante nem a si.
Tudo é questão de palavras. Estou convencido de que todos querem o mesmo que eu quero, só que à maioria falta a coragem de assumir a responsabilidade das próprias convicções e perder o amor aos privilégios adquiridos e nada mais.
Mas que o governo garanta alguma coisa de perene e eterno, todos estão cansados (como nós) de saber que isso é mentira, que o governo não garante coisa nenhuma, pois até ele é provisório e passageiro como uma estrela errante.
Por isso digo-vos: o governo não presta! E com igual razão os da última moda: bolchevista ou comunista, fascista ou socialista. Os nomes pouco importam. É que constituem um só conteúdo, uma coisa só: governo (ou desgoverno) e sempre pela força.


Armandinho
Texto publicado no periódico A Plebe, abril de 1933




OHIO PLAYERS - PAIN - 1971








DOWNLOAD: BS 2000 - SIMPLY MORTIFIED - 2001 - VBR
http://rapidshare.com/files/104811882/BS_2000-_Simply_Mortified.zip



Vêde: a destruição prossegue docemente. Restam apenas aqui e além algumas cidades com os seus milhões de almas e nada mais. Pequenas marcas de sangue cada vez mais vivas assinalam a nossa passagem entre as fagulhas de carvão do tempo. Canhões ocupam a entrada da luz. E de Norte a Sul, de Leste a Oeste, de criança para criança, aguarda-se o sinal de fogo. Não estranheis os sinais, não estranheis este povo que oculta a cabeça nas entranhas dos mortos. Fazei todo o mal que puderdes e passai depressa.

António José Forte



SABOTAGE - RAP É COMPROMISSO - 2001










POÉTICA

Estou farto do lirismo comedido

Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente
protocolo e manifestações de apreço ao Sr. diretor.
Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário
o cunho vernáculo de um vocábulo.
Abaixo os puristas
Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais
Todas as construções sobretudo as sintaxes de exceção
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis
Estou farto do lirismo namorador
Político
Raquítico
Sifilítico
De todo lirismo que capitula ao que quer que seja
fora de si mesmo
De resto não é lirismo
Será contabilidade tabela de co-senos secretário do amante
exemplar com cem modelos de cartas e as diferentes
maneiras de agradar às mulheres, etc
Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbedos
O lirismo difícil e pungente dos bêbedos
O lirismo dos clowns de Shakespeare

- Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.

Manuel Bandeira



DOWNLOAD: BOMB THE BASS - INTO THE DRAGON - 1988

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JOHNNY CLARKE - DREADER DREAD - 1976~1978
http://crocko.com/1903034968.html






- Escuta aqui, ó criolo…
- O que foi?
- Você andou dizendo por aí que no Brasil existe racismo.
- E não existe?
- Isso é negrice sua. E eu que sempre te considerei um negro de alma branca… É, não adianta. Negro quando não faz na entrada…
- Mas aqui existe racismo.
- Existe nada. Vocês têm toda a liberdade, têm tudo o que gostam. Têm carnaval, têm futebol, têm melancia… E emprego é o que não falta. Lá em casa, por exemplo, estão precisando de empregada. Pra ser lixeiro, pra abrir buraco, ninguém se habilita.
Agora, pra uma cachacinha e um baile estão sempre prontos. Raça de safados! E ainda se queixam!
- Eu insisto, aqui tem racismo.
- Então prova, Beiçola. Prova. Eu alguma vez te virei a cara? Naquela vez que te encontrei conversando com a minha irmã, não te pedi com toda a educação que não aparecesse mais na nossa rua? Hein, tição? Quem apanhou de toda a família foi a minha irmã. Vais dizer que nós temos preconceito contra branco?
- Não, mas…
- Eu expliquei lá em casa que você não fez por mal, que não tinha confundido a menina com alguma empregadoza de cabelo ruim, não, que foi só um engano porque negro é burro mesmo. Fui teu amigão. Isso é racismo?
- Eu sei, mas…
- Onde é que está o racismo, então? Fala, Macaco.
- É que outro dia eu quis entrar de sócio num clube e não me deixaram.
- Bom, mas pera um pouquinho. Aí também já é demais. Vocês não têm clubes de vocês? Vão querer entrar nos nossos também? Pera um pouquinho.
- Mas isso é racismo.
- Racismo coisa nenhuma! Racismo é quando a gente faz diferença entre as pessoas por causa da cor da pele, como nos Estados Unidos. É uma coisa completamente diferente. Nós estamos falando do crioléu começar a freqüentar clube de branco, assim sem mais nem menos. Nadar na mesma piscina e tudo.
- Sim, mas…
- Não senhor. Eu, por acaso, quero entrar nos clubes de vocês? Deus me livre.
- Pois é, mas…
- Não, tem paciência. Eu não faço diferença entre negro e branco, pra mim é tudo igual. Agora, eles lá e eu aqui. Quer dizer, há um limite.
- Pois então. O …
- Você precisa aprender qual é o seu lugar, só isso.
- Mas…
- E digo mais. É por isso que não existe racismo no Brasil. Porque aqui o negro conhece o lugar dele.
- É, mas…
- E enquanto o negro conhecer o lugar dele, nunca vai haver racismo no Brasil. Está entendendo? Nunca. Aqui existe o diálogo.
- Sim, mas…
- E agora chega, você está ficando impertinente. Bate um samba aí que é isso que tu faz bem.


Luís Fernando Veríssimo





DOWNLOAD: DAVID SHIRE -
THE TAKING OF PELHAM ONE TWO THREE OST - 1974 - 256 Kbps
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